Azul Piscina



Estava adorando minhas aulas, talvez por que estivesse me saindo muito bem em todas as matérias até então. Estava me preparando para minha primeira aula de poções que era com a Grifinória, mas não precisava ficar com medo, pois era uma sonserina e Professor Snape certamente iria nos favorecer.


A aula dele era nas masmorras – o que fazia bastante sentido, já que dava um ar mais assustador ainda à matéria – bem perto do nosso salão comunal, mas como era a primeira aula do dia não estávamos lá, mas no salão principal tomando café-da-manhã, então tivemos que correr. Eu tinha me aproximado de Blásio Zabini, que apesar de aparentemente ter pensamentos estúpidos iguais ao do meu primo, era bem legal. Em função disso, ainda que fosse contra minha vontade, estava falando com Draco de forma civilizada, mas continuava não gostando muito dele, ainda mais por que ele maltratava pessoas que não eram sangue-puro e implicava muito com o Harry Potter.


Entramos na sala de poções e sentamos, Draco, eu e Zabini em uma bancada aguardando por Snape. Pegava meu caderno e minha pena para fazer as anotações da aula quando o professor entrou. Ele parecia um morcegão entrando com aquela capa esvoaçante, ou um vampiro dos filmes trouxas que eu assistia. Começou a falar que poções não era uma matéria simples, que não iríamos ficar sacudindo varinhas – imediatamente pus a minha na mochila, acho que ele notou, pois deu um sorriso de canto de boca para mim e continuou – que era necessário talento e iria nos ensinar a engarrafar a fama, alcançar a glória e até mesmo atrasar a morte – tudo isso parecia fascinante, eu já tinha lido o livro de poções inteiro antes de vir para Hogwarts, para mim parecia um grande livro de receitas, eu era boa em receitas acrescentava ingredientes, substituía, alterava tudo para que ficasse melhor e mais gostoso. Na minha cabeça poções seria mais ou menos como cozinhar, restava saber se eu teria o tal dom que Snape mencionava.


Foi quando percebi que ele olhava Harry Potter de tal jeito que eu jamais gostaria de o ver olhando pra mim, chamou o menino de celebridade enquanto fazia a chamada, e logo depois começou a disparar para Harry perguntas sobre a matéria, todas as respostas estavam no livro...eu sabia a resposta de todas elas, mas parecia que a Hermione também sabia, pois conforme Snape perguntava sua mão se levantava mais alto, parecia que ela iria se levantar da cadeira para mostrar ao professor seu conhecimento, mas ele simplesmente a ignorava. Eu sabia que ele não iria chamá-la, eu tinha essa imagem dele na minha cabeça, quando Harry Potter respondeu que não sabia e falou para ele ouvir Hermione, pois ela estava com o braço levantado,  Snape continuava ignorando a menina que estava na frente dele. Quando ele ia começar a responder as 3 perguntas que ele próprio tinha feito, eu ergui meu braço e aqueles olhos pretos me encararam me fuzilando aos poucos por ter o interrompido, mas falou:


-       Sim, Senhorita Rosier.


-       Asfódelo e Losna prozem a poção conhecida como Poção dos Mortos Vivos, na verdade é uma poção para adormecer muito forte. – ele assentiu com a cabeça na minha direção, entendi que era para que eu continuasse – Bezoar é uma pedra retirada do estômago da cabra que serve como antídoto para a maioria dos venenos, e os dois acônitos que o senhor mencionou são plantas do mesmo gênero botânico.


Quando terminei de falar estava ligeiramente sem fôlego, vermelha por ter falado na frente da classe inteira, ter interrompido o professor e por ele ter me escolhido para falar ao invés de Hermione, que fez cara de quem já sabia absolutamente tudo que eu tinha dito. Draco me olhava chocado, não entendi o por quê...eu gostava de estudar, era a melhor aluna na minha escola de trouxas e pretendia continuar sendo a melhor aluna onde quer que eu fosse. Snape me olhava com interesse enquanto eu me questionava se iria perder pontos por ter o interrompido.


-       Por que não estão anotando tudo o que a Senhorita Rosier acabou de falar? – ele rosnou para a turma – Trinta pontos para a Sonserina, dez para cada pergunta respondida pela Senhorita Rosie. E Potter, vou retirar 10 pontos pela sua impertinência.


Estava muito feliz, tinha ganho pontos para a minha casa, e certamente para mim mesma com o professor de poções, mas responder perguntas era fácil, eu queria colocar a mão na massa, adoro essa expressão trouxa , e realmente fazer poções. Foi o que aconteceu logo em seguida, fomos separados em duplas para preparar uma poção bem simples de cura de furúnculos, mas como estávamos em número ímpar na Sonserina e Grifinória tinha duplas completas Snape me deu duas opções: formar um trio com Blás e Draco, ou fazer sozinha. Nas aulas de redação da minha escola trouxa eu detestava escrever em grupo, pois nunca saia do jeito que eu esperava; pensando nisso escolhi fazer sozinha, o que aparentemente surpreendeu o professor. Abri meu livro na página 8 para ler a poção, realmente me parecia bem simples:


Ingredientes:


-       5 Lesmas vivas


-       3 pétalas de Beladona


-       28g de pó-de-chifre de unicórnio


-       12 cerdas de porco-espinho


Preparo:


Cozinhe as lesmas inteiras a fogo baixo no caldeirão por 7 minutos e meio, retire e corte-as em tiras. Amasse as pétalas de Beladona junto com o pó-de-chifre de unicórnio com um pilão sempre no sentido anti-horário, quando tiver formado uma pasta cremosa e prateada pare. Com o caldeirão no fogo, coloque a pasta e o equivalente a 3 lesmas, misture em sentido horário por 3 minutos. Acrescente o restante das lesmas com o caldeirão ainda no fogo. Retire o caldeirão do forno e acrescente as cerdas de porco-espinho. Fora do fogo misture em sentido horário até atingir uma tonalidade azul clara. Aguarde esfriar e engarrafe.


MODO DE USAR:


Aplicar diretamente sobre os furúnculos. A poção leva 10 minutos para surtir efeito.


Me levantei e fui até o armário pegar os ingredientes na estante onde já tinha um amontoado de alunos. Reparei que Hermione já estava preparando a sua poção e que tudo saia corretamente, que droga – pensei – ela é muito boa e eu tenho que ser melhor, não adianta só o Snape gostar mais de mim simplesmente por eu ser uma sonserina, eu tenho que ser a melhor aluna da matéria dele. Finalmente cheguei até os ingredientes, peguei todos os potinhos menos o de pó-de-chifre, pois não conseguia alcançar, aparentemente todos os que estavam nas prateleiras de baixo tinham acabado, já que o Neville tinha quebrado 3 potes ao pegar o seu.  Fiquei parada olhando pra cima tentando calcular o quão alto eu teria que pular para alcançar o pote e não quebrar nada, quando vi um braço se erguer acima da minha cabeça e colocar o ingrediente na minha frente.


-       Aqui senhorita Rosier, desculpe o inconveniente, não sabia que esta turma teria um aluno tão desastrado como Longbotton, caso contrário teria posto uma maior quantidade de ingredientes na prateleira baixa. – ele disse isso em voz alta para toda a turma ouvir.


Todos pararam e encararam um Neville vermelho que tentava não tirar os olhos da poção que fervia verde em seu caldeirão. Retornei meu olhar para a estante e fiquei olhando os ingredientes, não queria que pensassem que era culpa minha a crítica que Snape tinha feito sobre Neville, sabia que essa não era a atitude mais sonserina de todas, afinal meus colegas gargalhavam da cara do menino.


-       Obrigada professor Snape.


-       De nada Senhorita Rosier.


Já ia me retirar de perto da estante quando bati os olhos em Hermione, sua poção já começava a ficar da cor correta. Eu tinha que ser melhor que ela. Virei novamente para a estante e dei de cara com o professor.


-       Esqueceu alguma coisa Srta. Rosier? Creio que já está atrasada no preparo de sua poção...


-       Esqueci sim senhor. – ele olhou para minhas mãos que tinham todos os ingredientes da receita, e eu fiquei nervosa – O senhor poderia pegar para mim um pouco de pus de bubotúbera?


Snape me olhava assustado, como se nunca tivesse visto algum aluno pedir ingredientes antes, tá talvez ninguém nunca tenha pedido ingredientes que não estão na poção, mas isso não vinha ao caso pra mim.


-       A senhorita sabe que sua receita não inclui pus de bubotúbera e que os ingredientes que já estão na sua mão servem para fazer  uma boa poção cura-furúnculo?


-       Sim senhor, mas eu não quero fazer uma boa poção...Eu quero fazer a melhor poção, e para isso preciso do pus.


-       Espero que a senhorita saiba o que está fazendo – disse Snape com um brilho nos olhos enquanto me entregava um pouco de pus de bubotúbera.


Voltei para meu caldeirão e comecei a fazer a poção. Misturaria o pus de bubotúbera para fazer a pasta cremosa e prata, por que ninguém tinha adicionado isso na receita era algo que eu não entendia. O pus puro causa ferimento na pele, mas quando levado ao fogo servia para tratamento de acne, auxiliar o processo de cicatrização entre outras coisas, estava tudo no livro de herbologia, será que ninguém tinha lido isso? Enquanto terminava de misturar os ingredientes ouvi Snape elogiar a poção de Draco, que estava na minha frente...Pouco depois o caldeirão em que Neville trabalhava começou a fazer um barulho estranho e uma fumaça verde e marrom aparecia. O caldeirão do menino estava derretido, e a poção ao invés de curar furúnculos criava os mesmos em quem encostava, era óbvio que ele tinha acrescentado as cerdas com o caldeirão ainda no fogo...Coitado, teve que ir para ala hospitalar...Parei de prestar atenção e voltei à minha poção.


Eu percebi que estava ficando perfeita, azul piscina ao invés do azul claro que dizia no livro, essa alteração exatamente o que eu esperava quando adicionei o pus. O professor caminhava entre os caldeirões fazendo comentários sobre as poções, fiquei na ponta do pé para ver a de Hermione, estava obviamente perfeita, mas o único comentário ouvido foi “muito bom”. Assim que terminei minha poção, ele se aproximou da minha bancada. Escutei Draco falando para Blás “a poção dela tá da cor errada, o que a gente faz? Troca a nossa com ela? Ele já passou aqui e elogiou a nossa...”. Estranho, Malfoy se preocupando comigo? Acho que Blás teve o mesmo pensamento por que o vi perguntar baixinho: “Desde quando você se importa com a sua prima?”, depois da resposta tudo fez sentido: “Não quero que essa idiota perca pontos para a Sonserina por não saber fazer uma poção idiota dessas”.


-       Então Srta. Rosier, esta – ele olhou para o vidro que eu segurava – é a sua poção.


-       Sim Professor Snape. – respondi com a voz mais firme possível olhando nos olhos dele. Reparei que brilhavam.


-       Hmmm...Como saberemos se funciona? –  seu rosto se iluminou, se virou e chamou Simas, da Grifinória – Simas, pegue o que sobrou da poção asquerosa que seu colega fez. Hermione Granger – a menina se levantou num salto – traga sua poção até aqui.


Simas chegou com a gosma nojenta que Neville tinha feito e uma Hermione orgulhosa colocou o frasco azul claro na minha frente, lançou um olhar para a minha poção azul piscina e  me encarou com um ar superior. Snape se colocou ao meu lado atrás da bancada e encarou a turma:


-       Alguém quer ser voluntário para encostar as duas mãos na poção de Longbotton e depois testar as poções de suas colegas?


Ninguém se movimentou na sala. Hermione olhava todos com uma cara de ofendida, eu sabia que todos ali temiam Snape e achavam que ele poderia não dar a poção de cura e deixá-los com as mãos cheias de furúnculos.


-       Ninguém?


-       Eu vou professor Snape, sei que minha poção vai funcionar perfeitamente. – Todos me olhavam como se eu fosse louca, acho que pensavam “como ela não pode ver que a cor está errada. Logo em seguida Hermione se manifestou...


-       Eu também vou professor, que tal eu testar a dela e ela a minha?


-       Não Senhorita Granger, cada uma testará a própria poção. A que tiver o efeito mais rápido – ele me encarou com os olhos faiscando - receberá 70 pontos pela eficiência da poção.


-       Certo.  - Dissemos em uníssono.


Todos os alunos estavam claramente nervosos, Draco parecia ser capaz de me bater se eu não ganhasse os pontos para Sonserina. E os grifos me encaravam com um ar de “já perdeu” bem irritante. Mergulhamos uma mão cada na poção de Neville, nossa, aquele menino realmente tinha errado a poção. Furúnculos começaram a brotar por todos os meus dedos, eca. O professor conjugou um cronômetro para marcar quanto tempo a poção levaria para curar aquelas coisas horrorosas.


-       As senhoritas estão prontas? Senhor Zabini e Weasley, por favor posicionem-se ao lado das senhoritas de sua casa, peguem um conta gotas, quando eu falar já cubram os furúnculos com as poções.


-       Sim senhor.


Zabini se posicionou ao meu lado e ficou me encarando com ar de interrogação. Weasley olhava de Hermione para mim e sacudia a cabeça. Snape nos olhou, parou os olhos em mim, eu sorri de canto. Ele disse “já” e apertou o cronômetro. Zabini e Weasley começaram a colocar as poções nos furúnculos.


Olhei para o cronômetro, 57 segundos, 58, 59. Ao chegar a um minuto olhei para minha mão, peguei um pano, retirei o excesso de poção e observei o resultado: nada, nenhuma marca, nada ali dava a entender que um minuto antes eu tinha coisas nojentas e gosmentas na minha mão. Hermione olhava para minha mão e para o cronômetro com olhos arregalados. Snape também parecia em choque. Olhei para os outros alunos e percebi que todos estavam da mesma forma.


-       Setenta pontos para a Sonserina. Meus parabéns Srta. Rosier. Senhorita Granger, se quiser se livrar de seus furúnculos antes dos tradicionais 10 minutos pode utilizar a poção de sua colega. Acabou a aula, podem seguir.


-       Hermione, se quiser pode usar – eu tentei falar de forma delicada – não tem problema mesmo.


-       O que você fez pra ela ficar assim? Ou foi um erro que deu certo?  - ela falou de forma meio invejosa.


-       Acrescentei pus de bubotúbera, somente 1/10 do cálice – respondi meio ríspida.


-       Mas não havia pus de bubotúbera nos ingredientes da poção! Você acrescentou assim? Sem saber o que ia acontecer?


-       Não foi por acaso que aconteceu, eu achei que poderia melhorar a poção dessa forma, e melhorei. Eu sabia as propriedades do pus de bubotúbera, e resolvi utilizar meu conhecimento.


-       Entendi... Bom, parabéns! – ela disse isso e saiu da sala.


Draco e Blás terminavam de limpar suas coisas e vieram me dar parabéns pela poção. Eles pegaram tudo e saíram da sala, só restava eu de aluna na sala, mas como tinha terminado a poção por último não tive tempo, como os outros para arrumar meu material e guardar minhas coisas. Lavava meu caldeirão quando ouvi a voz do professor Snape.


-       Senhorita Giulia Smith Rosier.


Achei estranho ele me chamar pelo nome completo, mas enfim, não poderia ignorar um professor.


-       Sim professor Snape...


-       Da onde você tirou a idéia de acrescentar o pus? Leu em algum livro de poções mais avançado?


-       Não professor, foi intuição mesmo...Eu li sobre as propriedades do pus em um livro de herbologia, e percebi que a cura proporcionada pelo pus era muito rápida, mas que não serviria para curar furúnculos sendo somente levada ao fogo, pois a origem dos furúnculos não é condizente com as propriedades do pus. Achei que ao acrescentar 1/10 do cálice usado para medir o pó de unicórnio  iria reduzir o tempo de cura para um minuto.


-       Você nunca fez nenhuma poção em casa? Com seus pais?


-       Não... Na verdade eu fazia muitas receitas de comida, pegava livros e seguia, mas muitas vezes achava que a receita poderia ser melhorada e assim o fazia. Acho que com a poção hoje foi a mesma coisa...Algum problema nisso? – perguntei ligeiramente envergonhada, eu percebi que conforme eu falava seus olhos brilhavam cada vez mais.


-       Não Giulia, se incomoda se eu te chamar de Giulia? – eu sacudi a cabeça mostrando que não me importava, até preferia na verdade – Achei ótimo o que você fez, nunca tive um aluno em Hogwarts como você, achava que dificilmente teria...


-       Como eu? Como assim?


-       Você possui um talento nato para poções, é intuitiva e tenho certeza que será a melhor aluna na minha matéria. – ele sorriu abertamente, me espantei com seu sorriso. Nunca tinha visto ele sorrir, nem quando ele estava na mesa dos professores ou andando pelos corredores. De repente o vi sorrir novamente.


Flash: Snape criança correndo com uma menina ruiva de olhos verdes. “Lily!” ele gritava sorrindo e corria atrás dela. Snape adolescente andando com a mesma menina em Hogwarts e sorrindo.


-       Giulia? Está tudo bem?


-       Sim professor! Estou desnorteada pelos elogios, quer dizer que nunca conheceu alguém como eu?


-       Além de mim mesmo? Somente uma menina que era do meu ano em Hogwarts – com os olhos arregalados fitei o professor, ele estava me comparando à ele?! – Sim Giulia, nosso talento é bem raro, como falei no início da aula, não são muitos que conseguem compreender a arte do preparo de poções. Agora, siga para sua aula, se não vai chegar atrasada. 

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