Novidades Para Rose






A cama era macia, a temperatura era agradável e a meia-luz, convidativa a dormir. Então por que ele estava sem o menor sono? Isso era tão incomum. Geralmente, bastava que ele se deitasse para apagar de vez. A exceção fora a noite do Baile de Inverno...


Rony se mexia na cama, inquieto. Parecia estar há horas ali deitado e não conseguia encontrar uma boa posição de jeito nenhum. O barulho de água corrente que vinha do chuveiro do banheiro só aumentava sua inquietação.


Hermione deixava a água cair sobre seu corpo sem a menor pressa. A temperatura era ideal, nem quente nem fria. O barulho do chuveiro aberto era contínuo. O banho, afinal, estava ajudando a aplacar a eclosão emocional que sentia, o calor que acometia sua pele em pleno inverno.


Ela lamentava que não pudesse prolongar aquele banho indefinidamente, porque a opção era encarar Rony e ela não sabia se já estava pronta para fazer isso. Não depois do que acontecera.


Menos de uma hora antes, eles estavam caídos no meio da sala, se beijando. Aquele havia sido o primero beijo que tinham consciência de estar trocando, no qual depositaram toda vontade reprimida, demonstrando com intensidade os sentimentos que nutriam um pelo o outro há sete chaves.


Poderia parecer a ordem natural das coisas que um casal apaixonado se beijasse  daquele jeito na calada da noite em sua casa, enquanto seus filhos ressonavam tranquilos. Contudo, como Rony e Hermione só formavam esse casal por terem acordado, sem mais nem menos, já nessa situação e anos a frente do tempo em que se lembravam de estar, e como o fato de estarem apaixonados era algo que costumavam esconder não apenas um do outro, mas até de si mesmos, as coisas eram um pouco mais complicadas.


Talvez fosse por isso que após aquele beijo eles só tenham conseguido sorrir um para o outro, momentaneamente incapazes de trocar uma palavra. Foi quando se sobressaltaram com um barulho repentino. Era apenas uma coruja batendo o bico freneticamente na janela da sala, mas ao se levantarem para atendê-la, a noção de quanto tempo ficaram enlaçados sobreveio. De repente estavam tão encabulados que já tentavam escapar do olhar um do outro.


Rony abriu a janela e Hermione desprendeu o envelope roxo da perna da coruja, que logo alçou voo em retirada.


– Uma correspondência do Ministério a essa hora? – indagou Rony, fitando o selo do envelope de forma exagerada.


– É para você. – disse Hermione, entregando-lhe o envelope – Preciso tomar um banho.


E retirou-se com mais pressa que a coruja do Ministério, deixando um Rony que se não estivesse com as mãos ocupadas, não saberia onde enfiá-las. Ele  abriu o envelope e leu a mensagem endereçada a todos os aurores que falava de um detector que estava apontando para o paradeiro da gangue que investigavam. Ótimo. Como se o que havia acabado de acontecer não fosse motivo suficiente para deixá-lo nervoso.


Foi assim que ficou insone.


Quando Hermione finalmente saiu do banho e foi se deitar, os olhos de Rony estavam fechados, mas seu corpo permanecia rígido de tensão. Ela sabia que ele estava fingindo, mas embora nunca tivesse lastimado tanto a ausência de contato como naquele momento, agradecia interiormente por não ser a única a fingir dormir. Era como se eles se agarrassem ao fato de estar despertos para não deixar o sono levar a prova do que tinham acabado de viver: de que sonhos podiam ser reais.


                                   ***


A claridade do alvorecer alertou Hermione mesmo de pálpebras fechadas, um fulgor vermelho como aquele que lhe subia pelo corpo, a mesma cor dos cabelos daquele que o provocava. Ela se levantou depressa, consciente de que Rony a entrevia, como fizera quase a noite a inteira.


Estava prestes a sair do quarto para preparar o café quando se deparou com uma Rose de olhos arregalados quase derrapando.


- Mamãe, é Hugo! Ele está mal, muito mal!


Assustada, Hermione correu até o quarto do filho, Rony já em seus calcanhares. O menino se encontrava gemendo e tossindo, os cabelos empapados de suor grudando em seu rostinho um tanto esverdeado.


- Hugo! – soltou Herminone num fio de voz, afastando os cabelos da testa do filho para medir sua temperatura. – Ele está ardendo de febre!


- Ma-mãe... Tá tu-do doe-e-endo – gaguejou o menino e o esforço o fez ter ondas de náusea.


- Rápido, Rony, vá buscar um tylenol!


- Claro! – Rony se prontificou, mas parou na soleira da porta, confuso – O que é um tylenol?


Hermione não via tempo para explicar que se tratava de um medicamento trouxa. Seu filhinho agonizava de dor à sua frente. Tal realidade fazia todo resto não importar mais. Enquanto desbravava freneticamente a mente à procura dos ingredientes certos para uma poção curativa - sabendo que demoraria para ficar pronta -, ela foi em disparada buscar o remédio que mencionara na pequena maleta de primeiros socorros que já avistara no banheiro.


Voltou ao quarto munida com um copo d’água e uma toalha úmida também. Ron estava ajoelhado junto ao leito do filho, segurando sua mão. Rose acariciava os cabelos do irmão. Quando Hermione gotejou o remédio no copo, Rony fez cara de intrigado, mas aparentemente preferiu não questioná-la. Ele ajudou a levantar a cabeça do filho, que engoliu o tylenol com uma careta. Hermione pôs a toalha em sua testa e se sentou ao seu lado na cama, deixando que o menino também apertasse sua mão.


Hugo fungou até adormecer aos sussurros de “já vai passar” da mãe. Rose saiu correndo do quarto após dar um beijinho no irmão, sem dar tempo para os pais perguntarem o motivo. O ar pareceu ficar tão quente quanto Hugo quando eles se viram praticamente à sós mais uma vez. Simplesmente não conseguiam se encarar. Ficaram ainda mais embaraçados quando foram tirar a toalha da testinha do filho ao mesmo tempo e esbarraram nos dedos um do outro. Foi então que Rose voltou, anunciando:


­- Vovó Molly está na lareira! Vocês não ouviram o crepitar?


Rony e Hermione trocaram o primeiro olhar desde a noite anterior, desconcertados, e seguiram a filha até a sala. A cabeça de Molly Weasley se encontrava entre as chamas verdes com uma expressão preocupada.


- O que houve com meu netinho?


- Acho que ele está com uma gripe forte, mas a febre diminuiu um pouco... – começou a responder Hermione


- Então você já o umedeceu com ditamno?


- A-ainda não... – Hermione estreitou os olhos (algo lhe dizia que essa era uma informação já muito conhecida para ela, mas não se lembrava de tê-la aprendido) – Vou fazer isso agora mesmo. E não vou ao Ministério hoje, é melhor ficar cuidando de Hugo. Você avisa ao nosso departamento para mim, Rony?


- É claro... querida. – disse Rony, que aparentemente tinha se esquecido que precisava trabalhar.


- Ótimo – retomou a palavra a Sra. Weasley, que olhava do filho para a nora como se desconfiasse do excesso de formalidade com o qual se comportavam – Mas se tiver que levar Hugo ao St. Mungus ou precisar de qualquer coisa, você sabe, é só me chamar, Hermione. E dê um beijo nele por mim.


Depois de se despedirem da Sra. Weasley, Rony foi colocar suas vestes de auror e Hermione, buscar o frasco de ditamno que se destacava dos demais remédios bruxos na prateleira ao lado da maleta de primeiros socorros trouxa. Com a ajuda de Rose, ela passou uma toalha limpa umedecida com ditamno em Hugo até sua pele voltar ao aspecto rosado normal e sua respiração regular. Suspirando de alívio, Hermione beijou o filho e deu a mão a Rose rumo à cozinha para preparar algo de comer.


Rony já estava pronto ao pé da lareira. Rose contou como o irmão estava melhor e estendeu os braços para o pai, que a rodopiou num abraço. A menina voltou ao chão sorrindo, mas assumiu o olhar estreito inquisitivo da mãe ao perceber que os pais se encaravam calados como se não soubessem como agir.


- Papai, você não vai beijar a mamãe?


Hermione quase teve um acesso de tosse e tentou disfarçar sua reação com um pigarro. Então Ron se adiantou e roçou brevemente seus lábios nos dela.


- Se tiver algum problema...


- Eu mando Pichitinho a você, não se preocupe. – afirmou Hermione.


Rony assentiu e pegou um punhado de Pó de Flu. Hermione teve a impressão de que havia vermelho demais contrastando com as chamas verdes ao ver o fogo levá-lo para o Ministério.


                                  ***


O peso das responsabilidades nunca havia caído tanto sobre Rony. Ele não era mais um garoto e, de um dia para outro, tinha de lidar com problemas que não se sentia pronto para assumir. Ele se frustrava por não se sentir seguro o suficiente para agir como o homem que era agora.


Mas não havia escapatória. Preparado ou não, ele tinha de enfrentar as situações de frente, o que já incluíra ter o beijo de Hermione pelo qual tanto ansiava interiormente correpondido e não saber o que dizer depois, ver seu filho convalescer repentinamente e ser tomado pela impotência para ajudá-lo como deveria, ser o auror bem treinado para armar e pôr em prática estratégias de combate às Artes das Trevas que não tinha formação para ser.


Marido. Pai. Profissional. A vida adulta não era fácil e isso Ron sentia na pele agora. Ter as reponsabilidades dessa vida e não estar preparado para carregá-las era como ser um bruxo que não sabe como usar a própria varinha.


- Também está de acordo, Ron? – perguntou Harry, sentado na cabiceira da mesa de reuniões do Quartel General dos Aurores.


- Hum... Claro, estou plenamente de acordo com isso – respondeu Rony, que não fazia ideia do teor do que estava concordando, alheio em suas divagações.


Harry não disfarçou sua preocupação no olhar que lançou ao amigo. Virando-se para os demais aurores, arrematou:


- Ótimo. Então Connor, Jared e Fiona tem uma semana para mapear a localização da gangue. Lisa, Aengus, eu e Rony estaremos prontos para seguir seus passos ao menor sinal, mas precisamos de um mapa completo para não deixar nenhum deles escapar. 


Todos assentiram e foram saindo aos poucos com visível ânimo por estarem pretes a entrar em ação. Só Rony permaneceu na sala, sério e calado.


- O que foi, Rony? Você anda tão disperso ultimamente...


- Só estou preocupado com Hugo, Harry. Nunca tinha visto meu filho naquele estado...


- Ele já está melhor. Se tivesse piorado, Mione teria mandado te avisar.


- Eu sei, cara. Mas não consigo deixar de ficar preocupado, sabe como é...


- E como sei. – afirmou Harry e aproximando-se, apertou o ombro do amigo – Mas Ron... Tem algo que você queira me dizer?


Rony engoliu em seco. Não havia dúvida que Harry estava desconfiando de alguma coisa. Ele encheu-se de coragem com o intuito de revelar a verdade ao amigo. Seria bom desabafar. Harry era o melhor amigo dele e de Hermione, quem melhor para saber o que eles estavam passando? No entanto, a verdade era mirabolante demais para pôr em palvras assim e ele não achava justo a revelar sem o consentimento de Hermione, até mesmo para alguém tão próximo como Harry. Aquilo pertencia apenas aos dois.


- Não, Harry. Está tudo bem.


Pela expressão de Harry, a resposta não soara muito convincente.


Quando chegou em casa naquele dia, Rony encontrou um desenho assinado por Rose em uma caligrafia esforçada demais para uma criança de cinco anos ao lado do que restara de uma deliciosa torta de frango. Ele sorriu diante dos traços infantis que formavam sua família de mãos dadas enquanto mastigava. Mas o sorriso que abriu ao entrar no quarto e se daparar com Hermione adormecida e aconchagada aos filhos, ambos ressonando com saúde perfeita, foi ainda mais caloroso. Quem se importava com o peso das responsabilidades ante uma cena como essa? Ele era um afortunado, pois ali estava sua família, real e palpável, muito melhor do que poderia sonhar.


Rony se aproximou para apagar a luz do abajur com um toque da varinha e beijou delicadamente a testa da mulher e das crianças. Voltou à sala ainda sorrindo para se acomodar no sofá, sem perceber que Hermione abrira os olhos a tempo de ver sua sombra se recortar contra a luz do corredor, a pele reverberando onde seus lábios tinham acabado de encostar, um sorriso se formando com a lembrança da noite anterior.


- Boa noite, Ron – Hermione deixou-se sussurrar ao se aconchegar mais aos filhos e submergir na escuridão de seu inconciente.


                                  ***


Os dias seguintes transcorreram bem, embora Rony e Hermione às vezes se comportassem como nos primeiros momentos em que acordaram subitamente no futuro. Mesmo possuindo uma certa bagagem de experiência paternal maior do que equivalia à apenas algumas semanas, a maneira excecivamente formal com a qual se comportavam um com o outro acabava por transcorrer para a relação com os filhos. É claro que nunca demonstravam displicência, pois eram cada vez mais cativados pelas duas crianças e descobriram que as amavam acima de tudo, mas a cumplicidade que um casal precisava manter para criar bem seus filhos parecia estar escondida em seu íntimo desde que se entregaram à sofreguidão daquele beijo.


Como amigos que se desejavam tentando suprimir para si esse sentimento, eles conseguiam se dedicar melhor à tarefa da paternidade. Uma tarefa que exige trabalho em equipe fica complicada quando a equipe se distancia devido à algo que deveria uni-la ainda mais.


Então o primeiro dia de aula de Rose irrompeu no horizonte como o equinócio de primavera que floresce após um inverno rigoroso.


Hermione vira numa agenda que o retorno de sua filha às aulas depois das férias de Natal se aproximava. Mãe e filha haviam saído em busca de um novo material escolar em um centro comercial trouxa. Compraram giz de cera e lápis de cor novos, uma mochila de unicórnio (Rose ficou encantada ao ver que os trouxas comercializavam produtos com imagens de animais fantásticos apesar de ignorar sua existência), cadernos extras, livros didáticos e mais um punhado de exemplares da literatura infantil para enriquecer as prateleiras de Rose e a biblioteca de casa. O único momento desagradável da tarde de compras foi quando Rose indagou à mãe porque ela e seu pai estavam se comportando “daquele jeito”. Hermione ficara desconcertada. Olhando para o chão, respondeu à filha que não era nada e estava tudo bem. Mas sabia que mesmo se Rose não fosse tão esperta, não teria acreditado que suas palavras eram verdade. Era visível que havia algo errado acontecendo entre os pais da menina. As palavras da mãe não soavam verdadeiras porque as cores vívidas de seu ambiente familiar estavam desbotando aos poucos.


Impulsionada pela inaceitabilidade de sua filha ter ido às compras saltitante de alegria e voltado sorumbática para casa, com a confirmação não dita de que as coisas não estavam como deveriam estar, Hermione decidiu que o dia da volta às aulas para Rose seria o mais maravilhoso que ela pudesse proporcionar.


O café da manhã teve direito à sobremesa preferida de Rose: torta de morango com chocolate. Aprumada em seu uniforme inglês, a garotinha partiu com os pais para deixar o irmão n’ A Toca e saiu de lá com uma robusta merenda preparada pela avó Molly rumo à escola primária trouxa. Em Londres, os três pegaram um ônibus vermelho de três andares . Saltaram e chegaram à escola com Rose dando as mãos aos pais  e balançando seus braços junto.


Ao acenar para filha que acabara de cruzar o portão, para manter o sorriso radiante que se desenhava no rosto da menina, Hermione pegou a mão de Rony e a apertou. Alguns segundos, que assustadoramente mais pareciam dias e dias transcorridos, se passaram desde que Rose sumira de vista dentro da escola e Hermione ainda apertava a mão de Rony com força, sem dizer nada. Até que o sinal tocou e ela soltou a mão desviando de um garotinho atrasado que correu pelo meio dos dois.


 - Daqui a pouco Hugo também vai estar correndo para entrar na escola. – disse Rony serenamente, colocando as mãos nos bolsos do sobretudo.


- Em dois anos. Será que... – Hermione não conseguiu completar, acometida por uma pontada da insegurança que  tentava subliminar em seu interior.


- Que ainda vamos estar aqui? Não sei, mas acho que sim, Hermione. Já se passaram semanas...


- Eu sei! E não acredito que tenhamos um prazo a cumprir ou algo do tipo. Só que quando você diz dois anos... É por querer tanto ainda estar aqui que ainda sinto medo. Quero ver nossos filhos crescerem!


- Eu também quero ver nossos filhos crescerem! Eu também quero... Quero estar aqui com você.


Hermione teve a sensação de que as palavras se perderam da ponta de sua língua. Desviando do profundo olhar azul de Rony, ela verificou as horas no relógio de pulso para ganhar tempo. Tempo. Como a noção desse fator que faz a humanidade refém de sua ação se perdia ao lado de Rony...


- Acho melhor irmos logo ou vamos chegar atrasados no trabalho.


Hermione não tinha andado nem três metros quando Rony a alcançou e segurou seu braço. Ele parecia estar prestes a dizer algo importante até uma segunda criança retardatária vir correndo em sua direção e quase trombar com os dois.


Rony pigarreou e deu o braço à esposa. Juntos, seguiram para o Ministério.


                                 ***


Coragem. Essa era uma característica que Rony não se habituara a achar seu forte. Porém, tinha de admitir que suas últimas atitudes com relação à Hermione serviriam para honrar seu lugar na Grifinória. Ou ele era muito estúpido, ou muito corajoso. E ele definitivamente preferia a última parte.


Hermione havia planejado que eles levassem e buscassem Rose na escola em seu primeiro dia, para tornar o momento mais especial para a filha. Contudo, suas obrigações como chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia exigiam que ela ficasse por mais algumas horas no trabalho, então Rony foi incumbido a ir buscar Rose sozinho.


Mais cedo, naqueles instantes após deixar a menina na escola, ele quase dissera a Hermione algumas coisinhas que estavam entaladas em sua garganta. Se eles haviam se beijado, se ela havia correspondido daquela forma e até tinham sorrido um para o outro depois, porque diabos ela estava tratando-o daquela maneira? Ele não queria o distanciamento casual com que vinham se tratando. O fato é que o que ele dissera era a absoluta verdade: ele queria estar ali com ela. Nunca estivera tão consciente disso. Talvez nunca estivesse nem ao menos consciente disso. A verdade é que nunca queria ficar longe dela. Quem queria ser capitão do time de Quadribol e ganhar a Taça das Casas? Seu maior sonho de repente se tornara ser feliz com Hermione.


E não conseguir sequer dizer isso estava quase sufocando-o. Quase. Rony estava decidido a dizer tudo de uma vez quando chegasse em casa, no maior de seus rompantes de coragem até então.


Rose estava esperando o pai sozinha em um banquinho no pátio da escola. Ergueu a cabeça ao vê-lo passar e se levantou para abraçá-lo, mas voltou a se sentar.


- A professora quer falar com você, papai – disse a menina


Rony bateu com os nós dos dedos na porta que Rose indicou. Uma mulher loira de rosto em formato de coração atendeu.


- Como vai, Sr. Weasley?


- Bem, Srta...


- Volant.


- Tudo bem, Srta. Volant. Rose me disse que queria falar comigo.


- Claro. No semestre passado eu cheguei a lhe falar sobre o potencial de Rose, não é mesmo? Ela está muito adiantada para cursar o primeiro ano.


- Mas ela só tem cinco anos!


- Oh, sim, mas o senhor já deve ter percebido que sua filha possui grandes habilidades.


Foi quase como levar um balde de água fria na cara. Rony se orgulhava de Rose por ela ser tão hábil, mas será que aquela professora tinha observado algum comportamento diferente em Rose? Será que sua filha havia demonstrado sinais de magia? Aquela era uma escola trouxa, será que a menina, tão nova, já havia desrespeitado involuntariamente o Estatuto Internacional de Sigilo em Magia?


- O que a senhora quer dizer com isso? – indagou ele, temeroso.


- Ora, que ela possui um intelecto avançado demais para a idade que tem.


- É claro. Rosie herdou o cérebro da mãe! – afirmou Rony, sem rodeios. Parando para pensar com seus botões, ele também estava ficando um bocado parecido com Hermione ao se preocupar logo com a possibilidade de Rose ter infrigido alguma regra.


- Então suponho que o senhor tenha conversado com a Sra. Weasley sobre o assunto.


- Hã... – Rony já não fazia ideia de onde a professora queria chegar. Que culpa tinha Rose ser tão inteligente? – Nós conversamos, sim – mentiu ele.


- Ótimo! Porque, como lhe disse antes do Natal, Rose está muito a frente da classe: já sabe ler e escrever até palavras mais complexas e fazer contas simples perfeitamente. Sua esposa concordou, Sr. Weasley?


- Concordou... – Rony deixou no ar uma evasiava para saber logo onde aquela conversa ia dar.


- Então está certo, eu já tenho a autorização da diretora. Amanhã Rose vai para o segundo ano!

                                   ***


Quando Ron chegara com Rose no colo, esfusiante de alegria, contando que ela mal voltara às aulas e já havia passado de ano, Hermione ficou sem reação por um segundo. Como assim sua filhinha já iria para o segundo ano primário de um dia para o outro? Elas mal tiveram tempo juntas e a menina já dava evidências de estar cescendo rápido demais. E se as crianças da classe para onde Rose iria não fossem boazinhas com ela? Hermione se pegou pensando o quanto estava ficando parecida com Hagrid com toda a sua super proteção. A diferença é que Rose não era um dragão norueguês, mas uma ruivinha linda que logo pulou do colo do pai e puxou o irmãozinho para compartilhar seu contentamento pulando no sofá até não poder mais com ela. Pichitinho apareceu piando feliz e descrevendo círculos acima da cabeça das crianças. Até mesmo Bichento ronronou e foi se juntar à algazarra de cauda empertigada.


Não houve como Hermione não ser contagiada pela alegria e vibrar de orgulho da filha.


- Tampém quelo ecola! – Hugo tinha exclamado.


Ainda bem que para o seu garotinho ainda faltava, ele era apenas um bebê para engatar em uma jornada acadêmica. Olha quem estava falando, a aluna mais estudiosa e esforçada de Hogwarts!


Agora Hermione já havia posto Hugo para dormir e escovava os cabelos de Rose. Era impossível não se encantar com a decoração do quarto da menina: a parede lilás, as cortinas de linho cor de pérola, os quadrinhos de flores, casinhas, castelos e personagens de bichinhos, o tapete macio, a poltrona, a cama, o armário e a penteadeira em estilo elisabetano, a escrivaninha com prancha para desenhar, o aroma de lavanda pairando no ar e as prateleiras recobertas por bonecas, ursinhos de pelúcia e clássicos da literatura trouxa e bruxa sob um teto de estrelas prateadas que se moviam e eram entremeadas por cadentes quando a luz era apagada.


Hermione colocou a escova na mesinha de cabiceira e cobriu a filha, mas antes que apagasse o abajur, Rose disse:


- Quero ouvir uma história, mamãe!


E Hermione achou que não poderia ficar mais enlevada ao pegar uma coletânea de contos de fadas dos irmãos Grimm e sentar-se na beirada da cama, abri-la e começar a ler, naquele quarto adorável, Branca de Neve para sua pequena menina-prodígio.


“Era uma vez uma rainha. Um dia, no meio do inverno, quando flocos de neve grandes como plumas caíam do céu, ela estava sentada a costurar, junto de uma janela com uma moldura de ébano...”


Durante toda a leitura Rose acompanhava a mãe recitando falas e até paragráfos inteiros. Quando terminou, Hermione recebeu um beijo estalado na bochecha e ouviu um animado “Branca de Neve será sempre uma das minhas histórias preferidas!”


No entanto, antes de Hermione dar o beijo de boa noite na testa da filha, ela já estava dizendo:


- Por que você também não me conta de novo “Babbitty, a coelha”, mamãe?


Ela não se lembrava de já ter escutado esta história antes, mas por quê não?


- Claro, Rose! Está em qual livro?


Rose ergueu uma sobrancelha.


- Em “Os Contos de Beedle”, o livro que você traduziu das runas, mamãe!


Hermione foi pega de surpresa. Até ali não sabia que havia traduzido oficialmente um livro. Para não deixar Rose desconfiada de um lapso da mãe, ela girou os olhos para o alto com uma expressão que dizia: “Olha o que o sono faz com as pessoas” e fez cosquinhas na barriga dela. Andou pelo quarto perscrustando as muitas prateleiras, mas não encontrou o título que a filha mencionara.


- Será que está na biblioteca, Rose...?


A menina ergueu a mão como quem pede tempo, numa postura diferente, pois já não estava mais rindo, apenas esboçava um sorriso sereno, muito concentrada. Seus olhos estavam semicerrados como quem perscrusta na mente uma informação imprecindível. De repente, a escova começou a se debater e a luz, a tremular até se apagar. Então a claridade voltou com o pousar gracioso de um exemplar de capa azul defronte a sua pequena propulsora.


A emoção de Hermione naquele momento é difícil de ser descrita. Um misto de fascínio, surpresa e orgulho. Na verdade, era mais que isso. Algo que só um coração de mãe pode entender.


- Estava mesmo na biblioteca, papai deve ter deixado lá outro dia depois de ler para mim. – falou Rose serenamente. A única coisa que indicava ter feito uma proeza em sua expressão era seu sorriso satisfeito.


Hermione arquejou, a boca aberta, sorrindo como a mãe mais orgulhosa do mundo. O que de fato era.


- Você praticou magia, Rose! Sua magia simplesmente... apareceu! – bradou ela.


Apertou Rose num abraço caloroso, cobriu o rostinho da filha de beijos e, rindo, fez mais cosquinhas em sua barriga. A menina ria feliz. Apenas dando de ombros, disse:


- Eu só queria o livro e fiquei pensando como queria que ele viesse da biblioteca até mim.


Hermione levou a mão à boca, uma recordação preciosa aflorando na mente, pois era como se estivesse a vivenciando de novo. Segurou a face da filha e a acariciou com os dedos. Contemplando-a, ainda muito emocionada, começou a contar:


- Eu também tinha cinco anos quando dei meus primeiros sinais de magia. Estava em uma livraria com meus pais e também queria muito que um livro viesse até mim. – ela balançou a cabeça, vívidamente admirada pela tamanha coincidência – Mas ele estava numa prateleira muito alta e meus pais estavam procurando outro livro para pegá-lo para mim. Minha mãe veio para perto de mim a tempo de ver o livro já flutuando e se abrindo exatamente na página que eu queria.


- Uau! – Rose abriu a boca num pequeno “O” – E qual era o livro, mamãe?


- O Mágico de Oz. – respondeu Hermione com placidez.


- Aquele? – Rose apontou para a prateleira e o livro saiu pela metade do lugar e voltou assim que Hermione o viu. – Adoro a história de Dorothy!


Hermione comprimiu os lábios para não deixar lágrimas caírem diante de mais um sinal de magia da filha. Os sinais que só deveriam aparecer aos sete anos estavam vindo com tudo.


- Esse mesmo. E eu não me espantaria se a minha bruxinha tivesse sapatinhos de rubi para bater e voltar para casa.


- Hum... É, talvez seja minha próxima aquisição. - disse Rose, sapeca.


 E juntas, mãe e filha deram mais gargalhadas com gosto.


- Agora – Hermione falou, se recompondo, pegando o livro de capa azul em cuja folha de rosto se lia que os contos tinham sido “traduzidos das runas originais por Hermione Granger ” e o folheando -, vamos ao conto que esta mocinha tanto quer ouvir.


 Quando Hermione chegou ao final – “Babbitty saiu saltando para muito longe, a estátua de ouro da lavadeira, que recobria o toco, durou para sempre, e nunca mais os bruxos foram perseguidos naquele reino.” – as pálpebras de sua prodigiosa Rose já estavam fechadas. Com muito carinho, alisou a testa da filha e a beijou.


- Durma com os anjos, Rosie. – ouviu alguém dizer, suspirando.


A porta estava entreaberta com Rony na soleira. Hermione saiu sem fazer barulho e o puxou pela mão, o sorriso ainda estampado no rosto.


- Nossa pequena Rose acaba de dar os primeiros sinais de magia! – informou Hermione e contou como foi todo aquele momento plenamente mágico.


A reação de Rony pode ser entendida como a de um pai-coruja muito orgulhoso que comemora o grande feito de sua filha, mas também como a de um homem apaixonado que aproveita o momento para transmitir com euforia o que sente pela mãe dela. Ele tirou Hermione do chão e a girou em um rodopio, rindo com uma felicidade que resplandecia em seus olhos.


E o que restava a Hermione senão corresponder à euforia daquele sentimento pleno que a preenchia por dentro? Se talvez fosse pela circunstância que estavam vivendo que ela preferia não se entregar, temendo o que aconteceria se não desse certo e o que isso poderia refletir nas crianças; se talvez fosse pelo medo de não ter a retribuição do que sentia como na vez do Baile de Inverno, o que poderia fazer em um momento como aquele? Todas as suas dúvidas foram esclarecidas com um gesto e só restava uma coisa a fazer.


Hermione envolveu o pescoço de Rony e o beijou. E o beijou de novo. E o beijou mais uma vez. Eles riram juntos e continuaram se beijando até perder o fôlego e caírem no sofá, abraçados.


- Eu te amo – confessou Hermione, com os braços de Rony envolta do corpo – E tudo que eu quero é ficar bem aqui com você, Rony.


- Então não precisa se preocupar, Hermione, porque eu também te amo e sempre vou estar bem aqui, ao seu lado – sussurrou Rony com aquele sorriso apaixoanado que fazia seus olhos brilharem num tom azul oceânico.

E os dois se beijaram e se beijaram como se não houvesse tempo, como se não houvesse nada além do que queriam demonstrar um pelo outro. Acabaram adormecendo ali mesmo, abraçados no sofá da sala, o que provocou muitas gargalhadas de Hugo e Rose pela manhã.
Foi preciso que a magia deixasse seus vestígios com antecedência através de uma criança para que a demonstração de um amor que já passava da hora de ser demonstrado viesse à tona. Rony e Hermione só precisavam de motivação para deixar aflorar a maior verdade de todas.



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N/A: Olá, queridos leitores!


Em primeiro lugar quero pedir desculpas pelo tamanho atraso da postagem.  Eu passei por momentos muito difíceis nos últimos meses, terríveis mesmo. Tenho uma síndrome chamada fibromialgia, que se caracteriza por dor muscular generalizada, fadiga e distúrbios do sono, entre muitos outros sintomas. A crise que tive recentemente foi a pior de todas, eu ficava tão prostrada e com tarefas atribuladas que não tinha forças nem para fazer coisas que mais amo, como escrever. Mas graças a Deus meus novos tratamentos, em conjunto, começaram a surtir efeito há algumas semanas e cá estou eu, voltando à ativa.


Muito obrigada por continuarem acompanhando Subitamente no Futuro! Saibam que essa fic e todo carinho que vocês têm por ela nunca saiu da minha cabeça. Nem do meu coração. Desde o início, já tenho toda estrutura  planejada e todos os capítulos com nome. Mesmo que eu poste de pouco a pouco e demore para concluír um capítulo, nunca abandonarei esta fic. Eu amo estes personagens, amo esta fic e amo o incentivo de vocês! É sério, vocês são demais, pessoal!


Espero que tenham gostado do desenlance da primeira parte de SnF. Na verdade, o ponto de divisão entre essa parte e a próxima é a plena consciência de nossos queridos sabe-tudo irritante e legume insensível  de que se amam e que isso basta para seguir adiante. Simples assim. (Ô, cabeças duras eles, né?!)


O título do próximo capítulo é Entre Dois Mundos e eu aviso quando ele estiver à caminho. É isso aí, comentem, ponham pra fora o que acharam e continuem fazendo esta autora feliz!


Um beijo e um abraço de algodão para cada um!
Brunna

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Comentários (13)

  • leleu_mione

    Que lindo esse capítulo, amei o final, deles se declarando, mas a parte da rose fazendo magia também foi bem fofa. Posso fazer uma proposta? Nós te acompanhamos, comentamos e te fazemos feliz e você continua essa fic linda e nos faz feliz também!!!!!!!!!!!!!!!!!! kkkkkkkkkkkkkk seja bem vinda de volta e até o próximo capítulo.

    2012-08-22
  • willi santana

    p.s. amei a capa!!!

    2012-08-22
  • willi santana

    uau!! que bom que vc voltou a postar estou adorando,  penso como eles estão se sentindo, todo medo de se aproximar e o que isso reflete para as crianças, que são naturalemnte sensiveis, ainda mais Rose!! essa novoidade agora.... fiquei curiosa, indo para o final!

    2012-08-22
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