Cobras X Leões
Apesar de o dia amanhecer ensolarado e perfeito para voar, Lilian não conseguia fazer seu estomago parar de dar cambalhotas e suas mãos tremiam imperceptivelmente. Não conseguindo dormir direito, a ruiva acordou enquanto ainda estava escuro do lado de fora de sua janela. Tomou seu banho e pôs o uniforme do time de quadribol de sua casa. Logo desceu para a sala comunal para tentar se acalmar e evitar que Lívia tivesse mais motivos para atormentá-la.
No dia anterior, ela pareceu hesitante quanto ao plano que elas haviam bolado para machucar Tiago Potter. A ruiva argumentou que um balaço enfeitiçado no meio de um jogo, mesmo que seu alvo tenha sido pré-estabelecido, era muito perigoso para todos. Balaços eram imprevisíveis, afinal. Mas Lívia não gostou da hesitação da menina e uma longa discussão repleta de ameaças implícitas decorreu. Lilian nunca admitiria que havia ficado temerosa perante Lívia, mas a verdade é que depois da descoberta de seus encontros com os sonserinos, a menina pareceu ficar mais perigosa.
O plano era simples. No dia anterior, elas entraram na sala da Madame hooch, professora de vôo da escola e juíza dos jogos entre as casa, e enfeitiçaram o balaço que seria usado no jogo. Ele perseguiria Tiago até que o atingisse. Apesar da ruiva afirmar que seu temor era por serem pegas, uma parte remota de sua mente continuava afirmando que sentia medo pelo Potter e pelo o que poderia acontecer depois de mais essa “brincadeirinha”.
A ruiva estava sentada no sofá, pensando novamente no maldito balaço, quando um movimento as suas costas a fez virar rapidamente e encarar o intruso. O ar faltou quando ela viu os óculos e o cabelo espetado, mas não pode se dizer surpresa afinal, a insônia de ambos vinha, curiosamente, nos mesmos dias.
Ele descia também com o uniforme do time. Esse seria seu primeiro jogo como capitão e a ansiedade o impediu de dormir direito. Por vezes, sonhava que algum jogador se machucava e eles perdiam o jogo contra as cobras. Não queria admitir, mas, na maioria dos sonhos, era Lilian quem se machucava e, a imagem da ruiva caindo de uma altura considerável e batendo no chão como uma boneca de pano causava-o calafrios. Ele se convencia de que aquele terror com a imagem da ruiva não tinha nada a ver com sentimentos românticos, mas apenas porque ela voava a pouquíssimo tempo e, portanto, era menos experiente que o resto da equipe. Por fim, ele prometeu a si mesmo que manteria um olho na menina, apenas para evitar que um membro da equipe se machuque e ela fique desfalcada.
Assim que avistou Lilian o encarando do sofá, seu estômago girou. Desde o beijo que eles não haviam se falado direito. Pensou que, afinal, a menina devia estar nervosa com o seu primeiro jogo e, vendo como uma obrigação de capitão dar apoio, ele sentou-se no sofá em frente a ela.
- E aí Evans – Ele começou atraindo a sua atenção – Nervosa com o seu primeiro jogo como artilheira?
- Eu to bem... – Ela disse dando de ombros, entretanto o menino notou o leve tremor de suas mãos e percebeu que ela queria manter a pose de Senhorita e era ele quem deveria abrir mão do orgulho para tentar uma conversa franca – Nervoso com o seu primeiro jogo como capitão?
- Sinceramente? – Ele olhou profundamente para ela – Muito nervoso! Eu quase não consegui dormir tendo pesadelos com a equipe perdendo o jogo ou se machucando
- Sério? – A ruiva perguntou engolindo em seco
- Muito sério! – Ele respondeu ainda olhando em seus olhos – A minha tarefa como capitão é me preocupar com a minha equipe. Com TODOS os membros dela.
- Nervosismo é para os fracos e inseguros – Ela disse depois de um momento de silêncio enquanto ela absorvia as palavras dele. Afinal, ele disse que se preocupava com ela? – Típico de um maroto...
- Pelo visto não é exclusivo dos Marotos já que eu consigo ver daqui a sua mão tremendo... – Ele falou com um meio sorriso nos lábios
- Tanto faz! – Ela disse furiosa e não conseguindo disfarçar a tremedeira – Eu vou comer antes que a sua presença me deixa ainda mais enjoada.
- Evans? – Ele gritou antes de ela passar pelo quadro. Quando ela se virou, ele completou confiante – Vai dar tudo certo no campo! Eu vou ta com um olho em você.
Mesmo não querendo demonstrar, a afirmação convicta do garoto que a protegeria em campo a deixava mais aliviada e mais arrependida. Enquanto ele estivesse tentando cuidar dela e evitar que morresse em cima da vassoura, ele estaria desatento ao balaço perseguidor. Esse pensamento a deixou mais inquieta.
x-x-x
Faltavam cinco minutos para o início do jogo e todo o time da grifinória estava no vestiário ouvindo o discursivo de incentivo de Tiago. Lilian aparentava arrogância e descaso, assim com Olívia e Lívia, mas a garota prestava atenção atentamente em cada palavra que saia da boca do maroto.
“ - E que boca... – Comentou Ge, em sua mente
- PÉSSIMA hora pra você aparecer Ge! – Lilian pensou – Eu realmente preciso me concentrar pra não cair da vassoura, não entrar na direção do balaço e não agarrar a peste na minha frente
Lilian se assustou com seu último pensamento e percebeu que realmente havia prestado atenção demais na boca do menino.
- Isso é desejo reprimido! – Comentou Ge, contente consigo mesma
- Oh inferno! – Chegou Di – É só eu dar uma voltinha que você já aparece pra tentar confundir a menina com essas suas baboseiras...
- Ela mesma admitiu que quer beijar o Tiago... – Ge discutiu – Porque ignorar essa vontade? Não se reprima, não se reprima!”
- Evans? – Lilian ouvia algo a chamando – Você ta ai?
Quando Lilian conseguiu focar na sua realidade, o rosto do maroto que era o motivo da discussão na sua cabeça estava próximo do seu e ele abanava uma mão na frente de seus olhos. Ela ficou estática por um momento devido a proximidade, mas se recuperou rapidamente e ralhou com o menino:
- Tá maluco Potter? – Ela exclamou se afastando – Fica me gritando assim e abanando essa mão irritante no meu rosto... O que deu em você?
- Eu é que pergunto! – o maroto retrucou irritado – Eu te chamei zilhões de vezes, mas você parecia que tinha ido dar uma voltinha e tinha deixado o corpo... A gente tem que entrar em campo!
- E o que a gente ta esperando? – Ela perguntou já montando na vassoura e seguindo, sem dar tempo do garoto responder
Tiago revirou os olhos antes de montar na sua própria vassoura e seguir para o meio do campo encarar as cobras.
Logo que os capitães se cumprimentaram, as bolas foram soltas e o jogo começou. Lilian voava espetacularmente e, com a ajuda de jogadas rápidas dos outros dois artilheiros, ela conseguiu marcar os dois primeiros gols da partida. Por dentro, ela estava tão feliz que seria capaz de dar cambalhotas. Depois do seu terceiro gol, ela finalmente percebeu que, afinal, quadribol era divertido e voar te dava a sensação de liberdade.
A grifinória ganhava de 60x40 quando começou a acontecer. Tiago havia tido um vislumbre do pomo e seguiu a toda velocidade naquela direção. O apanhador da Sonserina, vendo o movimento rápido do menino, atirou-lhe um balaço. Não conseguindo frear, o menino se desviou daquela bola que vinha em alta velocidade em sua direção e acabou perdendo o pomo de vista. Entretanto, o balaço voltou em sua direção e começou a persegui-lo. Lívia sorria discretamente enquanto observava a cena e não se movia para ajudá-lo, mas Sirius era seu melhor amigo e percebeu o perigo. Logo, ele conseguiu interceptá-lo e, com uma força descomunal, desviou-o de sua direção original.
Lilian estava tomando gosto pelo jogo e não percebeu quando o caos com o balaço havia sido instaurado. Ela estava extremamente concentrada em uma jogada particularmente difícil que envolvia agilidade e muitas fintas e não viu quando Sirius atingiu o balaço. A força que o maroto usou ocasionou a mudança do alvo original do balaço. E ele começou a ir em direção a ruiva, que comemorava seu último gol de costas para a bola. Tiago não teve muito tempo para pensar na situação. Com a imagem de seu último pesadelo com a ruiva caindo e a lembrança da sua promessa, ele voou em direção a ela e se jogou em sua frente.
A cena a seguir surpreendeu a todos. Toda a arquibancada havia visto o balaço indo em direção a ruiva distraída e todos já consideravam sua queda certa. Quando ela se virou, só o que viu foram os olhos de Tiago Potter antes do balaço acertá-lo nas costas, o barulho de algumas coisas se quebrando e seu corpo inerte despencando. Alguém foi rápido o suficiente para fazer um feitiço para retardar sua queda, mas os danos já haviam sido feitos. Ele foi imediatamente levado para a ala hospitalar. Lilian ainda não conseguia entender direito o que havia acontecido, mas a culpa já a assolava. Tiago havia cumprido sua promessa de cuidar da ruiva no jogo. Ele havia a salvado.
A próxima ação foi tão rápida e inesperada quanto à primeira. Lilian percebeu que todos já davam a partida por perdida e sentia que déia isso a Tiago, afinal, ele não devia perder sua primeira partida como capitão. Assim, ela voou rapidamente para o alto, passando por Sirius e rapidamente pegando seu bastão. Ela tomou mais velocidade e conseguiu acertar um balaço que foi em direção ao apanhador da Sonserina. O garoto não esperava pelo impacto e acabou desmaiado como o apanhador da Grifinória. Ela rapidamente jogou o bastão para Sirius e encarou a cena como se estivesse tão assustado com a cena quanto os outros.
Madame Hooch, que não havia visto a manobra da ruiva, pensou que havia sido Sirius quem tinha jogado o balaço. Depois de sua negar veemente, ela chegou a conclusão de que o problema era com o balaço, que já havia apresentado problemas mais cedo perseguindo o Potter. Com os dois times sem apanhador, o jogo teve que ser dado por encerrado e a vitória foi dada a Grifinória, que estava 30 pontos na frente do outro time.
Lilian sabia que havia agido por impulso, mas não se sentia culpada por ter estragado os planos de Lívia. Tinha a esperança de que a garota nem havia visto sua manobra, mas sabia que Sirius tinha consciência do acontecido e, uma hora ou outra, ele iria cobrar explicações.
Decidida a pensar nas conseqüências mais tarde com calma, a ruiva seguiu para o vestiário com o resto do time e, logo, já se confortável em seu dormitório.
x-x-x
Era uma da manhã, quando Lilian saiu silenciosamente de sua cama no dormitório. Havia alegado dor de cabeça e por isso, deitou-se mais cedo que as companheiras. Na verdade, só queria um tempo para pensar direito em tudo que havia acontecido. Querendo ou não, o Potter a havia salvado. Ele provavelmente havia quebrado algumas costelas e, pelo menos, um braço. Havia caído de uma altura considerável. Quando terminou de listar todos os possíveis danos do maroto, ela percebeu que, afinal, estava preocupada com o menino. Aquilo havia sido sua culpa de qualquer jeito.
Ela pensou um momento antes de decidir que não teria problemas em visitá-lo àquela hora. Ele deveria estar dormindo, assim como a curandeira, e ninguém saberia dessa sua preocupação. Quando terminava de pensar no assunto, Mitch, sua gata, surgiu a sua frente no salão comunal e, como se entendesse aquilo como apoio, ela se transformou em uma gata esguia e laranja e seguiu com a outra para fora da torre. As duas seguiram silenciosamente e sem problemas até a enfermaria. Já na porta do local, Lilian voltou a sua forma humana e se virou para a gata:
- Você toma conta da porta pra mim, tudo bem meu amor? – Ela disse fazendo carinho atrás da orelha da gata e recebendo um ronronado em resposta
A ruiva entrou silenciosamente na ala hospitalar e avistou o maroto em uma das últimas macas do lugar. Caminhou rapidamente até o local e sentiu uma leve perturbação quando abriu a cortina que o cercava e notou que a maior parte de seu corpo estava enfaixada. Ele provavelmente teve mais danos do que ela conseguiu imaginar. Ficou um tempo observando o menino dormir e sentiu seu coração apertar. Talvez Claire estivesse certa e ela ainda tivesse sentimentos pelo maroto.
Ela se assustou quando ele começou a resmungar e se mexer na cama. Devia estar tendo um sono perturbador e a idéia de que ele poderia sofrer mais fez com que ela se aproximasse mais da cama e passasse a mão delicadamente pelos cabelos do menino numa tentativa de acalmá-lo. Ela falava fracamente que tudo ia ficar bem e uma lágrima solitária escorreu de seu rosto. Ela estava distraída quando percebeu que ele abriu os olhos e a fitou. Ela se afastou rapidamente de sua cama e estava pronta para correr dali quando o ouviu chamá-la.
- Evans – Ele sussurrou sem forças
A menina parou a uma distância segura do maroto e virou seu corpo para encará-lo. A onda de culpa e dor a assolou de novo quando viu a careta de dor de Tiago ao tentar se mover e, sem saber mais o que fazer e sem poder ficar mais tempo no ambiente, ela falou:
- Brigada por cumprir a sua promessa no campo. Brigada por me salvar – Ela falou corando levemente e saiu correndo do lugar.
Tiago ainda não conseguia acreditar no que tinha acontecido no lugar e, cansado demais para pensar detalhadamente no assunto, procurou uma posição confortável e voltou a dormir. Dessa vez, sonhando com cabelos ruivos esvoaçantes e olhos verdes encantadores e penetrantes.
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Lilian havia ficado perturbada com a sua visita ao Potter. Estava mais confusa em relação aos seus sentimentos e decidiu que precisava de uma boa noite de sono. Transformou-se novamente em gata e seguiu para a sala comunal da grifinória na companhia de Mitch. Pensou que o lugar estaria vazio e ficou paralisada quando, após se transformar novamente no meio do salão, ouviu uma voz muito conhecida as suas costas.
- Onde você estava Evans?
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