O esconderijo



Bellatrix estava sentada à janela de seu esconderijo. Não sabia exatamente onde estava, fora seu mestre que a levara ali, mas era um lugar bastante silencioso... e frio. Nevava lá fora e era esse o motivo de Bellatrix estar ali. Havia um corte em sua mão, do qual o sangue escorria devagar e aos poucos e ela gostava de observar seu sangue pingar na neve e diluir-se. Sangue. Era isso que definia tudo.

Esse líquido, que circula em cada órgão, cada veia, cada nervo, cada célula, cada átomo, que era capaz de dar a vida ou de tira-la... Como seria possível que ele não definisse cada mínima parte de uma pessoa, que a definisse por completo, se essa pessoa sequer existiria sem seu sangue, suas origens? E como seria possível que alguém renegasse o próprio sangue?

No entanto, ele o havia feito. Havia recusado toda a decência, toda a moral, as crenças e os princípios de sua família e passara para o lado de trouxas, mestiços, sangue-ruins e outros traidores como ele. E Bellatrix odiava-o por isso, odiava-o por ser tão estúpido e não perceber de que lado deveria estar, por ter fugido ao chamado do seu sangue. Ele estava morto agora, ela o matara, e mesmo isso não aplacara seu ódio. Ela queria mais do que mata-lo, queria destruí-lo. Conhecia o ódio melhor do que qualquer outra coisa, mas mesmo assim odiava-o mais do que julgara ser possível, e odiava-o principalmente porque em todos aqueles anos ela nunca conseguira deixar de amá-lo.

Azkaban não conseguira arrancar dela sequer uma lembrança do que já vivera com Sirius porque nenhuma dessas lembranças era completamente feliz. Os dementadores haviam conseguido embaça-las, é verdade, extrair a alegria que existia nelas, mas não apaga-las, nem por um segundo, porque, antes de tudo, aqueles momentos eram cheios de vergonha e até mesmo uma espécie de culpa pelo que estava fazendo. Culpa, talvez, mas ela nunca teria desejado voltar atrás.

Ela era apensas uma criança quando acontecera, não cansava de se repetir isso, mas ele era ainda mais criança. E, não importa que idade tivessem, as suas experiências marcaram-nos pelo resto da vida, moldaram seu caráter e seus sentimentos um pelo outro. Não sentimentos bons, em geral.



Tudo havia começado de maneira bem comum... da mesma maneira que começa naqueles romances idiotas publicados no Profeta Diário. Bellatrix estava sentada em seu quarto, reclamando em voz alta para Narcisa sobre ter de passar todo o verão aturando seus primos, e Sirius entrara no quarto, ao mesmo tempo em que sua mãe gritava por Narcisa do andar de baixo e a garota saía para atender a mãe. Sirius caminhara até ficar frente a frente com Bellatrix e sorrira, daquele seu jeito petulante de sempre.

-

Não se preocupe, priminha, você sequer vai perceber que eu estou aqui.

-

Disso eu duvido muito.

-

Olha, apenas... Fique fora do meu caminho e eu não te incomodarei. A não ser, é claro, que você me peça.

-

Essa é a coisa mais absurda que eu já ouvi. E porque eu pediria para você me incomodar, Sirius?

-

Bem... eu estava pensando em alguma coisa desse tipo.

E então, ele a puxou por um dos braços para muito perto de si e encostou seus lábios nos dela. Bellatrix ficou surpresa, mas não resistiu e, na verdade, quando Sirius abandonou aquele delicado toque de lábios para intensificar o beijo, colocando sua língua devagar dentro da boca de Bellatrix, ela correspondeu à altura e ainda protestou quando, depois de alguns minutos, ele fez menção de afastar-se, prolongando o beijo por mais algum tempo.

Foi o seu primeiro beijo, se é que isso importava, mas não o de Sirius, todos em Hogwarts conheciam bem a fama do jovem Black. Ela já tinha 16 anos, quase um a mais do que seu primo, mas isso não demorara tanto pra acontecer porque ela estivesse se guardando para seu príncipe encantado, isso era babaquice emocional. A verdade é que ela simplesmente nunca havia achado alguém bom o bastante para interessa-la. Todos, absolutamente todos, os garotos que ela conhecera na vida, eram desmiolados ou impuros demais para chegar a sua altura. Exceto Sirius. Sirius seria perfeitamente interessante, se não fosse seu primo, e se não tivesse essa estranha preferência por companhias ruins. Se não fosse isso, ela sequer se importaria com o fato de ser mais velha do que ele.

Depois que eles se separaram, Sirius apenas sorriu, olhando para Bellatrix, que estava sem fôlego e com o rosto afogueado, e disse:

- Lembre-se, Bellatrix, a não ser que você queira... - E saiu do quarto.

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