Capítulo Único

Capítulo Único



                                                                    Entre erros


 


- Harry - Hermione chamou puxando o menino que vencera para longe das lentes do profeta diário. Os dois ainda estavam com as roupas sujas e rasgadas do confronto final enquanto Ron era atendido no que sobrara da ala hospitalar.- O Ministro será nomeado em breve, por favor Harry, não se esqueça de pedir a ele.


O rosto do menino endureceu conflituoso:


- Eu não posso Hermione, olhe para essas pessoas em volta- Falou apontando os arredores de um destruído salão principal. Os destroços estavam sendo empilhados em um canto próximo a onde um dia as ampulhetas mostravam quem venceria a Taça das Casas e algumas mesas foram improvisadas para as famílias que velavam seus mortos ou reuniam-se aliviadas - Não vou arriscar o resultado da guerra com seu pedido.


- Você sabe que não mudaria nada- Completou enxugando uma lágrima.- Ele não teve influência direta... Você salvou o Sirius, Harry. As pessoas merecem uma segunda chance... Dumbledore acreditava nisso...


- Ele não está mais aqui- falou angustiado- além disso, você ouviu o que Mcgonagall disse, todos os vira tempos foram destruídos. Eu sinto muito, Mione.


O menino a abraçou enxugando suas lágrimas, mas Hermione não se sentia confortada, tudo doía e desmoronava com tanta injustiça, falta de reconhecimento e respeito a alguém que sempre esteve disposto a arriscar tudo para protegê-los, pelo simples fato de um dia ter amado a pessoa errada.


- Eu prometo que esclarecerei a história para o Shackebolt, todos vão saber o herói que ele foi e sua participação na guerra, talvez ele até ganhe uma ordem de Mérlin póstuma, mas é tudo que está em minhas mãos.


Ela assentiu com a cabeça, sem confiar na voz embargada. Um repórter se aproximou, mas Harry rapidamente o repeliu com um gesto pedindo paciência.


- Vamos ver se Ron está melhor.


Hermione esperara a primeira distração dos meninos para se refugiar na casa dos gritos. Passara despercebida pelos aurores que arrumavam feitiços de proteção em torno do castelo, verificavam os corpos marcando-os e cuidavam da captura dos comensais restantes. A lua estava encoberta pelas nuvens no céu, como se não quisesse testemunhar aquela história. Ela pegou um galho e cutucou o nó no tronco do salgueiro lutador revelando sua passagem. Apressou- se pelo estreito corredor até a saída na casa dos gritos. Olhou espantada, o lugar em que o corpo dele devia ocupar estava vazio... Ela deixou o corpo escorregar cansado pela parede, até sentar puxando os joelhos em direção ao peito.


Ela demorara, já deviam tê-lo levado e no mínimo marcado-o como comensal. Ela errara, quão difícil era aceitar que uma escolha feita as pressas pudesse determinar o destino de alguém. A guerra mudava as pessoas, Hermione não tinha dúvida disso, ela vira e ouvira coisas demais e dera as costas à morte de um homem inocente.


Tudo que ela queria era um vira tempo, mas ninguém parecia se importar com a vida ou a morte de Severo Snape. Era um sacrifício para o bem maior, não era? Mas para ela era como se sua vida tivesse acabado no exato instante em que ela saíra da casa dos gritos mais cedo aquele dia, deixando o corpo dele lá, sozinho.


Ela fitou a poça de sangue no chão, a dor aumentando tanto que ela só queria gritar... Como a má vontade de algumas pessoas fez com que ela chegasse ao fundo do poço? Como Minerva e Harry tinham manipulado-a para aceitar um fato mutável?  Ela estava certa de que em algum lugar daquele castelo havia um vira tempo bem escondido, que fora emprestado a ela anos antes, que servira para ajudar o menino que sobreviveu a ter seu padrinho de volta, que salvara Bicuço, e possivelmente seria um trunfo para se certificar de que o lado certo venceria, mas que simplesmente não podia salvá-lo, mesmo que o cruel professor de poções fosse tão inocente quanto os outros, mesmo que ele tivesse feito mais que qualquer um. Ele sempre seria o mal humorado ranhoso.


"Pense Srta. Granger, um vira tempo nas mãos dos comensais da morte seria melhor que a invenção de um feitiço de ressurreição" ela repetiu desgostosa as palavras de Minerva.


A bruxa apertou os punhos, angústia, raiva, frustração, pagar por uma escolha. Ela teria que conviver com o sangue dele em suas mãos. 


Hermione acordou sobressaltada, os cabelos molhados de suor e a respiração ofegante. Levantou rapidamente buscando na lateral da cama algo para amarrar os cabelos no coque displicente, parecia que as imagens a guiavam, ela precisava chegar até ele. Colocou um robe preto por cima da camisola de dormir e calçou os chinelos. Passou tão rápido pelo quadro que guardava o acesso a seu quarto de monitora que nem percebeu. Seus pés conheciam bem aquele caminho e ela confiava neles o suficiente.


Andou apressada sem se preocupar em ser apanhada fora da cama no meio da madrugada por Filch ou sua gata, o máximo que ele faria era levá-la até o diretor, mas não era exatamente para onde ela estava indo?


Percebeu que estava nas masmorras quando teve que puxar mais o robe para se proteger do frio, ela rezava para que ele não ficasse muito bravo por ser acordado no meio da noite.


Bateu na porta e esperou, demorou a ouvir passos do outro lado. Snape caminhou até a porta com seu mais frio olhar estilo mestre de poções, a mandíbula cerrada pela intromissão, mas assim que abriu a porta e viu Hermione suas feições relaxaram, ela encurtou a distância abraçando-o pela cintura e soltando as lágrimas. 


- Shhhh, estou aqui.- ele disse caminhando com ela para dentro da sala.


A bruxa se acalmou um pouco ao ouvir a voz dele, Snape puxou delicadamente o rosto da menina para encará-la.


- Hermione... Estou aqui. Acalme-se. Eu só vou fechar a porta...- completou se separando da menina.


O professor olhou para os dois lados do corredor antes de fechar a porta, depois foi até a lareira e jogando um pouco de pó de flu colocou a cabeça chamando pela cozinha.


- Nala, por favor, me traga chá e um pouco de café.


- Em um minuto, diretor- A elfa respondeu.


Snape agora podia voltar suas atenções exclusivamente para sua bruxa, ele se sentou no sofá ao lado dela, puxando- a para seu peito.


- Aquele pesadelo de novo?


Ela assentiu com a cabeça.


- Desculpe- me Severo, acho que ainda não estou pronta para dormir sem a poção. - falou com a voz derrotada. -eu... Eu nunca encontro o vira tempo.


Ele puxou-a para o seu colo e deu um beijo em sua cabeça.


- Mas você conseguiu... Ou eu não estaria aqui e não poderia fazer isso...- Disse fazendo uma trilha de beijos  pela lateral do rosto dela.


Ela respirou fundo:


- Eu sei... Mas, estou com medo, Severo, eu errei... Nem todo mundo pode consertar seus erros.


- Eu pude e o meu foi muito pior que o seu....


- Perdoe-me...- ela o interrompeu.


- Hermione, olha pra mim.- Ela se ajeitou para ter acesso a seus olhos. - Você não tem culpa nenhuma, a não ser de trazer o professor mais detestável de Hogwarts de volta e ainda ajudá-lo a ser diretor- Snape disse num sorriso malicioso- Eu jamais a culparia, você não tinha nem como saber de que lado eu estava.


- Mas eu não me importava com isso, eu amava você.


- Amava?


- Amo- Ela corrigiu e ele a apertou em seus braços.


A xícara de chá e a de café apareceram na mesinha de centro e ele usou a varinha para trazer até suas mãos, só para não perder um segundo daquele contato.


Hermione bebericou o chá e começou a se sentir mais aquecida por dentro, mal sabia se era pelo líquido ou pela conversa.


- Eu pude consertar meu erro e você também, vamos aproveitar essa segunda chance então e acabar com esse assunto, tudo bem?


- Sim. - Ela sorriu com os olhos brilhando.


- E eu já disse que pode dormir aqui, ainda mais quando não quiser usar a poção.


Ela enrubesceu e ele achou-a mais graciosa ainda. Dumbledore uma vez falara que ele era um homem sortudo e ele em troca rira irônico, sem dúvida ser torturado dia sim dia não pelo Lord das trevas era um sinal de sorte, mas agora ele tinha que concordar, talvez fosse o homem mais sortudo do mundo porque por duas vezes na vida tivera uma segunda chance e alguém para acreditar nele e salvá-lo.


Ele afastou esses pensamentos e abaixou os lábios buscando os dela num toque casto, mesmo com a posição desconfortável ele pediu permissão para aprofundar o beijo, carinhosamente acariciou a língua dela com a sua iniciando uma dança silenciosa, enquanto suas mãos soltavam seus cabelos e acarinhavam-lhe a nuca. Ela terminou o beijo e abraçou-o desajeitada.


- Obrigada, Severo. Por não me deixar errar de novo...


- Ah, mas como eu deixaria a Srta. Sabe tudo perder sua fama?


Ela lhe deu um tapa zombeteiro e bocejou, deviam ser quase quatro horas da manhã e no dia seguinte ela teria que assistir suas aulas normalmente.


Ele percebendo o cansaço dela se levantou e estendeu a mão:


- Não foi isso que planejei para quando você resolvesse passar a noite aqui, ou o que pensei quando me interrompeu no meio da noite, mas vamos dormir?


Ela riu aceitando a mão dele e caminhando para o quarto:


- Mas professor- falou dando ênfase ao título enquanto ele torcia o nariz- O que iriam pensar se vissem o diretor e sua aluna favorita tão cansados pela manhã?


- Você se esquece da minha fama de morcego, e não seria difícil pensarem que a Srta. Anda suspirando de amores por um certo diretor e que isso acaba por tirar-lhe o sono.


- Convencido!


Ele esperou que ela deitasse e se acomodou puxando a manta para aquecê-los. Deu um beijo no topo de sua cabeça e abraçou-a pela cintura.


- Boa noite, meu amor.


- Boa noite.


E ela adormeceu sonhando que encontrou o vira tempo na primeira gaveta que abriu e agora ela poderia ficar para sempre ao lado dele.  

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