O inferno de Draco



2. O Inferno de Draco


Os dias que se seguiram foram para Draco como uma amostra do inferno. Ele era obrigado a auxiliar Filch na limpeza (sem magia, em solidariedade com o zelador abortado), a ajeitar as salas após o final do dia, a fazer diversos serviços mais pesados para Hagrid - que, de repente, parecia muito interessado em ter um ajudante e virtualmente incapaz de fazer qualquer coisa sozinho - quer dizer, qualquer coisa que envolvesse esforço físico, cansaço ou que parecesse chatear Draco ao extremo.

Filch adorava também mandá-lo tentar deter Pirraça durante seu horário "voluntário", o que não era uma das tarefas mais agradáveis ou fáceis do mundo. A professora Sprout, pelo menos, era uma das bruxas mais brandas: suas detenções não eram desumanas, embora Draco estivesse sempre machucado quando saísse delas. Grande parte disto era culpa sua, que ajudava no manuseio e organização da estufa com tanta boa vontade quanto um trasgo, o que geralmente irritava uma série de plantas. Ironicamente, quem se enfurecera com ele fora Snape. Aparentemente, o professor não gostara nada de ver um aluno da casa que dirigia naquela situação, e decidira que o garoto merecia ser tratado quase no mesmo nível que Harry Potter.

Ah, e os comentários nos corredores. Ewan Lacrimossa estava longe de ser o mais popular dos alunos, especialmente pelos de sua própria casa, mas mesmo quem achasse interessante não tê-lo berrando para todo lado o quanto ele amava a Sonserina não se sentia muito bem quando pensava que o pequeno rebelde estava no hospital. E a solidariedade aumentava quando se sabia que, ficando ao lado dele, poderiam fazer troça de Mafoy, de Draco Malfoy. Mesmo os sonserinos achavam bastante divertida a visão de Draco limpando o chão ou esfregando janelas, e nem todos guardavam essas opiniões para si mesmos. Podia ser um sonserino, mas era antes disso um aluno em situação ridícula, a seu ver.

Malfoy estava assolado por um desejo de morte, ultimamente. Sua, na minoria, e dos outros, na maioria. Um imenso desejo de cometer a maior chacina que Hogwarts já presenciara. Diversas vezes pensava que preferia ter sido expulso, embora lá no íntimo soubesse que não. Hogwarts era uma das maiores escolas européias, para onde ele poderia ir? Durmstrang? Não, seria a desonra da família. Iria piorar sua situação, se é que era possível. Ele era um Malfoy. Ele daria um jeito de contornar aquela situação, era só questão de ver como.

Infelizmente, até lá, aquilo era seu cotidiano. A maior parte de suas janelas era preenchida com trabalho voluntário, e ele gastava grande parte da noite fazendo deveres, que eram bem maiores que de costume, porque o cansaço fizera das aulas de Draco um excelente motivo para adormecer. E ele nunca saía de Hogwarts. Estava ficando verde com isso. A última vez que vira a luz do sol fora para visitar Ewan Lacrimossa, acompanhado da professora McGonagall. A coisa toda durara uns quinze minutos, porque ele estava adormecido (segundo entendeu da enfermeira, aquilo acontecia com bastante frequência, mas era consequência do veneno que o atignira e não deixaria danos permanentes). E só. Ele estava enlouquecendo. O Lufa-Lufa nem ao menos chegara a bagunçar a casa de Hagrid! Não valera muito a pena, afinal.

E, se parecia que o desgosto de Draco não poderia aumentar, aumentou. Ele descobriu da pior maneira possível (perguntando) que não poderia sair de Hogwarts no Natal. Teria de ficar para o tal "serviço voluntário". Sentiu vontade de chorar. Tudo bem que seu pai o olhara com uma frieza incalculável quando fora até a escola falar com Dumbledore a respeito do ocorrido e do St. Mungus, mas ele tinha quase certeza que Lúcio não estava, no fundo, depreciando sua atitude. Talvez sua incompetência. Mas, mesmo que fosse para ouvir sermão, seria bom sair da escola, para variar. E ele não poderia.

Estava pensando nisso, mais enfurecido do que triste com a perspectiva de ficar por lá praticamente sozinho (e muito possivelmente com Potter para atormentá-lo a tarde toda), quando se deparou com um cartaz. Um cartaz anunciando que, aquele ano, seria realizada uma peça de teatro pouco antes do Natal, e que pedia (mentira, praticamente suplicava!) para que aspirantes a atores interessados se dirigissem para testes naquela tarde. Dizia que haveriam compensações. Algumas. Talvez alguns sapos de chocolate e lanches oferecidos durante os ensaios. E, claro, algumas dispensas justificadas durante eles.

Draco refletiu. Teatro era uma coisa meio imbecil, arte de trouxas. Dizer que não era popular era muita generosidade - normalmente, as pessoas nem sabiam que havia um na escola, e eles nunca faziam nada, sinceramente. O pessoal que não era do Quadribol em geral preferia qualquer outra atividade extra- teatro só perdia para aulas de reforço. Era considerado trabalhoso, vergonhoso e inútil - "e é mesmo", murmurou Draco para si. Não entendia porque raios iriam apresentar uma peça naquele ano. Mas entendia que a diretoria dava apoio. Se pudesse fazer parte da apresentação... bem, era uma peça para o colégio, não era? Não contaria como trabalho voluntário também? Teatro era para trouxas, mas era preferível decorar umas frases idiotas do que continuar esfregando o chão. Talvez ele tivesse algumas semanas de folga do Filch, durante os ensaios. Parecia tentador, especialmente porque seus dedos doíam do contato prolongado com os produtos de limpeza.

Por isso, ele enforcou a aula de História da Magia para auxiliar o zelador e, à tarde, foi para os testes de teatro, ainda que com um grande atraso. A coisa era ainda pior do que ele pensara. Não lhe parecia à toa o tom quase de súplica do cartaz: não haviam muitas pessoas ali, e as que estavam não eram exatamente excepcionais. Haviam duas garotas gordinhas da Lufa-Lufa, e um grifinório cuja cara lembrava muito a de um dragão estuporado. Uma menina da Corvinal que fazia Trelawney parecer quase normal estava agitando a varinha a esmo, fazendo surgir pequenos pedaços de papel pelo chão. Havia mais uma dúzia de pessoas, "todas parecendo selecionadas a dedo dentre os alunos mais estranhos de Hogwarts", pensou Draco, com desprezo. E havia Neville Longbottom e uma garota loira, conversando no canto. A menina usava um enorme chapéu vermelho e roxo, com uma pluma verde, e nas orelhas havia algo que lembrava muito nabos grasnantes secos. Era Luna Lovegood, como Draco viria a descobrir depois. A julgar pela cara de Neville, ela devia estar apavorando-o, ameaçando-o, ou tentando maquiá-lo...

Ok, ele já vira o bastante. Talvez fosse melhor continuar esfregando o chão. Draco estava a ponto de sair quando a professora encarregada, que ele nunca vira antes, sorriu para ele e caminhou em sua direção.

- Ora, Malfoy! Mas que surpresa você se juntar a nós!



Continua no capítulo 3. Não fiz aqui porque estava ficando grande demais...

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