Capítulo III



Oi, oi povo!!!


Pois é, mais um capítulo! Devo dizer que está sendo muito interessante trabalhar nesse projeto, estou tomando todos os cuidados para adaptar os personagens do livro para o mundo de HP, sempre procurando as personalidades que batem e até criando algumas que fiquem no contesto e para isso tenho pesquisado bastante. Outra coisa que acho importante dizer, é que se tratando de uma história de época, estou  tentando manter o máximo que posso os diálogos e termos do período, algumas vezes até coloco uma nota de referência para facilitar, faço isso, porque acredito que se tirar acabará por perder o charme da escrita. Espero que esteja agradando todos vocês.


Vamos aos comentários:


Brenda: Espero que continue gostando, tem muita coisa pra acontecer.


Aninha: Sim, a Mione chegou!!! Dá mesmo um certo medo esse lago, uma dica, preste muita atenção nele, sua importância ainda não apareceu ou será que já...? rsrsrs


Aliás, é sempre bom prestar atenção nos mínimos detalhes... Tem sempre algo escondido em meias palavras... rsrs


Fico super feliz que você esteja gostando.


Nana: Seja bem vinda, puxe a cadeira e se divirta!!


Fico muito contente em ver que está gostando.


 


Bjs à todas!!


Boa leitura.


 


***


 


Alexis, fatigado pela viagem, teve de ficar na cama no dia seguinte. Calmo e resignado como de costume, olhava a irmã, que ia e vinha pondo em ordem o apartamento, enquanto o professor separava uns preciosos papéis antigos, cuidadosamente guardados em sua mala.


Otávia entrou, trazendo o café com leite, e avisou o professor e sua filha que a condessa os receberia dentro de uma hora.


— Eu virei buscá-los, porque decerto não saberão orientar-se em todos esses corredores. Dormiu bem, senhorita?


— Muito bem. Mas não seria possível tapar, nem que fosse com um papel, essa vidraça quebrada, que deixa passar tanto vento?


— Uma vidraça quebrada?... Em seu quarto, senhorita?


— Não, na galeria, ao lado.


Uma expressão de terror se estampou na fisionomia de Otávia.


— Na galeria?... A senhorita esteve na galeria? — sua voz tremia.


— Terei cometido, sem o saber, uma indiscrição? Eu apenas quis certificar-me de onde provinha o vento.


— Oh! Não há indiscrição alguma! Mas nunca ninguém vai lá, principalmente à noite. Oh! Não, certamente!


Tremendo toda, ela persignou-se.[1]


— Mas é preciso dizer que há grande perigo em ir à noite até o lago negro. É assombrado!


Ela abaixara a voz e olhava à sua volta como se temesse ver surgir algum fantasma.


Hermione pôs-se a rir.


— Eu não creio em almas do outro mundo e asseguro-lhe que nada vi ao entrar de noite nessa terrível galeria. Concordo, entretanto, em que o aspecto desse lago se presta a lendas sinistras.


— A lendas? — disse Otávia com a voz abafada — Fui eu mesma, senhorita, que certa manhã encontrei, estrangulada na beira do lago, uma camareira de minha idade; eu tinha então dezesseis anos. Fui eu também quem primeiro acudiu, aos gritos da Condessa Lyra[2], e quem a encontrou de joelhos, junto ao lago, os braços estendidos para a água negra, onde ela acabava de ver desaparecer a sua cunhada, antes que pudesse prestar-lhe socorro.


— Quem era essa Condessa Lyra?


— Irmã do Conde Abraxas, avô dos atuais senhores. Ele se casara em segundas núpcias com uma linda moça italiana. Meu Deus, como era formosa! A Condessa Paola... e tão boa, tão amável! Ela tomou-me ao seu serviço; eu ajudava a ama a cuidar de sua pequena Ceres[3], hoje senhora cônega de Malfoy. Pois uma manhã, a sua camareira correu para mim dizendo: “Otávia, a senhora condessa está louca!”


— E era verdade, senhorita — prosseguiu a criada — Entrei no seu quarto e a vi sentada, o olhar desvairado, repetindo de tempos em tempos: “O lago! O lago!” O conde e sua irmã correram também. Ao vê-los, a Condessa Paola teve uma crise terrível e eles foram obrigados a sair do aposento dela. A Condessa Lyra estava lívida; esse espetáculo pareceu ter produzido um efeito terrível sobre ela. O Conde Abraxas, ninguém o reconheceria! Diziam que ele não tinha o coração muito terno, mas, em todo caso, julgo que amava ardentemente sua esposa, e esta sempre parecera muito feliz junto dele. O médico, chamado às pressas, acalmou a crise, mas deu poucas esperanças quanto à volta da razão, e outros consultados não foram mais tranqüilizadores. A senhora ficou mais tranqüila, mas não podia ver nem o marido nem a cunhada, não podia ouvir nem os passos deles. Nunca mais falou a não ser para dizer, com um ar espantado: “O lago! O lago!”


A velha criada prosseguiu, o professor e os filhos ouvindo-a atentamente:


— E eis que numa tarde, enquanto eu trabalhava com outra criada nestes aposentos que a senhorita ocupa, e que serviam para os hóspedes nas ocasiões das grandes caçadas, ouvimos um grito pavoroso... Oh! Nem, gosto de me lembrar, o sangue gela em minhas veias! Não sei como tive coragem de correr para a galeria, apesar do amolecimento que me deu nas pernas. Decerto eu era mais corajosa do que agora e vi o que lhe contei há pouco: a Condessa Lyra, ajoelhada, torcendo as mãos e gritando por socorro, enquanto mostrava a água que fazia um grande redemoinho. Sondaram todo o lago com ganchos de ferro, mergulharam em todas as direções, mas não encontraram o cadáver da condessa. Sem dúvida ficou preso em algum dos poços que existem, segundo dizem, diante da entrada da capela.


— E o marido? Que disse ele? — perguntou Alexis.


— O conde estava em Düfelden. Um correio foi avisá-lo e vimo-lo chegar a galope. O seu ar era o de um espectro. Depois de ouvir as explicações de um de nós, dirigiu-se para o lago, proibindo-nos de segui-lo. Que fez lá? Jamais o soubemos. Uma hora mais tarde uma camareira o viu sair do apartamento de sua irmã, aquele que dá sobre o lago, oposto à galeria. A moça saiu correndo, espantada, ao vê-lo, tal era a expressão do seu olhar. Disse-me que nem parecia um ser humano! Em seguida, fechou-se na biblioteca, recusando qualquer alimento. Certa manhã, Argus ao passar viu aberta a porta que era sempre conservada fechada. Sobre a mesa do Conde Abraxas estava uma carta endereçada ao seu filho Lucius. Nessa carta o conde proibia-o de fazer qualquer investigação no lago para achar o seu corpo, porque ele desejava repousar junto à Condessa Paola... E o Conde Lucius respeitou a última vontade do pai...


— São umas tristes recordações! — disse Hermione — A pobre senhora foi sem dúvida atraída por essa água escura que tanto a obcecava em suas alucinações.


Otávia sacudiu a cabeça, tornando a persignar-se.


— Senhorita, ela vira o maldito! Foi por isso que ficou louca. Antes era perfeitamente sã, alegre e espirituosa! Mas o viu e, desde esse momento, ficou sob o seu domínio, até o dia em que ele a atraiu para o lago negro, para o abismo que se abre lá embaixo. E há noites em que eles saem da água, e os três são vistos: o Conde Abraxas, sua mulher e... Marius Black[4].


A voz da velha criada teve uma inflexão de pavor ao pronunciar este último nome.


— Quem é esse? — perguntou Alexis.


— É o maldito, o perjuro. Ele assassinou a própria irmã, Cassiopeia – isso se passou há centenas de anos – e lançou o corpo no lago. Mas sua esposa vira-o cometer o crime e começou a definhar de desgosto. O rude senhor, que no mundo só a ela amava, ficou no auge do desespero. Algumas horas antes de morrer, a senhora revelou ao marido a causa de sua morte, suplicando-lhe que se penitenciasse e construísse, em memória de Cassiopeia, uma capela expiatória no meio do lago onde jazia o seu corpo. Marius, louco de dor, prometeu o que ela pediu. E fez edificar a capela, mas, em lugar de se penitenciar, entregou-se à orgia, à magia e ao crime, e de tal modo que um dia, atacado por um acesso de loucura ou de desespero, precipitou-se por sua vez no lago... e seu corpo nunca foi encontrado.


— Mas esse lago é um verdadeiro túmulo de família! — exclamou o professor, que a ouvia com interesse — Nunca pensaram em desviar essas águas misteriosas?


— Não, senhor professor, ninguém teve essa idéia. Aliás, é melhor deixar em paz os pobres mortos.


— E os Malfoy são herdeiros desse Marius?


— Indiretamente. Marius Black morreu sem deixar filhos e seus bens passaram ao irmão mais moço, Pollux Black, já riquíssimo e poderoso, do qual descendem em linha reta os nossos jovens senhores.


— Alguma vez você viu esse terrível fantasma? — perguntou Hermione sorrindo.


A velha criada levantou as mãos para o céu.


— Se isso tivesse acontecido, já eu não estaria aqui, senhorita! Aquele que o vê está perdido! Foi o que aconteceu com aquela moça, minha companheira, da qual lhe falei há pouco. Sua curiosidade foi-lhe fatal. Ela não tinha medo de nada, como a senhorita. Já sabe como foi punida! E diga-me se se acha bem aqui — continuou Otávia, evidentemente desejosa de mudar de conversa.


— Muito bem. O ar é delicioso e parece que nos dá vida.


Hermione aproximou-se de uma janela e repousou por alguns instantes o olhar no fundo verde, formado pelas belas árvores do parque. Mais perto, era o espaço descoberto entrevisto na véspera. Cobria-o uma erva espessa. Na colunata de pedra escura e no tanque de bordas meio esboroadas que ocupava o centro, o musgo formava largas manchas esverdeadas. O lugar estava evidentemente abandonado há muito tempo.


— A senhora condessa pensou primeiramente em instalá-los no primeiro andar — disse Otávia aproximando-se da jovem — De lá poderiam ter uma soberba vista, mas depois julgou que o andar térreo seria mais cômodo, por causa de seu irmão. Aliás, lá em cima os quartos são inabitados e poderão subir quando quiserem ver a floresta.


Otávia saiu e Hermione voltou aos seus arranjos. A jovem recuperara a alegria. O sol entrava em cheio nos quartos que davam para o jardim e com ele penetrava o ar puro, vivificador, perfumado da floresta. Os raios de ouro dançavam nas grandes peças severas, iluminando os velhos móveis de formas rígidas, e faziam faiscar o lustre antigo suspenso no quarto do professor. Alexis parecia recuperar um pouco de vida; seus olhos claros se abriam, maiores, como para melhor absorver a luz benfeitora.


— É delicioso este velho castelo cheio de lendas! — exclamou ele encantado — Estas paredes seculares devem ter visto coisas estranhas e terríveis. Precisamos pedir a Otávia que nos conte tudo isso, não é, Mione?


— Não desejo outra coisa! Gosto muito dessas lendas de outrora! — respondeu alegremente a irmã.


De fato, Hermione reunia às qualidades práticas, herança de sua mãe, os gostos intelectuais do pai. O passado, em particular, a atraía como ao pai, como a Alexis, e a dócil Hermione não escondia o prazer que experimentava ao ouvir qualquer história antiga, fantástica e terrificante, principalmente quando contada no local mesmo em que se verificara e quando havia probabilidade de ter sido real. Estava, pois, encantada por descobrir, logo nos primeiros momentos, que Runsdorf possuía seus fantasmas próprios e, além disso, o misterioso lago negro que conservava zelosamente as suas vítimas.


Otávia voltou na hora combinada. Por intermináveis corredores, o professor e a filha, seguindo a velha criada, chegaram ao corpo principal da casa, que compreendia, no andar térreo, os apartamentos de recepção e no primeiro andar os da família.


Otávia introduziu os novos hóspedes de Runsdorf em um salão decorado de carvalho esculpido e antigas tapeçarias. Uma senhora de alta estatura, vestida de preto, com simplicidade até, estava em pé junto à janela. Voltando-se, inclinou a cabeça em resposta ao cumprimento dos recém-chegados.


— Sejam bem vindos a Runsdorf. Fizeram boa viagem? — perguntou ela num tom cortês e frio.


Depois que o professor respondeu com algumas palavras em que exprimiu o seu contentamento pela privilegiada localização de Runsdorf, ela disse, designando umas cadeiras aos hóspedes:


— Sim, estarão bem aqui. A vida é muito calma e terão completa independência em seu apartamento. A neta de Otávia encarregar-se-á do seu serviço.


— Oh! Não tenho necessidade de ninguém para me auxiliar — interrompeu Hermione — Em Viena eu me incumbia sozinha da casa.


Ela percebeu um reflexo de satisfação no olhar da condessa.


— Se preferir assim... Por favor, tenha toda a liberdade de escolher, senhorita. Rosa levar-lhe-á, então, somente as refeições e fará todos os servicinhos que pedir. Está tudo combinado sobre este assunto, não é? Agora, vejamos a questão das lições.


A sua voz era clara e um pouco grave, lembrando à Hermione a voz do Conde Draco, que ouvira na véspera. Esse, aliás, um dos pontos, que ali notara, de semelhança entre a mãe e o filho. Havia outro, entretanto, que Hermione só percebeu minutos depois. Nesse rosto envelhecido, cansado, que de certo possuíra uma beleza suave e grande frescor, na atitude e no acolhimento da condessa, observou de novo aquela distinção patrícia, a altivez e condescendência soberana do Conde Malfoy.


— Terão três alunos — disse a condessa, dirigindo-se ao mesmo tempo ao professor e à Hermione — Meu filho Áquila[5] tem treze anos, Maia[6] e Ariadne[7], onze e doze. Repartirão as lições como quiserem, deixo-lhes inteira liberdade sobre este ponto. Não pretendo fazer de meus filhos uns sábios, pois isso não está nas tradições da família. Que se instruam no que é necessário à sua classe, eis o que é preciso para os Malfoy.


Falando assim, a sua voz assumira um tom de orgulho e os olhos azuis, um tanto velados, se animaram durante alguns segundos.


— Vou mandar chamá-los para que os conheçam desde já. Começarão as lições quando estiverem completamente instalados.


Não se poderia contestar uma certa urbanidade e intenções benévolas. Era, sem dúvida, o orgulho de raça que erguia entre os hóspedes e ela, a barreira de gelo que Hermione sentira desde o princípio, e desde logo, também, nos seus futuros discípulos. Áquila, um rapazinho louro e franzino; Maia, pálida lourinha cujos traços finos recordavam os do irmão mais velho; Ariadne, loura, gordinha, de fisionomia calma e sonolenta – todos, sob a polidez de crianças bem-educadas, deixavam perceber a mesma altivez, parecendo dizer aos professores: “Nós estamos bem acima dos senhores; devem sentir-se muito honrados por terem sido escolhidos para dirigir a nossa instrução”.


— Teremos com eles relações estritamente necessárias, eis tudo — disse Hermione quando comunicava ao pai as suas impressões, ao retomarem o corredor por onde, ela supunha, os havia conduzido Otávia — A atitude de todos eles nos fizeram compreender, claramente, que não deve ser de outro modo.


— Assim também ficaremos mais livres. Mas não nos enganamos no caminho, minha filha?


— Estou com receio...


Chegaram ao fim do corredor, diante da porta aberta de um grande e luxuoso aposento, em cujo centro se via uma mesa ainda com restos de vitualhas[8]: pedaços de carne, postas de peixe rodeadas de geléia, bolos cortados, garrafas de champanha vazias.


Diante da mesa, de costas voltadas para a porta, estava de pé uma jovem de média estatura, com um vestido marrom, em parte escondido pelo avental de quadrados azuis. A cabeleira de tom louro-claro estava enrolada em trancinhas sobre a nuca. A moça voltou-se rapidamente, mostrando então seu rosto muito jovem, de traços bastante irregulares, mas de pele delicada. Os olhos cinza-prateados, profundos e expressivos, fixaram-se nos estranhos com surpresa e contrariedade.


O professor adiantou-se alguns passos e se inclinou.


— Peço-lhe perdão, mas nos perdemos nesses corredores e não sabemos como encontrar o nosso apartamento.


O olha da jovem suavizou-se.


— Isso não me espanta, vou fazer com que os reconduzam ao seu caminho. Rosa!


De um aposento vizinho saiu a camareira, sem dúvida ocupada em alguma fatigante limpeza, pois que se viam bagas de suor em sua testa.


— Rosa, vá indicar ao senhor professor o caminho do seu apartamento.


Depois dessa ordem, a loura desconhecida respondeu com uma graciosa inclinação de cabeça ao agradecimento de Adrian Granger e de Hermione, que se afastaram seguindo a jovem camareira.


— Essa mocinha é sem dúvida a filha mais velha da condessa, com a qual, aliás, se parece muito — disse o professor a Hermione, quando ficaram sós, assim que Rosa os deixou, após haver-lhes indicado a boa direção.


— Provavelmente. Sua fisionomia é agradável, a despeito de certo orgulho que parece existir nela também. Mas, segundo as aparências, não teremos nenhuma relação com essa jovem aristocrata.


Durante a tarde do mesmo dia, Argus veio bater à porta do apartamento de Adrian Granger. Trazia uma folha de papel para colar na parte quebrada da vidraça.


— Vão substituí-la mais tarde, porque aqui não há operários especializados nesse serviço — explicou ele, dirigindo-se para a porta cujo ferrolho Hermione acabava de puxar.


Enquanto ele dava conta de sua tarefa, com certa pressa, o professor fitava longamente a estranha superfície do lago onde o sol punha reflexos esverdeados.


— Do que provém a coloração dessa água? — perguntou.


Argus voltou para ele o rosto, que apresentava nesse momento – seria o reflexo do lago sombrio? – uma cor acinzentada.


— Parece que é do fundo.


O professor ficou um instante pensativo, parecendo meditar sobre a lacônica resposta. Depois, continuou:


— Se eu estivesse no lugar dos senhores de Runsdorf, tentaria desviar o lago.


O velho estremeceu e disse bruscamente, sem interromper o trabalho:


— Para que? O que adiantaria?


— Ora, para conhecer a sua conformação. Além disso, poderia encontrar os corpos dos que desapareceram ali, segundo contam, e enterrá-los convenientemente.


— Eles estão bem mais tranqüilos nesse lugar! — resmungou Argus enfiando o pincel na cola com certa violência.


Hermione, que entrara pouco depois do pai, chamou-o para lhe mostrar os numerosos retratos que enfeitavam a galeria. Alguns tinham saído dos pincéis dos maiores mestres. Albert Dürer, em particular, havia assinado três.


O atual senhor de Runsdorf herdara o tipo dos nobres antepassados. Em todos se notavam traços semelhantes: o rosto alongado, a pele de cor extremamente branca, a cabeleira clara, a atitude altiva e quase desdenhosa, que caracterizavam o jovem descendente. Só os olhos variavam mais acentuadamente: uns pequenos, outros grandes, claros ou escuros, sorridentes ou severos, mas sempre duros, imperiosos, denunciadores de pouca benevolência e bondade.


Um desses condes Malfoy apresentava, entretanto, fisionomia bem simpática. Aparentava uns quarenta anos e estava vestido à moda dos princípios do século XIX. De belos olhos castanhos, muito doces e penetrantes, parecia observar com agrado esses plebeus que os seus vizinhos tinham o ar de considerar com desdém do alto de sua pobreza.


— Que bela criatura! — disse Hermione, parando em frente do retrato de uma jovem, cujos maravilhosos cabelos claros eram encimados por uma coroa de princesa. O vestido era de damasco cor de púrpura constelado de pedras preciosas. Os olhos claros, na cabeça orgulhosa, pareciam fitar Hermione com pupilas duras.


— É a Princesa-regente de Darnstadt, nascida Condessa Andromeda Black Malfoy — disse Argus.


Tinha acabado o serviço e aproximara-se do professor e sua filha.


— Há numerosas alianças de casas soberanas com a família Malfoy. A irmã da bela Princesa Andromeda chamava-se Bellatrix e foi pedida em casamento por um Duque de Lestrange, mas recusou porque parece que amava Tom Marvolo Riddle, um fidalgote que lhe salvara a vida durante uma caçada. Como ela persistisse em sua recusa, o conde, seu pai, mandou prendê-la ali.


Argus apontou para o apartamento que ficava defronte à galeria, no outro lado do lago.


— E jurou que só sairia da prisão, noiva do Duque ou morta.


— E o que ela escolheu? — perguntou o professor.


— A prisão perpétua. Foi definhando lentamente e um dia acharam-na morta. Os Malfoy sempre consideraram a glória de seu nome acima de tudo!


Uma orgulhosa satisfação vibrava no tom do velho Argus Filch; sua cabeça se erguera. Um clarão perpassou-lhe pelo olhar agudo. Parecia que essa glória resplandecia sobre ele e que o penetrava até o fundo da alma.


— Pobre moça! — murmurou Hermione — O pai então não tinha nenhuma amizade por ela?


— Apenas obedecia às exigências de sua classe — respondeu Argus num tom meio áspero — Um conde Malfoy não pode agir como qualquer burguês. Isso deveria servir de exemplo para as futuras gerações de sua raça, para as condessas de Malfoy que pensassem em imitar sua filha Bellatrix e olhar para homens de condições inferiores. Em questão de casamento, o coração nunca é consultado. Preponderam, e assim deve ser, apenas as conveniências de fortuna e principalmente as de nascimento.


— Pobres mulheres! — disse Hermione, tomando o braço do pai para voltarem ao apartamento.


Ao passar pela frente do retrato do senhor de semblante simpático, ela parou e perguntou:


— E quem é esse?


O pincel escapou das mãos de Argus. O velho inclinou-se para apanhá-lo enquanto respondia laconicamente:


— O Conde Cepheus[9].


Na sala, quando o criado já ia sair, o professor perguntou:


— Nunsthel é muito longe daqui?


— É preciso meia hora mais ou menos, se se andar bem.


— O caminho é mau?


— Não, uma excelente estrada florestal, ladeira acima. Nunsthel está situado a meio caminho da montanha.


Argus parecia com pressa de se afastar. O professor, percebendo-o renunciou aos poucos pedidos de informações que pretendia fazer-lhe conjecturando que Otávia seria menos lacônica que esse velho rabugento e visivelmente pouco acolhedor dos novos hóspedes do castelo.


A camareira, com efeito, deu todas as indicações necessárias e se estendeu longamente sobre as qualidades físicas e morais do administrador Arthur Weasley.


— A despeito dos seus cinqüenta anos, ele é ainda o mais belo homem de toda a região. E que inteligência! O Arquiduque Dumbledore o tem em alta estima. Além disso, é de uma bondade, de uma caridade, das quais os seus subordinados e os pobres daqui poderão dar testemunho.


— E seus filhos?


— Seu filho Ronald se assemelha muito fisicamente, dizem também que é tão bom quanto o pai. Sua filha mais velha saiu do colégio no ano passado; tem ainda uma menina de uns doze anos. Uma bela família, muito unida, segundo consta, e que vive com grande simplicidade.


 




[1] Persignar-se: Fazer com o polegar três sinais-da-cruz: o primeiro na testa; o segundo na boca, e o terceiro no peito, dizendo respectivamente: Pelo sinal da Santa Cruz, livrai-nos Deus, Nosso Senhor, dos nossos inimigos.


[2] Lyra é uma constelação Boreal localizada no hemisfério celestial norte e é vizinha de Cygnus, Draco, Hercules e Vulpecula. Partindo do pressuposto de que tanto a família Black como a Malfoy tem os nomes baseados em estrelas e mitologia, decidi manter o padrão.


[3] Ceres na mitologia romana, seu equivalente na grega é a Deméter, deusa das colheitas.


[4] Marius Black: Pertence a 4ª geração dos Black. Filho de Cygnus Black com Violetta Bulstrode Black; tem como irmãos Pollux Black (avô de Narcissa Malfoy), Cassiopeia Black e Dorea Black Potter.


[5] Áquila: ou Águia como também é conhecida, é uma constelação do Equador Celeste.


[6] Maia: na mitologia grega, é a mãe de Hermes e uma das sete Plêiades, filhas de Atlas e Pleione, que cansadas de serem perseguidas por Órion, pedem a Zeus para se transformarem em constelação.


[7] Ariadne: na mitologia grega, ela é a filha de Minos, rei de Creta. Foi ela quem ajudou Teseu a sair do Labirinto do Minotauro e depois  de abandonada em Naxos por Teseu, se casa com Dionísio.


[8] Vitualhas: Artigos destinados à alimentação; víveres, mantimentos.


[9] Cepheus: é uma constelação Circumpolar Norte, localizada no hemisfério celestial norte e é vizinha da Draco e Cassiopeia.

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