Lavalle
- Então tá – Rony tomou o livreto das mãos de Hermione – onde esse Especialista vive? – Ele observou a lista:
“Lago Oulu 65°N, 27°O, Esp. Pr. Lavalle
Estreito de Bósforo, 41°N, 29°O, Esp.Ps. Derose
Ilha Graciosa, 40°N, 28°L, Esp.Ft. Brandon”
- Acredito que deva ser o Lavalle – ele consultou a lista – pela abreviatura... Alguém sabe onde fica o Lago Oulu?
- Na Finlândia – respondeu Hermione, que estava consultando um Mapa Mundi – é pra lá que temos que ir.
O professor parecia muito desgostoso com a idéia.
- Vamos então – Harry foi seguindo para a porta, enquanto o professor já estava na mesa, estudando os seus papéis – não vai nos desejar sorte? – ele perguntou.
- Ora, é claro – ele levantou e os levou até o jardim – boa sorte – e abraçou cada um deles.
- Professor, por que essas flores conseguem crescer aqui no Alasca? – Hermione olhou para o jardim em volta.
- Os feitiços de proteção são tão fortes que às vezes impedem até o frio de entrar – ele respondeu – mas é possível desaparatar aqui, somente se a pessoa souber a localização exata. Fiz isso por que Adalberto costumava sair com freqüência e esqueci de refazer os feitiços. Sorte de vocês.
- É – concordou Harry, desejando que os Especialistas não usassem feitiços de proteção.
CAPÍTULO 5 – LAVALLE
Desaparataram numa superfície cheia de pedras polidas pela água corrente. Rony se desequilibrou e caiu. Naquela região os únicos sons que se ouviam eram o do vento batendo nos pinheiros e o da superfície da água.
- Parece o quebra-cabeça na parede do consultório dos meus pais – disse Hermione.
Não havia nenhum sinal de atividade humana por ali, exceto por um charmoso chalé com grandes janelas de vidro no topo de uma encosta coberta de grama. Era a única opção.
Eles subiram a encosta com alguma dificuldade e esperaram alguns segundos para recuperar o fôlego antes de tocar a campainha.
- Deixa comigo – Harry apertou o botão.
Quase que instantaneamente a porta se abriu.
Uma moça que aparentava ter não mais que dezessete anos atendeu:
- Olá – ela sorriu, seus cabelos eram negros e lisos. As maçãs do rosto acentuadas e suaves traços orientais lhe completavam a fisionomia. Será que eles haviam errado de endereço?
- Desculpe, acho que erramos de endereço – Hermione já ia dando meia volta.
- Não, vocês não erraram – ela sorriu. É claro que não, ninguém morava ali perto, se tivessem errado de endereço, seria por muitos quilômetros – entrem, eu me chamo Lavalle.
Aquilo era demais para a cabeça de Harry. Ele havia imaginado o Especialista como um senhor alguns anos mais velho que Frederich – pelo menos aparentemente – carrancudo e mal-humorado. Aquela jovem era a mais perfeita antítese de tudo isso.
- Devo presumir que vocês estão em apuros – ela comentou, enquanto os três se acomodavam na mesa de encaixar. Harry notou a lareira acesa.
- Pensei que os professores não sentissem frio – ele apontou para o fogo.
- Harry, você já tentou segurar um pouco de serragem dentro de um balde com água sem que ele molhe?
Harry não prestou atenção na pergunta, estava chocado com o fato de ela saber o seu nome. Ela sabia se seus órgãos estavam funcionando bem, se sentia frio, se estava com medo, se o que havia comido no café da manhã estava sendo digerido direito. Tudo o que estava acontecendo naquele momento.
- Não – ele respondeu, após alguns minutos de raciocínio.
- Você sabe que por mais que segure com bastante força, um pouco de serragem ainda vai molhar. Pois bem, o mesmo acontece comigo: eu sinto frio, calor, mas não fico doente nem sinto fome.
- Interessante – disse Hermione.
- Então, eu presumo que vieram aqui buscar a minha ajuda?
- Sim – respondeu Rony.
- Eu sei que vocês já leram aquele livro, que entendem dos feitiços, que conhecem os diagramas, e também sei que estão aqui por que nada disso adianta – ela levantou e foi até a janela – está tudo aí, nas suas cabeças. São seus pensamentos agora.
Os três se entreolharam.
- Presumo que vieram aqui buscar a minha ajuda? – ela repetiu, voltando-se para eles.
- Sim – confirmou Harry.
- Então finalmente eu terei alguma utilidade – ela sentou-se numa cadeira e suspirou, melancólica.
- Desculpe? – interveio Hermione.
- É que depois de um tempo você vê que nada disso vai adiantar – ela levantou e começou a andar em volta da mesa – que por mais que você gaste mais mil anos estudando nunca vai poder voltar à sua vida normal – ela olhou para Harry – a incerteza é mesmo o pior de todos os sentimentos – ela olhou para o chão – mas existem certas coisas que você nunca vai conseguir entender.
Harry achou melhor não comentar nada a respeito daquilo.
- Então você está disposta a nos ajudar? – perguntou Rony, que como os outros estranhava a facilidade daquilo tudo.
- É claro – ela sorriu – o que mais eu poderia fazer? Uma das coisas que você aprende quando está na minha situação é que cada segundo conta, cada ação sua pode ter uma conseqüência enorme para outras pessoas. E se eu puder resolver pelo menos o problema de outra pessoa, já vou me sentir um pouco melhor.
- Obrigado – disse Harry, que não pôde deixar de sentir um pouco de pena da jovem.
- Não sinta pena de mim – ela retrucou – e eu não sou jovem! Tenho 490 anos, se contarmos os que eu aparento ter.
- E minha prima preocupada com sua crise de meia-idade! – exclamou Hermione, no que todos caíram no riso.
- Eu estou estranhando uma coisa – Rony olhou para o cômodo, amplo e organizado, só com um tapete e uma mesa. Daria pra fazer um baile ali, mas estava essencialmente vazio – cadê suas coisas?
- Ah! Vocês vão gostar de ver isso! Pela curiosidade em que estão! – ela então caminhou apressadamente para a escada, erguendo seu imenso vestido de ares imperiais escada acima, com os três recém-chegados em seu encalço.
Chegando acima, Harry teve uma surpresa: o cômodo baixo guardava uma imensa figura retangular de medidas excepcionais, que ocupava quase que todo o ambiente. Quando Lavalle abriu as cortinas de veludo que cobriam o teto de vidro, a luz entrou com tanta intensidade que todos tiveram que cobrir os olhos. Só se ouvia a garoa batendo no vidro e metros de tecido sendo arrastado.
Quando todos abriram os olhos, ficaram vários minutos em silêncio.
Era lindo.
Era o quadro mais belo que Harry já havia visto.
Retratava com exatidão a França do século XVI, as pessoas estavam acordando de um sono de dias. Lavalle deveria ter parado de pintar naquela semana. E ainda havia muita tela sobrando.
Só havia um pensamento na cabeça de Harry.
É lindo.
- Obrigada – Lavalle respondeu – essa era a minha época. Eu sempre gostei de pintar, então é essa a forma que eu encontrei de pensar. Como você pode ver, tem muita tela sobrando.
- É verdade – Hermione chegou mais perto da tela, um grupo de moças se amontoou em um canto, olhando para ela – qual delas é você?
- Eu sou a noiva – Lavalle respondeu, e Harry entendeu imediatamente o quadro. Era lindo sim, mas por ter o estilo manchado, parecido com Van Gogh, era difícil de enxergar os detalhes.
Aquilo era um casamento, num jardim, numa tarde de verão. Mas por que ela pintaria aquilo?
- Essa seria a minha vida normal – ela respondeu. Era desconfortável o fato de não precisar fazer perguntas.
Harry não quis saber o que ela havia feito para mexer com o tempo, e ela não respondeu.
- Então, vamos começar – ela separou três telas menores e colocou-as lado a lado em três cavaletes. Preparou suas tintas e ia dar a primeira pincelada quando Harry a impediu.
- Não vai dar certo – ele avisou, e ela o encarou, como quem acaba de entender alguma coisa.
- Não foi nossa vontade viajar no tempo – completou Hermione.
- Por isso não há o que possa ser feito – disse Rony.
- Bem que eu achei isso estranho! – ela pousou o pincel – achei esse pensamento de vocês três muito estranho e decidi ignorá-lo. Eu já sei o que pode ser feito então – ela tornou a cobrir a tela maior, enquanto as damas de honra jogavam beijinhos para Harry – fiquem tranqüilos.
- Você vai nos ajudar mesmo assim? – perguntou Rony.
- É claro – ela respondeu, simplesmente, já pondo o cachecol e pronta para partir para um lugar que ela já sabia onde era.
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