Casa de Adoção Saint Mary
A culpa novamente se recaiu sobre Alice. Sempre se recaía sobre ela. Toda vez que alguma coisa estranha acontecia no orfanato, era culpa de Alice. Dessa vez, dona Nair, uma senhora de meia idade, cabelos oleosos presos num coque e aproximadamente um metro e meio de altura se irritara com a quatidade de sapos que pulavam no corredor e invadiam a sala de refeição. O caos estava presente ali. Várias crianças gritavam, subiam em cima das cadeiras e mesas e procuravam se esconder enquanto cerca de duzentos sapos muito verdes e semelhantes saltavam e coaxavam por todo o lado.
- CHEEEEEEGA! - gritou Nair. - AGORA JÁ CHEEEEGA. VOCÊ PASSOU DOS LIMITES, ALICE. - dizia a velha enquanto pegava Alice pelos cabelos e a levava até a sala da diretora.
- O que foi dessa vez, Nair? - perguntou a diretora com sua típica cara de quem acaba de chupar um limão muito azedo. - Porquê de tanta barulheira lá em baixo?
- Foi esta menina, diretora. - Nair apontava um dedo gorducho para a pequena Alice.
- Mas eu não fiz nada, diretora! - exlamou Alice.
- Cale essa sua boca imunda sua pirralha nojenta! Diretora, ela espalhou uma centena de sapos lá embaixo. Está uma zona completa. Os estudantes estão apavorados e os monitores também. Ninguém sabe como expulsá-los e...
- Mas eu não fiz nada. - Alice tornou a falar.
- Silêncio, Alice. - pediu a diretora.
- Mas...
- SILÊNCIO! Prossiga, Nair.
- Ela começou com aquela história de novo de bruxaria. Estava colocando medo nos menores. Eu e os outros monitores ignoramos, mas quando nos demos conta, a sala estava cheia de sapos. Sapos diretoras. Eles estão coaxando... Tão nojentos. E ficam pulando por toda a parte... - Nair fazia cara de nojo e Alice tratou de disfarçar rapidamente seu riso com um acesso de tosse.
- O que você tem a dizer a respeito, Alice?
- Eu? Eu não fiz nada, para começar e...
- Já chega, diretora. Você precisa transferí-la!
No dia seguinte, Alice era transferida para a Casa de Adoção Saint Mary. Sentada sobre um balde virado de boca para baixo em um apertado armário de vassouras, ela escrevia em seu diário, um livro com capa de couro preta e muito desgastada, com a fraca luz de uma vela.
Querido diário,
acho que não sou mesmo normal. As outras crianças sempre me apontam e sussurram coisas a meu respeito entre si. Na verdade elas tem medo de mim e dizem que eu sou anormal, uma aberração. Não acho que eu seja de fato uma aberração. Apenas não encontrei meu lugar no mundo.
Ontem vários sapos invadiram o meu antigo orfanato, e como sempre colocaram a culpa em mim, mas não fui eu quem os convocou. O fato é que eu estou aqui, nesse novo orfanato à espera de alguém que me adote. Eu sei que isso é meio difícil, pois os adultos sempre preferem os bebês e eu já tenho nove anos e meio.
Tenho que ir antes que mais alguma coisa estranha aconteça e eles coloquem a culpa em mim.
P.s: As corujas não param de aparecer. E elas nem são nativas daqui. O que será que isso significa?
Até outra hora,
Alice.
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