Herdeiro dos Três
O dia amanhecera com uma espessa neblina sobre a cidade. Não se podia enxergar nada além de um palmo na frente do nariz. Todos os principais serviços do país estavam suspensos, funcionários não conseguiam chegar às repartições públicas e hospitais, e nem o povo conseguia se deslocar, e muitos não faziam por estarem com medo de saírem de casa. Casos estranhos eram noticiados a todo instante pelas emissoras de televisão. Mortes em massa, desaparecimentos de diversas pessoas e coisas que nunca se tinha ouvido falar antes. O governo tentava de todas as formas de acalmar a população, mas sua tarefa estava sendo em vão, nada do que falam ou fazem parece retirar das faces da população o medo e pavor.
Com toda essa tensão espalhada pelo ar e ninguém nas ruas, somente um gato percebeu uma pessoas surgir no ar sem fazer qualquer barulho, em uma pequena vila no sul da Inglaterra. O estranho percorreu rapidamente as ruas de pedra em direção a um pequeno beco. As casas rústicas estavam todas fechadas e nenhuma chaminé soltava fumaça naquele dia. Cruzando todo o caminho sem olhar para os lados, o vulto se dirigiu até o fim do imundo beco.
Retirando uma varinha de madeira da veste preta. Toca levemente um tijolo que tinha a marca de uma serpente nele. A parede começa a se movimentar e em segundos surge um corredor todo iluminado por archotes que emitiam uma luz arroxeada. Avançando com precaução e com todo cuidado para não pisar em nada e perturbar o silêncio de morte que reinava dentro do lugar, ele chega até uma porta de pedra encravada em uma rocha.
Antes mesmo que pudesse tocá-la, ela se abre e revela uma sala espaçosa com mais três portas no fundo dela. Uma cobra estava rastejando em volta de uma poltrona e nem mesmo levanta a cabeça para encarar o intruso. Uma mão toda branca surge no braço da poltrona e o ser vestido de preto faz uma profunda reverência e diz.
- Suas ordens foram cumpridas, milord. – com uma voz grave e forte. – Tudo é verdade. Ele confirmou tudo e disse que o tempo se novamente se aproxima.
- Muito bem. Agora só resta esperar. Eles em breve se manifestarão. - e depois de um profundo e demorado silêncio. – Ordene um ataque a Calais, na França.
- Sim, milord. – respondeu a figura.
Na rua dos Alfineiros, um vulto desafiava todas os dias a neblina que cobria tudo. Um garoto com quase dezessete anos, com cabelos pretos e olhos verdes, circulava por toda região. Ninguém gostava dele por ali, a não ser uma velha senhora que morava próxima a sua casa. Que na verdade, era a casa de seus tios, ele passava apenas as férias de verão por lá. Todos o achavam um deliquente, uma espécie de rebelde. Mas todos os moradores não se aproximavam dele, ainda mais que ele tinha voltado mais estranho ainda. Suas feições eram carregadas de profunda tristeza e dor. Ele não importava para nada do que dissessem ou fizessem, ficava o dia todo andando pelos largos e parques.
Esse garoto era Harry Potter, o Escolhido, o Menino-que-sobreviveu, aquele que tem o poder para derrotar Lord Voldemort. Famoso em todo o mundo bruxo. E a dor que sentia era pela perda de seu grande mentor e amigo, Dumbledore, que tinha sido assassinado no fim do ano letivo por Severo Snape, traidor da Ordem da Fênix e, agora, Comensal da Morte. Todo o peso da responsabilidade de salvar o mundo mágico caia em cima dele, não tinha mais com quem dividir esse fardo. Agora era ele e mais ninguém que teria que enfrentar o Cara de Cobra.
Depois de andar por toda a região, Harry tinha voltado para seu quarto na casa de seus tios. Eles evitavam conversar, aproximar, ficar no mesmo aposento, comer junto, ou seja, qualquer coisa perto dele. E ele agradecia profundamente por isso, não suportava os tios e seu primo Duda. Passava todo o tempo no quarto, olhando para o vazio com um olhar viajante, revendo tudo o que havia acontecido, onde ele tinha falhado.
Com esses pensamentos vagantes nem viu que a noite chegara e estava se alongando. Em breve o badalar do relógio indicaria que era outro dia. Dia 31 de julho. Dia de seu aniversário, onde completaria dezessete anos e estaria livre daquela casa para sempre. Harry estava esperando ansiosamente por esses dias, mas o sofrimento das perdas havia o feito esquecer essa data tão aguardada.
23:59.
A nuvem que cobria a lua se afasta por um instante e um pequeno feixe de luz ilumina o rosto do menino. Uma estranha luz começa a surgir dentro do quarto de Harry, em frente à porta. Começa a se expandir e tomar a forma de um animal, surgem quatro patas gigantescas e uma cabeça toda coberta por uma juba dourada. Um leão todo dourado com detalhes em vermelho aparece no chão e começa rondar Harry.
Nesse momento Harry acorda de seu torpor e se assusta com aquele imenso animal todo de luz em seu quarto. Após encarar por alguns instantes o ser de luz, ele lentamente tenta pegar sua varinha no bolso de trás da calça. O leão levanta as patas dianteira mostrando suas garras. O menino para a mão perto da varinha e não se mexe. Após segundos imóvel, continua o movimento em busca de sua arma de defesa.
Em algum lugar perto dali o sino de uma Igreja badala marcando meia-noite. O leão com um poderoso rugido dispara para cima de Harry com uma velocidade altíssima, sem ter tempo de pensar em algo ele apenas protege o olho. O animal salta em direção de dele e penetra totalmente em seu peito, desaparecendo sem deixar nenhum rastro. Depois de ser jogado no chão, o menino-que-sobreviveu levanta com uma certa dificuldade. Pela última vez o sino marca meia-noite.
O corpo de Harry começa a tremer. Primeiramente suas mãos e logo em seguida o menino dispara a vibrar loucamente. Os olhos assumiram uma cor esbranquiçada e iluminada, os cabelos se arrepiam e do corpo desprende uma aura vermelha que foi ficando cada vez mais forte. A mente de Harry estava viajando por milhões de caminhos dispersos. Milhares de cores e formas passavam rapidamente a sua volta. Até que uma luz apareceu e foi se tornando cada vez mais intensa. Ao fundo um som de tambores começou, a música era lenta e compassada. O ritmo começou a se acelerar e a luz girava mudando de tonalidades a cada instante.
De repente um canto bem baixinho começou. A voz de um homem com uma afinação perfeita cantava em uma língua desconhecida. Parou por um instante e quando voltou estava acompanhado de uma mulher que cantava em uma sintonia magistral com o seu parceiro. Várias figuras apareceram ao redor da mente de Harry, letras estranhas e números dispersos começaram a rodar ao seu redor.
Os tambores foram parando e só ficaram as vozes que continuavam a repetir o mesmo refrão. Quando terminaram, reinou o silêncio. Um silêncio profundo que dominava tudo. Nada se movia, nem uma luz brilhava ou figura rodava. Uma voz começou a declamar:
- Harry James Potter, tu que acabas de se tornar um bruxo adulto. Responsável pelo seu destino e por suas ações. Agora lhe é revelado sua ascendência. Tu és o último herdeiro de três dos quatro fundadores da Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts. Descendente direto de Godric Gryffindor e Rowena Revenclaw.
“Há muito foi predito que as famílias dos três fundadores guerreariam contra o clã de Salazar Slytherin, até que apenas um herdeiro de cada lado sobrevivesse e entre os dois se resolveria essa antiga guerra. Sabendo disso, os Rowena lança em suas últimas forças lança uma maldição sobre todos os membros da família até que o último herdeiro surgisse. Uma maldição que não deixava ninguém receber todo o poder do clã, há não ser o escolhido para por fim na guerra.
“E além disso, que cada ramo da prole que fosse sendo extinta deixaria para ele todos os bens que possuísse. Hoje você recebe por direito todo esse poder e fortuna que têm. Você é o último, o escolhido!”
As vozes voltaram agora a cantar só que em outra língua ainda desconhecida. Uma lira e uma flauta as acompanhavam. Tudo novamente começou a se mover em uma sincronia perfeita. Cada figura tocava as mãos, os pés, o peito e a cabeça de Harry. Depois desaparecia no ar. Tudo se silenciou da mesma forma que havia começado. E a voz novamente disse:
- Receba a coragem, a força, a lealdade, a astúcia e a bravura de seus antepassados. Honre com sua vida todas essas virtudes e em nenhum momento vire as costas aos que lhe são caros, não deixe em situação de ir em apoio aos seus amigos e nunca de esqueça que está no que fazemos com o que temos que nos define.
E começou o cântico novamente. Um oboé e um instrumento de sopro desconhecido davam o ritmo à cerimônia. As letras tocavam a boca, os olhos, os ouvidos e a fronte de Harry. E assim como as figuras desapareciam no ar. Quando o último caractere fez esse movimento tudo se silenciou.
- O conhecimento e a sabedoria daqueles que o precedeu agora pertence a ti. Utilize-a sempre para o bem e em nenhum momento desvie-se. Toda a sabedoria que ganhou depende de como usa, sua maior qualidade pode se tornar o seu maior defeito.
A voz se calou. Uma única voz cantava agora, algo que tocava o recanto mais profundo da alma. Os números que estavam em volta do corpo foram se juntando e formaram uma esfera que brilhava suavemente. Ela pairou sobre o peito de Harry e ficou assim por um tempo, depois de uma pequena elevação caiu com um estrondo ensurdecedor no peito de Harry e desapareceu.
- Receba todo o poder e a magia dos que morreram para que você vivesse. Combata as trevas com toda a sua vida e viva para a luz. Não deixe que a noite domine o dia. Nem que as trevas se sobreponham a luz. Tu és a esperança de muitos, mas só sua humildade e coragem farão se tornar vencedor de suas provas.
“Tudo isso que você acabou de receber só será seu a partir de seu esforço. Você quando acordar não será o maior dos bruxos, mas terá uma grande capacidade de aprender e expandir o seu conhecimento. Não deixe que esse poder morra com você sem utilizá-lo para o bem da humanidade.”
Tudo começou a se dissolver no ar. Iam aos poucos virando fumaça e desapareciam. A cabeça de Harry girava e escutava de longe algumas vozes. Parecia que as conhecia, mas não conseguia identificar de onde eram. Os ouvidos zumbiam e os olhos estavam cobertos por uma luz que o deixava cego.
Caos. Era isso que Harry via quando acordou novamente. Feitiços, maldições, fogo e gritos. Sua cabeça estava girando ainda, não conseguia focalizar nada. Apenas os vultos dispersos e vozes distantes. Com um pouco de força de vontade levantou-se do chão do quarto e respirou um ar frio e com cheiro podre. Sua mente rapidamente despertou por completo. Dementadores. Somente eles conseguiam deixar todo o local a sua volta daquela forma, sem felicidade nenhuma.
Caminhou até a janela e viu uma cena que o fez ficar pálido por alguns instantes. O jardim da casa de seus tios era um palco de guerra, comensais e membros da Ordem da Fênix duelavam por cada palmo do espaço. Dementadores aterrorizavam todos os que defendiam a casa e espalhava o terror em todos os trouxas da rua. Vários corpos caídos no chão, bruxos mortos e outros tantos feridos faziam com que o cenário ficasse cada vez mais tenebroso.
Harry abriu a janela do quarto e com um forte grito:
- Expecto Patronum. – conjurou um cervo para acabar com os dementadores.
O que aconteceu em seguida deixou todos estáticos. Nem mesmo o menino sabia o que tinha feito. Um cervo vermelho e dourado tomou conta do céu e com um galope furioso expulsou os dementadores de toda a volta, alguns até foram exterminados deixando apenas um manto negro no chão. Lupin que estava mais próximo da casa foi o primeiro a sair do transe causado pelo feitiço de Harry e olhando para cima viu o menino.
- O Harry está vivo! – e outros tantos foram olhando para cima e a esperança surgia novamente em seus rostos. E como se instigasse os parceiros ele gritou. – Vamos acabar com os comensais!
E a batalha se tornou ainda mais feroz, só que agora a Ordem parecia estar ganhando. Sem os dementadores para atrapalhar e deixarem eles com medo, os membros lutavam com mais empenho. Logo vários comensais já estavam no chão e outros tantos não conseguiam segurar o ataque da Ordem. Harry participava da batalha em cima da casa, contado com a proteção da janela e das paredes ele batalhava sem medo de ser atingido. Conseguiu derrubar vários comensais e já estava ajudando Carlinhos Weasley que lutava contra três comensais de uma vez.
Em pouco tempo houve uma debanda geral por parte dos comensais da morte. Vários outros membros da Ordem da Fênix já apareciam para ajudar e alguns aurores do Ministério da Magia. Alguns encapuzados ainda tentaram destruir algumas casas de trouxas, mas foram impedidos por Lupin e Tonks que estavam lutando na rua.
Harry desceu de seu quarto e foi até a porta onde estavam o Sr. Weasley e Olho-Tonto. No meio do caminho escutou um barulho no quarto debaixo da escada. Receando que estivesse algum comensal escondido, ele retirou a varinha do bolso da calça e lentamente abriu a porta. Ia já lançar uma maldição para dentro do quartinho quando sai em disparada pela sala um monte de banha. E logo em seguida um homem branco de medo e uma mulher toda despenteada, eram seus tios e Duda.
Encontrou os membros da Ordem já na varanda da sala. Todos tinham as vestes sujas de sangue e lama, e muitos estavam com alguns ferimentos graves no corpo. E quando apareceu na porta muitos abriram um enorme sorriso e até mesmo Moody deu um suspiro de alívio. Não demorou muito e alguns membros, puxados pelo Sr. Weasley, já estavam dando abraços e cumprimentando Harry.
- Que feitiço foi aquele em garoto. – disse Tonks. – Nem mesmo o nosso Moody consegue fazer algo assim.
Todos viraram os olhos para Harry, agora se lembrando do que ele tinha feito no meio do duelo. Nem mesmo ele conseguia entender como tinha feito o Patrono.
- Eu apenas lembrei em algo feliz. – respondeu meio encabulado.
- Acho que ele precisa descansar. – falou o sr. Weasley. – Molly deve estar louca em casa devido ao nosso atraso. – continuou percebendo o embaraço do garoto.
- E Harry! – chamou Lupin. – Feliz Aniversário!
Harry se lembrou nesse momento que era seu aniversário e que ele tinha completado dezessete anos, era um bruxo adulto. Nesse momento lembrou-se do que tinha acontecido na hora que dera meia-noite, o ritual e a coisa de ser herdeiro de Gryffindor.
- Você está bem menino? – perguntou Moody. – Parece que achou ruim que nós lembramos você de seu aniversário. – depois de receber um sinal de não do menino, emendou. – Meus parabéns! E fique em vigilância constante!
- Vá buscar suas coisas. – falou Lupins. – Temos que sair logo daqui. Antes que eles voltem.
Em menos de cinco minutos o malão de Harry estava ao lado dele no jardim da casa, que estava já sem nenhum corpo. Ele iria desaparatar com Lupin para a Toca. Quando foi dado o sinal, ele sentiu o grande puxão no umbigo e a sensação de tudo estar girando. E em um instante caiu de cara no chão no gramado da casa dos Weasley. Levantou batendo o pó da roupa e seu olhar se encheu de lágrimas quando viu a Toca. Era ali que ele se sentia feliz, essa sim era a sua casa.
Comentários (1)
Sua fic esta muito boa irei acompanhar!!! Depois escrevo comentarios maiores
2012-09-12