Capítulo 7
Tudo era escuro, nada enxergava além daquele par de olhos castanho-médio que pareciam encarar o observador. Neles transparecia um medo terrível, mas ao mesmo tempo a loucura, enquanto surgia à frente de um de seus olhos arregalados metade da lâmina de uma adaga. Foi quando uma voz fina ecoou, mas era gelada e tudo que conseguia expressar, apesar de parecer insensível, era um profundo rancor e ódio.
- Acabe com a dor.
Lacbel acordara com uma dor aguda em seu peito e não conseguiu segurar um gemido. Respirou fundo, conscientizando-se de que fora apenas mais um daqueles pesadelos comuns que começara a ter depois de iniciar sua convivência ao lado Dele. Mas, para seu completo desgosto, aquilo sempre o fazia acordar com aquelas correntes invisíveis a estrangulá-lo.
Após vários minutos de concentração forçada, as correntes afrouxaram e seu corpo ficou novamente móvel. A primeira inspecionada rápida pelo quarto, notou a ausência daquele insuportável ser e logo aquela ideia surgiu, sem necessitar de qualquer esforço para aparecer, sem precisar parar e pensar. Surgiu de modo automático. Era mais uma chance que não poderia desperdiçar.
Sentou-se na cama, olhando para os lados só para ter absoluta certeza de sua solidão. Deslizou calmamente as pernas para o lado, sentindo as correntes novamente apertando pela crescente ansiedade do que estava para fazer, colocando os sapatos e levantando-se.
Sabia que, já não bastasse estar transgredindo a regra de nunca falar com ninguém além Dele – apesar de não saber exatamente se sabia disso ou não -, agora iria sair sorrateiramente de seus aposentos no meio da noite para buscar algo que o tinha proibido de ver.
Não se importava. O conforto proporcionado por aquilo valia qualquer castigo.
Seguiu em direção à porta, ganhando rapidamente os corredores do castelo, àquela hora escuros e silenciosos. Apesar de tentar caminhar com rapidez, não conseguia. Algumas vezes era obrigado a parar e respirar para amenizar a ansiedade e a tensão do momento, sendo um dos inúmeros obstáculos para conseguir possuir o que tanto desejava.
Nem mesmo dava atenção aos comensais que vigiavam os corredores e que rapidamente, ao notarem seu broche peculiar, apressavam-se a dar passagem. Parecia sem rumo, tomando escadas e corredores, confiando que seus pés o levariam ao local certo. Durante seu trajeto, a pouca luz emitida por archotes acesos e a luz da lua que invadia o lugar através dos vidros das janelas do antigo castelo o distinguiam das sombras que dominavam o ambiente.
Conseguiu, após um pouco de esforço, chegar à gárgula que dava ao escritório dos diretores. Não se perguntou como conseguira chegar ali, principalmente à noite, sem saber quase nada do castelo-labirinto e nem ter caído em qualquer armadilha. Seus pensamentos estavam fixos no seu atual objetivo e precisava ser rápido. Parecia haver um imã entre o que procurava e a si mesmo.
Conseguia ouvir sua respiração ruidosa enquanto seus punhos se fecharam debaixo da capa negra. Precisava dizer a senha que Ele havia mudado há pouco tempo. Ele fizera questão de mudá-la na sua frente.
- Pequeno Tigre. - quase inaudível por sua voz rouca e baixa, mas sabia que magia não precisava escutar em bom som para ser ativada.
As correntes apertaram enquanto afloravam lembranças, junto às sensações, sem controle. Seus músculos se tencionaram ainda mais enquanto tentava acalmar o caos de sensações que só pareciam se acumular e tornar o momento muitas e muitas vezes pior. Mas não ia desistir, a lembrança que aquelas duas palavras proporcionavam não iam fazê-lo parar.
"Vai tornar tudo o mais difícil possível." pensou, observando a passagem aberta, mas sem qualquer possibilidade de atravessá-la, enquanto tentava apagar todos os sentimentos que haviam aflorado naquele momento. Passou-se alguns minutos até conseguir estabelecer ordem interna mínima, apenas o suficiente para recuperar os sentidos perdidos pela paralisia.
Finalmente pôde caminhar em direção à escada em espiral. Cada passo uma tortura, uma guerra interna onde tentava domar as sensações que teimavam em permanecer na altura de seu peito. Por mais empecilhos que Ele colocasse, sabia serem inúteis para pará-lo em sua procura.
Apenas um realmente o barrava. E no momento ele estava ausente. Apenas a presença Dele era seu obstáculo intransponível.
Só parou para respirar quando chegou à porta de carvalho sólido que daria no escritório. Sentia a tensão de seu corpo. Quando abrisse a porta não haveria mais volta, caso Ele estivesse lá dentro. Levou a mão enluvada em direção à maçaneta, sentindo o leve tremor de seus dedos, prendendo a respiração quando a girou e abriu.
Uma pequena fresta se fez, o suficiente para ver que ele não se encontrava na escrivaninha do escritório, seu local preferido. Abriu ainda mais a porta, percebendo que ele não parecia se encontrar em qualquer lugar do recinto. O alívio percorreu seu corpo quando constatou aquele fato, fechando a porta logo que entrou. O momento deveria durar o máximo que conseguisse e manter tudo como se nada houvesse invadido seu escritório era necessário.
Foi como um imã quando seguiu para a escrivaninha. Não estava preocupado com Nagini, pois esta se encontrava no segundo andar presa em um círculo de proteção. Mesmo que estivesse ali, não poderia deslizar e avisar seu mestre.
"Nas gavetas.", imaginou, começando a abrir uma a uma. Mas não havia nem sinal do que procurava. "Algum tipo de fundo falso.", surgiu-lhe a ideia, abrindo aleatoriamente uma gaveta. Pegou a varinha, produzindo um feitiço de revelação. Iluminou um pequeno e ínfimo fio que prendia-se na parte interna da frente da gaveta. Era quase invisível, principalmente para alguém apressado. Guardou a varinha, pois não iria necessitar dela.
Retirou tudo de dentro, desinteressado sobre o que se tratava, depositando em cima da escrivaninha, abarrotada de mais papéis também pouco interessantes. Puxou o pequeno fio e, aparentemente mais forte do que supunha, este parecia erguer o fundo da gaveta.
A primeira coisa que viu, fazendo palpitar seu coração, fora as bordas bem detalhadas. Depois surgiu o suporte, mas nesse momento não aguentava mais de tanta angústia, sentindo que se não fizesse algo acabaria cedendo à dor e as correntes em sua guerra particular que ainda travava dentro de si incessantemente.
Levou a mão livre até as bordas esforçosamente, pegando finalmente o objeto desejado.
Um retrato.
Virou para cima a parte da frente do retrato. Uma foto encontrava-se ali, estática e imutável. Havia pouca nitidez, já que a única fonte de luz era a janela por onde a lua banhava um curto espaço. Caminhou até esse limitado espaço para ao menos poder ver seu rosto com mais clareza.
Assim que os primeiros raios de luz tocaram a superfície, a imagem de uma jovem que parecia ter 16 ou 17 anos pôde ser vista. Os olhos cor-de-mel encaravam o observador com ar sonhador e um sorriso feliz deixava um ar gentil e inocente à imagem. Os cabelos levemente encaracolados caíam sobre seus ombros. Raios solares tocavam delicadamente seus cabelos, deixando-o com um brilho avermelhado sobre as madeixas castanhas.
Isso era tudo que necessitava ver. O resto da foto simplesmente eram detalhes irrelevantes.
O sentimento de paz chegou numa lufada quente e gostosa para o seu coração. A dor sumira, era como se o sofrimento não existisse em sua vida enquanto observava aquela foto.
"Ela...", pensou com ternura quando seus dedos foram até o vidro do retrato que defendia a foto de qualquer mal, fazendo um carinho silencioso sobre a imagem tão adorada. Apenas a imagem dela conseguia trazer paz e felicidade sem precisar sofrer. Apenas a imagem dela conseguia libertá-lo, mesmo que por um curto espaço de tempo, das correntes que o estrangulavam e matavam pouco a pouco, dia após dia.
A imagem foi ainda melhor iluminada quando o medalhão dourado que carregava começou a brilhar e iluminar com ainda mais nitidez. Porém Lacbel nada notava, hipnotizado demais pela imagem e as sensações que esta lhe proporcionava.
Estava hipnotizado o suficiente para não notar que alguém aproximava-se apressadamente de si. Saiu de seu torpor apenas quando seu paraíso desvanecera ao ter o retrato brutalmente retirado de suas mãos.
A sensação de sufocamento retornara, principalmente pela raiva que sentiu instantaneamente ao ser roubado. Seu capuz ergueu-se para saber quem havia sido o atrevido que tivera a ousadia. O atrevido se chamava Lord Voldemort. E estava furioso.
Sua raiva foi abrandada enquanto dava um passo para trás, afastando-se e abaixando novamente cabeça. O brilho de seu estranho broche cessou instantaneamente após não poder mais ver a imagem.
- Você me desobedeceu novamente, Lacbel. - a voz era mais dura e rígida que o normal, denotando como controlava a fúria por encontrá-lo ali, possuindo algo que não era permitido.
- Isso é meu. Não tem o direito de me proibir ou permitir de vê-lo. - havia um leve tom revoltado em sua voz, além da possessividade. Apesar de aparentar submissão, sua voz não parecia em nada demonstrar isso. Sempre que acabava de ver a foto demorava um tempo para retornar à normal insensibilidade que sempre demonstrava.
A fúria desvaneceu do rosto ofídico ao ouvir aquela fala atrevida, sendo substituída por um brilho divertido nos olhos vermelho-sangue. Sabia o que estava por vir. "Tudo para poder vê-la", pensou, já se preparando psicologicamente para o que teria de engolir, sem poder fazer nada.
- Vou ter de re-explicar isso mais uma vez, Lacbel...? É adorável como você anseia por ouvir o doce som da minha voz... - o tom malicioso e viperino demonstrava que ele não iria cansar de poder sempre jogar aquilo na sua cara, toda vez que começava a ficar rebelde. - Desde aquele dia, Lacbel... aquele dia, que bem se lembra, você não teve mais nada. Mas creio que sua memória seja levemente fraca para guardar minhas falas. Não se preocupe, eu estarei sempre aqui – ele fez questão de frisar essas duas palavras, fazendo-o cerrar os punhos, mas, como sabia, não havia como revidar – Para relembrá-lo. Cada frase. Cada palavra. Se necessário, cada sílaba. - o veneno destilava em cada palavra pronunciada, enquanto um sorriso cada vez mais perverso aumentava em seu rosto deformado.
Antes de continuar seu discurso, ele virou-se em direção à escrivaninha, caminhando até esta e depositando seu adorado retrato com a parte de cima virada para o tampo da mesa. Estava para chegar a pior parte do que sempre ocorria após ver a foto. Respirava fundo, tentando se preparar, mesmo que, em todas as vezes, suas tentativas se tornassem miseravelmente falhas.
Viu-o novamente se aproximar mansamente, indo até suas costas, repousando suas mãos, uma em cada ombro, com leveza e sutileza. Fechou os olhos e sentiu seus próprios dedos enterrarem-se com ainda mais afinco na palma de sua mão, erguendo a cabeça para olhar o céu noturno através da janela. De tantas coisas para lembrar, ele sempre lembrava daquele dia do qual tentava desesperadamente esquecer. Sentiu-o aproximar-se do lado de seu ouvido e, mesmo que houvesse o tecido de seu capuz, pôde ouvir nitidamente o que Voldemort falara aos sussurros.
- Você não tem nada além do que lhe dou e que posso retirar a qualquer momento. Eu sou dono de seu corpo e um dia serei dono de seus pensamentos e atos. - esforçava-se para tentar ignorar aquelas palavras ditas tão perto, mas era impossível. Aquela voz aveludada era como facas, dilacerando sua mente impiedosamente. Ele estava quase conseguindo cumprir aquilo que tanto lutara para não ser verdade. - Sinto que meus domínios aumentaram desde aquele dia... não concorda, Lacbel? - havia um tom enfático ao pronunciar a última palavra.
- Eu te odeio, intragável. - sussurrara de volta e com esforço para não soar como um gemido de dor, sem responder diretamente à pergunta. Mas pareceu ser o suficiente para satisfazê-lo.
Não conseguia manter sua voz muito estável. Era como se alguma coisa o queimasse por dentro. Mas não era realmente isso o que mais o desesperava, e sim a angústia que assolava seu coração, partindo-o lentamente em pedaços. Sabia que demoraria dias para se recompor daquela maldita conversa.
Sentiu sua visão embaçar e, sem conseguir segurar, seu rosto começava a lentamente umedecer pelas lágrimas rancorosas que caíam de suas pálpebras. Mas não havia acabado e rezava para que até lá nenhuma delas caísse de dentro de seu capuz.
- Senti falta de seus carinhosos apelidos... É uma pena que não possa retribuí-los, pois não estamos em um lugar reservado. Mas não se preocupe... A próxima terça-feira virá. - não precisava encará-lo para saber que havia um sorriso no rosto viperino, enquanto este se afastava de seu ouvido. - Agora, recomponha-se e me espere do lado de fora da gárgula. - suas expressões e tom de voz mudaram radicalmente, adquirindo um ar frio e indiferente, como se nada houvesse acontecido de diferente nos segundos anteriores.
Por sorte, suas lágrimas não caíram até ele dar as costas, pois a última coisa que queria era demonstrar o quanto suas palavras podiam feri-lo. Por isso não vira quando algumas lágrimas finalmente desprenderam-se de seu queixo, desfazendo-se ao chocar-se contra o medalhão dourado, deslizando lentamente pela imagem em alto relevo do dragão.
Quando finalmente recobrou a sensibilidade de seus sentidos, ao readquirir seu auto-controle emocional de volta, virara-se para seguir até a porta e cumprir sua recente ordem. Sentia os olhos felinos perseguindo cada movimento seu analiticamente até desaparecer pela porta.
Assim que Voldemort viu Lacbel desaparecer do escritório, ainda esperou mais alguns segundos. Sentava-se na cadeira da escrivaninha, repousando as mãos de longos dedos brancos sobre o retrato virado. Assim que certificara-se de que Lacbel estava longe, acendeu o que parecia ser um abajur sobre a escrivaninha e pegou o retrato cuidadosamente entre as mãos, começando a observar a foto, analiticamente, como fazia todas as vezes que mandava Lacbel para longe. Precisava pensar em um novo esconderijo para aquilo.
- Então, é assim que consegue manter Lacbel sob controle. - a fala baixa do velho diretor havia sido ouvida após algum tempo em que Voldemort encarava a imagem.
- Imaginei que quando pudesse ver e analisar melhor Lacbel, perceberia esse detalhe. Mas você encontrava-se em algum outro lugar, ocupado, no dia em que veio à este escritório pela primeira vez e, até ontem, única, Dumbledore. Vi seu retrato naquele dia, vazio. - ele sorrira, porém sem desviar os olhos da imagem para olhá-lo, mesmo que transparecesse mínimo divertimento. - Apesar de que não necessitava que você visse Lacbel para saber quem é. Só os boatos são o suficiente para se deduzir isso, para quem pôde ter um mínimo de contato a mais. No entanto, vê-lo provavelmente esclareceria muitas questões sobre meu plano... Pois você saberia identificar aquilo, mesmo disfarçado do jeito que o coloquei.
- Acredito que você tenha deturpado levemente a palavra "disfarçado", mas tenho de admitir que foi inteligente o método que o fez. Porém não consegui ver nitidamente, o ângulo de meu retrato não ajudou, mas, pelo modo como se tratam, restringe à apenas duas possibilidades.
- Muito bem, Amante de Trouxas, muito bem... seus estudos sobre Magia Negra são tão bons quanto os meus... - nesse momento, Voldemort desviara os olhos, erguendo-o levemente do retrato para lançar um sorriso de canto ao diretor. - Apesar de que não deveria estar me admirando, depois que encontrei isso... - ele indicara o livro de capa negra que ainda repousava sobre a escrivaninha. - Sua coleção de livros particulares é espetacular... existe alguns que não imaginava nem mais existir...
- Quanto tempo demorou para descobrir a senha? - o diretor perguntara em tom calmo, não se admirando com o que via nas mãos dele.
- Quase uma semana. Não quis utilizar as senhas normais, o que me deu um pouco de dor de cabeça... - ambos sorriam e, apesar de estranho, havia um ar levemente cúmplice no olhar de cada um.
- Mas não entendo como conseguiu driblar a magia que corre em seu sangue. Mesmo tal feitiço não teria como atravessar barreira tão forte. - comentou o velho diretor calmamente.
- Correto, Dumbledore. O feitiço original não ultrapassa direito toda a magia proporcionada por seu sangue, era completamente inútil para o que desejava. Tive de modificá-lo, torná-lo mais forte... Aproveitei para fazer algumas modificações por conta própria. No entanto, o mesmo defeito do original permaneceu em minha modificação. Este defeito jamais poderá ser consertado. É completamente indomável, não aceita ser controlado... E não sei se isso é bom ou ruim. - ele suspirou, repousando o cotovelo sobre a escrivaninha, deixando o retrato que ainda segurava na mão na altura de seus olhos, que retornavam à sua observação concentrada da imagem.
- Creio que compreenda seu dilema. O imediato ou o duradouro. - Dumbledore desviou os olhos para a foto, mas sem enxergá-la realmente bem, pela distância – Mas noto que a força de seu feitiço é grande, uma vez que Lacbel não tentou fazer nada para recuperar o retrato.
Voldemort sorrira, sem observá-lo, finalmente parecendo satisfeito e decidindo por guardar o retrato em um dos bolsos de suas vestes. De certa forma, não fora inútil a desobediência de Lacbel.
- Tenho orgulho dos feitiços que produzo. Principalmente daqueles que crio. - respondera simplesmente, indiferente. Levantara-se, observando a bancada do segundo andar com ar pensativo.
Dumbledore voltou a falar, mesmo que Voldemort parecesse completamente distraído, provavelmente planejando alguma coisa.
- Conte-me, Tom, agora que novamente podemos falar à sós, por que ainda não matou Harry Potter? Compreendo o motivo do agora, mas não do antes.
- Antes, Amante de Trouxas? - ele perguntou, com uma denotação intrigada em sua voz, mas ainda sem sair de sua posição.
- Quando o capturou. Por que não o matou imediatamente, mesmo tendo condições suficientes para isso? Para que deixá-lo preso? O que planejava?
- Dumbledore, você fala como se não me conhecesse... É decepcionante constatar isso, mesmo depois de quase 60 anos de, digamos, convivência pacífica? - ele riu ao falar essas últimas palavras.
Dumbledore permaneceu em silêncio, esperando-o continuar.
- Antes de responder a tais perguntas, responda-me. Acha que sou um reles assassino de crianças que mal saíram das fraldas? Até você cegou-se com a aparência de que sou tão incapaz que não consigo matar uma criança? - nesse momento, surgira uma expressão levemente cética em suas feições, poder-se-ia dizer até mesmo decepcionada.
- O que está insinuando? Que tudo não passou de um teatro? - nesse momento, pôde-se ver as sobrancelhas de branco platinado contraindo-se, tornando mais evidente as rugas de sua testa.
Voldemort sorrira e um brilho maligno instalou-se em sua íris vermelha.
- Acha que gostaria de matar uma presa singular como esta tão rapidamente? - antes de obter qualquer resposta, respondera por si mesmo. - Não. Porque meu verdadeiro prazer não é matar... É caçá-las. Adquirir o máximo de prazer com suas vãs esperanças de sobrevivência. Mas de certa forma dei privilégios à Harry Potter... Dei-lhe chances de escapar de mim várias vezes. Mas admito que essa experiência é divertida...
- Eu creio que minhas memórias não são tão boas quanto há décadas. Deveria ter me lembrado que você gosta de brincar com suas presas até cansar-se. Mas isso não explica o porque de desejar que ele continue vivo, sendo que já deve ter atrapalhado muitos de seus planos.
- Vejo que não é apenas sua memória que está afetada, Amante de Trouxas, pois nem consegue fazer uma simples lógica. - ele havia comentado venenosamente e sorrido – Pois vamos explicar desde os primórdios, para que nada fique fora do lugar. O primeiro ponto crucial é essa Guerra que simplesmente não existe. Desde sua lamentável e deplorável morte, meu caminho tornou-se completamente desimpedido para dominar a Grã-Bretanha. Nosso acordo de cavalheiros morreu junto com seu corpo.
- Muito me surpreende que ainda não resolveu essa guerra, se pelo que diz seu único empecilho era eu.
- E o que farei depois de resolvê-la? Sentar numa cadeira e planejar a paz do que conquistei? - ele falou cético, produzindo certo divertimento em Dumbledore.
- De certo, imaginá-lo produzindo paz não lhe cai bem. - a voz divertida do velho diretor apenas produziu um suspiro por parte de Voldemort.
- Continuando... – se poderia perceber um leve retrair acima de um de seus olhos, tentando ignorar a fala jocosa do diretor. - Desde que perdi meu parceiro nesse grande jogo de xadrez, o que me restou foi ter de controlar ambos os lados do tabuleiro. O seu lado é mais difícil, já que não tenho controle direto, mas o desafio é maravilhoso.
- Por que acha que existe apenas você de jogador? Posso ter treinado outros para substituir-me.
- Por hora, apenas existe eu, isso eu tenho certeza. Seus discípulos não estão ainda à minha altura para adentrar nesse jogo. Mas não se preocupe... Eu tenho paciência de esperá-los ganhar experiência. Como você teve comigo.
- Que gentileza da sua parte. - o diretor sorrira, seus dentes brancos só não brilhavam por não existir luz. - E o que toda essa explicação tem a ver com minha questão ainda não respondida?
- Acalme-se... Estamos chegando lá. Bem, você sabe qual é o ponto crucial que todo estrategista está ligado. Depois é apenas escolher para qual lado quer planejar.
- Combater o caos ou criá-lo. O que lhe deixa numa situação complicada.
- Exatamente. Preciso criar e ao mesmo tempo combater o que eu mesmo criei. Controlar as minhas peças e as suas peças. Aqui é onde se encontra a resposta à pergunta... Onde Harry Potter se encaixa em tudo isso? - falou Voldemort, parecendo intrigado. – Por que, afinal, mantê-lo vivo?
Dumbledore ficou esperando pacientemente ele observar os objetos estranhos dentro da sala, pensativo, para ouvir a resposta desejada.
- Harry Potter é o que motiva o seu lado a continuar a tentar me combater. Sem ele, não há com o que batalhar, pois todas as esperanças irão cair por terra. Não haverá mais qualquer resistência, nem mínima... O que me obrigará a dominar tudo e acabar tendo de sentar numa cadeira e planejar a paz. - ele revirou os olhos, enfadado.
Dumbledore deu uma tossidinha, levando a mão aos lábios para não mostrar o sorriso debochado. Depois de se recompor - sendo encarado veementemente por um Voldemort levemente irritado por não ter sido enganado por uma tosse tão mal disfarçada - retornou a falar mais seriamente.
- Então, - nesse momento ele sorrira largamente – terá sua guerra por poucos meses, se quiser levar adiante o plano, que creio tenha entendido seu propósito nesse momento. Seus dias divertidos parecem estar sendo contados lentamente...
- Divirta-se o quanto pode, Amante de Trouxas. Você verá a grande paz que produzirei. - seus olhos faiscavam. Levantou-se, sem falar mais nada, saindo do aposento.
Parecia ouvir as batidas de seu coração descompassado, enquanto caminhava rapidamente. O Lorde garantira estar acordado, mesmo sendo altas horas da madrugada. No entanto, não encontrava-se nos seus aposentos. Virou um corredor, sentindo arrepios pelas sombras produzidas pelos archotes, mas estava chegando. Logo que desse o recado, poderia relaxar. Seus olhos, mais abertos que o normal, perceberam a gárgula e, para seu pavor, Lacbel encontrava-se ali ao lado, parecendo um guardião. Estancara no mesmo lugar, sentindo o suor frio que começava a escorrer por sua testa enquanto tentava decidir-se. Prosseguia ou esperava Lacbel sair de lá?
Sua resposta veio poucos segundos após, quando o próprio Lorde aparecera pela passagem, ficando de frente à Lacbel assim que o notara. Pela distância em que estava, o máximo que pôde perceber é que ele ordenava alguma coisa e Lacbel desaparecia como se aparatasse. Seu estômago congelou de tanto medo, mas a oportunidade era perfeita para falar com o Lorde.
Caminhou, aproximando-se com passos apressados até o Lorde, que erguera a cabeça, provavelmente pelo barulho produzido pelos seus passos. Não mexeu-se, esperando pacientemente que aproximasse e lhe desse a informação que desejava obter dele.
Assim que ficou à sua frente, fez uma reverência respeitosa, antes de começar a falar.
- Vim avisá-lo de que tudo foi feito como ordenou, Milorde, para hoje ainda. - ele falava baixo, por causa do horário. Desnecessário, mas já se tornara um certo hábito.
- Muito bem. Avise Bellatrix que estou ordenando que ela se mantenha afastada do meu escritório hoje. Pode ir.
Voldemort observou o comensal sair apressadamente de sua presença, obviamente para fazer o que acabara de lhe ser ordenado. Sorrira. Aquele seria o dia perfeito pro que planejara há alguns dias.
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