Voltando para casa
Capítulo 28
Voltando para casa
O período entre minha última passagem por Londres e o Natal passou conturbadamente rápido. Ir até a casa de tia Françoise não se provou tão satisfatório como eu gostaria, a não ser para Alexey e Aimèe. Enquanto eles matavam a saudade um do outro, eu ficava no escritório de tio Timoh, procurando qualquer coisa que pudesse me ajudar. Não que eu tivesse ficado inteiramente abandonada... Alexey não fora tão egoísta assim, e nós nem permanecemos, também, muito tempo em Paris.
Com o fim de setembro, novas coordenadas se apresentaram e tivemos que viajar para a Romênia. Havia um lugar que Sebastian gostava de ficar e que sabíamos estar desocupado. Se o vampiro possuísse algo que pudesse me ajudar, estaria em sua casa abandonada. Encontramo-nos, então, em um vilarejo romeno chamado Strigoi. Alexey me falara que o lugar recebera aquele nome devido às crenças locais sobre vampiros. Não que a população estivesse errada...
O lugar onde Sebastian vivia era um castelo, localizado em um morro a uma boa distância do vilarejo. Era uma edificação magnífica, embora pequena. Eu não fazia ideia de quando ela datava, nem mesmo Alexey soube me dizer precisamente. Os habitantes de Strigoi, ao perceberem que nossa intenção era ir até o Castelo Negro – como era chamado – tentaram nos aconselhar o contrário. Quando não lhe demos atenção, eles apenas disseram que rezariam por nós.
— Será que encontraremos algo aqui? — perguntei assim que alcançamos a entrada principal do castelo.
— Talvez... Espere um pouco — Alexey falou, segurando-me pelo braço a fim de impedir que eu continuasse a andar. Ele olhou para os lados, procurando por algo, mas estávamos sozinhos. Depois fechou os olhos e respirou fundo. Eu sabia o que ele estava fazendo: era uma técnica que ele estava me ensinando, que apenas nós, Vrykolakes, possuíamos. Dessa maneira, conseguíamos descobrir se havia alguém como nós nas redondezas. Alguns minutos foram necessários para ele perceber que, como aparentava, estávamos sozinhos.
Não foi difícil entrar no castelo, pois o lugar estava estranhamente desprotegido. Assim como do lado de fora, seu interior era todo revestido de pedras negras, tanto no chão quanto nas paredes. O tapete que vinha da entrada principal até o hall era de carmim profundo, com detalhes em dourado, negro e branco. Caminhamos em silêncio, cautelosos, até que chegássemos a uma enorme sala, cuja lareira estava apagada. O frio ali pareceu aumentar. Mas não foi o frio que me paralisou. Eu conhecia aquele lugar.
— Eu já estive aqui antes — senti o medo se alojar em minha espinha como da primeira vez que eu tinha visto Sebastian, em meus sonhos. Olhei para a lareira como se fosse vê-lo de pé, sorrindo diabolicamente para mim. — Na primeira vez que Sebastian mostrou-se para mim, em meus pesadelos. Foi neste lugar.
— Não fique pensando muito nisso — Alexey aproximou-se de mim e colocou suas mãos em meus ombros. Eu o olhei. — Estamos sozinhos. E, além disso, ele não tem o punhal do demônio.
— Eu sei — desvencilhei-me de Alexey, olhando ao redor. — Onde você acha que Sebastian guarda suas coisas importantes?
— No quarto dele, talvez... Mas vamos olhar tudo. Vem comigo.
Percebemos logo que no andar térreo não havia nada de interessante. Apenas aquela enorme sala e corredores que terminavam em uma cozinha, mais duas salas revestidas de quadros antigos e cortinas e um jardim. Já no primeiro andar, contabilizei dez quartos imensos, embora apenas seis pareciam estar sendo ocupados. Os outros tinham camadas grossas de poeira que me fizeram espirrar tão logo entramos. Foi uma procura vagarosa, pois Alexey e eu não queríamos deixar rastros.
As horas passaram, os quartos foram terminando e o sol já se punha quando alcançamos o segundo e último andar. Nele, havia uma imensa biblioteca e um escritório ao lado, com uma porta interna e discreta os interligando. Em frente, apenas dois quartos. Ao que parecia, aquele deveria ter sido o andar dos senhores daquele castelo muitos anos atrás. Com o auxílio da varinha, iluminei os inúmeros tomos que preenchiam aquelas estantes.
— Isso aqui vai levar tempo — lamentou Alexey.
Não lhe dei atenção. E logo meu primo também olhava tomo por tomo, procurando algo que poderia nos interessar. Encontramos livros antigos sobre botânica, literatura, política e até um espaço para livros sobre feitiços, bruxaria e rituais macabros. Mas, como Alexey dissera, a imensidão da biblioteca era tanta que esse trabalho renderia dias. A madrugada já estava avançada quando ele achou melhor voltarmos para o vilarejo a fim de descansarmos.
— Se tudo correr como espero, Sebastian demorará a voltar. Teremos tempo.
No segundo dia fomos preparados, levando comida e água para que ao menos um problema não nos atrapalhasse. O dia passou devagar e novamente a noite chegou sem que encontrássemos coisa alguma. Somente no terceiro dia, a procura rendeu frutos.
Alexey estava encostado na mesa, terminando de comer um pedaço de torta. Eu segurava um sanduíche com a mão esquerda, enquanto com a direita folheava um livro apoiado em minha perna. Era um livro sobre feitiços, antigo, cujas páginas amarelas e grossas estavam se soltando. Havia maldições naquele tomo que deixaria qualquer adorador de Arte das Trevas horrorizado. Uma ou outra não conseguiam sair da minha cabeça devido às ilustrações muito reais. Eu já estava no fim do livro quando uma ilustração chamou minha atenção. Era uma analogia à morte de um demônio com asas, em cujos pés havia pessoas mortas com o que me parecia sangue.
Quando eu estive em casa, Alexey havia dito que uma estaca era a causa da morte de muitos vampiros, mas apenas se considerássemos a mitologia dos trouxas. Para nós, Vrykolakes, a situação era diferente. Prata nos machucava e poderia nos matar, porém não era algo concreto. Precisaria de algo mais, um complemento que a tornasse mortal.
Uma vez que não consegui identificar a origem idiomática do que eu lia naquele livro, chamei Alexey.
— Consegue decifrar?
Ele bateu as mãos na calça, limpando-as, para depois pegar o livro.
— Parece uma mistura de latim antigo com novo — ele disse depois de um tempo, para em seguida ler em voz alta: — Diabolus magicas exhaurit. Diabolus appetierit immortalitate atque opibus. Fecitque sicut Iudas.
— Ele está falando sobre diabo e Judas? — retorqui, identificando apenas a primeira e última palavra.
— Sim. Diz que o demônio drena magia e cobiça imortalidade e riqueza, assim como Judas. Não é estranho a parte religiosa, sabe? Afinal de contas, o ritual que Sebastian fez com você foi uma excomunhão. Claro que envolvia magia, mas... — ele deu de ombros.
— O que mais há aí?
— Tem umas palavras que não conheço. Parece que misturaram idiomas, aqui, não apenas o latim. — E continuou, depois de ler mais algumas frases. — Parece que a prata é, afinal de tudo, o que pode nos destruir.
— Como?
— Um feitiço... “Decapitar não elimina o demônio”, aqui diz. “Queimar até tornar cinzas não se mostra efetivo se ele for primeiramente um mago ou feiticeira, pois ambos têm poder de anular o fogo. A prata, invocada pelo instrumento de Merlin, é a única arma efetiva contra um demônio de sangue.”
— Instrumento de Merlin?
— Olhe na ilustração. — Alexey colocou o livro na mesa, indicando com o dedo o que o homem segurava. Era uma varinha.
— Então o que pode matar Sebastian é um feitiço? Eu tenho que conjurar o quê? Uma estaca?
— Sim. Aqui tem as palavras. Plata-stakka Clavare. Traduzidas, significa “cravar estaca de prata”. — Alexey fez uma careta. — Isso é pior que Densaugeo.
Rolei os olhos.
— Agora você quer brincar de etimologia? O que esperava com tudo isso escrito em latim? Que as palavras fossem gregas?
— Temos origem grega. Os Primeiros eram filhos de gregos. Por que não?
— Sim, pois seria muito mais fácil esses latinos escreverem algo como diakyvév̱ontai asi̱mí.
— Quem escreve ou fala latim não é latino. E o feitiço não é apenas “estaca de prata”.
— Que seja... Vamos embora daqui — falei, retirando a página com o feitiço e enfiando a folha dobrada no bolso de meu casaco.
Guardamos os livros nas estantes, pois não desejávamos que Sebastian suspeitasse de nossa visita, e depois descemos rapidamente o morro até o vilarejo.
— Eu vou ficar por aqui — Alexey falou, parando em frente a porta de um bar.
— Preciso praticar o feitiço.
— Não, você vai entrar comigo.
— Não, obrigada.
Deixei Alexey para trás e segui diretamente para a hospedaria. Assim que me fechei no quarto, retirei o papel do casaco, lendo o feitiço novamente. Eu era boa em feitiços, então não poderia ser tão complicado.
No entanto, depois de várias horas, eu não conseguira alcançar meu intento. As palavras saíam, eu conseguia até visualizar uma estaca indo na direção da almofada em cima da cama – onde eu apontava minha varinha –, mas nada acontecia. Cheguei a cogitar que o feitiço era errado, que Sebastian deveria ter colocado aquele livro falso, pois de alguma maneira sabia que procuraríamos por resposta em seu castelo. Contudo, tal ideia também era absurda.
— Devo estar fazendo alguma coisa errada — murmurei, tentando encontrar alguma informação nas instruções. Mas, como antes, eu não conseguia entender as palavras. Eu precisava de Alexey. E Alexey estava enchendo a cara no bar ao lado.
Suspirei, sentando na cama. Alexey entrou minutos depois, os passos não tão firmes.
— Finalmente se cansou de beber?
— Eu não estava apenas bebendo — ele falou, deitando-se na minha cama. — Estava também pensando.
— Sobre o quê?
— O motivo de Sebastian ter esse livro com este feitiço.
— Alexey, ele tinha livros de Aristóteles na estante dele. E, pela capa gasta como estava, deveria ser a primeira edição. Será que ele realmente sabe os livros que tem? Será que ele já chegou a ler tudo aquilo?
— Eu sei que ele é um colecionador de quadros. Viu a quantidade que estava pendurada nas paredes?
— Sim. — Era praticamente um quadro a cada cinco passos.
— E então? Conseguiu alguma coisa?
— Não. Eu devo estar fazendo algo errado.
— Vamos ver. — Alexey sentou-se, pegando o papel como feitiço. Bocejou audivelmente, sem um pingo de educação. — É só apontar a varinha para onde quer lançar o feitiço. Não tem segredo.
— Então por que não consegui nada?
— Faça para eu ver.
Respirei fundo, concentrando. Apontei a varinha para a almofada e falei o feitiço. Nada aconteceu.
— Você está dizendo errado — Alexey nem abriu os olhos quando falou.
— E como se diz?
— Quando você diz Clavare, esquece que está falando uma palavra em latim. Lembre-se que os “as” são abertos, e o “e” também. Já o “r”, você não pode falá-lo como se tivesse um pedaço de torta dentro da boca. Ele é vibrante.
— Pedaço de torta na boca — resmunguei. — Muito didático, você.
— Só não dou aulas, porque o pagamento é ruim — ele sorriu.
— Você e o Binns seriam uma excelente dupla.
Mais uma vez apontei a varinha para a almofada. Como Alexey me instruíra, falei as palavras corretamente. E uma estaca de prata, um pouco menor do tamanho da palma de minha mão, projetou-se na almofada.
— Como eu disse — Alexey levantou-se, indo até a porta e abrindo-a — era só tirar a torta da boca.
XXX
A neve começou a cair mais cedo àquele ano. Mal dezembro começou, ruas e calçadas ficaram escorregadias e as lareiras permaneciam acesas vinte e quatro horas por dia. Eu havia retornado a Londres fazia poucas semanas, mantendo-me em casa sem procurar ninguém. Lily me queria apenas no Natal, então eu deixaria para aparecer apenas na semana do dia 25. Preferi ficar em casa, aproveitando o momento sozinha para pensar e pesar em tudo o que havia acontecido.
Nas semanas seguintes ao descobrimento do feitiço, Alexey achou melhor que fôssemos para nossas respectivas casas. Protegermo-nos era a primeira medida a ser tomada afim de prevenir uma visita inesperada de Sebastian. O vampiro não era o mestre da clarividência, no entanto, se ele quisesse, seria fácil descobrir no vilarejo que um casal de turista ficara por três dias em seu castelo. Contudo, eu estava segura que nenhum mal aconteceria. A preocupação de Sebastian em encontrar a Arma de Belial o mantinha longe, tanto física quanto mentalmente. Eu nem queria pensar que ele não me incomodava através de sonhos há meses. Imaginava que, se começasse a contar o tempo que ele me esquecera, acionaria algo que, naquela mesma noite, renderia uma visita de Sebastian.
Então, a única coisa que eu fazia em casa era continuar a ler os livros da biblioteca que Arktos e meu pai montaram e treinar o feitiço. O tamanho das estacas havia aumentado e poucas se quebravam se eu mirasse em algo mais firme, como a parede. Eu sabia que conseguiria matar Sebastian no momento em que ele ficasse na minha frente. E este era o problema.
Alexey havia dito que ficaria de olho por onde Sebastian andava e, assim que tivesse notícias dele, falaria. Eu esperava uma maior agilidade por parte de meu primo, porém Sebastian não era bobo. Ele sabia que o procuraríamos. Então eu podia apenas esperar.
Quando a semana de Natal chegou, finalmente saí de casa. Fui até o Beco Diagonal, pois, além de precisar comprar roupas novas há um tempo, eu não queria chegar na casa de Lily sem presentes.
Assim que aparatei em uma rua ao lado do Banco Gringotes, surpreendi-me ao ver o Beco quase vazio. Das últimas vezes, eu sempre o encontrava abarrotado nessa época do ano, mas agora era como se estivéssemos vivendo uma recessão. As pessoas que transitavam pelas ruelas não andavam sozinhas, estando sempre com um ou mais acompanhante. Não havia crianças excitadas, debruçando-se nas vitrines, pedindo presentes que muitas vezes não poderiam ganhar. O clima natalino, que sempre aquecia o Beco Diagonal a despeito da neve, não existia. Só havia medo, desconfiança e pressa em terminar as compras para voltar à segurança das casas.
Apesar de tudo isso, eu andei tranquila. Sabia do perigo, mas eu havia ficado tanto tempo fora, com outras preocupações, que toda aquela reação me parecia exagerada. O medo de toda uma população por um único homem beirava ao absurdo.
Fiquei um bom tempo caminhando, com sacolas da Madame Malkins e Talhejusto & Janota em uma mão e, na outra, um gatinho manchado de marrom que eu comprara para Lily. Não querendo ficar muito mais tempo naquele lugar que mais parecia o deserto, fui para a passagem de tijolos. Eu teria que chamar um táxi na parte trouxa de Londres, pois não havia como aparatar com aquele filhote nas mãos. Eu estava quase saindo do Caldeirão Furado quando ouvi uma voz masculina me chamar duas vezes.
— Por onde você tem andado? — Fabian havia se aproximado e me abraçado, embora eu não pudesse retribuir com o mundo de coisas que carregava. — Faz quase dois anos que não te vejo!
— Eu viajei por um tempo — sorri. Fabian pegou as sacolas e as colocou em cima de uma das muitas mesas desocupadas. — Como você está?
— Ótimo. Muito trabalho, pouco descanso... — Ele apontou para a mesa donde seus amigos nos olhavam, curiosos. — Isso aí é raro. Acho que não sento para beber há tanto tempo que, se me derem Cerveja Amanteigada, vou cair igual a um elfo doméstico.
— Então esqueça o Uísque de Fogo.
— Pode ficar tranquila — ele riu. — Eu não sabia que você gostava de bichos de estimação.
— Ah, não é meu — ajeitei o gato em meus braços. O filhote se aconchegava muito tranquilamente, quase dormindo apesar do barulho do bar. — Comprei para Lily, de Natal.
Fabian o pegou de minhas mãos.
— Isso quer dizer que você já tem onde passar as Festas?
— Lily me chamou. — Dei de ombros.
Ele brincou um pouco com o gato, que despertara e tentava pegar seu dedo com as garras pequenas, mas afiadas. Fabian então disse, sem me olhar:
— Desde que Molly se casou, passamos a virada do ano na casa dela. — O gato finalmente agarrou seu dedo, fazendo com que ele se soltasse apressado. — A Lily vai ter que lixar as unhas desse bicho para deixá-lo perto do Harry. Passo na sua casa às nove horas da noite?
— O quê?
— Para a virada do ano. A festa não é tarde nem cedo demais, afinal tem as crianças.
— Fabian, é muita gentileza, mas...
— Sem “mas”. — Ele me entregou o gato. — E vá de branco. Molly adora essas tradições trouxas. Embora um pouco de paz, mesmo que supersticiosa, seria muito bem-vinda no momento. Vou te chamar um táxi.
Fabian pegou as sacolas e saiu para a rua. Eu protegi o gato com meu casaco antes de alcançá-lo.
— Quem é Harry? — perguntei.
— O filho dos Potter, oras — ele me olhou como se estranhasse a pergunta. — Você não sabia?
— Não. Eu estive fora, disse a você.
— Claro... Pois é, o chamaram de Harry. Só vi as fotos que o Potter levou para todo mundo da Ordem ver. Mas o Lupin disse que ele já tem os cabelos do pai e os olhos da mãe.
— Em tão pouco tempo? Nossa... Achei que demorasse mais que dois meses para isso.
— Ele está com quase cinco! Nasceu em julho. Você viajou ou se isolou? — gracejou Fabian. Porém eu não tive tempo de responder-lhe, pois um táxi havia acabado de parar. Esperei que ele colocasse as sacolas no banco para então me despedir. — Não se esqueça, estarei na sua casa às nove horas. E não aceito “não” como resposta — ele completou, entrando novamente no Caldeirão Furado.
Maldizendo minha covardia nos momentos mais inoportunos, entrei no táxi e fui para casa.
Na manhã do dia 25, permiti-me ficar na cama mais tempo do que o necessário. Este era o primeiro Natal que eu passava em casa depois da morte de Arktos. Sentei-me na cama, não encontrando os presentes que ele sempre colocava para mim na poltrona, uma tradição que ele dizia pertencer à nossa família. Fiquei olhando por um tempo a poltrona vazia, tentando encontrar uma desculpa para não sair de casa. Mas no momento em que meus olhos arderam e respirar tornou-se pesado, levantei-me. Eu não iria lamentar.
Tomei um banho demorado e coloquei a roupa que havia comprado. Havia sido até ridículo o valor daquele vestido, de tão alto. No entanto, eu queria estar bonita para a festa de Natal de Lily. A angústia e a saudade que pareciam explodir em mim não poderiam transparecer em meu rosto ou meu modo de vestir ou agir. Então, o vestido preto com detalhes em dourado que a vendedora tanto elogiou tinha que servir para alguma coisa além de desfalcar minha conta no Gringotes. Junto dele, coloquei os brincos que Arktos me dera no último Natal e o colar que eu havia ganhado de Fabian no aniversário do ano anterior. Os cabelos, como sempre, estavam presos em uma trança um pouco frouxa. Ainda sem pensar muito, coloquei as botas, peguei o casaco, os presentes e saí.
Com a guerra, muitas casas bloquearam suas lareiras, e a casa dos Potter fora uma delas. James e Lily moravam sozinhos desde a primavera, quando a Sra. Potter adoecera gravemente e morrera. Uma vez que a lareira estava bloqueada e eu tinha sacolas e um gato em mãos, aparatar não se tornara uma opção. Portanto, fui até a garagem e retirei o carro que Arktos tanto adorava. Não me senti estranha, como pensei que aconteceria. Aquele carro era uma das lembranças boas que eu tinha de meu irmão, e dirigi-lo era como estar com Arktos novamente.
O bairro trouxa que eles moravam era um pouco afastado, quase meia hora de minha casa. Era um bairro bonito, totalmente residencial, com casas grandes e jardins perfeitos, apesar de estarem cobertos de neve no momento. Estacionei o carro em frente a casa de Lily. Antes de bater na porta, ela se abriu.
— Finalmente! — Clair me recebeu com um abraço apertado, fazendo o gato se agitar. — Oh, desculpe — ela sorriu.
— Como você...?
— Eu a vi pela janela. Não sabia que você dirigia.
— Um costume que Arktos passou para mim.
Remus foi o segundo a me cumprimentar, abraçando-me também. Peter acenou com a mão, perto da lareira, pois estava brincando com Harry. Antes que eu perguntasse pelos donos da casa, James e Sirius saíram da cozinha. Eles estavam rindo, porém o riso de Sirius morreu no instante em que ele me viu.
Desde que eu o deixara dormindo em minha casa, dois anos atrás, não nos falamos. As únicas notícias que eu tinha dele foram passadas por Lily nas raras cartas que trocamos enquanto eu viajava com Alexey. Eu não esperava que ele fosse fazer uma cena, é verdade, porém a maneira fria com que ele me tratou foi como um tapa no rosto. Com um simples aceno – que se limitou a um erguer de sobrancelhas como se eu fosse uma completa desconhecida – ele se juntou a Peter.
— E aí, garotão, vamos brincar de voar? — Sirius pegou Harry no colo, que já ria enquanto o padrinho o fazia voar como se fosse um avião.
— Ele está um menino lindo — falei para James, que deu de ombros.
— O sangue é forte, sabe?
— Começou — resmungou Remus, embora com bom humor.
Eu também sorri, fingindo que não havia acontecido nada com a entrada de Sirius.
— Onde coloco tudo isso? — perguntei, mostrando as sacolas na mão direita.
— Pode me dar, eu coloco na árvore. Lily, a Ariadne chegou! — James gritou enquanto ia em direção à arvore de Natal, ao canto da sala. — Tem bastante presente aqui...
— Fazia tempo que eu não os via, então...
— Então achou que seria melhor nos comprar com tudo isso para equilibrar com seu sumiço? — Lily falou enquanto entrava na sala. Cumprimentei-a, com saudade, sem me importar com a provocação.
— Claro que não. Na verdade, o que eu trouxe para comprar você foi isso daqui. — Peguei o gato das mãos de Clair e o entreguei para Lily.
— Ah, que gracinha! Olhe só, James.
— Eu já estava me perguntando sobre o gato — ele disse, aproximando-se da esposa. — Achei que fosse da Clair.
— E eu adoraria, vale dizer — Clair disse.
— Já tem nome? — Lily perguntou, relanceando-me rapidamente.
— Não. É fêmea — falei.
— Então será Mel. Que tal um pires de leite, Mel?
— Precisa de ajuda? — perguntei, seguindo-a, quando vi que ela voltava para a cozinha.
— Na verdade...
— Então te ajudo.
Lily me olhou com o cenho franzido para depois dar de ombros. Assim que a porta da cozinha fechou atrás de mim, ela disparou:
— Eu havia me esquecido o quão covarde você é.
— Você não é a única que me disse isso.
— Sério? — Lily sorriu, olhando-me de esguelha enquanto colocava leite em um pires para o gato. — Eu pensei que fosse a única pessoa que tentava colocar um pouco de juízo nessa sua cabeça.
— Feliz em deixar seu dia melhor — falei sarcástica.
— Dois anos sem vê-lo e você foge para a cozinha no minuto seguinte em que chega na minha casa.
— Prefiro lidar assim com meus problemas.
— Está errada. Você encara seus problemas. Ou não está dando um jeito de se livrar daquele tal de Sebastian?
— Sebastian e Sirius são situações diferentes.
— Você está certa. Um quer destruir sua humanidade por completo, enquanto o outro apenas quer te dar felicidade. Problemas totalmente diferentes.
— Lily...
— Mas, quer saber? — Ela retirou o peru do forno, colocando a forma em cima da mesa como se quisesse transpassá-la. A raiva de Lily me surpreendeu. — Não vou ficar te dando sermão. Você já é bem grandinha para saber o que quer, Ari.
— Você age como se fosse uma escolha fácil. Não é, Lily!
— É sim. Vocês se amam e poderiam enfrentar isso juntos.
— E por que eu o colocaria em risco? Por que eu reduziria a vida dele a fugir à simples aproximação de Sebastian?
— Porque é melhor enfrentar o risco e ter uma vida, do que fugir de tudo e se esquecer de ser feliz.
— A minha vida não será perfeita como a tua, Lily!
— Minha vida não é perfeita, Ariadne! Neste momento, tem um maníaco homicida procurando meu filho, e eu nem sei o motivo! Eu só sei que ele quer o meu bebê morto.
— Que gritaria é essa?
Somente neste momento que me dei conta como ficamos alteradas. Lily havia se jogado na cadeira, chorando, enquanto James se aproximava dela. Olhei para trás, vendo todos na porta da cozinha, deixando a cargo de Sirius acalmar o afilhado que começara a chorar devido aos berros da mãe. Fechei os olhos, respirando fundo.
— É melhor eu ir embora.
— Não seja idiota — Lily resmungou, levantando-se. — Você veio para um almoço de Natal e é isso que terá nesta casa. Um almoço normal e feliz.
Olhei para Lily com o cenho franzido, achando-a louca pela primeira vez em minha vida.
— Sim, pois este aqui é um perfeito cenário da felicidade — Pettigrew falou como se mencionasse o tempo. — Pontas, lembre-se de me convidar para o aniversário de um ano do Harry. Mal posso esperar. Ei, são batatas?
— Não mexa aí, Pete — Lily deu um tapinha na mão de Pettigrew.
— Ei, estou com fome! E aposto que vocês também estão, pois ninguém que tem o estômago forrado fica de mau humor. — Ele surrupiou uma batata e correu para a sala. — Batatas, Harry?
Com essa saída, Pettigrew deixou o clima da casa melhor. No entanto, em nenhum momento saiu de minha cabeça o que Lily havia dito sobre Voldemort estar caçando seu filho. Evitei este assunto até que estivéssemos sentados novamente na sala, bebendo um licor que Clair havia dado para eles de Natal. Olhei por alguns segundos para Harry, que dormia nos braços de James.
— Por quê? — perguntei, ao que todos ali me olharam. — Por que ele?
Remus afundou-se no sofá e Clair se acomodou melhor ao lado do namorado. Pettigrew levantou-se do sofá indo até a janela enquanto Sirius e James trocavam olhares conturbados. Lily olhou para o filho por um tempo para depois voltar seus olhos para mim.
— Não sabemos exatamente. Mas, por algum motivo, ele tem nos caçado. Nós e os Longbottom.
— Frank?
— E Alice. Eles se casaram e também têm um filho. Neville tem a mesma idade de Harry. — Ela sorriu. — Pensamos que isso era devido à Ordem, mas...
— Dumbledore não pôde nos informar melhor — disse James.
— Por que não?
James apenas deu de ombros.
— Esse bairro trouxa está sendo um bom esconderijo para nós. Moramos aqui desde setembro, quando descobrimos que Harry corria perigo. Na verdade, esta é a primeira vez que recebemos visita.
— Pelas calças de Merlin...
Todos olhamos para Pettigrew quando ele falou aquilo. Não que sua frase estivesse fora de contexto, mas sim pelo tom. Ele estava assustado.
— Rabicho, o que... — Sirius falou, levantando-se, mas o amigo o interrompeu, olhando-nos apavorado.
— Comensais da Morte. No jardim.
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
NA: Sim, a fic está chegando ao (primeiro) ápice. Como eu havia dito em meu perfil aqui do FanfictionNet, pretendo chegar com essa fic até a parte em que Sirius passa pelo Véu da Morte. Honestamente, pensei que não passaria do capítulo 30, mas devido a algumas enrolações que fiz anteriormente (que minha beta até quis me bater..hehe), a história acabou ficando imensa. Portanto, se ela alcançar os 40 capítulos não se assustem! Rsrsrs.
Já recebi o capítulo 29 da Pri, portanto, assim que eu arrumar o capítulo com as dicas dela, posto também.
Duda, você é uma querida! Se eu te der o Alexey, a coisa não vai rolar muito bem entre você e a Aimèe..rsrs. Quanto à capa... Mande-me por e-mail! É liviacavalheiro ARROBA gmail PONTO com. Tem que fazer separado, pois o FanfictionNet engole links, esse feio. Já histórias de comédia... Eu sou melhor escrevendo ironias e sarcasmos do que comédia em si... Na verdade, eu amo escrever um drama! Mas não digo que nunca escreverei comédias, pois isso é algo que não faço, ainda mais no que diz respeito a escrever..hehe. Espero de coração que você tenha gostado deste capítulo. E logo virá o próximo, talvez já no fim de semana. =) Beijo.
Até o próximo.
Lìvia.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!