Natal em Família



O vento da noite gelada de dezembro batia na janela de madeira do antigo quarto de Gina Weasley n’A toca, onde dormiam Rose e Lílian. As duas dividiam um beliche antigo, que rangia a cada remexida das duas. Lílian suspirava alto com o rosto escondido pelos cabelos vermelhos, coberta até o pescoço.


Rose tinha as mãos embaixo do rosto, sentindo um vento familiar atingir seu rosto. Não era o vento que entrava pelas frestas da janela. Era um vento com ares de água. Como aqueles ventos que sopravam perto de lagos e mares. Ela sentiu o cheiro que se sentia em floresta invadir suas narinas. Ar puro.


Colocou-se de barriga para baixo, amassando a bochecha no travesseiro, inconscientemente se vendo em um ambiente familiar. Ela andava com calma pela beira do lago de Hogwarts. Sentia o ar puro chegando às suas narinas com mais intensidade. O vento balançava seus cabelos. Ela sentia a terra lamacenta sujar seus sapatos. Foi obrigada a levantar o vestido pesado que usava.


Eu não uso vestidos compridos, pensou, olhando para baixo, sentindo as mechas do cabelo preto e liso caírem no rosto. Eu não tenho cabelos pretos, ela lembrou a si mesma, olhando ao redor. Não pode ser eu!


Ao longe, ela podia enxergar Hogwarts, um simples castelo, ainda sem tantas torres e sem movimento algum. Era uma época distante da sua. Ela voltou-se para seu caminho. Um caminho que desconhecia, estava apenas indo aonde seus pés a levavam. Parou na beira do lago e levou a mão ao peito.


Respirou fundo sentindo a agonia lhe invadir. Não enxergava seu rosto, mas sabia que se tivesse um espelho em mãos, enxergaria os olhos tristes e desamparados. Não sabia por que se sentia assim, mas se sentia triste, desamparada. Cerrou os olhos e tocou os dedos da mão direita com a esquerda.


Um único anel de destacava entre os dedos finos. Um anel calomboso com uma grande pedra no interior de uma disforme espiral. Ela abriu os olhos, colocando os pés na água gelada. O anel brilhava intensamente nos dedos trêmulos. Ela abriu os olhos, sentindo lágrimas pesadas lhe saírem diretamente da alma ao retirar o anel com cuidado.


Sentiu-se fraca de repente. Sua visão ficou turva, mas não era culpa das lágrimas. Seu campo de visão ficou estreito e limitado, mas mesmo assim, ela se manteve em pé e puxou a varinha de dentro do vestido, mais pesado ainda por causa da água. Segurou firme o anel na mão esquerda, enquanto apontava com a varinha para o interior do lago.


Recitou uma série de palavras em latim que nem mesmo ela conseguia entender. Piscou os olhos com certa dificuldade, sentindo-se mais fraca. Parecia que estava definhando. Não poderia duvidar se suas roupas ficassem largas ou seu rosto mais fino. Não precisava se alimentar. Tinha a energia que precisava. Até agora.


No instante em que terminou de recitar as palavras, as águas do lago se contorceram, abrindo-se em um redemoinho nervoso. Ela sorriu, enquanto abria a mão esquerda, encarando pela última vez seu anel em espiral. As águas soavam estranhamente enquanto o anel era jogado, pelas mãos da dona, no interior do redemoinho.


Ela não agüentou muito tempo em pé, mas soube, ao ver que o redemoinho de fechava, que sua prisão tinha chegado ao fim. Ela se sentiu desmoronar. Seus olhos se fecharam e em segundos ela não estava mais consciente. Ouviu ao longe a voz da filha clamando por ela.


Eu não tenho filha, Rose se horrorizou, abrindo os olhos rapidamente.


 


===


Lílian levantou do beliche, coçando os olhos e tentando fazer o mínimo barulho possível, o que não adiantou em nada. As madeiras barulhentas da cama rangeram como se estivessem sofrendo com o peso dela. Ela espiou a cama superior, onde a prima estava deitada com a cabeça enterrada no travesseiro. Lílian não sabia que Rose não estava dormindo. Parecia não precisar mais dormir.


Aquela não era a primeira noite em que se mantivera de olhos fechados por apenas algumas horas. Seu corpo estava de excelente saúde, mas ela quase não dormia e quase não comia. Também sentia como se não precisasse mais comer. Seu estomago estava sempre recheado e nenhum prato de comida, por mais apetitoso que fosse, lhe deixava com fome.


Lílian se arrastou para fora do quarto, enrolando-se em um casaco de lã, enquanto Rose tomava fôlego para se levantar. Não devia ser muito tarde, mas provavelmente a família toda estaria acordada. Talvez recebendo os outros filhos de Molly e Arthur que chegavam para o almoço natalino.


Rose desceu a tempo de ver os tios Fred, Gui e Carlinhos espalhados pela sala, antes de a Sra. Weasley berrar pelos netos que ainda dormiam. Carlinhos estava sentado ao lado de Rony perto da lareira com uma grande taça de vinho nas mãos. Gui e Fred cumprimentavam Harry, Gina e Hermione no outro canto da sala, enquanto os filhos corriam escada acima.


Freddy e Dominique quase atropelaram Rose enquanto corriam em direção ao quarto dos meninos para acordá-los. A menina colocou-se ao lado de Lílian na sala de estar, depois de estender a mão e receber abraços da grande família que a cercava. Nunca a casa dos Weasley esteve tão cheia.


- Primeiro natal com toda a família reunida em cinco anos, hein? – Tiago observou, sentando-se ao lado de Rose, como que fazendo eco aos seus pensamentos.


- É um progresso, com certeza! – Ela respondeu, sorrindo.


Ele tomou um gole da caneca de café que trazia em mãos.


- Chamou seu namorado?


- E você chamou a sua? – Ela provocou.


- A família da Ami não tem um passado tão grave, prima.


A intenção de Tiago não era a de parecer uma provocação. Tinha a intenção de brincadeira, como tudo que ele fazia, mas para os ouvidos já cansados de Rose, aquilo parecia mais com uma afronta. Ela cerrou os dentes.


- Depende pra quem, primo – Usou de toda a raiva que tinha. – Às vezes, uma ex-namorada linda é mais perigosa do que um comensal arrependido e reformado.


Tiago ergueu as mãos, largando a caneca no colo. Seus olhos se arregalaram e era mais do que óbvio que ele não ficara surpreso e nem um pouco atingido ou chateado com a resposta dela. Ele quase entendia o que ela passava.


- Fui vencido!


Rose levou a mão à testa, cerrando os olhos.


- Desculpe.


- Tudo bem, eu procuro entender.


- Você não tem como entender – Ela o encarou fundo.


- Isso não é único no mundo, Julieta.


Não era a primeira vez que ouvia aquela comparação.


- Julieta – Ela repetiu, balançando a cabeça. – Essa comparação é ridícula.


- Só peço para que você não se mate, certo?


- Ridículo de novo!


- Ah, esqueci de comentar na escola – Ele disse, se levantando. – Belo anel.


Rose rolou os olhos, encarando o anel em seu dedo. Demorou-se fitando as pedras da espiral, mas acabou acatando os pedidos da avó, que os chamavam loucamente para a mesa. A mesa de jantar ficou pequena para os tantos membros da família, então os jovens se viram obrigados a sentar dos sofás e cadeiras espalhados pela sala. Metade deles conversava sobre aulas e Hogwarts.


Na outra metade, que envolvia os mais novos falavam sobre possibilidades de vida eterna. O assunto era meio ridículo na verdade e Rose acabava rolando os olhos ao ouvir cada possibilidade boba e improvável que eles inventavam.


- Tiago, como se vive para sempre? – Lílian perguntou, atraindo a atenção do irmão, que falava sem parar com Freddy.


- Sei lá.


- Você está acabando a escola, deve saber! – Ela insistiu.


- Hm – Ele pensou, gesticulando com o garfo. – Deve haver algum tipo de feitiço.


- Algum artefato talvez? – Chutou Molly, do outro lado da sala.


- Talvez.


- Mas – Alvo começou, demorando-se na palavra. – Isso seria boa magia?


- Se isso seria magia negra ou branca? – Hugo colocou.


- Visão preconceituosa. – Victoire alertou, sentada a mesa, virando a cabeça.


- Se isso seria magia das trevas? – Hugo recolocou.


- Então, para ficar mais interessante. Traduzindo em uma pergunta... – Ted comentou, ao lado de Victoire, mas ela o interrompeu.


- Você sabe a resposta, antes de tudo?


- Não, por isso é para ficar mais interessante!


- Não sabe mesmo? – Ele sacudiu a cabeça, negativamente. – Continue.


- Qual artefato ou feitiço relacionado às artes das trevas pode dar vida eterna.


Todos ficaram em silêncio, inclusive os adultos na mesa de jantar, que viraram a cabeça, curiosos ao assunto dos jovens. Harry apertou os olhos. Ele sabia que existia. A voz de Rose foi a única a encher a sala. Ela encarava seu prato de comida em seu colo, remexendo as batatas com a faca e levando pedaços já cortados de carne à boca.


         - Uma horcrux. – Ela disse, falando com a boca cheia. – Partilha sua alma em pedaços e os prende em objetos ou pessoas que o autor estima. A cada horcrux, um assassinato cometido pelo autor. Enquanto os objetos ou as pessoas em que as partes da alma do autor estiverem trancafiadas viverem, o autor também viverá. Eternamente.


O silêncio voltou a tomar o cômodo amplo, fazendo com que os barulhos do lado exterior fizessem eco lá dentro. O vento zunia através da madeira da casa. Todos os olhares estavam dirigidos à Rose, mas ela não ergueu os olhos até perceber que tudo estava muito quieto. Ela encontrou os olhares em pânico.


- O que?


- O que você disse? – Harry perguntou, boquiaberto.


- O que? – Rose franziu o cenho, confusa. Estava acontecendo novamente.


- Você acabou de nos dar uma aula sobre horcruxes! – A voz de Hermione falhou ao terminar a frase. Os olhos dela estavam perdidos nas órbitas.


- Como você sabe sobre horcruxes? – Harry se colocou em pé.


- Horcruxes? – Ela largou o garfo no prato com um tilintar.


- É.


- Eu não sei.


- Como não? – Hermione esganiçou-se.


- Não sei – Rose sentiu as lágrimas chegarem aos seus olhos. – Não sei.


- Rose, isso é muito cruel! Você não deveria saber nada sobre isso!


- Mãe – Ela sussurrou, trêmula.


- Eu preciso de uma explicação, Rose Weasley!


- Eu não tenho nenhuma.


- Você perguntou a alguém? – A mãe cogitou. – Algum professor?


- Talvez ao namorado dela – Hugo comentou, com um tom de escárnio.


Rose girou os olhos turvos para ele.


- Isso não tem nada a ver com Scorpius! – Ela murmurou, por entre dentes.


- Tem a ver com o que, então? – Hermione segurou os ombros dela.


Os olhos da mãe estavam na altura dos olhos dela. Podia ver o mesmo tom de castanho e as mesmas linhas obliquas. Hermione estava transpirando pavor, mas não podia fazer nada além de gritar e querer arrancar a verdade a força da menina. Rony estava com os olhos arregalados e as orelhas muito vermelhas.


- Eu não sei.


Rose sussurrou devagar, livrando-se dos braços da mãe e correndo escada acima até o quarto que dividia com Lílian. A prima não subiria tão cedo. Rose tinha os olhos turvos, mas as lágrimas não desciam. Ela respirava muito rápido. Muitas vezes, o ar parecia não querer ser sugado por suas narinas e ela engasgava, voltando rapidamente ao normal.


Andava de um lado para o outro, por vezes cerrando os olhos e tropeçando nas tábuas do piso de madeira crua. Suas mãos se remexiam nervosamente, por vezes, secando o suor frio que vertia pelo seu rosto torcido de pavor.


Ela não estava isenta de sentir pavor. Como poderia estar dizendo coisas sem se dar conta? Não era a primeira vez que as pessoas ao seu redor tinham aquele tipo de reação. Como poderia simplesmente não se dar conta do que falava? Não era possível que por duas vezes, as pessoas ao seu redor tivessem um lapso estranho e virassem as culpas para ela.


- Por Merlin - Ela sussurrou, tropeçando em uma tábua do chão.

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Comentários (2)

  • tamires wesley

    iiiiii misterios rondam rose wesley..kkkk.. pow hermione pego pesadinho em.. \0/

    2012-07-27
  • Lana Silva

    Hum...Ela tá começando a descobrir que tem algo errado perfeiiiiiiito nossa a Mione é rigida demaiiis :@

    2011-09-27
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