Reencontro




Eu sabia, ao pegar um ônibus para a escola no dia seguinte, que a sorte não estava ao meu favor – Não que eu acredite em sorte. Porque eu particularmente, não acredito. – Mas por falta de termo melhor, eu me sentia a pessoa mais azarada do mundo. Era ridículo e infantil pegar um ônibus quando a escola ficava tão perto de casa. Eu estava evitando, porém, qualquer contato com as ruas daquela cidade. Ok, eu estava – para ser mais específica- evitando á casa ao meu lado direito.

Mal sabia eu, no entanto, que acabaria encontrando-o o mais rápido que esperava. E eu não estava preparada.
Encontrei a Luna no portão da escola, que estava preocupada, e me fazia uma série de perguntas, que ecoavam vagamente na minha mente, mas eu não estava prestando 
atenção.

‘’Porque não veio andando comigo? Onde se meteu? Fiquei esperando horas por você! Porque não me avisou que pegaria um ônibus? Porque não me chamou para ir com você? Eu fiz alguma coisa de errado?’’

- Não – respondi vaga, caminhando lentamente para acompanhar seus passos 
– Só precisava de um tempo para mim, mesmo que seja menos de dois minutos de ônibus de casa até aqui. Prometo que amanhã venho com você. No meu carro até, se você quiser. -
Agora, porém, ela que parecia não estar me ouvindo. Suspirei, e revirei os olhos, querendo um pouco de atenção. Não que eu pudesse exigir alguma coisa, é claro, sendo que ninguém era mais desatenta do que eu.

- Você sabe, não sabe? – ela perguntou. Sua voz não passava de um sussurro. Concordei com a cabeça, tentando parecer forte. Eu sabia, no entanto, que o modo nervoso que eu mordia o lábio inferior me entregava. Eu tinha mudado de casa, comprado um carro, e tinha até arranjado um namorado. Eu estava seguindo em frente, finalmente, depois de três anos. Só Deus (e a Luna) sabiam o quanto tinha sido difícil pra mim. O quanto eu ficava na porta do apartamento, esperando o dia todo que ele voltasse rindo,dizendo que tudo não passava de uma brincadeira, e que ele nunca me deixaria. Ficava horas no telefone esperando uma ligação. Checava meu e-mail pelo menos vinte vezes por dia.

Foram quatro longos anos. quatro anos de dor, tristeza, solidão. Anos em que eu me perguntava todos os dias o que havia feito, porque ele tinha partido. Anos esperando uma notícia, sem saber o que poderia ter acontecido – e no fundo, sem querer saber também-. Anos em que eu gritava para quem quisesse ouvir que ele iria voltar, e que tudo não havia passado de um mal entendido.

E de fato, ele havia voltado como em todos os meus sonhos – e até pesadelos. Era covardia, no entanto. Eu tinha desistido de tudo, e agora reconstruía minha vida. Quase como se soubesse que eu estaria bem, no entanto, ele havia voltado. Era quase como se ele quisesse destruir tudo que eu havia construído com cada pedra que ele deixara para trás. 

Luna me abraçou. Eu sabia, ela sabia, aquele gesto valia mais do que qualquer palavra que pudesse ser proferida. Até porque nada naquele momento faria com que eu me sentisse melhor. Eu queria que ele fosse embora. Eu queria que ele partisse que me deixasse viver a minha vida em paz e que levasse consigo cada memória, cada sentimento. Ele estava derrubando a parede que eu tinha demorado tanto tempo para construir. A parede que me separava dele. A parede na qual ele não me deixou escolhas quanto construí-la ou não. No final, era eu que colhia tudo, que me machucava. 

O sinal tocou, e andamos silenciosamente para a primeira aula – da qual tínhamos juntas. Eu gostava de Física. Naquele dia, no entanto, eu realmente não estava prestando atenção. Fiquei escrevendo um texto qualquer no meu caderno, e antes que pudesse perceber, eu havia feito uma música. Assim que escrevi á última frase da música, minha atenção foi desviada para Luna, que olhava petrificada para mim, como se verificando que eu estava realmente bem.
Fiz uma cara extremamente confusa, que se desfez em compreensão assim que olhei para porta. Ele estava ali.

Parado a pouco menos de três metros de mim, sorrindo para o professor, e perguntando se podia entrar. E se eu tivesse forças o suficiente para responder á muda pergunta de Luna, seria não. Eu não estava bem. Minhas pernas tremiam, e meus lábios estavam secos. Ele não tinha mudado praticamente nada – percebi, para o meu desespero. Era ele. Seus cabelos estavam um pouco mais curtos, ele parecia maior também, mas forte, ele era um homem formado agora. 
E então, seus olhos me encontraram.

Eu estava em desespero, meu corpo tremia, minha voz havia desaparecido (e eu tive a certeza de que se pudesse, teria dado um grito ali mesmo). Eu não sabia como reagir, o que fazer. Esconder-me, talvez, fazer com que ele não me notasse. Pular da janela, quem sabe? Fiz uma careta com o último pensamento infantil.

Eu queria fugir dali, eu queria que ele voltasse para onde quer que ele tivesse. Eu o queria distante. Mentira.
Era ele, era ele, era ele, era ele, e alguma parte tola e inútil de mim, parecia gostar de vê-lo novamente. Sua beleza era como cócegas para meus olhos, era prazerosamente torturante, e doía quando era de um modo exagerado. Doía quase sempre. Era bonito demais para ser real.

Rezei para que conseguisse escapar, para que ele não me olhasse. Como se eu estivesse pedindo alto demais, seus olhos encontraram os meus. Senti uma onda de choque desconhecido passar pelo meu corpo no mesmo segundo, e alguma coisa me impedia de desviar o olhar. Assim que ele se sentou na única carteira vazia no fundo da sala – não muito distante de mim – eu me levantei.


- Não estou me sentindo bem – informei ao professor, surpresa quando as palavras saíram com dificuldade da minha boca. Eu estava falando. De algum modo, eu conseguia encontrar as palavras certas. O professor acreditou assim que olhou para o meu rosto. Imaginei que devia mesmo estar com uma cara péssima. Ele me entregou um cartão que informava que eu estava dispensada da aula, e eu deixei meus pés me guiarem até o jardim da escola, o único local onde nenhum professor, funcionário, ou aluno me encontraria. Eu devia ter ido para a enfermaria, eu sabia disso. Mas não me importava de pegar uma detenção, não no momento.

Corri quando me aproximei do local, e caí no chão, deixando as lágrimas jorrarem livremente. Não sei quanto tempo fiquei deitada, sentindo meu rosto contra a grama, até uma mão quente segurar meu ombro, me obrigando a ficar sentada.

Corri quando me aproximei do local, e caí no chão, deixando as lágrimas jorrarem livremente. Não sei quanto tempo fiquei deitada, sentindo meu rosto contra a grama, até uma mão quente segurar meu ombro, me obrigando a ficar sentada.
Ainda de olhos fechados, só os abri quando tive certeza de que não era ele. Eu reconheceria seu perfume de quilômetros.

- Mione? Você tá bem? – perguntou. Era Pierre, meu namorado, e do lado dele, Luna me olhava como se eu fosse desmaiar – e talvez eu fosse mesmo.
Não respondi a pergunta de Pierre por um momento. É claro que eu não estava bem!

-Estou ótima – menti – Foi só uma dor de cabeça, só isso, mas já estou melhor. – De certa forma, tinha sido uma dor de cabeça,
Por isso não me senti culpada por mentir (ou melhor, omitir). Seus olhos, porém, pareciam tristes quando ele fitou meu rosto manchado de lágrimas. Ele parecia saber exatamente que a minha dor de cabeça de chamava Harry Potter.

- Eu sei que você está assim por causa... Dele, Mione. Tá tudo bem, achei que você já tivesse superado isso. – a cada palavra, eu me sentia pior e mais culpada. Talvez o problema não fosse exatamente a volta dele,

Talvez, o problema fosse eu. Talvez o problema fosse o sentimento que eu tinha por ele, a única coisa que eu desejava ter ido embora com ele. Amor

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.