Sem saída



As robustas gotas de água fria despejadas violentamente do céu sobre a cabeça de Harry e Gina eram torturantes. Enquanto o sistema imunológico deles era cada vez mais desgastado, os dois corriam contra o tempo para chegar o mais rápido possível à cachoeira, onde esperavam contar com o abrigo de algum morador da vila. Se não fosse pelos raios, as árvores seriam uma boa escapatória para se proteger da tempestade, porém ambos sabiam que as mesmas eram uma bela atração para trovões e raios, de modo que se abrigar sobre sua proteção era suicídio.
Em meio às horríveis condições em que se encontravam, uma boa notícia nascia gradualmente: eles estavam chegando perto da cachoeira, pois além de as cerejeiras estarem diminuindo consideravelmente, já era possível ouvir a mesma escorrendo furiosamente por sobre o riacho que entrava em choque com a chuva. O som das cataratas estava se sobrepondo ao estrondo sufocante dos raios que piscavam e se debatiam na escuridão do céu.
- Harry! - exclamou Gina com a voz fraca e sem fôlego devido ao fato de eles estarem correndo e sendo atingidos por uma tempestade impiedosa ao mesmo tempo – Estamos chegando! Você consegue ver algum abrigo para nós?
- Ainda não. - respondeu ele sentindo uma forte dor de garganta – Teremos que ir até a beira da cachoeira para conseguirmos procurar um abrigo!
Eles não haviam parado de correr nenhum segundo desde que a tempestade começara, porém Harry não conseguiu não parar e analisar rapidamente a expressão de Gina. A garota estava pálida e quase anêmica, sem contar sua feição infeliz e doente. Harry tinha vontade de juntar toda a força que tinha e colocar Gina sobre o ombro que não estava ocupado com Neville, porém ele sabia que não conseguiria, pois o amigo já estava estourando suas costas de modo que seu corpo ficasse dormente, e apesar de Gina ser muito mais leve, Harry iria acabar se machucando seriamente devido a tanto desgaste físico, e, na pior das hipóteses, ele poderia até morrer.
- Harry, está tudo bem? - gritou Gina parando de correr por um instante e indo ver o porquê de o garoto ter cessado – Precisamos correr! Eu sei que você consegue aguentar mais um pouco!
Harry assentiu e voltou a correr, ainda tentando se desvencilhar da tentação de carregar Gina, só para que ela se sentisse melhor, mesmo que ele tivesse de se sacrificar.
Quando finalmente chegaram até a cachoeira, ambos já estavam no limite de seus esforços físicos e esperavam que tudo começasse a dar certo a partir daquele ponto. Harry vislumbrou aquela grande quantidade de água que despencava e se debatia contra um rio tão negro quanto aquele que enfrentara para conseguir a falsa horcruxe de Voldemort, e não viu nada de muito positivo naquela cena. Eles estavam rodeados por árvores que já não faziam mais parte da plantação de cerejas e que fechavam todos os lados, fazendo com que eles, também devido à escuridão, não soubessem mais qual era o caminho de volta.
- Agora você consegue ver algum abrigo? - perguntou Gina com os dentes trincando.
Harry não havia procurado por um abrigo ainda, de modo que começou a perpassar seu olhar atento por toda a área com a esperança de encontrar ali algum sinal de luz vindo de um lugar provavelmente habitado. No entanto, ele não achou absolutamente nada de luz nem de algo parecido com habitação.
- Gina, - murmurou ele já se sentindo a beira da morte, porém temendo a mesma mais para Gina e Neville do que para si próprio – Não há nenhum abrigo aqui.
- Como assim não há nenhum abrigo aqui? - bradou ela não acreditando no que estava ouvindo – Mas você disse que...
- Eu estava errado! - gritou ele com raiva de si mesmo – Eu me enganei e agora todos nós vamos morrer!
- Não! - gritou Gina em negação – Não pode ser! Eu vou achar uma saída, eu... - Ela não conseguiu terminar a frase, pois começou a se sentir tonta e uma dor de cabeça alucinante a consumiu, fazendo-a cair sobre os pés de Harry como se estivesse tendo uma convulsão.
- Gina! - gritou Harry se desvencilhando rapidamente de Neville e abraçando a amada – Você tem que aguentar, você não pode... - Em meio ao sofrimento e a possibilidade de perder Gina, ele sentiu seus pensamentos se embaralharem e a cicatriz começar a latejar. Os estampidos dos raios, da tempestade e da cachoeira sumiram junto com a vista da realidade em que se encontrava. Agora Harry estava sentindo seu corpo em contato com a grama fria e molhada e estava se incomodando com os pingos de chuva que caiam sobre o seu corpo escamoso. Ele era uma cobra e estava rastejando ao lado de uma cachoeira em direção a uma grande pedra que possuía uma abertura espaçosa o bastante para um humano atravessar, algo como uma caverna. Harry ansiava por alcançar aquela abertura o mais rápido possível e se livrar das sensações agonizantes que estava sentindo, e, quando finalmente ele sentiu suas escamas parando de se arrastar pelo feno e passando a entrar em contanto com um chão quente e confortável, ele se esqueceu de toda a tempestade lá fora e começou a sentir suas forças sendo renovadas novamente.  Sua língua bífida já começava a sentir o doce ardor do recinto para qual a abertura que ele estava entrando chegava.
- Harry, eu sinto muito, mas acho que não vou conseguir... - Harry não deixou Gina terminar de falar, pois ele voltara a enxergar e ouvir tudo que se passava a sua volta, e a sensação de que havia uma saída para longe dos braços da morte renovou suas forças e suas esperanças, mesmo sem ele ter entendido de fato o que acabara de acontecer. Ele levantou Gina e a colocou sobre o seu ombro direito, fazendo o mesmo com Neville, só que sobre seu ombro esquerdo. Ele sabia que aquilo poderia matá-lo, porém não havia alternativa. Ignorando a interminável dor que sentia, Harry fechou os olhos e visualizou o caminho seguido pela cobra até a abertura na pedra e começou a percorrê-lo. Ele ainda estava com os olhos lacrados quando começou a caminhar, pois naquele momento, Harry não precisava deles, o garoto só precisava de sua memória fotográfica para chegar até o local e sua confiança para acreditar que podia. Cada vez que sentia seu sapato em contato com a grama, Harry lembrava-se de seu momentâneo corpo escamoso se arrastando pela mesma, e de repente, era como se ele soubesse para qual lado deveria ir e qual caminho deveria seguir. Astuciosamente, Harry foi dando um passo de cada vez com a ajuda de sua intuição. Ele sentia a cachoeira ao seu lado e ela o atraía como se fosse um abismo, porém o garoto ignorou-a assim como estava fazendo com a sua dor. Quando sentiu que aquele era o último passo que deveria dar, abriu os olhos e se encontrou em frente a uma abertura localizada no centro das imensas pedras que formavam o caminho até o centro da cachoeira. Harry não conseguia enxergar muito bem de onde vinham aquelas pedras e nem para onde elas davam. No entanto, aquilo não importava agora, de modo que ele tirou Gina de seus ombros e a empurrou para dentro da abertura, fazendo o mesmo com Neville logo em seguida. Por último, Harry penetrou naquele lugar desconhecido, mas ao mesmo tempo familiar, e foi tomado por uma onda de calor e conforto.


 - Thiago, - chamou Lilian do andar de cima – suba até aqui um minuto! - Ela segurava Harry nos braços e tentava fazê-lo dormir balançando-o de um lado para o outro e cantando uma antiga canção de ninar. Os passos pesados de Thiago começaram a aumentar gradualmente até que ele já estava na frente de Lilian com toda a prontidão que uma pessoa poderia ter àquela hora da noite.
- O que houve? - perguntou ele atônito devido ao fato de ter subido apressadamente as escadas.
- Preciso que você segure Harry por um instante, - explicou ela tentando passar o bebê de seus braços ágeis e confortáveis para os braços desajeitados do marido – tenho que fazer a mamadeira dele.
- Tudo bem, - respondeu Thiago não muito confiante quanto às suas recentes habilidades como pai – mas eu acho que ele não me quer, Lilian.
- Faça com que ele queira. - rebateu ela tentando se desvencilhar carinhosamente do filho.
- Vou tentar, - assegurou Thiago – mas pense bem meu amor: quem trocaria você por mim? Só um bebê burro, o que não é o caso do nosso filho.
Os dois começaram a rir da situação. Decididamente, Harry não estava muito disposto a trocar de colo, mas ele também não se daria o luxo de ficar sem sua tão adorada mamadeira.
- Certo então, - concluiu Lilian – você terá de fazer a mamadeira dele.
- Acho que isso já está ao meu alcance. - comentou Thiago sorrindo. Ele deu um breve beijo em sua mulher e logo em seguida, desceu para cumprir seu papel de pai, mal ele sabia que isso duraria tão pouco tempo.


Harry acordou de seu sonho atordoado e confuso, pois na verdade, ele nem sabia que havia adormecido. Quando abriu os olhos, a primeira coisa que encontrou foi uma Hermione desatando em lágrimas e chamando por seu nome desesperadamente.
- Harry! - gritava ela - Por favor! Acorde!
- O que aconteceu? – perguntou ele se levantando de onde estava deitado e já sacando sua varinha. Harry estava muito agitado, por isso, até ele conseguir perceber que estava seguro no local em que se encontrava, levou tempo suficiente para Hermione parar de chorar e ir abraçá-lo aliviadamente, seguido por Rony e Luna.
- Harry, que susto que você nos deu! – comentou Rony visivelmente feliz por estar desabafando – Pensávamos que iríamos te perder, cara.
- Mas o que aconteceu? – perguntou ele confuso, afinal, o fato de Hermione, Luna e Rony estarem ali a sua frente era maravilhoso, porém o garoto não fazia a mínima ideia de como aquilo poderia estar acontecendo, ainda mais no lugar em que eles estavam.
Enquanto Hermione e Luna se entreolhavam para saber quem contaria a história, já que Rony não era o mais apto para tal ato, Harry sentiu uma sensação estranha de que estava esquecendo-se de alguma coisa. No entanto, a vontade de saber o que estava de fato acontecendo era maior, de modo que ele voltou sua atenção para os amigos.
- Bem, eu e Rony estávamos esperando você e Hermione no lugar em que havíamos combinado, até que nós decidimos ir atrás de vocês. – explicou Luna forçando sua memória para se lembrar exatamente de como tudo acontecera – Mas nós acabamos encontrando Hermione e Fred no caminho e eles nos explicaram o que estava acontecendo na ida para a cachoeira. – Ela demonstrou grande pesar por tudo que ouvira da história com um breve gesto com a cabeça - Quando estávamos quase chegando, começou a chover e nós corremos até a cachoeira, só que chegando lá, não encontramos nenhum abrigo e muito menos vocês. Então todos entraram em pânico, afinal, estava caindo uma tempestade horripilante em cima de nós! Ninguém sabia o que poderíamos fazer e eu estava tão desorientada quanto qualquer um deles, até que de repente, eu avistei, no meio daquela escuridão toda, um filhote de Testrálio adentrando neste lugar aqui, então sugeri que o seguíssemos. Claro que ninguém estava acreditando em mim, até porque nenhum deles vira o filhote e isso nem seria possível, mas na falta de outra opção, aceitaram a minha história e agora estamos aqui. O estranho foi que eu nunca mais encontrei o Testrálio, talvez ele tenha adentrado mais para fundo dessa caverna.
- Assim que entramos aqui, foi como se nós nunca estivéssemos estado sobre uma tempestade, pois tudo aqui é quente, confortável e... curador! Ao pisarmos nesse solo, já estávamos curados de qualquer eventual problema que pudesse aparecer! – continuou Hermione, ainda perplexa com tudo que lhes havia acontecido – Nós conversamos brevemente sobre essa sensação boa e estranha que estávamos sentindo, mas aí do nada apareceram você, Gina e Neville aqui e nós ficamos muito...
- Gina! – interrompeu Harry finalmente lembrando-se do que estava esquecendo – Neville! Onde eles estão? Eles estão bem?
- Sim, eles estão bem, só precisam se recuperar um pouco... Fred está ali atrás com eles, - respondeu Hermione impaciente para continuar a história – mas o caso é que nós ficamos muito intrigados com o fato de vocês terem...
Harry não ficou para ouvir o resto da história, ele nem se importava mais. O garoto foi direto para o fundo da caverna para ver como estavam seus amigos. Assim que avistou a cabeleira ruiva de Fred, correu até ele e sentou-se ao lado de Gina, que estava recostada em uma pedra. A garota estava com a aparência muito melhor do que a de antes, mas ainda parecia extremamente cansada e alguns ferimentos ainda eram visíveis.
- Como está? – perguntou ele colocando a cabeça dela em cima de suas pernas – Eu fiquei tão preocupado, pensei que poderia perdê-la...
- Não se preocupe Harry, - pediu ela suavemente – estou me sentindo bem agora. E tudo graças a você, é claro.
Ele sorriu com a notícia e afagou o rosto da amada. Ao lado dela estava Neville, que apesar de possuir um pedaço de camiseta enrolado no braço esquerdo e na perna direita para estancar o sangramento, parecia estar com um humor excelente.
- Olá Harry! Fico feliz em ver que está bem... - disse ele sorridente – A propósito, você não tem ideia o tamanho da minha gratidão por você, pois são muito poucos os que fariam o que você fez. Eu só queria que você soubesse que eu te agradeço muito por ter me levado e tudo mais.
- Eu fiz o que devia fazer e o que você teria feito também. – respondeu Harry retribuindo o sorriso calorosamente.
- Harry! – chamou Hermione – Eu quero te contar o final da história, você vai demorar muito?
- É minha impressão ou você está fugindo dela? – brincou Fred.
- Bem que eu gostaria! – respondeu Harry tentando parecer descontraído, mas a verdade era que ele estava muito nervoso com tudo que havia acontecido, principalmente com a parte em que ele se sentiu no corpo de uma cobra que, coincidentemente, estava indo para o lugar que salvaria a sua vida, de Gina e Neville, e o lugar em que, coincidentemente, ele encontraria seus amigos.
- Mas nem tudo acabou tão bem no final das contas, não é? – comentou Neville triste.
- Como assim? – perguntou Harry realmente desentendido.
- Não sei se você percebeu Harry, mas Jorge não está entre nós... – respondeu Fred tentando esconder o grande sofrimento que estava sentindo devido ao fato de o irmão não estar presente – Sabe-se lá onde ele pode estar agora ou por o que pode estar passando!
- Jorge! – exclamou Harry - Precisamos encontrá-lo! – declarou ele se levantando do seu lugar  – Eu vou lá fora e consigo achá-lo.
- Se você não se sentar agora, vai se arrepender de ter nascido. – disse Gina muito séria, ela não parecia estar de brincadeira – Você quer morrer? Pois se sair para a rua com uma tempestade dessas acontecendo é o que mais cedo ou mais tarde irá acontecer com você.
- É, Harry... - concordou Fred – Nem pense em ir atrás do Jorge com o tempo que está lá fora. Além disso, tenho certeza que meu irmão não está numa pior, afinal, nós somos gêmeos, ou seja, ele deve ter herdado algum tipo de inteligência suprema de mim.
- Nem convencido! – reclamou Gina – Mas o caso Harry, é que se você não tirar essa ideia estúpida da cabeça, vai se ver comigo, pois todos nós sabemos que Jorge não poderia estar numa situação pior do que a que nós estávamos minutos atrás. Falando nisso, como foi exatamente que nós saímos dela? A última coisa de que eu me lembro é você carregando eu e Neville e nos colocando aqui para dentro.
Harry não sabia se estava pronto para dizer o que acontecera ou até mesmo tentar refletir sobre o assunto. Tudo era tão estranho e ocorrera tão rápido. Eles estavam tão perto da morte e agora já estavam ali saudáveis e curados. O garoto sabia que as respostas viriam, pois elas sempre chegavam, mas em seu determinado tempo. Ele estava muito confuso e não sabia nem no que pensar, muito menos no que explicar.
- Sabe Gina, nem eu sei direito o que aconteceu... – começou a enrolar ele – E, além disso, é muito complicado e confuso de entender, nem eu mesmo vejo muita lógica no que...
- Tudo bem Harry, - interrompeu Gina calmamente – você não precisa contar se não quiser. O importante é que estamos aqui.
Harry já ia começar a dar mais desculpas, porém o olhar de Gina foi compreensivo e silenciador, espalhando a segurança de que o que aconteceu poderia ficar guardado só com ele próprio.


Todos dormiam rodeados pela escuridão e pela insegurança provinda dela, pois apesar de o lugar em que eles se encontravam ser muito acolhedor e até mesmo protetor, os ruídos impertinentes da tempestade faziam tremer até aqueles que, em estado de sono, estavam inconsciente. Harry por sua vez, aparentava estar esperando por algo que tardava a chegar, quando na verdade, simplesmente não conseguia adormecer. Sempre que fechava os olhos, era interrompido por um raio enfurecido, além do fato de que ele não se sentia no direito de dormir, pois deveria estar sempre alerta para qualquer eventual surpresa, afinal, o futuro era imprevisível e normalmente não guardava coisas muito positivas, apesar de que ele não poderia reclamar, já que o fato de estar vivo naquele momento  era uma grande vitória.
A tempestade não dava sinal de que iria cessar tão cedo, de modo que Harry já se via em desespero por falta de comida e outros problemas que não tardariam a aparecer. A reunião da Ordem da Fênix provavelmente ainda estaria ocorrendo naquele momento, sem que Lupin se quer imaginasse todos os apuros pelas quais ele e seus amigos já haviam passado. Havia tanto para pensar, tantas decisões para tomar. O que fariam para sobreviver? Onde estaria Jorge? Era como se Harry estivesse em um beco sem saída, no qual mais e mais problemas lhe eram impostos a força, e apesar de ele ter a companhia de seus amigos, sentia que era o único que poderia resolvê-los.
- Harry? - chamou Gina sonolenta - Está acordado ainda?
- Sim, não estou conseguindo dormir. - respondeu ele se perguntando o que teria acordado Gina - Mas volte a dormir, você tem que recuperar suas energias.
- Certo. - concordou Gina recolocando a cabeça no ombro do garoto - Você ficará bem?
- Se você voltar a dormir, com certeza eu ficarei bem. - respondeu Harry desviando repentinamente o olhar para um canto mais escuro da caverna no qual ele notara um movimento quase imperceptível - Você tem que descansar. - Tentando esconder o medo que surgira com a possibilidade de alguém estar naquela parte da caverna, Harry tentou suavizar suas palavras com um beijo na testa da ruiva, que sorriu radiante e minutos depois, já voltou a dormir.
O garoto por sua vez, voltou sua atenção para o ponto mais escuro da caverna. Ele tinha certeza de que algo se movera ali, e isso era um fato que ele não podia ignorar. Harry estreitou os olhos, e, forçando a visão, tentou distinguir algo dentre a escuridão. Foi então que o garoto se lembrou de como ele e Luna haviam chegado até aquela caverna. Harry encontrara aquele lugar através de uma cobra que por um momento fez parte do seu próprio eu interior, e Luna por sua vez, localizou-a através de um Testrálio que ela confirmara ter visto. Será que essas criaturas estavam ali? Era a solução mais lógica, porém não era nem um pouco positiva, pois se um Testrálio e uma cobra já haviam achado aquele lugar, era de se imaginar que muitos outros seres haviam feito o mesmo e estavam bem ali naquele momento.
Então, para se certificar sobre o que de fato estava ali, Harry retirou cuidadosamente a cabeça de Gina de seu ombro e a posicionou sobre o ombro de Rony que estava bem ao seu lado. Por um instante, a ruiva fez menção de acordar, porém voltou a adormecer logo em seguida. Silenciosamente, ele se levantou, e, com um passo de cada vez, foi se distanciando de seus amigos e se aprofundando mais e mais na caverna, cuja dimensão nem imaginava.
À medida que ia se aproximando do local em que vira o movimento, ele foi sentindo que a caverna se tornava gélida, e que aquela sensação de conforto e tranquilidade já não prevalecia mais no ambiente. Os dentes de Harry já trincavam e seu corpo já tremia. Ele não compreendia as reações que estava tendo, e muito menos a mudança climática tão repentina que estava ocorrendo naquele lugar. O garoto se questionou se seus amigos também estariam preocupados com o frio que ali fazia, e por isso, se virou para a direção de onde estava vindo, porém percebeu que todos estavam dormindo do mesmo jeito que a alguns segundos atrás. Harry constatou que era só ele que sentia o frio congelante, porém não teve tempo para refletir sobre isso, pois novos movimentos rápidos e fora do comum chamaram a sua atenção. Ele sacou sua varinha, e, sem hesitar, adentrou na mais profunda escuridão da caverna, onde os movimentos continuavam sem parar. Cada vez que o garoto se aproximava deles, os mesmos se afastavam, fazendo com que tivesse que segui-los para mais longe.
De repente, os movimentos que antes só eram perceptíveis pelo fato de agitarem o ar criando assim vento, agora possuíam cores, de modo que Harry descobriu que eles afinal, não eram as criaturas que estava imaginando. No entanto, esse traços de cores que se moviam freneticamente no céu pareciam conduzi-lo para o fundo e era como se ele não tivesse capacidade para parar e voltar para seus amigos.
Harry queria seguir aqueles flashes de luz, ele queria saber o que eram, o que queriam e por que estavam o conduzindo. Os traços fúlgidos aumentaram a velocidade e o garoto também. Harry imaginava que logo estaria no fundo da caverna, porém o fim tardava a chegar e as luzes continuavam a guiá-lo. Quando se deu por si, percebeu que corria velozmente em direção às luzes e que ansiava por alcançá-las. O que estava acontecendo? Ele não conseguia raciocinar direito, só sabia que precisava agarrá-las, senti-las. Quando finalmente chegou ao auge de sua velocidade e as luzes já estavam a uma distância razoável, Harry se desprendeu de sua varinha e saltou em direção ao ar para apanhá-las, porém foi surpreendido por uma parede gélida, que entrou bruscamente em contato com sua cabeça, fazendo com que ele caísse no chão e ficasse inconsciente por alguns minutos.



Harry acordou com a cicatriz latejando e a cabeça doendo. Ele estava sem os seus óculos, de modo que só conseguia ver imagens embaçadas de uma parede branco perolada a sua frente, cercada por uma escuridão que ele já conhecia. O garoto começou a rastejar pelo chão gélido em uma tentativa de achar seu óculos, porém, para a sua surpresa, primeiro localizou sua varinha, que nem ao menos havia sido dada como perdida por ele ainda. Com a varinha em mãos, Harry conjurou “Accio" e logo seus óculos vieram até ele, fazendo com que tudo ficasse visível e distinguível novamente.
Ao se deparar com a gigantesca parede branco perolado, o garoto começou a tomar consciência de sua situação e de como viera a chegar nela.
- Mas eu não me lembro dessa parede... - refletiu confuso – Se ela estivesse de fato aqui, eu a teria visto a uns pelo menos dois metros de distância!
Ele deu uma visualizada por todo o local e constatou que estava no fundo da caverna, pois a parede era contínua e fechava qualquer passagem que pudesse existir, enquanto do outro lado só havia o escuro e a passagem de volta para seus amigos.
Estava tudo muito silencioso e as luzes coloridas haviam desaparecido completamente. Era só Harry, sua varinha e aquela parede branco perolado que mais parecia uma muralha. Ele se aproximou totalmente intrigado com o que via e também perplexo pela complexidade de sua estrutura. A parede era imponente e impenetrável, porém muito graciosa, lembrando assim uma pista de patinação coberta por uma neve lisa e unicamente enfeitada com pequenos fragmentos de pedras preciosas.
Harry apoiou suas mãos contra a parede e sentiu um arrepio percorrer por todo o seu corpo. A marca dos dois pares de cinco dedos ficaram sobre aquele tipo de gelo por alguns segundos, sendo absorvidos por ele logo em seguida, como se nunca tivessem estado ali.
Era estranho algo como aquela parede estar naquele lugar, já que era um território trouxa. Harry pensou por alguns instantes e chegou a conclusão de que na verdade esse fato não era tão estranho assim, já que o mundo dos bruxos está sempre interligado com o mundo trouxa. Além disso, as pessoas nunca veem o que está a sua frente, elas sempre tem um olhar superficial sobre tudo, de modo que fica fácil esconder o que não vai ser procurado.
Harry já estava quase desistindo de encontrar alguma coisa e voltando quando sua varinha começou a tremer em sua mão. Primeiro ele achou que aquilo estivesse acontecendo devido ao frio, porém logo depois, muitos jatos branco perolados começaram a ser direcionados para tudo quanto é lugar sem que o garoto nem ao menos os tivesse invocado. Harry segurou com força sua varinha que estava quase se desprendendo de sua mão para soltar mais e mais feitiços involuntariamente. Ele não sabia o que estava acontecendo, mas também não estava conseguindo raciocinar direito naquele momento, pois a única coisa com a qual estava se preocupando era conter sua varinha e os feitiços que estavam provindo dela em direção a parede, que os neutralizava facilmente.
A varinha foi parando de tremer e os feitiços foram cessando gradualmente. Quando tudo voltou a ficar mais calmo, Harry percebeu que a ponta dela ainda piscava e era atraída pela parede branco perolado, porém a força dessa atração estava muito mais forte do que a força com que ela estava disparando os feitiços há alguns segundos. A varinha começou a arrastar Harry contra a parede para satisfazer assim a forte conexão que parecia existir entre elas. O garoto não conseguia pará-la e estava quase sendo arremessado contra aquela muralha branco perolado. A varinha estava a frente dele conduzindo-o direto para a parede dura como aço, e não havia escapatória. Porém Harry nunca pensara que ao estar a segundos do choque que provavelmente traria grandes sequelas, ele simplesmente fosse sugado pela parede, de modo que a atravessasse como se fosse vento.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.