25 de Janeiro a 4 de Fevereiro

25 de Janeiro a 4 de Fevereiro



Capítulo 16
de 25 de Janeiro a 4 de Fevereiro


Dia 119, Segunda


"…de vez em quando", Pansy dizia em voz baixa quando Draco finalmente registrou que ela estava falando com ele.


"Desculpe, o que foi?"


"Eu disse que você parece um dia chuvoso em um cemitério. Tente ficar mais animadinho de vez em quando"


"Oh". Ele balançou a cabeça, se trazendo de volta ao aqui e ao agora. Tinha bastante tempo para pensar quando estava sozinho; agora precisava estar alerta e desperto. Especialmente porque sabia que as pessoas estariam prestando atenção nele. Era o primeiro dia de volta às aulas depois de uma grande mudança na sua vida. De novo.


Sempre Poções, Draco refletiu. A primeira aula depois do elo, a primeira aula depois da suspensão. E, agora, a primeira aula depois do fim do elo. Sempre, Poções era a aula onde eles tinham que encarar pela primeira vez novas circunstâncias, com os olhos atentos de Snape avaliando a ambos, sua língua afiada atacando Harry sempre que o grifinório estivesse vulnerável de alguma forma. Provavelmente era se esperar demais que Snape não fizesse nada hoje, de todos os dias possíveis.


"Aquela lição sobre poção de animar não é para hoje, é?", ele perguntou para Pansy, tentando encontrar algo que lhe tirasse dos devaneios.


"Não, é para amanhã. Mas você já começou a escrever, certo?"


"Oh, sim, está quase pronta. Só não descobri ainda o ingrediente para evitar o efeito colateral das risadinhas".


"Asas de morcego", Pansy disse quando eles entraram na sala de aula, e ela caminhou na frente, claramente esperando que Draco a seguisse. Pansy sentou-se e acenou para que ele fosse para cadeira ao seu lado enquanto os outros sonserinos se acomodavam. Nos mesmos lugares que ocupavam no começo do ano. Não naqueles em que haviam se sentado nos últimos meses.


De volta a cada casa sendo uma unidade fechada, mais ou menos. Apesar do fato de que a situação política dentro da Sonserina estava ainda mais turbulenta e incerta do que antes, os membros da casa estavam sentados em um bloco: os que tinham se tornado próximos dos grifinórios perto de Draco por lealdade a ele, quem tinha se voltado contra ele sentava no mesmo lugar que ficara no ano inteiro.


Era uma boa coisa que eles tinham chegado cedo. Harry normalmente sentava no fundo da sala. Dessa maneira, Draco não precisava vê-lo entrar, ou olhar para ele durante a aula e tentar não pensar nele.


"Você tem tinta extra?", perguntou para Blaise, irritado consigo mesmo porque passara tempo demais aquela manhã procurando a gravata para se lembrar de checar o tinteiro. Ficou um pouco tenso quando ouviu o barulho de pessoas entrando na sala e um burburinho se espalhar pela classe. Sem dúvida, Harry e seus amigos tinham acabado de chegar. Draco se ocupou procurando tinta para sua pena. O curandeiro tinha dito para um evitar o outro tanto quanto possível, e ele iria fazer isso, não importa o quanto quatro meses de hábito lhe diziam para pelo menos se virar e dizer ‘oi’.


"Abram os livros na página 432", Snape disse quando entrou, e o barulho do folhear de páginas calou os sussurros curiosos. Pelo menos a aula de Poções tinha essa vantagem, não havia tempo para ninguém vê-los fazendo muito mais do que tentar acompanhar as explicações de Snape ou os exercícios práticos.


Especialmente quando o exercício prático envolvia uma tarefa tão impossível quanto aquela, Draco pensoualgum tempo depois, enquanto a sala toda se posicionava com seus caldeirões. Ele ajeitou seu destilador, com dó dos pobres idiotas que ainda tinham que destilar veneno manualmente, e passou os olhos na cópia do Profeta de domingo que Pansy tinha trazido para a aula enquanto o destilador fazia seu trabalho.


O Menino-Que-Sobreviveu solteiro novamente


Sim, é verdade. O Profeta confirmou os rumores de que o casamento involuntário de Harry Potter com seu inimigo Draco Malfoy finalmente acabou, após quatro turbulentos meses. Por meio de métodos desconhecidos, Lucius Malfoy, Comensal da Morte condenado e sogro de Harry Potter, conseguiu localizar o responsável por lançar a maldição do casamento em seu filho e no sr. Potter. Fontes próximas à família Malfoy alegam que o responsável também era um Comensal da Morte e foi entregue ao Ministério de Magia.


A notícia sobre o divórcio foi manchete da WWN no sábado, enquanto os alunos contavam a novidade para os pais e Hogwarts celebrava. Fontes próximas ao casal afirmam que o rompimento do elo foi realizado com o mínimo de alarde, e que ambos estão aliviados por estarem livres.


"Estou muito feliz por ele. Ele é jovem demais para isso", disse a sra. Elora Dingham, de Dundee, mãe de uma amiga próxima de Potter, Clarence Dingham.


"Dependendo de vocês terem seguido as instruções competentemente ou não, sua poção irá exalar um desses dois odores distintos", disse Snape. "Se sua poção tiver cheiro de água do mar e fumaça, você testará sua potência administrando-a em seu animal de teste. Se sua poção tiver cheiro de excremento de porco podre, você testará sua potência e efeito administrando-a em si mesmo".


Draco olhou para sua poção, borbulhando exatamente como previsto. Deu uma olhada na poção de Pansy: estava igual. Garota esperta. Voltou a ler o jornal.


"Ninguém deveria ser obrigado a viver com um idiota como Malfoy", disse um dos alunos de Hogwarts, que preferiu se manter anônimo.


"Eu simpatizo mais com Draco," disse outro aluno. "Potter é meio lerdo".


"Eu realmente achei que havia algo verdadeiro entre eles", o pai de um aluno de Hogwarts, o sr. Elisha Bois, disse a nossos repórteres. "O tal do garoto Malfoy não disse que eles eram felizes juntos? Não podiam ser tão felizes, já que se separaram assim que puderam".


"Mas não dá para culpar Harry", opinou sua esposa, Ellen. "Quem iria querer permanecer relacionado com aquela família?"


E o que pensa seu ex? Draco Malfoy, que foi generoso o suficiente para nos conceder uma entrevista em dezembro, não foi localizado para comentar.


Draco fez uma careta de aborrecimento. Ele não fora localizado porque o Profeta simplesmente não tentou localizá-lo, embora duvidasse que teria declarado qualquer outra coisa além de "cai fora".


O procurador David Glynstook deu a seguinte declaração para a imprensa, em nome de seu cliente Lucius Malfoy: "Meu filho lidou muito bem com o stress do elo forçado, mas é compreensível que esteja feliz com o final da maldição. Ele sempre quis encontrar uma companheira adequada e ter sua própria família. É claro que nós temos muito respeito pelo sr. Potter e esperamos que a amizade entre eles continue, mas não acho que seja difícil entender por que Draco quis terminar o feitiço assim que isso foi possível".


Lucius Malfoy não foi localizado para mais comentários sobre o fim do elo de seu filho.


Draco suspirou, tentando não se preocupar com o pai. "Não foi localizado" – será que isso significava a mesma coisa do que quando se referia a Draco? Ou significava que eles verdadeiramente não tinham conseguido localizá-lo a tempo da edição de ontem? E, se fosse isso… onde ele estava? Ele ainda não tinha voltado?


E, se não tivesse voltado… quanto tempo eles teriam que esperar antes de saber se algo tinha dado errado?


E que diabos era aquilo de "esperar que a amizade entre eles continue"? Draco tivera a impressão de que seu pai preferiria comer o próprio fígado a manter qualquer tipo de conexão com Harry por mais tempo do que fosse absolutamente necessário.


Draco espiou Harry, que estava assistindo à sua poção escorrer para outro frasco. Não mais do que uma olhada rápida, porque as pessoas estariam prestando atenção nele para algum sinal de… bem, qualquer coisa, para correr e contar ao Profeta. Uma espiada longa o suficiente para registrar que, sim, Harry tinha mesmo vindo para a aula. Que ele parecia cansado e desanimado. Bem igual a como Draco se sentia, na verdade. A diferença era que de jeito nenhum Draco permitiria que isso refletisse na sua aparência, ou deixaria que qualquer pessoa pensasse por um momento que havia algo de errado com ele.


E provavelmente não era uma boa idéia pensar em como ele tinha se sentido deprimido naquela manhã, a terceira em que acordou numa cama vazia e tendo que lidar com as conseqüências de um sonho bastante vívido com Harry. Todo esse lance do divórcio estava se mostrando mais duro de agüentar do que ele tinha imaginado — literalmente.


Maldito elo, ainda o incomodando. Iria melhorar, ele se assegurou; só precisava ser forte.


Embora provavelmente não tivesse ajudado muito o fato de que tinha lidado com sua excitação matutina com a imagem de Harry na mente, pensando na primeira vez que eles tinham feito sexo oral um no outro. Era melhor que ele arranjasse fantasias mais adequadas, se quisesse se livrar do elo de um modo rápido e eficiente.


Mas aquela era uma ótima lembrança. Uma das coisas mais legais que tinha acontecido durante os feriados do Natal. Draco provavelmente nunca se esqueceria da expressão de Harry na primeira vez que o sonserino usou a boca para aqueles fins — presumindo que, como estava fazendo aquilo pelo grifinório, seria bom o outro retribuir. O choque e a excitação de Harry com as novas sensações deixaram Draco estupefato, superando seu desconforto e hesitação por estar fazendo aquilo pela primeira vez. Habilidade não contava muito, Draco concluiu, quando se recebia sexo oral pela primeira vez. A falta de experiência de Pansy não o havia incomodado em nada alguns anos atrás. E nem a de Harry, quando foi a vez dele retribuir.


Harry tinha se mostrado bastante talentoso naquela área em particular. Depois de um tempo, a mera possibilidade de receber sexo oral era suficiente para deixar Draco ansioso, e a experiência em si o deixava fora de sintonia.


Harry desviou o olhar da sua poção, e Draco corou quando os olhos deles se encontraram. Eles trocaram um pequeno e desconfortável sorriso antes de desviarem o rosto.


Nenhum contato. Acabe com tudo de uma vez. É melhor.


Acabar com tudo de uma vez não era tão fácil, especialmente no que dizia respeito a sexo. Draco olhou para sua poção, se perguntando como havia esquecido que o estado normal da maioria dos garotos é de excitação contínua e frustrada, sem nenhuma ajuda para tanto a não ser a da própria mão direita. E da esquerda, se a direita cansasse.


Ele olhou para Pansy especulativamente. Pansy nunca tinha sido difícil de arrastar para cama… e ela certamente estava sendo amigável ultimamente… o havia distraído bem da preocupação com seu pai. Talvez ela estivesse disposta a distraí-lo dos problemas relacionados ao fim do elo…


Talvez não. A amizade deles esse ano tinha os tornado mais do que simples amigos de infância e às vezes amantes. Não parecia... certo, dormir com ela e não se preocupar com mais nada. Especialmente porque ele não tinha um número grande de aliados e amigos na Sonserina; pôr em risco a única fonte segura de apoio provavelmente não era uma boa. Ele voltou a prestar atenção na poção.


"Draco", Pansy disse no seu ouvido, o assustando um pouco, apesar do fato de ele estar pensando nela. Ou talvez por causa disso. "Você está distante de novo. Vamos passear lá fora depois da aula. O ar fresco vai te fazer bem. Pare de se preocupar com seu pai".


Draco engoliu em seco. Certo. Seu pai.


"Sim, obrigado, eu vou tentar isso na próxima aula", Blaise estava dizendo para Weasley quando voltou do armário de ingredientes para sua mesa. "E sobre a sua poção — lembre-se de amaciar a categute antes, esse foi seu problema da última vez".


"Sim, obrigado, Zabini", disse Weasley, voltando para seu caldeirão.


"Ainda se associando com traidores do sangue, Blaise?" disse Queenie acidamente. "Eu achei que isso era apenas para puxar o saco do Malfoy. Será que há uma amizade de verdade aqui? Com um Weasley?". Os olhos azuis de Weasley se estreitaram, e a sala caiu em silêncio. Blaise lançou um olhar desinteressado a Queenie e voltou para sua poção.


"Você deveria pensar melhor" Queenie disse, mais baixo. "Você sabe o que estão dizendo. O navio mudou de direção. Melhor seguí-lo".


"Ótimo, você que reprove em Feitiços, então", Blaise respondeu. "Eu estarei sendo ajudado pelo único aluno do nosso ano que consegui fazer um sino de vento soar como uma flauta na última aula".


"É tudo culpa da Granger, você sabe", Queenie zombou. "Você está aceitando conselhos de uma sangue-ruim, por meio de um traidor do sangue".


"E?"


"Sua família não vai ficar muito contente".


"Tenho certeza que vai, se eu conseguir todos os meus NEWTS. Mas acho que sua família não saberia o que fazer com você se você conseguisse pelo menos um".


Draco olhou rapidamente para Harry. Os olhos de Harry estavam no mesmo nível que os seus enquanto eles sustentavam o olhar.


Não importava. Blaise não tinha que se preocupar em acabar com tudo de uma vez, como ele.


Draco voltou-se para sua poção.


ooooooo


Dia 121, Quarta


Tórrido triângulo amoroso tira Hárpias e Montrose da Copa!” dizia a manchete do Profeta. E, abaixo, em letras menores, “Comensal da Morte condenado Lucius Malfoy está misteriosamente desaparecido, de acordo com fontes”.


Harry automaticamente olhou para a mesa da Sonserina, onde Draco estava abrindo seu próprio jornal. Assistiu a testa do outro franzir em preocupação antes do loiro se reprimir e assumir uma máscara de frio desinteresse. Harry desviou rapidamente o olhar quando os olhos de Draco encontraram os seus.


Eu devo me lembrar de sentar de costas para a mesa da Sonserina, Harry disse para si mesmo.


Ele esfregou a testa, querendo afastar uma leve dor de cabeça, e prestou atenção no jornal. Nada de muito interessante. As Hárpias e o Montrose não estavam jogando bem neste ano mesmo, e a misteriosa ausência de Lucius parecia consistir em ele não estar disponível para responder aos pedidos de entrevista do Profeta, enquanto sua esposa e os representantes da família alegavam que ele simplesmente havia viajado a negócios. Tirando isso, parecia que as únicas notícias eram sobre o divórcio.


Harry refletiu que, enquanto antigamente isso o teria aborrecido muito, agora ele se sentia satisfeito. Porque se o jornal ainda estava obcecado com sua vida privada era sinal de que não havia outras notícias para publicar. Eles podiam escrever sobre o divórcio pelos próximos meses, no que dependesse dele.


Ollivander ainda estava desaparecido, assim como Florian Fortescue, e às vezes a impressão que dava era de que o mundo bruxo estava prendendo a respiração coletivamente. Mas, enquanto ninguém mais desaparecesse, que continuasse desse jeito, na opinião de Harry.


Ele franziu a testa quando viu a matéria na página quatro, entre os anúncios de poções para cabelo e livros de feitiços:


O Profeta apurou que Parnassus McKay, o responsável pelo feitiço que aprisionou o Menino-Que-Sobreviveu em um casamento involuntário, era um Comensal da Morte de pequena importância, querendo avançar nos rankings de Você-Sabe-Quem.


"Ele queria ganhar poder simultaneamente matando Harry Potter e prejudicando Lucius Malfoy, Comensal da Morte condenado e um dos maiores seguidores de Você-Sabe-Quem", um funcionário do Ministério explicou para o Profeta, sob condição de anonimidade, detalhando que o esperado era que Potter e seu marido matassem um ao outro ou morressem pelos efeitos colaterais de um feitiço adicional não-especificado lançado junto com o elo. McKay também acreditava que, quer Potter e seu marido morressem ou não, Lucius Malfoy perderia sua considerável posição entre os Comensais da Morte. Parece não haver honra entre ladrões.


Oh, Lucius Malfoy provavelmente iria amar essa frase, Harry sorriu para si mesmo.


Mas Draco, provavelmente, não. O sorriso de Harry desapareceu.


O funcionário do Ministério explicou que algumas partes da trama talvez nunca sejam descobertas; antes de entregar McKay, Lucius Malfoy negociou um acordo com o Ministério proibindo o uso de Veritaserum em interrogatórios com qualquer um dos envolvidos.


"Tudo parece ter se voltado contra McKay", afirma nossa fonte. "Potter e Draco Malfoy não morreram, o plano foi descoberto, e eu não me surpreenderia se Lucius Malfoy voltasse a ficar às boas com Você-Sabe-Quem. Azar de McKay; era um bom plano, se você parar para pensar".


Não foi esclarecido como McKay conseguiu lançar a maldição dentro de Hogwarts. O Ministério acredita que ele deve ter tido a ajuda, embora admita que o Comensal da Morte possa ter entrado na escola por si só durante a agitação de atividades que invariavelmente acompanha o início do ano letivo. Para evitar a repetição deste tipo de ocorrência, os feitiços de proteção ao redor da escola foram aumentados.


Seria um sinal do retorno d’Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado? Se seus seguidores conseguem entrar em Hogwarts e colocar nossos alunos em perigo… quem está seguro?


Harry rodou os olhos. Os seguidores de Voldemort entravam em Hogwarts de um jeito ou de outro desde seu primeiro ano; eles provavelmente já tinham as chaves do lugar. E, mesmo assim, toda vez que aquilo acontecia, O Profeta abordava o assunto em tom de descrença e pânico com a chocante nova evidência da vulnerabilidade generalizada. Como Ginny tinha notado uma vez, "É como se em todas as vezes fosse a primeira vez de todas!"


Também não se sabe qual será o futuro de McKay. Não parece haver planos de levá-lo a julgamento pelos acontecimentos em Hogwarts, mas existem várias acusações contra ele por crimes cometidos em apoio a Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado. O Profeta também apurou que McKay está em observação para se evitar tentativas de suicídio, uma precaução comum com Comensais da Morte; muitos dos seguidores de Você-Sabe-Quem acabam dando fim à própria vida quando são presos.


Ele franziu a testa e pulou o resto do artigo. Passou os olhos pelo restante da página e imediatamente se arrependeu quando o título Um novo amor para o Menino Que Sobreviveu? chamou sua atenção.


"Por deus, Potter, não leia essa besteira", Blaise Zabini disse por cima do seu ombro, e, por um momento, Harry se sentiu meio desorientado, achando que estava de volta à mesa da Sonserina. "Você está com as anotações de Feitiços, Weasley?" ele perguntou, sentando-se ao lado de Harry.


Ron concordou com a cabeça, acabou de engolir um pedaço de torrada e revirou sua mochila. "Sim, e eu acho- Hermione, você descobriu aquela parte não-verbal?"


"Está na margem da página", disse Hermione, apontando para a folha.


"Oh, está aqui. Obrigado, Granger", respondeu Zabini, parecendo contente. "Weasley, eu ainda não acabei com a sua redação de Poções — mas arrisco o palpite de que se você não conseguir aprender a diferença entre asfódelo e assafétida... bem, vamos dizer que seus colegas de dormitório não vão ficar muito felizes com você". Ele levantou.


"Você está indo para a biblioteca?" Ron perguntou, e Zabini acenou que sim. Ron levantou, guardando as coisas de volta na mochila. "Espera aí, então, nós também vamos. Qual a diferença?"


"Asfódelo e assafétida?", Zabini riu, e eles começaram a caminhar. "Um tem cheiro de lírio e ajuda em poções digestivas. O outro vem de raízes de funchos gigantes e tem cheiro de indigestão. Francamente, qual é a vantagem de conviver com Longbottom se você não consegue que ele te ajude com Herbologia?"


Harry observou pensativo enquanto o grupo deixava o Grande Salão. O que existia entre Ron e Zabini não era uma amizade próxima, estava mais para uma troca mútua de benefícios acadêmicos, mas era legal ver que nem todas as coisas boas dos últimos quatro meses tinham acabado. E isso não era insignificante. Harry lembrava claramente de Zabini sendo hostil com todos os não-sonserinos durante os anos anteriores. E ele era particularmente desagradável com os nascidos trouxas e os "traidores do sangue", como os Weasleys. Ver esse comportamento quase completamente mudado… não era muito, mas já era alguma coisa.


Ele olhou de novo para a matéria a respeito de si, balançando a cabeça para o tom piegas e agradecido por pelo menos o texto estar escondido nas páginas do meio do jornal.


De solteiro a casado e de volta à solteirice, tudo isso antes dos 18 anos. Este certamente tem sido um ano agitado para Harry Potter, e, julgando pela quantidade de cartas sobre ele que chegam ao Profeta, não são poucas as jovens bruxas — e alguns jovens bruxos — sonhando em conhecer o rapaz, que já provou ser um excelente partido para casamentos.


"Se ele pôde fazer um casamento dar certo com alguém como aquele terrível garoto filho de um Comensal da Morte, imagine como poderia ser feliz com uma boa garota de família", disse Yolanda Lovelace, famosa por sua coluna de conselhos amorosos e especialista em casamentos-


Harry suspirou, afastando o cabelo dos olhos com raiva. Verificou sua mochila e percebeu que tinha esquecido das anotações para a aula de Feitiços. Caramba, precisava voltar a colocar a cabeça no lugar; estava passando metade do tempo divagando e a outra metade procurando suas coisas. Ele não se lembrava de ser tão desorganizado antes de passar quatro meses vivendo com Draco Malfoy, aquele terrível garoto filho de um Comensal da Morte e elfo-doméstico nas horas vagas.


Provavelmente porque, naquela época, Harry não passava uma desconcertante quantidade de tempo sentindo falta do idiota de cara pontuda. Ele se obrigou a não olhar para a mesa da Sonserina enquanto levantou para ir para a biblioteca, tentando não se importar pelo fato de que, mais uma vez, Ron e Hermione tinham saído sem esperar por ele. Não era culpa deles. Eles não faziam aquilo deliberadamente. Harry não era o único que tinha formado hábitos nos últimos quatro meses; seus amigos e colegas de casa tinham se acostumado a não tê-lo por perto boa parte do tempo, também. Agora que ele não tinha alguém constantemente do seu lado, lhe fazendo companhia para o bem e para o mal, percebia o quanto estava isolado na Grifinória.


Iria melhorar. Iria, sim. Só alguns dias tinham passado, afinal. Eles só precisavam de tempo.


ooooooo


Dia 123, Sexta


Pansy apertou os lábios enquanto olhava para Draco por cima da tabela de revisão de Runas Antigas.


Ele parecia estar bem. Focado na revisão, procurando por algumas respostas que não tinha entendido, um pequeno franzido na testa pela concentração enquanto silenciosamente murmurava as palavras para si mesmo para memorizá-las. Perfeitamente bem.


Uma atuação maravilhosa, na verdade. Qualquer um que não o conhecesse há anos iria pensar que não havia nada de errado.


Pansy suspirou, desviou o olhar da tabela de revisão e acabou reparando em outra maldita matéria do Profeta.


Há muitas especulações dizendo que Lucius Malfoy, Comensal da Morte condenado e pai de Draco Malfoy, ex-cônjuge de Harry Potter, pode ter voltado a Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado, agora que seu filho não está mais vulnerável a um possível ataque contra Potter. Ele está incomunicável desde que o filho foi libertado do elo com o sr. Potter. Teria Malfoy mudado de lado novamente?


Oh, não, será? Pansy pensou.


Se Malfoy retornou a Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado, haverá chances de ele ser aceito de volta? Ou ele será punido?


Pansy olhou para Draco por cima do jornal. Qualquer pessoa que não o conhecesse bem pensaria, se tivesse notado seu sutil desânimo, que ele estava meramente preocupado com o pai e com a posição da sua família com o Lorde das Trevas. Porque tanto os Comensais da Morte quanto os inimigos sabiam de uma coisa a respeito do Lorde das Trevas: ele não era um grande fã de perdoar e esquecer.


Qualquer um que conhecesse Draco tão bem quanto Pansy saberia que isso não era tudo. Ele estava preocupado, Pansy podia perceber isso. Mas ele também estava…


Bem, ele não se alterava com a menção ao Lorde das Trevas ou a seu pai. Ele se alterava quando Potter era chamado nas aulas. Ele não corava e desviava o olhar quando alguém falava sobre o Lorde das Trevas. Ele fazia isso quando Potter estava falando.


Sua língua estava mais afiada do que nunca quando provocava Queenie e Nott e ocasionalmente Millicent, quando ele tirava sarro de Lufas-Lufas aleatórios ou de Di-Lua Lovegood. Ele nunca mencionava Potter.


Pansy deixou o jornal de lado e correu os dedos pelos cabelos de Draco, fazendo com que ele soltasse uma exclamação de aborrecimento e afastasse a cabeça do alcance dela, sem levantar o olhar da tabela de revisão. Ela tinha sentido um pouco de dó quando ele lhe pedira para cortar seus cabelos, no dia anterior, mas Pansy tinha que admitir que esse comprimento era provavelmente mais prático, e também ficava bem nele. Mas os fios branco-gelo com o comprimento até o ombro ficavam lindos. Que pena, um cabelo tão bonito desperdiçado em um garoto.


Draco franziu a testa para suas anotações, rabiscou uma resposta e suspirou, encarando o nada. Pansy o observou, pensativa.


Ele nem percebia o que estava fazendo. Ficando desanimando, caindo em silêncio quando não era chamado para o mundo exterior. A preocupação com seu pai e a desorientação pelo elo rompido o deixavam desse modo distraído e reflexivo.


E ele precisava cair fora daquilo. Não era bom para ele ficar daquele jeito, se equilibrando precariamente em nada, esperando pelo desenrolar da questão sobre sua família e lamentando-se pelo fim do seu elo como um gato com suas crias perdidas. Infelizmente, Pansy não podia fazer muito para ajudá-lo. Estudar, jogar xadrez, fofocar sobre os outros alunos… nada disso parecia distrair muito Draco.


Ele provavelmente precisava de uma boa transa, ela refletiu. Porque, entre outras coisas, ir de um relacionamento físico bastante… vigoroso para absolutamente nada não deveria ajudar muito.


Pensando bem, ela também precisava de uma boa transa. Anthony Goldstein tinha sido divertido por algum tempo, mas ela tinha cansado dele e terminado tudo há três meses. Pensando bem, não fora uma decisão sábia; enquanto tinha sido bom se livrar das irritantes manias de Anthony de enrolar o cabelo no dedo, de ficar batendo a pena na mesa e de nunca conseguir ajeitar a gravata, ela também sentia vontade de azarar Draco e Potter todas as vezes que eles desapareciam e voltavam com aquela aparência feliz de quem acabou de ter uma boa transa. Em outras palavras, várias vezes por dia.


Ela sorriu e se ajeitou na cadeira, tocando o ombro de Draco. "Querido, nós estamos aqui há horas. Eu preciso de uma pausa".


"Sim, tudo bem, eu só vou terminar o terceiro capítulo-"


"Eu acho que você também precisa de uma pausa".


"Certo", ele concordou com a cabeça, deixou o livro de lado e esfregou os olhos, se espreguiçando e ainda franzindo a testa para a lição.


"Pare de pensar".


"Certo, é".


"E pare de se preocupar".


Ele a encarou com curiosidade. "Como?"


"Com seu pai, meu amor. Ele é um homem esperto. Ficará bem".


"Certo".


Pansy olhou ao redor do salão comunal para buscar inspiração e viu Queenie e Nott, cujas idas e vindas no relacionamento pareciam estar em um ponto alto, julgando pela abundância de membros entrelaçados em uma das poltronas.


Pansy fez uma careta. "Sabe, essa era uma das coisas que eu gostava em você e Potter. Vocês mantinham as evidências nauseantes a um nível mínimo".


Draco seguiu o olhar dela e sorriu de leve.


"Você sente falta disso?"


"Do quê?"


"De transar regularmente. Eu tinha tanta inveja o tempo todo que você estava com ele — quer dizer, depois que você finalmente conseguiu com que ele agisse como um ser humano do sexo masculino normal. Lá estava eu, reduzida aos malditos feitiços franceses de plaisir, enquanto ele te servia três vezes por dia. Que injusto".


Draco lançou para ela um sorriso de divertimento.


"Não deve ser fácil, ir de um banquete desses à condição de faminto total de uma hora para outra", ela disse, e Draco deu de ombros, o olhar se voltando novamente para a lição.


Pansy rodou os olhos para ele. Ela pensou na idéia de simplesmente dizer, "Por gentileza, preste atenção em mim enquanto eu estou tentando te seduzir", mas decidiu que, para levantar o astral dele, seria muito melhor se Draco pensasse que era ele que a estava conquistando, como qualquer garoto solteiro saudável deveria fazer.


"Não entendo o que Nott vê em Queenie, francamente", disse Pansy. "Além disso, eu ouvi dizer que ela se recusa a visitar os países baixos, se é que você me entende".


"Sério?"


"Sério. Muito estranho. Bem, a mãe dela é uma dessas bruxas irlandesas fanáticas, sabe, dessas que vão a encontros só de mulheres e tudo isso?"


"É, eu ouvi dizer".


"Eu não tenho problema com a parte teórica, mas, francamente, se esses encontros requerem que você evite um dos passatempos mais agradáveis que existem, me deixe fora dessa".


"Realmente".


"Pois é, mas ela não parece estar tão inibida agora, parece?", Pansy fez uma pausa, notando que Draco não estava mais olhando para sua revisão, mas para Nott e Queenie.


"Ugh, eu não consigo assistir a isso" disse Pansy. "Eles estão perturbando a minha opinião sobre sexo". Ela voltou a olhar para a lição de Runas, notando com divertimento que Draco estava um pouco corado. "Agora, por que Blaise não pode sair com alguém da Sonserina? A ele eu assistiria feliz". Ela rabiscou o papel. "Eu já te disse que peguei ele e aquela idiota da Grifinória, Lavender Brown, em flagrante uma vez?". Ela suspirou. "Doeu no meu coração, ter que descontar pontos deles — eu queria pagá-los pelo show. Um par muito bonito".


Draco desviou o olhar de Queenie e Nott e começou a bater a pena na mesa, limpando a garganta e correndo uma mão pelo cabelo. Pansy deu um sorriso malicioso.


"Mas Blaise terminou com ela logo depois disso — ele disse que cansou da estupidez da garota, mas acho que ficou desapontado porque ela não pediu para a Parvati Patil se juntar a eles. Você sabe que há rumores sobre aquelas duas há um tempão, elas sendo tão próximas e tudo isso-"


"Pansy".


"Sim, querido?"


"Você se importa? Alguns de nós não estamos acostumados com a privação como você".


Pansy olhou para ele, fingindo surpresa. "Oh, Draco, me desculpe, foi meio insensível da minha parte, não?"


"Bastante", disse Draco.


"Desculpe, meu amor", ela acariciou a mão dele brevemente como desculpas e se voltou para as Runas. Esperou pacientemente por alguns segundos e…


A mão de Draco estava sobre a sua, e ele estava se inclinando para mais perto do que o comum. "Você não consideraria compensar para mim, consideraria?", ele disse, e Pansy franziu as sobrancelhas.


"Como?", ela piscou para ele, e então levantou suas sobrancelhas. "Oh. Oh!" Ela balançou a cabeça para o lado, como se estivesse considerando. "Oh, mesmo? Isso é uma proposta?"


Draco sorriu para ela. "Depende. Você está disponível para essa proposta? Ou prefere continuar discutindo sobre a vida sexual de tudo mundo da escola que tem uma?"


Pansy sorriu de volta para ele e se parabenizou mentalmente.


ooooooo


Dia 125, Domingo


Hermione deixou de lado a lição de Feitiços de Ron e sorriu quando Harry entrou no salão comunal da Grifinória.


"Então… como foi seu encontro?", ela perguntou.


"Meu o quê?", ele disse, sentando ao lado de Ginny.


"Você e Hannah Abbot, na biblioteca", disse Ron, encarando a lareira, deitado confortavelmente no sofá com a cabeça no colo de Hermione enquanto ela conferia sua lição. "Como foi?"


Harry franziu a testa para ele. "Você quer dizer, eu ajudando-a com a redação de Herbologia?"


"Que seja", disse Ginny impacientemente. "Como foi?"


"Eu estava ajudando ela com a lição", ele repetiu devagar, parecendo confuso.


"Oh, pelo amor de deus, Harry, você não pensou mesmo-", Hermione interrompeu-se quando Harry franziu ainda mais a testa em confusão. "Você está brincando. Você achou mesmo que era só sobre a lição de casa?"


"E não era?", Harry registrou os olhares admirados dos três. Hermione se segurou para não rodar os olhos.


"Ela está a fim de você desde o começo do ano passado. Você não sabia disso?"


"Bem… sim, você me contou".


"E você não considerou que ela deveria ter um outro motivo para pedir que você a ajudasse com Herbologia?"


Harry negou com a cabeça timidamente.


"Então, como foi?"


"Bem, eu acho", Harry murmurou, e dessa vez Hermione rodou os olhos.


"Você não falou sobre mais nada além da lição, não é?"


"Bem, eu não sabia que havia mais alguma coisa para se falar", Harry disse defensivamente.


"Ela é muito bonita. E você estava meio interessado nela no começo do ano passado também", Ginny lembrou. "Você ia esperar para ver se algo acontecia depois do verão, não é? E então o elo aconteceu e isso foi esquecido".


"Bem, sim".


"Harry, você não está mais casado", Hermione o relembrou de modo encorajador, franzindo a testa quando ele torceu o nariz para suas palavras. Ela levantou as sobrancelhas, perdendo o rumo da conversa enquanto pensava em outros sinais sutis que tinha visto nos últimos dias, e chegou a uma conclusão bastante triste.


Oh, Harry.


Pobre Hannah. Investindo em um garoto que aparentemente ainda estava um pouco ligado a seu ex.


Não era de se surpreender, Hermione refletiu. Eles estavam confortáveis um com o outro perto do fim; se Harry não estivesse unido a Malfoy, Hermione até diria que o grifinório estava feliz com ele. Mas ambos pareceram bastante dispostos a terminar o elo, e Hermione esperava apenas alguns dias de desorientação antes que Harry voltasse ao normal, aliviado, livre e pronto para seguir com sua vida.


Só tinha passado uma semana, ela se lembrou. Não era muito tempo. Malfoy aparentemente estava mais feliz do que Harry — havia rumores de que ele e Parkinson eram um casal novamente — e Harry, sendo menos superficial do que Malfoy, só precisava de um pouco mais de tempo. E um pouco mais de ajuda, visto que ele não tinha muita noção no que dizia respeito à sua vida pessoal.


"Como ela estava?", Ron dizia.


"Normal. Quieta";


"É, ela é um pouco tímida", Ron concordou.


"Você fez algo que possa tê-la ofendido?", Hermione perguntou.


"Er… não, eu acho que não".


"Bem, então a convide para sair de novo", ela o encorajou.


"O quê? Como?", Harry disse idiotamente, e Hermione e Ginny se entreolharam.


"Harry, vamos lá", disse Ginny. "Não acredito que você está nervoso por convidar alguém para sair".


"Eu nunca… quer dizer, eu não-"


"Você foi casado por quatro meses!", Ron disse, incrédulo. "Como você ainda pode ser tímido com esse tipo de coisa?"


"Eu não tive que convidá-lo para sair, tive?", Harry murmurou, desconfortável. "E eu não tive que tentar distraí-lo, ou, ou torcer para que ele não se entediasse comigo".


"Entendi".


"Além disso… e se ela quiser… você sabe…"


"O quê, ir para cama com você? E, novamente, como é que você pode ainda-"


"Não, não ir para cama", Harry disse impacientemente, e então franziu a testa de leve, e Hermione percebeu que a idéia também parecia deixá-lo extremamente nervoso. "Eu quis dizer, conversar…"


"Qual é o problema?"


"Sobre o que eu falaria com ela? Eu não consigo conversar com garotas", ele murmurou.


"Com quem você está conversando agora?", Ginny disse, devagar.


"Vocês duas não contam", ele respondeu.


"Oh, que bom, estou contente de ver que você voltou ao normal", Ginny disse secamente.


"Peça para sair com ela de novo", Ron sugeriu.


"Pedir para sair com quem de novo?", Dean perguntou quando ele, Seamus, Neville, e Colin Creevey se juntaram ao grupo perto da lareira.


"Hannah Abbot".


"Ah, é, como foi o seu encontro, Harry?" Colin perguntou.


"Tudo mundo menos eu sabia que isso era um encontro?", Harry perguntou, com raiva.


"Sim", veio a resposta em coro.


"Ele pensou que era só Herbologia", Ginny explicou. "Nós acabamos de explicar o conceito todo para ele".


"Ele vai convidá-la para sair de novo", disse Ron.


"Não, eu não vou-"


"Sim, boa idéia, Harry", disse Seamus. "E, se você acabar ficando com ela, isso vai ser mais fácil de conviver do que com… quer dizer, você sabe…"


O grupo inteiro riu. "Oh, sim, Harry", Dean disse, animado, "você poderia trazer Hannah para cá e Seamus não ficaria surtado".


"Mesmo se você fizesse algo tão chocante quanto sentar perto dela-" disse Colin.


"Ou segurar a mão dela-", disse Neville.


"Ou mesmo", Dean abaixou o tom de voz dramaticamente, "agarrá-la".


"Calem a boca, seus idiotas!", Seamus murmurou.


"Mas você vai ter que ter limites, não vai poder deitar no sofá com a cabeça no colo dela", disse Ron. "Porque isso é… bem, tão indecente-", ele riu enquanto Seamus subia as escadas, fazendo gestos obscenos para eles.


"Olha, eu não acho que vocês… acho que Seamus não vai ter nada com que se preocupar. Eu não vou convidá-la para sair", Harry disse, desconfortável.


"Por que não?"


"Eu não tenho tempo para… eu só quero me concentrar nos NEWTS e em voltar a jogar Quadribol. E no que está acontecendo fora da escola. Eu não quero nenhum tipo de distração".


Houve um desconfortável silêncio enquanto todos tentavam não pensar nas últimas notícias do Profeta. Outro sumiço. Perturbadores rumores de atividades de Comensais da Morte nas proximidades de Hogwarts. Hermione olhou para o jornal na mesa de canto do salão comunal. "Comensal da Morte condenado Lucius Malfoy retorna da sua misteriosa ausência", dizia a manchete.


"Bem", Ginny limpou a garganta. "Esse foi um jeito muito legal de acabar com o clima, Harry", ela disse, e os outros riram, desconfortáveis. "Se você queria que a gente parasse de falar sobre sua vida amorosa, era só pedir".


"Desculpe".


Ginny pegou O Profeta. "Eu me perguntou se ele já pensou em mudar legalmente de nome para ‘Comensal da Morte Condenado Lucius Malfoy’", ela disse.


"O que você acha que o pai do Malfoy vai fazer?", Neville perguntou em voz baixa.


"Eu não sei", Harry disse. "E acho que não quero saber".


"O que você vai fazer?", Neville perguntou hesitantemente. "Se a guerra chegar e você tiver que… ir contra Malfoy. Lutar contra ele".


"Eu não sei", Harry disse em voz baixa.


Hermione olhou para ele, pensativa. Embora Harry nunca houvesse falado a respeito, ele provavelmente já se perguntara a mesma coisa centenas de vezes nos últimos meses. Todos tinham. Mas até então era diferente, porque ele e Malfoy estavam unidos pelo elo, não havia como Malfoy lutar contra Harry sem cometer suicídio, e o sonserino não era do tipo de se sacrificar pela causa


Mas, agora…


"Eu não sei se conseguiria lutar contra ele também", Neville balançou a cabeça.


Todos o encararam, surpresos. "Mesmo?", Hermione perguntou.


"Ele não é o pai dele", Neville respondeu.


"Não, ele não é".


"Ele é nosso colega de classe. Ele não é o inimigo. Nenhum deles é, na verdade".


"Não, agora eles não são", disse Ron. "Mas, e se um deles atacasse você?"


"Se eu tivesse que me defender, sim. Mas, atacar antes…", Neville balançou a cabeça.


"Bem, vamos esperar que nunca tenhamos que descobrir", disse Ron, fechando os olhos e sinalizando o fim da discussão.


Hermione acariciou o cabelo de Ron, refletindo enquanto encarava as chamas na lareira e perdendo novamente o rumo da conversa.


Esposito estava certa. Harry e Malfoy poderiam fazer bem a muitas pessoas se tivessem ficado juntos. Na verdade, eles já tinham feito isso, mesmo que por alguns meses. Ainda que tivesse sido difícil no começo, muitas pessoas de várias casas se esforçaram para se dar bem e tinham conseguido, em diferentes níveis. Zabini e Ron, Dean e Tracey Davis — mesmo Hermione havia conseguido deixar de lado sua animosidade com Pansy Parkinson, não apenas para coisas importantes, como salvar as vidas de seus melhores amigos, mas para coisas mais simples, como organizar a surpresa para Harry e Malfoy participarem do Baile.


Alguns de nós podemos ser humanos’, tanto Esposito quanto Parkinson tinham dito, e Hermione finalmente percebia que era verdade. E ela tinha quase certeza que alguns sonserinos tinham percebido isso também.


Quão longe todos eles poderiam ter ido, se Lucius Malfoy não tivesse encontrado Parnassus McKay?


ooooooo


Dia 129, Quinta


Harry suspirou, voltando para o depósito de Quadribol para pegar os livros que tinha esquecido depois do treino daquela manhã. Ele esfregou a testa, tentando afastar a dor de cabeça que havia piorado nos últimos dias.


Droga, tinha que sair dessa. Aquilo estava ficando ridículo. Não estava conseguindo se concentrar, e precisava conseguir se concentrar, por outros motivos além dos NEWTS. Que estranho, ele não tinha percebido o quanto tinha sido influenciado pelos hábitos de estudo de Draco, já que grande parte do tempo em que eles estavam juntos Draco estava estudando. E, como Harry não queria sentar e ficar assistindo ou reler ‘Quabribol Através dos Tempos’ pela qüinquagésima vez, a única coisa que sobrava para ele fazer era estudar também. Mas não era fácil manter esse tipo de disciplina sem conviver constantemente com uma espécie de consciência acadêmica. E as reclamações de Hermione não se comparavam.


Era fácil demais se distrair do tédio de estudar. Se não era um jogo de Snap Explosivo era Quadribol e, se não era nenhum dos dois, eram as notícias no jornal.


Ele provavelmente deveria voltar a fazer o que mesmo de quando o elo foi lançado: ficar o mais afastado possível do Profeta. Porque era fácil demais se entregar às especulações inúteis de quais notícias tinham relação com Voldemort e quais não tinham. Ou passar horas pensando no que Lucius Malfoy deveria estar planejando. Naquele dia mesmo havia sido publicada uma frase dele sobre não confiar em trouxas — combinava com as outras de suas declarações conservadoras desde que voltara de seu misterioso sumiço, e Harry não tinha idéia do que aquilo significava.


E o grifinório ainda estava esperando pelas "coisas feias" que Draco havia mais ou menos lhe avisado no dia em que o elo foi dissolvido.


O que o levava para o outro motivo da sua distração. Definitivamente, não era fácil manter os estudos enquanto ele ficava cada vez mais irritado em como estava sendo lenta a sua superação do elo. O curandeiro avisara sobre "um pouco de desorientação nos primeiros dias", mas já tinham se passado quase duas semanas e ele estava ficando cansado de sentir falta de Draco. A sensação de que estava andando sem uma parte de si tinha aprofundado de um jeito que ele não se sentia mais afetado apenas pela falta da companhia constante, mas pela vontade de querer falar com o outro nas aulas, de querer voar com ele, ou de simplesmente ouvir sua voz. E isso não estava diminuindo, pelo que Harry percebia.


E todo o lance da falta de sexo… não estava facilitando em anda. Meio-excitado estava se tornando uma condição permanente. Com tudo isso, e com a distração e o desânimo, não era de se estranhar que ele estava com dor de cabeça.


Talvez devesse convidar Hannah para sair, mesmo que a idéia não o entusiasmasse. O que era estranho; Hannah era bem bonita e ele tinha se interessado por ela, antes. Mas agora não tinha interesse algum, e… bem, era ridículo, mas ele se sentia como se estivesse cometendo uma traição, ou algo assim, só de pensar em convidá-la para sair.


Ainda mais ridículo era que a idéia de fazer qualquer coisa remotamente romântica com Hannah quase o assustava. Ele fizera sexo mais vezes e de mais maneiras que achava que fosse possível nos últimos quatro meses, e, mesmo assim, lá estava ele, alarmado com o pensamento de ficar com Hannah Abbot.


E o fator ridículo absoluto era a parte de si que estava com medo de não ficar ou dormir com Hannah Abbot. E se ela não quisesse sexo? E se ela quisesse conversar? Conversar com Hermione e Ginny era uma coisa, mas ele fora um desastre conversando com a única garota que chamara para sair, e não estava animado com a perspectiva de tentar novamente.


Aquilo tinha sido bom em estar com Draco. Draco nunca queria particularmente conversar e sempre queria sexo. E, quando eles conversavam, Harry nunca tinha que se preocupar com o que dizer. Exceto pelo breve período em que estavam tentando descobrir como ficar juntos de uma maneira não-hostil, a comunicação entre eles sempre tinha sido relativamente fácil. No início, tinham um padrão bem-estabelecido de ódio e insultos mútuos, e, depois da suspensão, tinham ficado confortáveis um com o outro. Além disso, Harry nunca tivera que passar metade da conversa se preocupando com o que Draco estaria pensando ou sentindo, ou ele sabia, por causa do elo, ou não sabia e não se importava.


Inacreditável. Lá estava ele, lembrando com nostalgia do seu erro de casar com Draco Malfoy, e aterrorizado com a idéia de sair com uma Lufa-Lufa. Harry quase podia ouvir a voz de Draco fazendo comentários maldosos que envolviam as palavras 'patético', 'imensuravelmente' e 'idiota'. E podia se ouvir concordando plenamente.


Não, ele realmente deveria tentar com Hannah. Afinal, aparentemente Draco tinha ficado com Pansy não muito depois que o elo foi rompido, e, se Draco podia seguir em frente, ele também podia.


Harry virou na direção do depósito e acabou colidindo com alguém que vinha pelo mesmo caminho.


"Oh, desculpe!", murmurou, tentando manter o equilíbrio quando uma voz familiar disse "Olhe por onde você-"


Ele e Draco ficaram imóveis, encarando um ao outro com os olhos arregalados.


"Oh. Erm. Desculpe. Eu, eu não estava prestando atenção-", Harry desviou o olhar primeiro, abaixando-se para pegar os livros que Draco tinha derrubado.


"Não, tudo bem… foi minha culpa, eu não estava, erm…" Draco se interrompeu.


"Aqui", Harry levantou, entregando os livros para Draco.


"Obrigado".


Os dois olharam para o chão por um momento.


Harry limpou a garganta. "Erm… é bom te ver-", ele fez uma careta assim que as palavras saíram da sua boca por pensar como elas soavam idiotas. Eles se viam o tempo todo. "Fora da aula, quer dizer".


Um breve sorriso, rapidamente reprimido, da parte de Draco. "Sim". Ele limpou a garganta também. "Como… como você está?"


"Tudo bem", Harry disse rapidamente. "Erm… você?"


"Sim, bem".


"Eu ouvi… quer dizer, eu li que seu pai voltou".


"Sim".


"Isso é… bom, não é?"


"Oh, sim. Sim, isso é… é bom".


Merda, aquilo era tão estranho. Harry limpou a garganta de novo. "Eu acho que é melhor nós, erm…"


"Sim", Draco concordou com a cabeça, e Harry começou a se afastar, e então levantou o olhar quando Draco limpou a garganta novamente.


"Como… como você está, de verdade?", Draco perguntou rapidamente.


Harry deu de ombros, desconfortável, mas lhe lançou um pequeno sorriso. "Erm… tudo bem. Mas… ainda é meio estranho, não é?"


"Sim".


"As coisas estão… bem, na Sonserina?"


"Erm… mais ou menos", disse Draco, evasivo.


"Mesmo?"


Draco deu de ombros. "Nott ainda está sendo um pentelho, mas…"


"Mas você saberia que algo estava errado se ele não estivesse".


Draco riu. "É".


"Você… não me diga, obviamente, se você não puder, mas eu só estava pensando… você descobriu alguma coisa sobre McKay…", ele se interrompeu, desconfortavelmente consciente de que Draco poderia não dizer nada para ele, mesmo se soubesse.


Draco balançou a cabeça. "Ele era um Comensal da Morte. Isso é tudo que eu sei. E não sei como meu pai o encontrou… ou como conseguiu entregá-lo, ou se ele tinha alguma relação com alguém daqui".


"Que pena".


"Sim".


E não havia mais nada a dizer, Harry percebeu. Apesar do fato de que nenhum dos dois parecia ter pressa para se livrar do outro, eles não tinham mais nada para conversar.


E essa era uma coisa boa. Ele se repreendeu mentalmente e balançou a cabeça. "Bem. É melhor eu ir pegar meus…"


"É, eu também".


Eles passaram um pelo outro, e então Harry pensou em uma coisa e se virou. "Draco?"


"Sim?"


"Eu vi que você voltou ao time. Eles já estão melhores".


Draco sorriu. "Nós vamos acabar com vocês no último jogo".


Harry sorriu de volta. "Eles não estão tão bem assim".


Draco deu de ombros. "Seu time pode ter jogadores melhores, mas o goleiro de vocês é terrível. E o apanhador também não é muito bom".


"Eu sou melhor em partidas, lembra? E aprendi um pouco com seu estilo de jogar também".


"Não vai adiantar nada", Draco desdenhou. "Mas boa sorte contra a Lufa-Lufa".


"Obrigado".


E eles continuaram a caminhar.


Harry entrou no depósito e se inclinou contra a porta. Por deus, aquilo era ridículo… ele estava… a dor de cabeça fora esquecida, e ele estava corado e tremia um pouco, com uma sensação quente no peito como se alguma coisa maravilhosa tivesse acontecido, ao invés de uma simples e estranha e horrível conversa com seu… ex.


Continue em frente. Continue em frente e caia na real. Não foi nada de mais. Harry alinhou os ombros e foi procurar seus livros.


ooooooo

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