Dentro da Floresta Proibida

Capítulo 18 - Dentro da Floresta Proibida

Já era hábito de Martha ir tomar chá com Hagrid e geralmente encontrar os três alunos inseparáveis da Grifinória na pequena cabana às margens da Floresta Proibida. Ela não abriu mão dele depois do casamento, e Severo achava até interessante que ela tentasse algum contato com o corpo estudantil mesmo que fosse com "a gangue de Harry Potter", como ele costumava dizer. Minerva também tomava chá com Martha, que rapidamente aprendeu o caminho para a Torre de Grifinória.

Com o passar das semanas, parecia que a situação com Voldemort tinha entrado numa estranha espécie de calmaria. Severo era chamado e Martha tentava não mostrar sua preocupação, por vezes fingindo estar adormecida quando ele voltava, exausto e/ou ferido, no meio da noite.

Durante o dia, Martha estudava. Ela levou quase três dias enviando cartões de agradecimento a todos que mandaram presentes pelo casamento, mas depois disso, afundou a cara nos livros. Ela leu os livros novos e antigos sobre Estudos dos Trouxas, ocasionalmente dando palestras para os alunos. Ela descobriu que as turmas mais novas pareciam estar genuinamente interessadas nela, tanto quanto naquilo que ela tinha a dizer. Era gratificante ver os rostinhos jovens parecendo maravilhar-se com a visão de quem não tinha magia em sua vida. O Prof. Hagglemore sempre a incentivava a dar palestras sobre temas variados.

Ao encerrar um ciclo de palestras, ela se dirigiu à cabana de Hagrid, enfrentando o vento frio e atravessando o gramado coberto por uma camada fina de neve. Como sempre, ela foi recebida com um sorriso:

- Olá, Sra. Martha! Acabei de colocar uma chaleira no fogo! Entre, vamos!

- Obrigada, Hagrid. Oi, Canino - ela juntou as mãos enluvadas - Hoje está mesmo frio, não?

- É, o inverno está chegando bem rápido.

Martha se acomodou numa das poltronas mais próximas da lareira, Canino ficou deitado a seus pés:

- Ah, assim está bem melhor. Hagrid, como você está das mãos? Passou a dor da ferida dos tronquilhos?

- Melhor, obrigada. Os danadinhos têm mesmo uns dentes afiados.

- E você terminou não indo ver Madame Pomfrey?

- Por causa de uma coisinha à toa? Ela iria até estranhar - Hagrid passou-lhe uma caneca de chá - Hoje fiz chá de espinheira. Espero que goste. É melhor deixar curar alguns minutos.

- Hum, o cheiro é bom. Minerva é quem sempre me apresenta uns chás novos, mas esse ela nunca mencionou.

- É feito com espinhos de ouriço - Martha arregalou os olhos e Hagrid apressou em dizer - Mas eu passei uma peneira fina, não se preocupe!

Ela não pôde evitar sorrir e disse:

- Hoje não vou poder ficar muito tempo, Hagrid. Eu estou um pouco cansada e ainda quero passar algum tempo na biblioteca preparando minha próxima palestra.

- Hum, você sempre fica tão animada para essas palestras. Essa vai ser sobre o quê?

- Entretenimento trouxa nos séculos 20 e 21. Fui eu quem sugeriu o tema ao Prof. Hagglemore.

Hagrid sorriu:

- Ele que se cuide, senão você vai pegar seu emprego.

- Eu jamais aceitaria isso - disse ela - Além do mais, ninguém se torna professor de um dia para outro. Eu nunca dei aulas antes, preciso de tempo para aprender.

- Harry e Hermione têm gostado. Eles dizem que os demais alunos também gostam das palestras.

- Eles são uns amores. Será que vão aparecer aqui?

- Não, Sra. Martha, eu acredito que não. Eles têm muita lição de casa para fazer, segundo Rony disse.

- Oh, que pena. Faz alguns dias que eu não os vejo. Sinto falta deles.

- Mas vocês não se vêem no castelo?

- Não - ela deu de ombros - Os garotos não ficam à vontade nos meus aposentos por causa de Severo. Acho que nós nos divertimos mais em território neutro.

- E você fica chateada com isso. Dá para ver pelo jeito que você fala.

- Eu acho que Severo é um tanto incompreendido, mas reconheço que ele não tem exatamente o que se chama de grandes habilidades sociais. Eu só gostaria que eles se dessem bem, só isso.

- Você gosta dos meninos, não?

- Como se fossem meus irmãos. Eu nunca tive irmãos, então acho que estou transferindo um pouco. Por isso eu queria tanto que eles se dessem bem com Severo. É como se eles fossem a minha família.

- Eu amo Harry como meu irmão caçula, também. Fui eu quem disse a ele que ele era um bruxo. Ele quase não acreditou.

Martha bebericou um pouco de chá:

- Eu só imagino o susto que o pobre menino levou. E isso que ele era bem mais novinho!

- Foi no dia que ele completou 11 anos.

- Eu era adulta e quase não acreditei em Severo tampouco. Nós, trouxas, preferimos explicações racionais. Magia não é uma delas. Eu nem acreditava em coisas do estilo New Age - ao ver o rosto confuso de Hagrid, ela acrescentou - É uma espécie de ilusão trouxa. Na verdade, é um assunto complicado.

- É difícil imaginar o que se passa na cabeça de trouxas.

- Você tem mais razão do que pensa, Hagrid - ela se levantou, vestindo as pequenas luvas de lã - Lamento, mas eu devo ir agora. Está anoitecendo.

- Oh, que pena. Tente voltar amanhã.

- Eu vou fazer isso, Hagrid. Obrigada pelo chá. Estava muito gostoso.

Martha se despediu de seu anfitrião e começou a atravessar o gramado coberto de neve no lusco-fusco do entardecer. Ela realmente se sentia cansada, e imaginou que talvez a ida à biblioteca pudesse ser adiada para o dia seguinte. Contudo, seus pensamentos foram interrompidos por ruídos vindos da Floresta Proibida. Na verdade, vozes.

Até aquele dia, Martha jamais tinha sequer pensado em entrar na Floresta. Ela estava proibida de fazer isso sem um bruxo adulto ao lado. Mas as vozes pareciam aflitas - e jovens. Podiam ser alunos em apuros.

Mais tarde, ela não saberia responder por que não tinha chamado Hagrid assim que achou que haveria problemas. Mas quando as vozes ficaram mais altas e mais angustiadas, ela não pensou em mais nada a não ser em achar os donos delas. Agarrando a barra da saia e da grossa capa de inverno, ela se embrenhou pela Floresta adentro, na direção dos ruídos.

Na verdade, Martha não precisou entrar muito longe na Floresta. Em questão de minutos, ela localizou um clarão e foi para aquela direção. As vozes, agora mais distinguíveis, também estavam mais claras.

Alguém definitivamente estava em perigo.

Ela quase caiu para trás quando viu quem era. Draco Malfoy estava no chão, apoiado pelos cotovelos, e era mantido imóvel pela varinha acesa de Emília Bulstrode. Aparentemente, a garota o encurralara para fazer alguma maldade.

- A hora chegou, Malfoy - disse a moça, num tom ameaçador - Hora de dizer onde está sua lealdade!

Mesmo caído e assustado, Malfoy parecia estar buscando uma saída:

- Bulstrode, pense no que está fazendo! Isso só vai piorar sua situação!

Martha viu que os dois estavam tão entretidos que não perceberam sua aproximação. Ela viu também que a varinha de Malfoy estava no chão, não muito longe dela. Isso significava que o garoto estava desarmado e indefeso. Talvez ela pudesse pegar a varinha sem que eles percebessem...

Pé ante pé, ela foi se aproximando do objeto mágico. Ela estava bem perto da varinha e quase deu um pulo quando ouviu:

- Ora, ora! Olhe só quem resolveu aparecer, Draco!

Martha deu uma corrida até a varinha e ficou com ela na mão. A cena fez Emília cair na gargalhada:

- Ahahaha! Olhe só a trouxa! Coitadinha, ela pensa que pode fazer magia! Draco, olha só para isso!

Martha ignorou a provocação e disse, de olhos fixos em Emília Bulstrode:

- Isso pertence a você, Draco?

- Sim, senhora.

- E você está bem? Está machucado?

Ele tentou responder, mas Emília o interrompeu:

- Isso é um assunto particular, trouxa. Você está se metendo onde não é chamada. Vocês, trouxas, não aprendem boas maneiras?

Martha continuou tentando se controlar e dirigiu-se a ela, dizendo calma e pausadamente:

- Srta. Bulstrode, se abaixar sua varinha e voltar para o castelo nesse exato momento, eu lhe prometo não falar de nada disso para o Prof. Snape. Deve saber tão bem quanto eu que o que está fazendo aqui vai lhe render uma expulsão na certa. Portanto, se pensar bem, verá que essa é a melhor solução para todos.

A moça franziu sua cara horrível para gritar:

- E do que me importa ser expulsa? Isso já não tem mais a mínima importância!

- Como assim?

- Então você não sabe? Eu recebi uma carta do Ministério da Magia. Eles instauraram um inquérito por causa de minha brincadeira. Malfoy foi chamado a depor e é claro que você também será chamada. Já convocaram a Suprema Corte dos Bruxos! Eu posso ir para Azkaban por sua causa, sua trouxa imunda!

Martha ficou tensa. Ela jamais desejara que as coisas tivessem ido tão longe, mas a coisa estava fora de suas mãos. Ela disse:

- Eu não sabia disso, Emília. Eu sinto muito. Muito mesmo.

A moça pareceu se irritar mais ainda:

- Pois eu aposto que está louca para comemorar! Era tudo o que você queria, não era, trouxa? E aqueles idiotas adoradores de trouxas do Ministério caíram nessa! Bem que meu pai diz que o sangue de um bruxo conta cada vez menos hoje em dia.

Martha tentou dizer:

- Emília, por favor -

Foi interrompida e ameaçada com uma varinha:

- Não me venha com essa! Você vai pagar por isso, trouxa!

Foi então que várias ações aconteceram quase simultaneamente. Bulstrode agitou a varinha e gritou:

- Everte Statum!

Draco aproveitou a distração dela e gritou ao mesmo tempo:

- Accio varinha!

Vendo que ela estava para atacar, num reflexo, Martha se encolheu e levou os braços a proteger sua cabeça, ao mesmo tempo em que a varinha de Draco voava de sua mão. Nesse momento, o mais incrível aconteceu: o raio dourado e sinuoso que saiu da ponta da varinha de Emília fez um gracioso arco no ar negro da noite fechada e desviou-se para ser absorvido pela pedra na aliança de casamento de Martha.

Por um momento, ela ficou imóvel, encolhida, tentando sentir onde havia sido atingida. Emília também ficou abobalhada por um minuto, tentando descobrir o que tinha acontecido. E esse minuto era tudo o que Draco precisava para apontar a varinha e dizer:

- Petrificus totalus!

O volumoso corpo de Emília se esticou e ela foi ao chão, imóvel. Martha arriscou abaixar os braços, indagando:

- O que você fez com ela?

- Ela só vai ficar imóvel - disse ele, erguendo-se do chão e usando as mãos para tentar tirar a neve e a lama de suas capas - A senhora está bem?

Martha ficou em pé, respondendo:

- Sim, estou ótima. Mas gostaria de saber como.

Draco chegou até ela e parecia mancar um pouco. Martha ficou surpresa:

- Você está ferido! Por que não me disse quando eu perguntei?

O jovem fez uma careta de dor:

- Nada pessoal, eu só não queria dar a ela a real medida de sua vantagem sobre mim. Questão de estratégia.

Martha passou o braço dele em volta do seu pescoço:

- Vamos, eu vou ajudar você a chegar à enfermaria. Você está tremendo de frio! Como podemos transportar Emília?

- Mandamos alguém vir pegá-la mais tarde - Draco deu de ombros.

- Ela vai congelar de frio! - escandalizou-se Martha - Agora que você tem sua varinha, não podia despetrificá-la com segurança?

Draco olhou para Martha, indagando:

- Você realmente se preocupa com ela?

- É claro que sim! Ela tem pais que devem estar preocupados!

Seja que resposta Draco quis dar, morreu em sua garganta. Um barulho os deixou em alerta. Eram Snape e Hagrid, este último trazendo uma lanterna. Martha gritou:

- Estamos aqui!

A voz de Severo transmitia toda a sua contrariedade e preocupação quando ele indagou:

- O que está acontecendo aqui?

Coube a Draco Malfoy explicar:

- Foi tudo obra de Bulstrode, senhor. Ela conseguiu me atrair para a Floresta e me falou sobre o depoimento no Ministério da Magia.

Hagrid disse:

- Bem alto, inclusive. Foi isso que me atraiu para cá, mas o Prof. Snape já estava a caminho.

Severo indagou, preocupado:

- Martha, você entrou na Floresta sozinha? Por quê?

- Eu ouvi vozes quando saí da cabana de Hagrid - explicou ela - Alguém parecia estar em perigo. Eu só queria dar uma olhada para avisar alguém, mas Draco estava rendido e indefeso com aquela moça. Ele precisava de ajuda.

Hagrid indagou:

- Está ferido, Malfoy?

- Sim - confessou o rapaz - Ela tirou minha varinha e me acertou com uma ou duas maldições.

- Venha, eu vou levar você até a Enfermaria - Hagrid livrou Martha de sua carga e depois olhou para a jovem petrificada - Acho melhor recolher o lixo também.

Colocou Emília sobre o ombro, e ela parecia uma tora de madeira tanto no peso quanto na forma. No outro ombro, carregava Malfoy, que reclamou um pouco, mas conformou-se que não podia andar. Em seguida, o meio-gigante despediu-se:

- Bem, estou indo agora. Sabe o caminho de volta, Professor?

- Certamente que sim, Hagrid.

- Então até mais! E fique quieto, Malfoy, ou eu chamo Fofo para te fazer companhia!

E saiu rumo ao castelo com seus dois "pacotes", um muito duro e o outro se contorcendo todo.

Severo se virou para Martha:

- Você está bem?

- Estou só meio gelada e assustada, mas fora isso estou bem.

- Tem certeza?

- Sim. Não se preocupe.

Agora que Severo viu que Martha estava bem, ele sentiu raiva e indagou:

- Você faz idéia do risco que estava correndo? As proteções de Hogwarts não se estendem à Floresta! E se fosse uma cilada?

Ele tinha razão. Martha sentia-se como se fosse uma aluna, recebendo a ira de um Severo mal-humorado:

- Desculpe. Eu agi mal, impensadamente. Foi um ato imprudente de minha parte. Desculpe pela preocupação que causei, mas não foi minha intenção.

Ele suspirou e pegou a mão dela:

- Não, eu é que peço desculpas. Estou nervoso. Quando eu recebi um aviso de que você estava em apuros...

- Através da aliança?

- Não, é do colar que lhe dei. Por que pergunta da aliança?

- Ela... teve um comportamento estranho quando a moça tentou me enfeitiçar. Ela meio que absorveu o raio - ela disse - Você não disse que essa aliança era uma herança de família?

As sobrancelhas de Severo se ergueram visivelmente.

- E é. Está há pelo menos quatro gerações na minha família. Mas eu não sabia desse poder protetor de suas pedras. Embora isso não me surpreenda.

Martha disse:

- Olhe, eu sei que isso vai parecer tolo, mas... tem certeza de que esse anel não está ligado a nada do mal? Sabe, tem uma história trouxa famosa sobre um tal senhor dos anéis, e aquele anel não era coisa boa.

Severo deu de ombros:

- Em se tratando da família Snape, há sempre uma chance de haver magia das trevas envolvida. Mas eu acredito que, se o anel fosse prejudicial, seus poderes já teriam aparecido. Não, é mais provável que ele tenha poderes de proteção a quem o usar.

- Essa aliança salvou minha vida hoje, Severo - ela se pôs na ponta dos pés e beijou-o - Obrigada por ter me dado.

Ele passou os braços em volta dela e convidou:

- Vamos voltar ao castelo antes que você pegue uma pneumonia.

- Está bem - disse ela, andando agarrada ao marido - Depois você me fala sobre essa tal audiência no Ministério da Magia?

- Não antes de você tomar uma boa xícara de chocolate quente.

- Eu posso pensar em outras maneiras de me esquentar...

- Martha, eu tenho provas para corrigir.

- A gente pode se esquentar rapidinho na banheira e você corrige as provas depois.

- Promete ser rápido?

- Só se você for um bom menino...

- Isso é incentivo para me tornar mau? Agora estou ligeiramente confuso com meus valores.

- Eu adoro quando você é mau, Severo. Quando você é bom, você é bom, mas quando você é mau, você é melhor ainda, sabia?

- A senhora está ficando muito saidinha, sabia disso, Sra. Snape?

- Meu marido gosta de mim assim como eu sou.

- Mesmo? Que cara de sorte.

- E vai ter mais sorte ainda essa noite...

- Vai me fazer correr até o castelo, é?

- Só se for atrás de mim!

Um grupo de alunas lufa-lufas do segundo ano achou incrivelmente divertido ver o mestre de Poções correr atrás de sua mulher nos corredores que iam dar nas masmorras. Elas nunca tinham visto seu carrancudo professor com aquela expressão no rosto.

Ele parecia absurdamente feliz.

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