Aliados
Tom ficou parado por uns instantes, a tentar perceber se a jovem falava a sério. Quando os segundos passaram e ela não vacilou, teve de admitir que parecia estar.
- Tu queres derrubar o ministério da magia. - Disse, devagar. Megan moveu a cabeça algumas vezes. - Posso perguntar porquê? E mais, como é que o planeias fazer?
- Porquê, não acho que seja da tua conta. - Respondeu Meg. Sentou-se junto à janela, sem tirar os olhos dele. - Também não acho que te vá importar. - Tom pensou que ela tinha razão. Não lhe importava nada do que dizia respeito a aquela jovem. Queria saber porque ela o quisera tirar do diário, e queria saber o que ela pretendia dele agora que o prendera ali. Tom analisara as protecções que ela deixara para o impedir de sair, e descobriu que a magia que conseguia fazer sem varinha era incapaz de as quebrar. Tal só muito raramente lhe acontecia, e ele estava intrigado. Precisava de uma ideia das capacidades mágicas da pessoa que enfrentava. Até agora, só sabia que Meg era capaz de lançar imperdoáveis e de se materializar.
Á parte disso, nada sobre ela lhe interessava.
- E quanto ao como? - Perguntou, pensando que ouvir qual o plano dela o ajudaria a perceber o tipo de pessoa com quem lidava. Meg mordeu o lábio, parecendo embaraçada pela primeira vez.
- Eu esperava que tu me pudesses ajudar com isso. - Tom lançou-lhe um olhar incrédulo.
- Porque é que eu havia de ajudar? Porque me tiraste do diário? Eu acabaria por consegui-lo por mim próprio em pouco tempo, muito obrigado. - Cuspiu ele. Megan olhou-o, confundida.
- Mas não é isso que tu queres também? - Perguntou. - Derrubar as pessoas que estão no poder? Não foi para isso que trabalhaste durante tanto tempo? Para dominar o mundo mágico?
- Por isso mesmo - replicou Tom - seria pouco razoável combater os meus próprios esforços, não é verdade? Quer dizer, eu nem deveria estar aqui, agora. Deveria ser o meu outro a acordar-me, quando estivesse velho. Ou então Malfoy, depois deste morrer. - O rapaz sacudiu a cabeça, parecendo ocorrer-lhe qualquer coisa. - Em que ano estamos? - Meg respondeu, e ele inspirou. - Bem, não estou muito adiantado, felizmente. O meu outro deve estar perto dos setenta anos por esta altura. Apenas mais alguns, e ele irá naturalmente passar o poder para mim. - Viu a expressão de Megan e franziu a testa. Ela cometera um erro em libertá-lo tão cedo, mas não podia culpá-la por isso. Mais alguns anos dentro do diário e ele perderia a razão. - Entretanto, posso ir aperfeiçoando as minhas habilidades mágicas, suponho. Assim e o meu outro estaremos ao mesmo nivél quando chegar a hora de ele renunciar em meu favor.
Enquanto ele falava, Meg ia pensando furiosamente. Tom, ou Voldemort, não estava a fazer sentido. Ocorreu-lhe que ele podia não saber o que se passara enquanto estivera preso no diário.
- Tom…- Começou ela, imaginando como é que colocaria aquele assunto - qual é a última coisa que te lembras sobre a tua vida?
- De ser colocado no diário. - Respondeu ele, automaticamente. - Depois disso, fui posto á guarda de um dos meus colegas, Lucius Malfoy. Ele mantinha-me informado dos avanços do meu outro. Da última vez que soube dele, penso que há onze anos, Lucius informou-me de que se preparava para dominar o ministério da magia. Por isso, vês, se o meu outro tem estado no poder todos estes anos, não há nada que eu vá fazer para mudar as coisas.
Meg manteve a boca entreaberta durante todo o seu discurso. Agora percebia que tinha uma tarefa ainda mais difícil pela frente.
Ela teria de contar a Tom Riddle tudo aquilo que se passara no mundo mágico nos últimos onze anos.
- Tom - disse, respirando fundo - acho que preciso de te dizer uma coisa. Mas não vais gostar de ouvir!
- Impossível!
Tom Riddle andava ás voltas pelo quarto, tão depressa que Meg se admirou de o chão não ganhar buracos. Ela estava sentada na cama, a fazer festinhas a Kazeila, que se enroscara no seu colo. Tom parou de repente e olhou para ela.
- Estás a dizer-me - ele parecia ter recuperado a postura, pelo menos de momento. - Que eu nunca cheguei a supremo governante do mundo mágico porque fui morto há onze anos atrás por um fedelho de um ano de idade?
- Mais ou menos isso, sim. - Respondeu Meg, aliviada por ele estar a engolir aquilo tão bem. Só levara uma hora a deixar de gritar.
- Impossível. - Disse Tom novamente, antes de dar um soco na parede. Meg suspirou. Nas passadas horas, ela explicara-lhe resumidamente o que se passava actualmente no mundo mágico, nomeadamente o que acontecera com Lorde Voldemort, até onde ela sabia. Deixou Tom despejar mais alguma raiva na parede antes de fazer um som para lhe chamar a atenção.
- Acho que é uma má altura para perguntar…- Começou - Mas sobre o que eu te perguntei antes…- Tom virou-se para ela e examinou-a de alto a baixo antes de responder:
- Sim, eu alinho. - Com uma voz que fez Megan interrogar-se se seria ou não sensato ter-lhe contado tudo aquilo.
- A sério? - Soprou ela, um bocadinho incrédula. - Vais ajudar-me a derrubar o ministério? - Tom moveu a cabeça umas quantas vezes.
- Eu não lutaria contra mim mesmo. - Disse ele - mas contra um sujeito chamado…- Fez uma pausa, parecendo embaraçado, antes de perguntar - como é que se chama o actual ministro da magia, afinal?
- Guillaume Duprée. - Respondeu Megan automaticamente, antes de se lembrar. - Ah, não, isso é em França, desculpa. O ministro da magia britânico é um tal Cornelius Fudge.
Tom cerrou os dentes.
- Não estás a falar a sério. - Megan abanou a cabeça, descontente. Aquilo não estava a ir tão bem como esperava.
- Estou a falar a sério. Pára de dizer isso. - Já impaciente, levantou-se. - Ele também não será ministro por muito tempo, de qualquer das formas.
Tom gostou da iniciativa da jovem. Ela daria uma seguidora excelente, se aprendesse a superar o seu pequeno problema de temperamento. Na sua cabeça, começava já a traçar o seu próprio plano. Ainda não se encontrava restabelecido o suficiente ou ao corrente do que se passava no mundo. Assim, seria estúpido começar de imediato a fazer planos de recrutamento. Por enquanto teria de contentar-se com uma menina e uma cobra. Teria também de se inteirar de quaisquer inovações em matéria de magia que existissem entretanto. O seu outro separara-o num momento crítico da sua vida, na opinião de Tom. Ainda havia tanto conhecimento que lhe restava aprender e tanto treino mágico de que precisava.
Por agora, tinha de conseguir uma varinha. Notara que Megan não andava com uma de reserva, como qualquer feiticeira sensata faria, e isso era uma mancha na opinião que tinha dela.
- Suponho que não será possível arranjar-me uma varinha ainda esta noite? - Perguntou. Meg pestanejou algumas vezes - ela fazia isso muito, reparou - e estendeu-lhe a sua própria, ao mesmo tempo que perguntava:
- Mas porque precisas tu de uma? - Tom encarou-a. A opinião que tinha dela começava a esfarelar-se.
- Porque é que um feiticeiro precisa de uma varinha? - Era uma pergunta de retórica. Não esperava ver Megan pestanejar e responder:
- Não sei. A mim nunca me fez falta uma. - Tom fez um som de troça.
- Suponho que consegues atordoar alguém de mãos vazias, não é? - Disse, sarcástico. Meg fez uma pausa, gritando de seguida:
- Stupefy! - Tom mal conseguiu mover a varinha para evocar um escudo a tempo. Surpreso, sentiu a força do encantamento embater no escudo. Incrédulo, olhou para a jovem que lhe sorria.
Engoliu algumas vezes. Aquilo não era uma situação em que tivesse estado antes. Encontrava-se em desvantagem relativamente a alguém, o que o irritava. Mas também sabia que podia tirar partido daquela situação. Aprenderia com Meg, o suficiente para poder chegar ao resto por si mesmo e superá-la. Acabava de perceber que ela nunca entraria na categoria de Devorador da Morte. Não era uma inferior que pudesse comandar, e nunca aceitaria o seu comando. Era uma inimiga em potencial, e uma ameaça preocupante, que a seu tempo teria de eliminar. Até lá, o melhor era fingir derrota e humildade. Tom era bom nisso, desde que se recordasse de que se tratava de fingimento.
- Podes ensinar-me como fazer isso? - Perguntou. Meg acenou, rindo.
- Claro. - Disse, amigavelmente. Tom quase sentiu que aquilo era fácil demais. Embora tivesse morto antes, ela continuava a ser uma jovem demasiado inocente, que confiava facilmente. - Somos aliados ou não?
- Aliados. - Tom riu-se interiormente. Aliados. Ele não tinha aliados, tinha servos. Embora Megan não entrasse exactamente nesse grupo, a seu tempo ela aprenderia quem mandava. Deixá-la ia pensar que a via como igual, por enquanto.
Encontrava-se tão concentrado nessa ideia que perdeu a piscadela de olho subtil que Meg dirigiu à cobra enroscada no seu colo, e o quase silvo de troça que esta deixou escapar em resposta.
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