CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 20
Quando Gina se aproximou do salão, o ruído que tinha sido audível do seu quarto se transformou em um fulgor ensurdecedor. Estava formado por uma cacofonia de risadas e música que se sobrepunham a muitas conversas. Com o pé sobre o último degrau, vacilou por um instante antes de aparecer diante da vista dos convidados.
Sabia, sem necessidade de olhar, que o salão estaria cheio de homens que sabiam tudo sobre ela; homens que indubitavelmente tinham estado no acampamento na noite em que foi entregue a Harry como um pacote; outros homens teriam tomado parte em seu segundo seqüestro, quando foi obrigada pela força a deixar o castelo de Weasley, e outros teriam assistido a humilhante recepção de que tinha sido objeto nesse mesmo dia por parte dos aldeãos.
Fazia apenas meia hora, quando seu marido lhe falou com aquele tom de voz tão profundo e persuasivo a respeito de lembranças para conservar, a perspectiva da festa lhe pareceu maravilhosa; agora, entretanto, a realidade a respeito de como tinha chegado até ali fazia com que o prazer começasse a se desvanecer. Considerou por um instante a idéia de retornar para seu quarto, mas sabia que seu marido iria procurá-la. Além disso, disse a si mesma, preparando-se para fazer sua entrada, de qualquer forma teria que confrontar aquelas pessoas em um momento ou outro, e uma Weasley nunca se acovardava.
Emitiu um prolongado suspiro para infundir ânimo, desceu o último degrau e entrou no salão. A luz das tochas a fez piscar e se sentir confusa por alguns segundos. Ali devia haver pelo menos trezentas pessoas; estavam de pé, falando, ou sentadas diante de longas mesas instaladas em um lado do salão. Outras se dedicavam a contemplar o espetáculo; e todas elas mostravam assombradas com a variedade; na galeria havia uma pequena orquestra, enquanto vários malabaristas perambulavam pelo salão, entretendo pequenos grupos de convidados. No centro do salão, quatro malabaristas, com trajes multicoloridos, jogavam bolas ao ar, enquanto no lado mais afastado três acrobatas faziam piruetas. Atrás da grande mesa situada sobre o estrado, um músico tocava alaúde, acrescentando seus doces acordes ao burburinho que reinava no salão.
Gina observou, não sem certa surpresa, que também havia pressente umas trinta mulheres, certamente as esposas de alguns dos cavalheiros, ou dos vizinhos. Distinguiu Harry com facilidade, pois, com a única exceção de Hagrid, era o homem mais alto que havia no salão. Estava de pé, não muito longe, conversando com um grupo de homens e mulheres, com uma taça na mão, rindo de algo que algum deles havia dito. Ocorreu-lhe pensar que nunca o tinha visto daquele modo, conversando relaxadamente, como o dono de seu próprio castelo. Essa noite não se parecia em nada com o lobo que era; parecia, mas bem um nobre poderoso, e também perigosamente atraente, teve que admitir Gina com um pequeno comichão de orgulho enquanto contemplava seu rosto bronzeado.
Alertado da presença de Gina pelo súbito término do ruído no salão, Harry deixou a taça, desculpou-se diante de seus convidados e se voltou para ela. Um lento sorriso de admiração se estendeu sobre seu rosto ao contemplar a jovem duquesa de aspecto régio que caminhava para ele, com um traje de veludo azul, com um corpete fazendo jogo e uma saia que se abria para revelar o brilhante tecido dourado do vestido que usava por baixo. Sobre seus ombros estava uma capa de veludo entremeada com fios de ouro, e fechada com um broche de ouro engastado com pedras de água-marinha. Em sua estreita cintura havia um cinto de cetim dourado, de bordas azuis, com água-marinha engastadas. O cabelo, partido ao meio, caía-lhe sobre os ombros e as costas em cachos reluzentes que formavam um esplendoroso contraste com a cor do vestido.
Deu-se conta tardiamente de que tinha permitido que sua corajosa e jovem esposa, fosse quem se aproximasse dele, e se apressou a sair em seu encontro. Agarrou as frias mãos entre as suas, atraiu-a para ele e a contemplou com um sorriso resplandecente, incapaz de esconder sua admiração.
- Está muito linda. - sussurrou. - Fique quieta um momento, para que todos possam te ver.
- Me deu a entender, milorde, que uma das muitas razões pelas quais se opusesse a se casar comigo, mesmo que fosse a rainha da Escócia, é porque me considerava carente de atrativos.
Gina observou a expressão de surpresa que apareceu nos olhos de Harry e soube instintivamente que era genuína.
- Estou seguro de que durante minha colérica entrevista com Henrique expus numerosas objeções, mas posso lhe assegurar que essa não foi uma delas. - disse ele. Depois de uma breve pausa, acrescentou: - Provavelmente seja muitas coisas, Ginevra, mas não sou cego.
- Em tal caso, - replicou ela - me dobro a seu excelente julgamento sobre o aspecto que ofereço esta noite.
- E se dobrará também a qualquer outra coisa? - perguntou com um tom significativo.
Ela inclinou a cabeça como uma rainha que concedesse seus favores reais a um mortal de menor categoria.
- A qualquer outra coisa... enquanto permanecermos aqui embaixo.
- Que teimosa é você! - exclamou com fingida severidade. Depois, olhando-a com ternura, acrescentou: - É hora do noivo e a noiva se reunirem aos seus convidados.
Quando a pegou pelo braço e se voltou, Gina se deu conta de que durante aquele breve intercâmbio de palavras, seus cavalheiros tinham formado uma linha atrás dele, seguindo, evidentemente, um plano previamente planejado, para ser formalmente apresentados a todos sua nova duquesa. Encabeçando a fila estava Ronald Potter, que apenas a tinha olhado até esse momento. Agora, depositou um ligeiro beijo de irmão em sua face. Ao retroceder e lhe dirigir um sorriso, Gina se sentiu novamente impressionada ao comprovar o quanto se parecia com Harry, sobretudo quando sorria. O cabelo de Rony era mais claro e seu rosto menos curtido pelas inclemências do tempo; seus olhos não pareciam duas brasas, como os de seu irmão, mas nem por isso carecia de encanto quando decidia utilizá-lo, como agora.
- Pedir desculpas pelos problemas que tenha lhe causado não é suficiente, milady, mas é algo que faz tempo que quero fazer. Faço agora, com a maior sinceridade e a esperança de que algum dia encontre em seu coração o ânimo necessário para me perdoar.
A desculpa foi apresentada com tal sinceridade, e com palavras tão amáveis, que Gina não pôde fazer outra coisa a não ser aceitá-la, tal como exigia o protocolo e os ditames da boa educação. A recompensa que recebeu em troca foi um amplo sorriso de seu cunhado, que se inclinou para frente e acrescentou:
- Naturalmente, não preciso pedir desculpas ao meu irmão, pois foi um grande favor o que lhe fiz.
Para Gina o comentário foi tão divertido que se pôs a rir. Ao seu lado, sentiu que Harry a olhava, e ao se voltar para ele observou que em seus olhos havia uma expressão de aprovação e de algo que se parecia muito com orgulho de tê-la por esposa.
Hagrid veio a seguir, e o chão de pedra pareceu retumbar quando o terrível gigante se adiantou para ela. Tal como Gina tinha esperado o gigante de rosto de granito não se rebaixou se desculpando, e muito menos falou um discurso galante. De fato, nem sequer se inclinou diante dela. Permaneceu erguido, olhando-a de cima de sua enorme estatura, e ao término de um instante sacudiu a cabeça e fez uma breve reverencia. Girou e afastou-se e deixou Gina com a sensação de que era ele quem a dominava, e não o inverso.
Ao sentir o desconcerto de sua esposa, Harry se inclinou e lhe sussurrou ao ouvido:
- Não se sinta insultada... Hagrid nunca consentiu em jurar fidelidade a ninguém, nem sequer a mim.
Gina olhou fixamente para seu marido e, de repente, toda animação pareceu estender-se diante dela com a promessa e a excitação da primeira noite cálida da primavera.
A seguir se apresentaram os cavalheiros que formavam a guarda pessoal de Harry. Sir Godfrey, um homem alto e atraente, de pouco menos de trinta anos de idade, foi o primeiro deles, e instantaneamente se transformou em seu favorito porque, após lhe beijar a mão, fez algo que dissipou completamente a tensão. Voltou-se para todos os presentes e proclamou em voz alta que ela era a única mulher viva com engenhosidade e coragem suficientes para enganar todo um exército de homens guerreiros. Depois, voltou-se de novo para ela e disse com um sorriso:
- Confio, milady, que se alguma vez decidir escapar de Claymore tal como fez de nosso acampamento semanas atrás, lembre de nosso orgulho ferido e se digne a nos deixar um rastro melhor para seguir.
Gina, que aceitou a taça de vinho que Harry lhe oferecia, respondeu com fingida solenidade:
- Se alguma vez tentar escapar daqui, idealizarei um plano bastante ruim para me assegurar de que sejam vocês a me encontrarem.
Aquelas palavras fizeram com que Sir Godfrey desse uma gargalhada e, deixando-se levar por um impulso, beijou-a na face.
Sir Eustace, loiro e elegante, com alegres olhos castanhos, anunciou com galanteria que se não estivesse com o cabelo preso ao escapar, teriam visto seu reflexo avermelhado entre as árvores, e teriam conseguido encontrá-la onde quer que se escondesse, o que ganhou um olhar suave de reprimenda por parte de Harry. Sem se deixar intimidar por isso, Sir Eustace se inclinou e, dirigindo-se à duquesa, acrescentou em tom zombador:
- Como vê já se sente enciumado... tanto de meu charme superior como de minha conversa cavalheiresca.
Um após o outro, desfilaram diante dela aqueles cavalheiros que em outro tempo teriam sido capazes de matá-la com uma só ordem de seu senhor, mas que agora estavam destinados a protegê-la, até as custa de suas vidas. Vestidos com veludos e lãs, em vez das cotas de malha e dos casacos, os mais velhos a trataram com deferência, enquanto que os mais jovens mostravam um certo sobressalto.
- Confio - disse-lhe o jovem Sir Lionel - não ter causado a sua graça nenhum indevido desconforto quando... bom, quando... a tomei pelo braço e lhe arrastei...
- Para me escoltar até minha tenda na primeira noite? - perguntou Jenny com um sorriso.
- Isso mesmo, para lhe escoltar. - assentiu o com um suspiro de alívio.
Gawin, o jovem escudeiro de Harry, foi o último a ser apresentado a sua nova senhora. Muito jovem e idealista para seguir o exemplo dos cavalheiros mais velhos e experientes e deixar o passado atrás, inclinou-se diante de Gina, deu-lhe um beijo na mão e depois, com mal dissimulado rancor, disse:
- Suponho, milady, que não foi sua intenção deixar que morrêssemos de frio quando destroçou nossas mantas.
Aquele comentário ganhou uma dura reprovação por parte de Sir Eustace, que lhe disse, zangado:
- Se essa for sua idéia da galanteria, não é nada estranho que a jovem Anne não tenha olhos pra você e sim para Roderick.
A simples menção de Roderick e Lady Anne fez com que Gawin ficasse tenso e dirigisse um olhar irado ao redor. Depois de murmurar uma precipitada desculpa diante de Ginevra, dirigiu-se apressadamente para onde se encontrava uma bonita jovem de cabelo castanho que falava com um homem que Gina não reconheceu. A atitude de Gawin parecia mais beligerante que galante.
Harry o viu partir e olhou a Ginevra com expressão de divertida desculpa.
- Gawin perdeu a cabeça por essa bonita jovem e, evidentemente, também perdeu a prudência. - Ofereceu-lhe o braço e acrescentou: - Deve conhecer o restante de nossos convidados, milady.
Os temores que Gina abrigava a respeito da recepção que pudessem lhe dispensar quem não estava relacionado com o Harry por votos de lealdade, desapareceram completamente durante as duas horas seguintes, à medida que foi apresentada a cada um deles. Evidentemente, as palavras pronunciadas por Harry no pátio do castelo foram amplamente repetidas, inclusive aos convidados que chegaram das propriedades vizinhas, e embora Gina se encontrasse ocasionalmente com algum ou outro olhar hostil, quem fazia era cuidadoso de ocultá-lo depois de um sorriso amável.
Uma vez terminadas todas as apresentações, Harry insistiu que Gina jantasse, e na mesa do estrado houve mais conversa, alegre e agradável, só interrompida pelos trompetistas que soavam na galeria cada vez que se anunciava a chegada de um novo prato da cozinha.
Tia Elinor estava em sua glória, pois dispunha de uma audiência de mais de trezentas pessoas, embora a pessoa que a via mais freqüentemente não era outro senão o pobre Hagrid. Gina a observou e achou muito divertido que a senhora parecesse fascinada com a única pessoa que não desejava falar com ninguém.
- Está comida está à altura de suas expectativas, milorde? - perguntou Gina voltando-se para Harry, que se servia de uma segunda porção de pavão assado e outra de cisne.
- É adequada, - respondeu ele franzindo levemente o cenho - mas esperava que fosse melhor, considerando que estão sob a supervisão de Prisham.
Nesse momento, o mordomo, Snape, apareceu atrás de Harry e Gina, que o via pela primeira vez.
- Temo sentir muito pouco interesse pela comida, sua graça. - disse o homem em tom gélido. Voltou-se para Gina e acrescentou: - Uma concha de sopa suave e um pouco de carne magra é suficiente para me satisfazer. Além disso, estou seguro de que sua esposa ficará encarregada da cozinha e criará menus e receitas que lhe agradarão muito mais.
Gina, que não sabia nada de receitas e menus, não prestou a menor atenção ao comentário, porque estava ocupada em conter uma onda de aversão instantânea para aquele homem, que usava uma corrente de ouro ao redor da cintura, usava uma roupa branca, como insígnias em destaque, e era tão magro que parecia esquálido. As mandíbulas se sobressaíam sob a pele, que era branca e quase transparente. Mas não foi isso o que fez com que Gina reagisse tão negativamente diante dele, e sim a frieza de seus olhos ao olhar ao redor.
- Confio - prosseguiu ele, mostrando maior respeito para Harry, mas não mais do que o demonstrado para com Ginevra - que, com exceção da comida, todo o resto esteja a sua inteira satisfação esta noite.
- Tudo está muito bem. - assentiu Harry, que deslizou a cadeira para trás ao mesmo tempo em que se iniciava o baile no outro lado mais afastado do salão. - Se amanhã se encontrar bem, eu gostaria de ver os livros, e no dia seguinte percorreremos a propriedade.
- Certamente, sua graça, mas depois de amanhã é vinte e três, que é habitualmente o dia de Julgamento. Deseja que atrase?
- Não. - respondeu Harry sem vacilar, e colocou a mão sob o cotovelo de Ginevra para lhe indicar que devia se levantar. – Será interessante observar e ver como se faz.
Depois de fazer uma reverência para Harry e outra menos profunda para Ginevra, Snape se retirou. Apoiado em seu cajado, caminhou lentamente rumo a suas habitações.
Ao sentir que Harry pretendia unir-se ao grupo que dançava, Gina se deteve e lhe dirigiu um olhar receoso.
- Dancei muito pouco, sua graça. - explicou, observando os giros que os enérgicos bailarinos efetuavam e tentando compreender os passos que davam. - Provavelmente não deveria fazer agora, quando há tantos...
Com um sorriso zombador, Harry a tomou firmemente entre seus braços.
- Só têm que se segurar em mim com força. - disse, e começou a fazê-la girar com peritos movimentos.
Gina se deu conta em seguida de que seu marido era um bailarino consumado. Além disso, também era um excelente professor, já que na terceira música ela já girava, deslizava e saltava ao compasso dos outros. Depois de uma dúzia de musicas, Ronald Potter pediu a Gina que dançasse com ele, e depois foi à vez de Sir Godfrey, Sir Lionel e outros cavalheiros.
Com a respiração entrecortada e sem deixar de rir, Gina negou com a cabeça quando Sir Godfrey tentou tirá-la de novo para dançar. Harry, que tinha dançado com algumas das outras damas presentes, permaneceu de pé para o lado durante a última meia hora, conversando com um grupo de convidados. Agora, apareceu de repente ao lado de Ginevra, como se estivesse sentido que estava exausta.
- Ginevra necessita um descanso, Godfrey. - Fez um gesto para Gawin, que parecia manter uma conversa beligerante com o cavalheiro chamado Sir Roderick, na presença de Lady Anne, e acrescentou asperamente: - Sugiro-lhe que convide Lady Anne para dançar... antes que Gawin cometa uma estupidez para ganhar sua admiração, como desafiar Roderick para um duelo e morrer na intenção.
Atento, Sir Godfrey se aproximou da dama em questão para lhe solicitar uma dança, e Harry conduziu Gina para um canto mais tranqüilo do salão. Entregou uma taça de vinho, apoiou a mão na parede, perto de sua cabeça e a olhou fixamente nos olhos.
- Obrigada. - disse ela, um pouco agitada pelo exercício. - Realmente, precisava descansar um pouco.
Harry contemplou com admiração a rosada pele, que inchava por cima do decote quadrado de seu vestido, e isso fez com que Gina se sentisse estranhamente excitada e nervosa tudo de uma só vez.
- É um bailarino excelente. - acrescentou quando ele a obrigou a olhá-lo. - Deve ter dançado muito na corte.
- E também no campo de batalha. - replicou com um sorriso.
- No campo de batalha? - perguntou ela, perplexa.
Harry assentiu com um amplo sorriso.
- Observe qualquer guerreiro que tenta evitar as flechas e as lanças que lhe jogam e compreendera os passos de dança e os movimentos dos pés que tanto lhe surpreende.
A capacidade de Harry para rir de si mesmo animou o coração de Gina, acrescentando-se a tudo isso mais as taças do forte vinho que tinha tomado. Envergonhada por um instante, desviou o olhar para o lado e viu Hagrid, que estava a poucos metros de distância. A diferença do resto dos presentes, que dançavam, comiam e riam, Hagrid permanecia de pé, com os braços cruzados sobre o peito, as pernas separadas e uma expressão letal no rosto. A seu lado se encontrava tia Elinor, que falava com ele como se sua própria vida dependesse de lhe arrancar uma resposta.
Harry seguiu a direção do olhar de Gina.
- Pelo visto, a sua tia gosta de correr riscos. - disse em tom de brincadeira.
Animada pelo vinho, Gina lhe devolveu o sorriso.
- Hagrid fala alguma vez, quero dizer, com verdadeiras frases, ou ri?
- Nunca o vi rir. E só fala o imprescindível.
Gina observou os imponentes olhos de Harry e se sentiu estranhamente segura e protegida e, mesmo assim, incomodamente consciente de que seu marido era um mistério para ela. Ao perceber que naquele estado de ânimo amavelmente coloquial estaria disposto a responder algumas perguntas, perguntou suavemente:
- Como o conheceu?
- Na realidade, ninguém nos apresentou. - respondeu ele. Ao sentir que ela continuava olhando-o como se esperasse mais informação, acrescentou cortesmente: - A primeira vez que vi Hagrid foi a oito anos, no meio de uma batalha que se travou durante uma longa noite. Ele tentava livrar-se de seis atacantes que o acossavam com espadas e lanças. Fui a sua ajuda imediatamente, e nós dois conseguimos acabar com eles. Eu fiquei ferido, mas Hagrid nem sequer me agradeceu por meus esforços. Limitou-se a me olhar e se afastou para lançar-se de novo ao fragor da batalha.
- E isso foi tudo? - perguntou Gina quando Harry guardou silêncio.
- Não. No dia seguinte, perto do anoitecer, voltei a ser ferido, e desta vez também me derrubaram do cavalo. Ao me inclinar para recolher meu escudo, olhei para cima e vi que um cavaleiro se dirigia diretamente para mim a lança em riste. No instante seguinte, o lançador foi decapitado de um só talho, e ali apareceu Hagrid, que se agachou para recolher seu machado ensangüentado e se afastou novamente sem me dirigir uma só palavra. Minhas feridas me deixaram virtualmente inútil para o combate, e Hagrid apareceu naquela noite e em outras duas ocasiões, como surgido do nada, para me defender de meus atacantes quando via que me superavam em número. No dia seguinte destroçamos o inimigo e o perseguimos. Olhei por cima do ombro e vi que Hagrid cavalgava ao meu lado. Assim o tem feito até agora.
- De forma que ganhou sua mais inquebrável lealdade porque foi resgatá-lo de seis atacantes? - sintetizou Gina.
Harry negou com a cabeça, e respondeu:
- Não, suspeito que ganhei sua mais inquebrável lealdade uma semana mais tarde, quando matei uma grande serpente que tentava se introduzir silenciosamente sob sua manta, sem que ele se desse conta.
- Quer dizer que um gigante como Hagrid teme às serpentes? - perguntou Gina com uma risada.
Harry lhe dirigiu um olhar de fingida reprovação.
- São as mulheres quem teme às serpentes. - replicou. - Os homens, por outro lado, detestam-nas. - Depois, estragou todo o efeito de suas palavras com um sorriso malicioso. - Entretanto, as duas coisas significam o mesmo.
Gina se deixou arrastar por aquela faceta tão terna, brincalhona e coloquial de Harry, e fez de repente a pergunta que tinha lhe obcecado.
- Tinha realmente a intenção de permitir que matassem aquele menino esta manhã?
Harry ficou ligeiramente tenso, mas disse com calma:
- Acredito que já é hora de subirmos.
Sem saber por que tinha tomado tão repentinamente aquela decisão ou se só pretendia continuar conversando em um lugar mais íntimo, Gina vacilou, receosa.
- Por quê?
- Porque você deseja conversar - respondeu - e eu desejo levá-la para cama. Em todo caso, meu quarto é muito mais adequado para ambos os propósitos que este salão.
Gina soube imediatamente que se não queria fazer uma cena que só acabaria por humilhá-la, não restava outra alternativa que abandonar o salão com ele. Um pensamento, entretanto, assaltou-a antes que desse o primeiro passo, e voltando-se para Harry disse em tom implorante.
- Não tentarão nos seguir, não é verdade? Quero dizer, não haverá nenhum ritual de noivado, não é verdade?
- Mesmo se houvesse, não causaria o menor dano. - respondeu ele com paciência. - Isso não é mais que um antigo costume. Mais tarde falaremos disso.
- Peço-lhe. - disse Gina. - Seria uma farsa, visto que todo mundo sabe que já fizemos... que já fizemos... isso, e um ritual de noivado não faria mais que dar espaço aos falatórios.
Harry guardou silêncio, mas ao passar junto a Hagrid e tia Elinor, deteve-se por um instante para falar com ele.
Quase todos os presentes, entretanto, perceberam que os noivos se dispunham a se retirar, e quando passaram diante da mesa do estrado, Gina já tinha o rosto ruborizado diante das ásperas palavras de ânimo e dos conselhos dirigidos a Harry. Quando começaram a subir a escada, ela dirigiu um olhar de desespero por cima do ombro e com alívio, viu que Hagrid, obedecendo sem dúvida uma ordem de Harry, situava-se ao pé da escada, com os braços cruzados sobre o peito, para evitar que nenhum dos presentes os seguissem.
Quando Harry abriu a porta que conduzia a seu dormitório, Gina já estava presa ao terror e um sentimento de impotência. Em silêncio, viu-o fechar a porta atrás de si. No quarto, observou a seguir, era muito grande e luxuoso, com uma enorme cama com baldaquino com delicadas cortinas de veludo. Contra a parede havia três armários ricamente esculpidos, um para a roupa, conforme soube Gina sem necessidade de olhá-lo, sequer, enquanto que os outros deviam conter moedas e outros tesouros, a julgar pelo tamanho das maciças fechaduras. Ao lado da cama havia candelabros de prata, com velas acesas, e outro cada lado da lareira. As paredes estavam cobertas de tapeçarias e havia uma grande esteira sobre o polido chão de madeira. Mas o mais extraordinário do quarto era a janela, uma grande janela com cristal chumbado que dava para ver o pátio de treinamentos, e que durante o dia devia dar ao local um aspecto alegre e luminoso. À esquerda havia uma porta entreaberta que se conectava sem dúvida com uma câmara privada, enquanto que a porta da direita devia conduzir, evidentemente, ao quarto que ela tinha ocupado.
Gina olhou as duas portas restantes, evitando escrupulosamente se voltar para a cama, e quando Harry fez um movimento, ela deu um pulo e disse a primeira coisa que lhe ocorreu.
- Aonde essas portas vão dar?
- Uma delas a uma sala privada, a outra, a um armário. - respondeu ele sem deixar de perceber a forma como ela procurava não olhar em direção à cama. Com uma voz serena que, apesar de tudo, transmitia um inconfundível matiz de ameaça, acrescentou: - Se importaria de me explicar como é que a perspectiva de se deitar comigo lhe parece mais alarmante uma vez casados, do que antes, quando tinha tudo a perder?
- Naquele momento não tive outra opção. - respondeu ela, na defensiva.
- Tampouco a têm agora. - assinalou razoavelmente.
Gina sentiu a boca seca. Cruzou os braços, como se estivesse com frio, e sem poder evitar mostrar-se confusa e desesperada, disse:
- Não lhe compreendo. Nunca sei o que esperar de você. Às vezes, parece quase cortês e racional. E quando começo a pensar que até pode chegar a ser amável... quero dizer normal, - corrigiu-se – faz uma loucura e me expõe as mais absurdas acusações. - Estendeu as mãos, como se lhe pedisse que tentasse compreender. - Não posso me sentir a vontade com um homem que é um estranho para mim. Um estranho imprevisível que me aterroriza!
Harry avançou um passo, e depois outro, e Gina retrocedeu até que suas pernas se chocaram com a cama. Incapaz de avançar, e obstinadamente decidida a não retroceder mais, permaneceu de pé, perdida em um rebelde silêncio.
- Não se atreva a me tocar. Detesto que me toque! - advertiu-lhe com voz tremula.
Harry franziu as escuras sobrancelhas. Estendeu uma mão e introduziu um dedo pelo decote do vestido de Gina, sem deixar de olhá-la diretamente nos olhos, enquanto fazia descer o dedo, até que ficou agasalhado profundamente no espaço entre seus seios. Começou a lhe acariciar, os lados dos seios, enquanto diminutas labaredas começavam a percorrer o corpo de Gina, cuja respiração era cada vez mais agitada. A mão de Harry abriu espaço entre o tecido e a pele, e se fechou sobre um dos seios.
- Me diga agora que detesta que eu toque você. - sussurrou sem deixar de olhá-la nos olhos, enquanto seus dedos brincavam com o endurecido mamilo.
Gina voltou à cabeça para o fogo que ardia na lareira, envergonhada de sua incapacidade para controlar seu traiçoeiro corpo.
Bruscamente, ele retirou a mão.
- Começo a pensar que deve gostar de me atormentar, - disse - pois jamais conheci ninguém que o fizesse melhor. – Passou a mão no cabelo com expressão de ira contida, aproximou-se da jarra de vinho com especiarias que descansava perto do fogo e se serviu de uma taça. Depois se voltou para Gina e a estudou em silêncio. Ao término de um momento voltou a falar com um tom de voz sereno quase como se estivesse se desculpando, o que assombrou Gina e a obrigou a olhá-lo. - A culpa pelo que acaba de acontecer é minha e tem pouco a ver com que me atormente ou não. Só me ofereceu uma desculpa para fazer o que desejei desde que a vi com este vestido. - Ao ver que ela permanecia em silêncio e o olhava com receio, deixou escapar um suspiro, e acrescentou: - Ginevra, este matrimônio não foi escolhido por nenhum dos dois, mas o certo é que aconteceu e teremos que encontrar uma forma de viver com isso. Enganamos um ao outro, e ninguém pode mudar isso. Eu esperava poder enterrar o passado, mas provavelmente seja melhor lhe permitir falar dele, visto que está decidida a fazer. Está bem, - acrescentou, como se tivesse chegado a uma conclusão - me exponha suas ofensas. O que deseja saber?
- Duas coisas, para começar. - replicou Gina em tom áspero. - Quando se deu conta de que fui enganada? E como pode dizer em nome de Deus, que lhe enganei?
- Preferiria deixar essa última pergunta sem responder. - disse ele em tom inexpressivo. - Antes de ir lhe ver esta noite, passei duas horas nesta mesma habitação, tentando me reconciliar com todas as coisas que têm feito, e finalmente decidi deixar tudo isso para trás.
- Muito virtuoso de sua parte. - disse Gina com ironia. – É difícil, milorde, que eu não tenho feito nada, absolutamente nada que necessite de seu perdão ou pela qual tenha que lhe dar uma explicação. Além disso, estou disposta a lhe dar qualquer explicação que deseje, uma vez se você me der isso também. Parece-lhe que devemos fazer um acordo?
Harry apertou os lábios enquanto contemplava à bela moça, que já tinha abandonado o temor em favor da ira. Era intensamente doloroso comprovar que tremia. Fez um esforço por suavizar a careta de seu rosto e assentiu.
- Perfeitamente. Pode continuar.
Ginanão necessitou de maior estímulo. Estudou seu rosto, para detectar qualquer sinal de engano, e perguntou bruscamente:
- Ia ou não ia permitir que Hagrid matasse hoje aquele menino?
- Não. - respondeu. - Não ia permitir.
Gina começou a abandonar sua atitude hostil e temerosa.
- Então, por que não disse nada?
- Não tive necessidade de fazer. Hagrid só age seguindo minhas ordens. Ele se deteve, não foi devido ao seu grito, mas sim porque esperava que eu tomasse uma decisão.
- Não... não está mentindo, não é verdade? - perguntou, olhando intensamente seu rosto inescrutável.
- O que você acha?
Gina mordeu o lábio inferior e um sentimento de culpa se apoderou dela.
- Peço-lhe desculpas. Fui rude com você. - sussurrou.
- Prossiga. - disse Harry, que aceitou suas desculpas inclinando levemente a cabeça. - Qual é a sua pergunta seguinte?
Gina respirou fundo e, consciente de que agora pisava em um terreno perigoso, disse em tom vacilante:
- Queria saber por que se sentiu obrigado a humilhar meu pai e a minha família, demonstrando que era capaz de burlar as defesas de Weasley e me seqüestrar de meu próprio dormitório. - Fez pouco caso do brilho de cólera que apareceu nos olhos de Harry, e continuou tenaz: - Demonstrou sua habilidade e poder. Se queria que vivêssemos em paz e harmonia, não precisava demonstrar de uma forma tão mesquinha e...
- Ginevra, - interrompeu-o ele em tom cortante - me ridicularizou em duas ocasiões, e me induziu a parecer um estúpido em outra ocasião. Isso não se faz a qualquer um, asseguro-lhe. Agora resta a você deixar de lado essa questão.
Fortalecida pelo vinho que tinha bebido e sua teimosia natural, Gina observou sua expressão. Apesar do tom sarcástico que Harry tinha utilizado, a dura expressão de seus olhos indicava que a «conspiração» a que ele se referia, fazia mais que encolerizá-lo, e que na realidade o feria até provocar amargura. Fez um esforço em não se deixar arrastar pelo que parecia emanar dele, e que era mais forte a cada momento.
- Aceitarei, - disse em tom despreocupado - mas antes queria estar absolutamente segura de saber o que tenho feito para merecê-lo.
- Sabe condenadamente bem a que me refiro.
- Não estou totalmente... certa. Detestaria assumir uma culpa por algo que não fiz. - disse ela, levantando sua taça.
- É uma mulher extraordinária, capaz de mentir e me olhar diretamente nos olhos. - Harry fez uma pausa, e continuou em tom irônico: - De acordo, sigamos seu jogo até o desagradável final. Em primeiro lugar, circulou o rumor de que sua irmã, de quem teria jurado que não tinha sentido comum suficiente para se vestir sozinha, conseguiu escapar com sua ajuda e a de uns almofadões de pluma...
- Está informado disso? - perguntou ela, engasgando-se com o vinho e tratando de esconder um sorriso.
- Eu se fosse você não riria. - advertiu-lhe.
- Por quê? - perguntou Gina. - Para mim foi uma brincadeira tanto quanto foi para você.
- Devo supor que não sabia nada desse estratagema? - falou ele, que observou o significativo rubor de suas bochechas, e se perguntou se devia ao vinho ou a que estivesse mentindo.
- Se soubesse, - replicou ela com seriedade - acha que teria estado tão disposta a dar minha honra por umas plumas?
- Não sei. Teria feito?
Ela deixou a taça e respondeu com expressão sombria:
- A verdade é que, não estou certa. Suponho que teria feito para ajudá-la a escapar... mas não até ter esgotado outras possibilidades. Portanto, não posso me responsabilizar pelo engano de que foi objeto nesta ocasião. A que outras duas ocasiões se referia?
Harry deixou com força a taça sobre a mesa e se aproximou de Gina.
- Imagino que se refere ao fato de que eu tenha escapado com o Carlinhos, não é verdade? - continuou ela, incomodada, retrocedendo um passo diante da sinistra expressão de seus olhos. -Tampouco posso me responsabilizar por isso. Ele estava escondido entre as árvores do bosque e não senti sua presença até que estava a ponto de se afastar com Hagrid.
- Muito bem, - disse ele gélido - e apesar de que está sabendo de meu comentário sobre a rainha da Escócia, não sabe, entretanto, que no mesmo momento em que escapava eu, como um estúpido, estava dizendo ao Graverley que tinha a intenção de me casar com você. E pelo visto tampouco sabe que ia partir com destino a um convento imediatamente depois da celebração de nosso casamento em Weasley, não é mesmo? Algo que teria me unido a você para toda a vida, ao mesmo tempo em que teria me privado de ter herdeiros. E se mentir para mim mais uma vez...
Arrancou-lhe a taça de vinho da mão e a atraiu com força para seus braços.
- Vai fazer... o que? - sussurrou ela.
- Já basta de tanta tolice. - exclamou ele em tom autoritário. Inclinou a cabeça e a silenciou com um beijo nos lábios. Diante da sua surpresa, ela não resistiu. De fato, parecia como se não soubesse o que estava fazendo. Ao levantar a cabeça, ela o olhou com uma expressão que nunca tinha visto anteriormente em seus olhos azuis.
- Vai fazer... o que? - repetiu de novo, com voz entrecortada.
- Já me ouviu. - respondeu secamente.
Um calor estranho e traiçoeiro se estendia pelo corpo de Gina, que o olhava como se estivesse hipnotizada.
- Por quê? - sussurrou. - Por que disse que tinha intenção de se casar comigo?
- Porque nesse momento devia estar ficando louco. - replicou ele friamente.
- Por mim? - sussurrou ela de novo, guiando-se pelo que lhe dizia seu coração.
- Por seu delicioso corpo. - respondeu Harry cruamente.
Mas em alguma parte de seu coração, Gina aceitava algo mais... outra explicação tão estranha que sentiu medo de considerá-la. Algo que explicava tudo.
- Não sabia. - limitou-se a dizer. - Jamais imaginei que desejasse se casar comigo.
- E suponho que se tivesse ficado sabendo, teria se despedido de seu meio-irmão e teria ficado em Hardin comigo, não é verdade? - perguntou ele em tom zombador.
Gina não tinha enfrentado um risco assim em sua vida, mas nesse momento lhe disse a verdade.
- Se eu... soubesse como ia me sentir depois de fugir... teria ficado com você. - Viu que Harry apertava as mandíbulas e, sem pensar, estendeu a mão e lhe acariciou a face. – Não me olhe assim, por favor. - sussurrou, olhando-o intensamente. - Não estou mentindo.
Fazendo um esforço infrutífero em fazer pouco caso da terna inocência de sua carícia e afastar de sua mente a forma como tinha beijado suas cicatrizes, Harry perguntou diretamente:
- E suponho que tampouco estava sabendo da conspiração tramada por seu pai, não é verdade?
- Eu não ia partir para nenhum convento. O que ia fazer era ir com você na manhã seguinte. - disse ela. - Jamais teria me ocorrido fazer algo tão... ruim.
Convencido de que Gina continuava mentindo, Harry tomou-a violentamente entre seus braços e a beijou, mas em vez de se revoltar, ela se apertou contra seu corpo, lhe dando as boas-vindas, e jogou os braços em seu pescoço. Abriu os lábios e os roçou contra sua boca. Harry, totalmente assombrado, se deu conta de que ela tentava seduzi-lo. E apesar de se dar conta disso, não pôde evitar que acontecesse. Suas mãos lhe soltaram os braços e se deslocaram sobre as costas de Gina, em uma inquieta e suave carícia, para deslizar até a nuca e sustentar seus lábios mais perto de sua ávida boca.
À medida que a paixão aumentou, também ficou com a terrível sensação de culpa, com a idéia de que estava enganado. Enganado em tudo. Afastou a cabeça, reteve Gina entre seus braços e esperou que sua respiração se normalizasse. Quando finalmente se sentiu com forças para falar, a fez dar um passo para trás e levantando seu queixo com os dedos, pediu-lhe suavemente:
- Me olhe, Ginevra. - Ao contemplar seus olhos não viu culpa e sim confiança. Os olhos que o olharam eram inocentes de toda culpa, e o que fez a seguir não foi uma pergunta, mas sim, uma afirmação. - Não sabia nada sobre a conspiração de seu pai, não é verdade?
- Não houve tal conspiração. - respondeu ela, simplesmente.
Harry jogou a cabeça para trás e fechou os olhos, tratando de afastar de sua mente a verdade mais evidente: depois de obrigá-la a permanecer em seu próprio lar em Weasley, e de suportar os sarcasmos de seu próprio povo, tinha-a tirado da cama, tinha-a obrigado a se casar com ele, para arrastá-la depois para a Inglaterra. E como se tudo isso fosse pouco, fazia apenas alguns momentos tinha decido «perdoá-la» e «enterrar o passado».
Enfrentado à alternativa de destroçar as ilusões que ela pudesse ter a respeito de seu pai, ou de permitir pensar que ele era um homem cruel, escolheu a primeira. Não estava com humor para mostrar-se galante, e muito menos à custa de seu matrimônio.
Acariciou-lhe o sedoso cabelo e observou aqueles olhos confiantes, perguntando-se como era possível que aquela mulher tivesse o poder de lhe fazer perder o juízo.
- Ginevra, - disse com voz serena - não sou o monstro que têm boas razões para acreditar que sou. Houve uma conspiração. Quer escutar ao menos minha explicação?
Ela assentiu com um gesto, mas o sorriso que esboçou deu a entender que essa explicação seria muito fantástica para acreditar nela.
- Quando cheguei ao castelo de seu pai, estava convencido de que seu pai ou qualquer outro membro do clã tentaria violar o pacto que garantia minha segurança enquanto estivesse na Escócia para me casar com você. Coloquei homens nos caminhos que conduziam a weasley, e ordenei que não deixassem passar nenhum grupo sem fazer averiguações.
- E eles não encontraram ninguém que tentasse violar o pacto. - disse ela com serena convicção.
- Não. - admitiu Harry. - Mas o que descobriram foi à caravana de uma abadessa, que com uma escolta de doze homens se dirigia com toda pressa para o castelo de Weasley. Portanto provavelmente tenha razões para acreditar, - acrescentou com um amargo sorriso - eu e meus homens não temos o costume de incomodar ou seqüestrar clérigos. Por outro lado, e seguindo as instruções que eu tinha dado, meus homens interrogaram os membros do grupo... mediante o conveniente estratagema de fazer a abadessa acreditar que estavam ali para lhe proporcionar escolta. Ela confirmou então alegremente que estava indo a Weasley para se carregar de você.
Gina o olhou com estranheza, e Harry quase lamentou lhe dizer a verdade.
- Continue. - disse ela.
- A abadessa e seu grupo se viram atrasados pela chuva, que foi também a razão pela qual seu pai e o «piedoso» frei Benedict inventaram de fingir que o bom sacerdote estava muito doente para celebrar a cerimônia. Segundo a abadessa, uma tal Lady Ginevra Weasley tinha decidido ingressar em um convento enclausurada como resultado de um matrimônio não desejado. Conforme disse, o «marido» estava decidido a impedir que a dama em questão realizasse seu desejo de entregar sua vida a Deus, e ela ia para ajudar Lady Ginevra e seu pai a tirá-la do castelo de Weasley em segredo, e afastá-la assim das garras de seu marido. Seu pai tinha maquinado a vingança perfeita. Visto que nosso matrimônio já tinha sido consumado antes que se celebrasse, ficaria completamente descartada a possibilidade de que eu pudesse obter uma anulação do mesmo, por isso o divórcio não teria sido possível. Sem a oportunidade de voltar a contrair matrimônio, não poderia gerar um herdeiro legítimo, de forma que, com a minha morte, Claymore e tudo o que possuo, teria passado para as mãos do rei.
- Não... acredito. - disse Gina em tom determinado. Depois, em uma atitude que minimizava, corrigiu-se - Parece-me, que você acredita em tudo o que me disse. Mas a verdade é que meu pai nunca teria me trancado em um convento sem ter me dado ao menos à possibilidade de escolher.
- Não só teria feito, mas também tinha a intenção de fazer. - Ela negou de maneira tão enfática que Harry se deu conta de repente de que não podia suportar acreditar no contrário.
- Meu pai... me ama. Não faria isso. Nem sequer para se vingar de você.
Harry fez uma careta e se sentiu como um bárbaro que fazia pedacinhos das ilusões de Gina.
- Têm toda a razão. - concedeu Harry. - Eu... provavelmente foi um engano.
- Sim, isso mesmo. - disse ela com um sorriso tão doce e encantador que Harry sentiu que o pulso acelerava, porque aquele sorriso não se parecia com nenhum outro que uma mulher tivesse lhe dirigido. Refletia confiança e aprovação, e também algo mais que não pôde identificar.
Gina se voltou, aproximou-se da janela e olhou para a noite, cheia de estrelas. Havia tochas acesas nas ameias e a silhueta de um dos guardas se recortou claramente contra a luz alaranjada. Sua mente, entretanto, não se ocupava dos guardas ou das estrelas; nem sequer pensava em seu pai, e sim no homem alto, de cabelo escuro, que permanecia de pé atrás dela. Tinha querido transformar-se em seu marido, e o fato de saber a enchia de uma emoção tão intensa que mal que podia resistir. Era tão entristecedor que outros sentimentos como o patriotismo e a vingança desapareciam em comparação.
Estendeu uma mão e deslizou a ponta de um dedo pela fria superfície do cristal; lembrou de todas aquelas noites de insônia no castelo de Weasley, das quais não podia afastá-lo de sua mente, noites em que sentia seu corpo vazio e ardente, e desejava ter Harry a seu lado. Percebeu que ele avançava para ela, e soube o que ia acontecer em seguida com a mesma certeza que sabia que o amava. Que Deus a perdoasse por estar apaixonada pelo inimigo de sua família. Soube em Hardin, mas até então ela era muito mais forte, e também tinha mais medo. Medo do que pudesse lhe acontecer se permitisse a si mesma amar um homem que parecia considerá-la como um pouco mais que uma diversão temporária. Agora, com a mesma segurança que sabia que o amava, também estava certa de que ele compartilhava seus sentimentos. Isso explicava tudo, a cólera de Harry, sua risada, sua paciência... as palavras que tinha pronunciado no pátio.
Notou sua presença como algo tangível, inclusive antes que ele deslizasse lentamente o braço ao redor de sua cintura para atraí-la contra seu corpo. Seus olhos se encontraram, refletidos no cristal da janela, e o olhou fixamente antes de lhe arrancar a promessa de que a liberaria de todo sentido de culpa por lhe entregar seu amor e sua vida.
- Jura não levantar nenhuma vez sua mão contra minha família? - perguntou com voz suave e tremula pela emoção.
- Juro. - respondeu ele.
Uma incrível ternura se apoderou de Gina, que fechou os olhos e se apoiou em seu peito, com uma atitude de entrega absoluta. Harry inclinou a cabeça, roçou-lhe a têmpora com a boca, levou a mão até um de seus seios e começou a acariciá-lo. Sua boca riscou um caminho ardente que desceu para a orelha, e a língua explorou cada curva ali, enquanto a mão deslizava agora pelo interior do vestido, apoderava-se do seio e esfregava o endurecido mamilo com o polegar.
Inundada de intensas sensações, Gina não ofereceu a menor resistência quando ele a obrigou a se voltar e a beijou na boca. Não experimentou a menor vergonha ou culpa quando desamarrou o vestido, que caiu lentamente no chão em torno de seus quadris, nem quando se deitou com ela na cama, com seus musculosos ombros nus reluzentes como o bronze sob a luz das velas, ao inclinar-se sobre ela e lhe separar habilmente os lábios com a língua. Com um silencioso gemido de rendição, rodeou-lhe a nuca com uma mão, introduziu os dedos entre o cabelo cacheado e manteve a boca de Harry ferozmente apertada contra seus lábios, deslizando entre eles sua ávida língua. Seu ardor inocente foi muito mais do que o corpo faminto de Harry pôde suportar. Rodeou-lhe os quadris com um braço, atraiu-a até produzir um vibrante contato com suas tensas coxas, e moldou o corpo de Gina aos rígidos contornos do dele.
Com a outra mão segurou sua cabeça, enquanto introduzia a língua em sua boca várias vezes, obrigando-a a lhe devolver a urgência sensual que lhe oferecia.
Gina afastou sua boca da de Harry e ele grunhiu decepcionado, pois acreditou que ela voltava a se sentir assustada diante da sua paixão desenfreada, mas ao abrir os olhos o que descobriu nos dela não foi temor nem repulsão, e sim admiração. Experimentou então uma infinita ternura e permaneceu quieto, observando como Gina tomava seu rosto entre as mãos e com dedos trêmulos lhe acariciava quase com reverência as pálpebras, as maçãs do rosto e a mandíbula, para depois beijá-lo nos lábios com um ardor quase igual ao dele. Gina o fez se voltar em seus braços, apertou-o de costas contra os travesseiros, e seu cabelo se derramou sobre eles como um véu acetinado. Beijou-o nas pálpebras, no nariz, na orelha e quando seus lábios se fecharam sobre um bico de seu mamilo, Harry perdeu o controle.
- Gina. - gemeu, enquanto lhe acariciava as costas, as nádegas e as coxas. Os dedos dela se afundaram em sua cabeleira, para atrair de novo os lábios para sua boca febril, e ele voltou a sussurrar com voz rouca: - Gina.
Harry a fez rodar para pô-la novamente de costas e lhe cobriu o corpo com o seu.
- Gina. - murmurou ardorosamente, enquanto a beijava apaixonadamente nos seios, no ventre e nas coxas. Não podia deixar de pronunciar seu nome. Soou como uma melodia em seu coração quando ela o rodeou com os braços e levantou os quadris, se apertando de boa vontade contra sua grande virilidade; ressonou em suas veias quando ela gemeu ao primeiro e feroz impulso do corpo de Harry dentro do dela; sentiu o prazer percorrer cada uma das fibras de seu ser, enquanto ela acompanhava seus impulsos ferozes, cada vez mais rápidos, até que finalmente explodiu em sensações com ela gritando: «Eu te amo», ao mesmo tempo em que afundava as unhas em suas costas e seu corpo era invadido por uma onda atrás da outra de prazer.
Com o corpo tenso, precisando desesperadamente de liberação, Harry afastou os lábios, apoiou-se sobre os antebraços e esperou que os tremores de Gina se acalmassem, enquanto contemplava seu lindo rosto coberto pelas sombras. E então, não podendo se conter por mais tempo, impulsionou-se profundamente em seu interior uma última vez e sussurrou seu nome. Harry experimentou uma convulsão atrás da outra enquanto derramava sua semente no interior dela.
De costas, sua esposa se acomodou contra seu corpo, enquanto ele esperava que seu coração recuperasse o ritmo normal. Harry ainda se sentia aturdido. Durante os anos em que tinha mantido encontros sexuais sem objetivo e tórridos jogos amorosos, nada tinha se aproximado do êxtase que acabava de experimentar.
Ao seu lado, Gina levantou a cabeça e ele a olhou nos olhos. Neles observou a mesma admiração e confusão que se encontrava na dele.
- Em que pensa? - perguntou-lhe Harry com um terno sorriso.
Gina esboçou também um sorriso e acariciou seu peito peludo.
Só dois pensamentos cruzaram a mente de Gina e, em vez de admitir que tivesse desejado ouvi-lo dizer que a amava, confessou-lhe seu outro pensamento.
- Pensava - sussurrou a contra vontade - que se no castelo de Hardin você tivesse sido como hoje... acredito que não teria partido com o Carlinhos.
- Se eu tivesse agido como hoje - replicou Harry em tom zombador - teria seguido o Carlinhos de qualquer jeito.
Sem se dar conta de que podia despertar tão facilmente o desejo de Harry, Gina percorreu com os dedos a superfície plana de seu ventre.
- Por que não fez?
- Nesse momento me encontrava detido. - respondeu ele asperamente. Agarrou a mão que o acariciava para impedir que continuasse descendo. Depois a soltou, e acrescentou: - Por ter me negado a te entregar a Graverly.
Harry conteve a respiração quando a mão de Gina deslizou pela sua coxa.
- Gina. - advertiu-lhe com voz rouca, embora já soubesse que era muito tarde, pois o desejo percorria novamente seu corpo, impiedosamente.
Com um sorriso tranqüilizador diante da expressão assombrada de Gina, a pegou pelos quadris e a levantou, para baixá-la suave, mas firmemente sobre seu rígido membro.
- Tome tudo o que quiser pequena. - disse. - Estou inteiramente a seu serviço.
A risada terminou, entretanto, quando sua esposa desceu sobre ele, montou-o e lhe cobriu docemente a boca com a sua.
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