Capítulo Único.
Abri os olhos, e olhei bem dentro de seus olhos cinzas, como eu havia feito cerca de três anos atrás, sentada à mesa da Grifinória, quando eu ainda era apenas a Sangue-ruim amiga do Potter, e ele era apenas a Doninha-quicante. Olhei dentro de seus olhos, como também havia feito em nosso terceiro ano, segundos antes de acertar-lhe um soco na face, é, talvez aquela tenha sido a primeira vez que eu tenha olhado em seus olhos, e enxergado além do que eles demonstravam, além do que os outros eram capazes de ver.
Provavelmente o foi, mas eu estava tão descontrolada e fora de mim, que nem ao menos percebi. Foi burrice, e hoje eu sei disso. E me culpo por isso. Me culpo por saber que se eu não houvesse sido tão tola e preconceituosa naqueles tempos, naquele dia em especial, então tudo poderia ter sido diferente. Mas não foi.
Um feitiço foi gritado em algum lugar, mas eu estava mergulhada profundamente demais naquela imensidão cinza para que pudesse perceber qualquer coisa que não fosse seus olhos. Havia perdido toda e qualquer noção de tempo ou espaço que eu pudesse possuir.
Ele franziu a sobrancelha e crispou levemente os lábios, o feitiço tinha passado a milímetros do meu braço direito, o qual encontrava-se na altura da minha cintura, olhei vagamente para baixo e vi que eu segurava firmemente a varinha em minha mão, deixando os nós de meus dedos brancos feito papel. Eu não havia desviado do feitiço, na verdade, eu não havia nem ao menos cogitado desviar dele. Subi meus olhos novamente para os deles, e pude sentir em minha pele a força do seu olhar, era raiva banhada de preocupação.
Um pequeno sorriso tentou formar-se em meus lábios quando senti seu olhar a cravar-se em minha pele, fazia com que eu me lembrasse de quando eram suas mãos a percorrer meu corpo, fazendo carícias em minha cintura, puxando-me possessivamente em sua direção, mesmo quando não havia mais espaço físico a ser preenchido entre nós.
Bateu uma leve sensação de deja vu, quando lembrei da situação na qual nos encontrávamos há três anos atrás, o mesmo local, quase que as mesmas pessoas, mas eu sabia que desta vez tudo terminaria de uma forma diferente, desta vez tudo terminaria. Nós sabíamos disso.
Foi no término do sexto ano, quando ele trouxe os Comensais para dentro do castelo, que nos vimos nesta mesma situação pela primeira vez depois de tudo, depois de nós. Sei que se eu fechasse os olhos, ainda poderia escutar o som daquela noite, e enxergaria as luzes dos feitiços que foram lançados, mas sei que acima de tudo isto, eu ainda poderia sentir o gosto amargo de sua boca sobre a minha em um beijo de despedida.
Eu achei que morreria ali, naquela noite, quando Harry me contou de seus planos e me entregou o frasco da Felix Felicis junto ao Mapa do Maroto, e eu achei que não me importaria de morrer, caso ele realmente estivesse certo. E ele estava.
Mas eu não. Tanto é que não morri naquela noite, não fisicamente. Eu sabia que ele era um Comensal, no fundo eu sempre soube, mas negar este fato era mais fácil, mais viável. O medo que corria freneticamente em minhas veias, o desespero, nem a horrível sensação de espera, de não-saber, nem ao menos a decepção que eu me negava a sentir, foi tão horrível e inesquecível quanto o sussurrar rouco de sua voz a dizer-me:
“ Sinto muito, Granger. Mas ninguém pode negar sua verdadeira essência.”
E seus olhos tinham brilhado intensamente, na maior demonstração de dor e sinceridade que Draco Malfoy seria capaz de me dar, mas não havia sido o suficiente para mim, nós sabíamos que não seria. Juntei meus lábios aos seus, em um último beijo casto, e antes de me abandonar naquele corredor após beijar calidamente minha testa, ele sussurrou uma resposta, para uma pergunta que eu nunca teria coragem o suficiente para fazer.
“ Eu ainda amo você, Granger...”
E seus olhos, sempre tão indecifráveis e vagos para os outros, abriram as portas para sua alma, e eu pude então ler, a continuação daquela frase, “ e sempre vou amar”.
Naquela batalha, eu havia fugido dele, muito mais de seus olhos do que de seus feitiços, mesmo sabendo que ele não dirigiria nenhum dos dois para minha pessoa, jamais. Mas agora era diferente, e nós dois sabíamos disso, não haveria fuga, nós não nos permitiríamos fugir, nenhum de nós.
É por isso que eu me pergunto, que se eu houvesse feito uma tentativa, há muito tempo atrás, naquela tarde fatídica do terceiro ano, a aquele menino loiro e magrelo, de olhos cinza tão plenos e indecifráveis, se tudo não poderia ter terminado de uma forma diferente, se tudo precisaria ter terminado.
Talvez pudesse ter havido outro final, mas agora já é tarde demais, eu sei disso, ele sabe, nós sabemos. Encarei novamente o cinza de suas íris, enquanto apertava mais forte ainda a varinha em minha mão, fazendo com que doesse, mas não mais do que minha alma doía, a dor em si já havia se tornado minha parceira há muito tempo, três anos para ser mais exata.
Sorri levemente, era mais um mexer de lábios do que um sorriso, mas não importava. Ele retribuiu, só que diferente de mim, ele sorriu verdadeiramente, amplamente. Ele sabia o que eu iria fazer, e seus olhos sorriam para mim como em um desafio, acompanhando o sorriso em sua face. Ele sabia o que ia acontecer.
Vingança.
Era isso que iria acontecer.
Dois meses antes, uma coruja bicara a janela do meu quarto na Ordem da Fênix, trazia um envelope negro, com o símbolo dos Comensais da Morte dentro da mesma, e desenhado com sangue logo abaixo do mesmo, um nome, Gina Weasley.
Quatro horas depois, o pequeno e pálido corpo de minha amiga foi jogado na praça em frente ao largo Grimnauld, todo machucado e manchado de sangue. Eu chorava, assim como todos ali presentes, Rony, Harry, Molly, Arthur e todos os outros Weasleys, mas por mais horrível que possa parecer, eu não chorava apenas pela minha amiga que havia sido assassinada, eu chorava por ele, por mim. Porque ali foi que eu percebi, eu não só o havia perdido, eu estava perdendo aos meus amigos, mas mais assustadoramente do que qualquer outra coisa, eu havia me perdido, em algum daqueles dias dentre aqueles três anos, eu havia me perdido.
E tenho plena certeza de que nunca mais me encontraria novamente, não aquela Hermione Granger, jamais.
Fora Draco quem fizera aquilo, eu sei que foi. Três semanas após a morte de Gina, Harry e Rony finalmente haviam conseguido um resultado em suas buscas por vingança, Pansy Parkinson fora capturada. Era minha chance de saber a verdade, e eu rezava para que estivesse errada, mas não estava. Ela confirmara, um dos amigos do Potter deveria morrer, era uma ordem direta de Voldemort, era para ser o meu nome e não o de Gina, era para ser meu corpo nu jogado naquela praça, e não o de minha amiga. Mas ele se metera, lutara e desdenhara, assumira todas as responsabilidades e disse que eu era apenas uma tola sangue-ruim, que não valia tanto.
Harry, junto de Rony, mataram a Parkinson, e devolveram seu corpo aos comensais da mesma forma como eles haviam feito, mas o que ela me revelara em particular, minutos antes de ser morta, a verdade sobre quem deveria estar morta, aquele pedaço dela sempre viverá, dentro de mim. E este é mais um dos motivos porque eu não o perdoarei.
Uma lágrima solitária correu por meu rosto, e ergui meu braço, fazendo com que a varinha apontasse para seu peito.
Ele não poderia ter feito aquilo, escolher por mim. Ele não era Deus para decidir quem deveria ou não viver, ele não era. E eu jamais o perdoaria por isso, por me fazer carregar a culpa pela morte de minha melhor amiga, jamais. Como jamais o perdoaria por me fazer carregar um pedaço de Pansy, para sempre. Jamais o perdoaria por me fazer amá-lo como se nada mais importasse, mesmo eu sabendo que todo o resto importa. Existem muitas coisas pelas quais eu jamais o perdoaria, mas nenhuma que fosse maior do que o amor que eu sentia por ele.
“ Eu ainda amo você, Draco...”
Eu disse, movendo meus lábios devagar, para que ele pudesse compreender perfeitamente, e ele compreendeu, e sorriu. E o cinza sempre misterioso de seus olhos brilharam para mim, Draco abriu a boca para completar nossa frase, a mesma usada em nossa despedida.
“ E sempre vou amar!”
Completamos, juntos. Mais uma lágrima caiu de meus olhos e fez seu caminho por minha face, fazendo com que eu sorrisse quando ela atingiu meus lábios. Eu o amava!
“Herm...”
Não sei ao certo quando tudo isso começou, ou como começou. Mas eu sei como vai terminar, quando vai terminar. Olhei uma última vez em seus suas orbes cinzas, que sorriam para mim, e fiz o que deveria ser feito.
“Avada Kedrava!”
Eu havia feito, mesmo que eu não tenha querido fazê-lo, era o que precisava ser feito, e Hermione Granger sempre faz o que deve ser feito, nós sabíamos disso. Por mais que minha vontade fosse a de desviar meus olhos, a luz do raio verde a fazer seus olhos brilharem quase em um azul intenso atraíram-me como o fogo atraí mariposas. O raio o atingiu, e seu sorriso foi morrendo, assim como o brilho e a vida em seus olhos.
Estava feito afinal. E eu sabia que ele não me culparia ou julgaria, na verdade eu fiz o que ele esperava que eu fizesse, o que era o certo a ser feito.
Mas de algo eu tinha certeza, mais do que qualquer um, eu havia morrido ali.
Então, era isso.
Era o fim.
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N|A: Espero que tenham gostado, é meio que um "especial de dia dos namorados trash" haha! Comentem!
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