Tudo o que deveria ter dito



Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava o rock para as matinês


“Querida Hermione,
Tenho muito para dizer, porém não sei bem como começar...”


Ron estava deitado na grama do jardim da Toca há duas horas, tentando começar sua carta, sem obter grande progresso. Olhou para o céu, procurando alguma resposta, porém o sol o cegou momentaneamente, naquela bela e quente manhã de primavera.

“Espero que você compreenda o mau jeito. Bom, você sabe que escrever nunca foi meu forte, por mais que você se esforçasse em me fazer estudar.”

“Boa, Ronald, isso está um lixo!” – ele pensou, desanimado – “Mas eu preciso continuar.”

Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu fiz coroar
E era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país


“O que você deve saber é que eu te amo demais, mesmo que nunca mais ouça o som da sua risada, sinta o cheiro dos seus cabelos ou olhe bem nos seus olhos. Está tudo guardado no meu coração desde que te vi no Expresso de Hogwarts e fiquei fazendo papel de bobo. Como, aliás, eu fiz durante quase 7 anos inteiros.”

O homem suspirou e deixou uma lágrima nostálgica passear pelo seu rosto sardento.

“Você, inteligente como sempre, entendeu de cara que eu era um idiota ciumento e apaixonado, no nosso quarto ano. Eu, imaturo e teimoso, não quis dar o braço a torcer. Mas eu nunca estou do lado certo quando discutimos, não é? Enfim, depois do episódio com Víctor Krum, eu, aos poucos, fui descobrindo o que sentia. E, se a Ginny não tivesse me tirado do sério, nós talvez tivéssemos ficado juntos antes.”

Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido
Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido


Ron ouviu alguém xingando baixinho e levantou a cabeça, que olhava para o pergaminho, a tempo de ver um gnomo correndo de um gato peludo e se escondendo num buraco no chão. Suspirou suavemente e continuou com sua carta:

“Eu, contudo, acho que nós nos aproximamos no momento certo, quando eu finalmente consegui amadurecer, parar de brigar com você por motivos imbecis e me render ao nosso amor. A coisa mais maravilhosa que aconteceu em toda a minha vida. Naqueles segundos, no meio da guerra, em que você correu atrás de mim e me beijou – eu digo ‘segundos’ porque não idéia de quanto tempo se passou – meu coração acelerou como nunca tinha acontecido, nem quando eu jogava quadribol.”

O ruivo fechou os olhos para se lembrar com mais clareza dos detalhes: os dentes de basilisco caindo, os braços dela ao seu redor, o beijo.

Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal
Era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim?


“Você trouxe a verdadeira magia à minha vida, deu cor aos meus dias, me ensinou a amar de verdade, construiu o homem que sou. Eu, tolo, nunca soube retribuir e agora não posso mais segurar essa emoção guardada em mim. Deveria ter dito isso enquanto era tempo.Obrigado, minha Mione.

Com amor, seu Ron.”


Ele se levantou da grama, agora chorando baixinho, lacrou a carta, colocou Bichento no colo e entrou no carro dirigido por Hugo, de tão abalado que estava para aparatar, para o cemitério de Godric’s Hollow.
Aproximou-se, então, da lápide onde estava escrito: “Hermione Jane Granger Weasley, amada filha, esposa, mãe e amiga.”
Beijou o envelope e o colocou em frente à lapide e então sentiu seu coração se aquecer de modo familiar, o que lhe deu a certeza de que ela não o havia deixado por completo.



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