CAPÍTULO QUATRO



CAPÍTULO QUATRO

O quarto já estava completamente escuro quando o tele-link ao lado da cabeça de Gina tocou. A policial que carregava dentro de si acordou primeiro, ligou o aparelho e se levantou na cama.
- Aqui é Weasley falando.
- Gina, ah, graças a Deus! Gina, eu preciso de ajuda!
A mulher que havia dentro dela se juntou à policial em um estalar de dedos e Gina olhou para a imagem de Luna na tela.
- Luzes! - ordenou ela, e o quarto ficou claro o suficiente para que ela pudesse enxergar as coisas em volta. O rosto de Luna estava pálido na tela, com uma marca roxa embaixo de um dos olhos. Um dos lados da face estava todo arranhado e os cabelos estavam em desalinho. - Luna! O que aconteceu? Onde você está?
- Você tem que vir até aqui. - Sua respiração estava ofegante e o ar saía por entre os dentes. Seus olhos estavam vidrados demais devido ao choque para permitir o aparecimento de lágrimas. - Corra, venha depressa, por favor! Acho que ela está morta, e eu não sei o que fazer!
Gina não tornou a perguntar pela localização, e em vez disso digitou um código para que a ligação fosse rastreada. Reconhecendo o endereço de Leonardo, quando ele apareceu sob o rosto de Luna, ela manteve a voz calma e firme:
- Fique onde está. Não toque em coisa alguma. Você entendeu o que eu disse? Não toque em nada, e não deixe ninguém entrar, a não ser eu. Entendeu, Luna?
- Sim, sim, entendi, eu faço isso. Não deixo ninguém entrar, mas venha rápido. Isso é horrível!
- Estou indo! - Ao se virar para o lado, viu que Harry já tinha se levantado e estava colocando as calças.
- Vou com você.
Ela não discutiu. Em menos de cinco minutos, eles já estavam na rua, rodando em alta velocidade em meio ao período mais escuro da noite. As ruas desertas foram substituídas pelo burburinho constante de turistas que circulavam pelo centro, e o brilho dos anúncios luminosos oferecia todos os prazeres e artigos conhecidos pelo homem; então, entraram na área do Village, cheia de badalação e notívagos que se reuniam em torno de minúsculas xícaras de café aromatizado, discutindo fatos relevantes, para, finalmente, alcançarem as sonolentas ruas onde moravam os artistas.
A não ser para perguntar o endereço, Harry não fez perguntas e Gina se sentiu grata por isso. Ela ainda estava com a imagem de Luna na cabeça, pálida e aterrorizada. Pior, muito pior, ela vira as mãos de Luna tremendo, e a mancha que estava espalhada em seu rosto era de sangue.
Um vento forte que anunciava a formação de uma tempestade chicoteou o ar através das gargantas formadas pelos prédios da cidade. Ele bateu forte no seu rosto quando Gina saltou do carro, antes mesmo de Harry ter parado por completo, junto ao meio fio. Atravessando os quase trinta metros de calçada que a separavam da entrada do prédio em uma corrida vertiginosa, ela se dirigiu à câmera de segurança.
- Luna, é Gina. Luna, droga! - Gina estava em tal estado que levou mais de dez frustrantes segundos para perceber que a câmera tinha sido destruída.
Harry entrou pela porta destravada e seguiu Gina até o elevador, entrando logo atrás dela.
Quando a porta se abriu, ela viu que a situação era tão ruim quanto ela temia. Em sua visita anterior, o ateliê de Leonardo lhe parecera alegremente entulhado, desorganizado, mas colorido. Agora, estava cruelmente destruído. Havia longas tiras de material rasgado, mesas viradas de pernas para o ar, com os objetos espalhados e quebrados.
Havia sangue em grande quantidade, manchando as paredes e as sedas como zangadas pinturas de dedo feitas por uma criança mal-humorada.
- Não toque em nada! - Gina alertou Harry, por puro reflexo. - Luna? - ela deu dois passos para a frente e então parou ao ver uma das cortinas de pano brilhante inflar e ondular. Luna apareceu por trás dela; estava em pé, mas oscilava para a frente e para trás.
- Gina! Gina, graças a Deus!
Tudo bem. Está tudo bem. - No instante em que Gina a puxou para perto, sentiu um alívio imenso. O sangue não era de Luna, embora estivesse espalhado nas roupas e nas mãos. - Você está ferida... Está muito machucada?
- Estou tonta, enjoada. Minha cabeça...
- Vamos fazer com que ela se sente, Gina. - Tomando Luna pelo braço, Harry a levou até uma cadeira. - Venha, querida, sente-se aqui. Isso! Ela está em estado de choque, Gina. Pegue uma coberta. Coloque a cabeça para trás, Luna. Isso, garota! Feche os olhos e respire fundo por alguns instantes.
- Está frio!
- Eu sei. - Ele esticou o braço, pegou no chão o pedaço rasgado de uma peça de cetim cintilante e a envolveu com ele. - Respire fundo, Luna. Devagar, respire de novo, bem fundo. - e olhou para Gina. - Ela precisa de cuidados médicos.
- Não posso chamar os para-médicos antes de saber qual é a situação. Faça o que puder por ela. - Sabendo perfeitamente o que poderia encontrar, Gina foi para trás da cortina.
Ela morrera de forma terrível. Foi o cabelo cheio de gloriosas mechas negras encaracoladas que confirmou a Gina quem aquela mulher tinha sido. O rosto, com a sua perfeição impressionante e quase estranha, desaparecera, esmagado e mutilado pela força de golpes cruéis e repetidos.
A arma ainda estava ali, jogada ao lado, de forma descuidada. Gina imaginou que se tratava de algum tipo de bastão sofisticado, ou bengala, um acessório de moda. Por baixo das manchas e do sangue coagulado, o objeto era de prata brilhante e tinha quase três centímetros de espessura, exibindo um cabo trabalhado no formato de um lobo com os dentes arreganhados.
Ela vira aquele bastão há apenas dois dias, encostado em um canto da área de trabalho de Leonardo.
Não era necessário verificar o pulso de Pandora, mas Gina o fez. Então, deu um passo para trás com todo o cuidado, para não prejudicar a cena do crime ainda mais.
- Meu Deus! - murmurou Harry atrás dela, e então colocou as duas mãos em seus ombros. - O que você vai fazer?
- O que tiver que ser feito. Luna jamais faria uma coisa dessas.
- Você não precisa dizer isso para mim. - e a virou, colocando-a de frente para ele. - Ela precisa de você, Gina. Precisa de uma amiga, e vai precisar de uma boa policial.
- Eu sei.
- Para você, não vai ser fácil fazer os dois papéis.
- É melhor começar logo. - e voltou até o lugar onde Luna estava sentada. O rosto dela parecia cera derretida, com a marca roxa e os arranhões contrastando com a pele branca como cera. Gina se agachou e colocou as mãos geladas de Luna entre as dela. - Preciso que você me conte tudo o que aconteceu. Pense com calma, mas conte-me tudo.
- Ela não estava se mexendo. Havia todo aquele sangue, e o jeito que o rosto dela estava. E... e ela não estava se mexendo...
- Luna. - Gina deu um apertão forte e rápido nas mãos da amiga. - Olhe para mim. Conte-me exatamente tudo o que aconteceu desde o momento em que chegou aqui.
- Eu vim... Eu queria... Achei que devia conversar com Leonardo. - Tremeu e, com as mãos ainda manchadas de sangue, apertou um pouco mais para junto do corpo o pedaço de tecido que a protegia. - Ele estava aborrecido quando apareceu na boate a última vez, procurando por mim. Chegou até mesmo a ameaçar o segurança, e ele não costuma fazer isso. Não queria vê-lo estragar a carreira. Então achei que devia conversar com ele. Vim até aqui e notei que alguém havia quebrado a câmera de segurança. Então eu subi direto. A porta não estava trancada. Às vezes ele se esquece de trancar. - murmurou, e parou de falar.
- Luna, Leonardo estava aqui?
- Leonardo? - Enfraquecida pelo choque, seus olhos percorreram toda a sala. - Não, acho que não. Eu chamei por ele, porque vi que estava tudo bagunçado. Ninguém respondeu. E havia... havia sangue. Eu vi sangue. Tanto sangue! Fiquei com medo, Gina, com medo de que ela talvez tivesse se matado, ou feito alguma loucura desse tipo, e então corri e fui olhar atrás da... ali atrás. Eu a vi. Acho que... fui até lá. Acho que eu fiz isso, porque de repente eu já estava ajoelhada ao lado dela, tentando gritar. Mas eu não conseguia gritar. Dentro da minha cabeça eu estava gritando muito, e não conseguia parar. Então, acho que alguma coisa me atingiu. Acho que... - Vagamente, ela tocou a parte de trás da cabeça com os dedos. - Está doendo! Mas tudo estava na mesma quando eu acordei. Ela ainda estava ali, e o sangue ainda estava todo ali. E eu liguei para você.
- Certo. Você tocou nela, Luna? Você tocou em alguma coisa?
- Não me lembro... Acho que não.
- Quem arranhou o seu rosto?
- Cho.
- Querida, - Gina sentiu uma fisgada de medo - você me contou que ela já estava morta quando você chegou aqui.
- A briga aconteceu antes. No início da noite. Eu fui até a casa dela.
Gina respirou fundo para contrabalançar a reviravolta que sentiu no estômago.
- Luna, então você foi até a casa dela hoje à noite? A que horas?
- Não sei exatamente. Eram mais ou menos onze horas, talvez. Queria dizer a ela que eu ia me afastar de Leonardo para fazê-la prometer que não ia estragar tudo para ele.
- Você brigou com ela?
- Ela estava ligada, tinha ingerido alguma coisa. Havia algumas outras pessoas lá, era uma espécie de festa. Ela foi cruel, me disse coisas ruins. Eu respondi. Saímos no tapa. Ela me deu um soco e me arranhou toda. - Luna afastou o cabelo para trás para revelar outros arranhões no pescoço. - Duas pessoas da festa nos separaram e eu fui embora.
- Para onde você foi?
- Andei por alguns bares, - deu um sorriso fraco - um monte de bares, eu acho. Estava sentindo pena de mim mesma. Só circulando. Então, me bateu a idéia de conversar com Leonardo.
- A que horas você chegou aqui? Sabe informar que horas eram?
- Não, era tarde, bem tarde. Três, quatro horas da manhã.
- Você sabe onde Leonardo está?
- Não. Ele não estava aqui. Queria que ele estivesse aqui, mas ela... o que vai acontecer agora?
- Vou cuidar disso. Tenho de dar o alarme do que aconteceu, Luna. Se não fizer isso, vai parecer estranho. Vou ter que gravar tudo isso, e vou ter que levar você para interrogatório.
- Inte... Interro... Você não acha que fui eu que...
- Claro que não. - Era importante manter a voz firme para disfarçar os próprios temores. - Só que nós vamos ter que esclarecer isso o mais rápido que pudermos. Deixe as preocupações por minha conta agora, certo?
- Não dá para raciocinar direito.
- Fique sentadinha aqui, enquanto eu agito as coisas. Quero que você tente se lembrar dos detalhes. Com quem você conversou ontem à noite, onde esteve, o que viu. Tudo o que conseguir lembrar. Vamos repassar tudo mais uma vez daqui a pouco.
- Gina. — Com um ligeiro tremor, Luna se recostou. - Leonardo. Ele jamais faria uma coisa dessas com alguém...
- Deixe as preocupações por minha conta. - repetiu Gina. Ela lançou um olhar para Harry, que, compreendendo o sinal, chegou mais perto para se sentar com Luna. Gina pegou o comunicador e se virou para o outro lado:
- Aqui fala a tenente Weasley. Tenho um homicídio.


A vida de Gina jamais fora fácil. Em sua carreira como policial, ela já vira e fizera tantas coisas de provocar pesadelos que não dava nem para lembrar. Nada, porém, havia sido tão difícil até então do que levar Luna para interrogatório.
- Você está se sentindo bem? Não precisa fazer isso agora, se não quiser.
- Não, os para-médicos me deram um analgésico - Luna levantou a mão e tocou o galo que se formara atrás da cabeça - e isso deu uma aliviada. Eles andaram me dando outros remédios também, acho que isso me colocou esperta novamente.
Gina olhou demoradamente para os olhos de Luna, para a cor dela. Tudo parecia estar normal, mas isso não aliviou a sua apreensão.
- Olhe Luna, não seria má idéia se você fizesse um checkup no hospital e ficasse lá por um ou dois dias.
- Não, você está só adiando o problema. Quero resolver logo isso. E Leonardo? - Luna engoliu em seco. - Alguém já encontrou Leonardo?
- Ainda não. Luna, você pode ter um advogado, ou um representante, presente no interrogatório.
- Não tenho nada a esconder. Eu não a matei, Gina.
Gina deu uma olhada na câmera, ainda desligada. Ela podia esperar mais um ou dois minutos.
- Luna, vou ter que fazer isto seguindo todas as regras. Ao pé da letra. Eles podem me tirar do caso se eu não agir desse jeito. Se eu não for a investigadora principal, não vou ser de muita ajuda para você.
- Então vai ser duro, não é? - Luna umedeceu os lábios com a língua e sentiu sede.
- Pode ser muito duro sim, muito mesmo. Você vai ter que agüentar.
Luna tentou dar um sorriso, e quase conseguiu.
- Bem, - disse então - nada pode ser pior do que entrar lá e dar de cara com Cho. Nada.
Ah, pode ser ainda pior, sim, pensou Gina, mas simplesmente balançou a cabeça. Ligando a câmera, informou o seu nome, deu o número de sua identidade e, oficialmente, recitou os direitos de Luna. Com todo o cuidado, levou Luna pela mesma linha de interrogatório que já havia seguido na cena do crime, especificando os horários tanto quanto possível.
- Quando você entrou na casa da vítima para falar com ela, havia outras pessoas presentes.
- Algumas. Parecia uma pequena festa. Justin Young estava lá. Você sabe quem é, o ator. Jerry Fitzgerald, a modelo, também. E havia outro cara que eu não reconheci. Parecia um executivo. Você sabe, de terno e tudo.
- A vítima atacou você?
- Ela me deu um soco. - disse Luna com ar de lamento, levando a mão até a marca roxa no rosto. - No início, ela estava só cheia de onda. Pelo jeito com que os olhos estavam se mexendo de um lado para outro, saquei que ela estava ligada.
- Você acredita que ela estava sob o efeito de uma droga ilegal?
- De montão. Quer dizer, os olhos dela pareciam bolinhas de cristal, e aquele soco que ela me deu... Eu já tinha me atracado com ela antes, você viu. - continuou Luna enquanto Gina fazia uma careta. - Ela não estava com aquela força toda da outra vez não.
- E você reagiu?
- Acho que acertei um soco nela, pelo menos um. Ela me arranhou... Aquelas unhas afiadas! Voei nos cabelos dela! Acho que foi Justin Young e o sujeito de terno que nos separaram.
- E depois?
- Acho que continuamos nos xingando por mais uns dois minutos, e então eu fui embora. Fui beber de bar em bar.
- Para onde você foi? Quanto tempo ficou em cada bar?
- Fui a vários lugares. Acho que o primeiro foi o ZigZag, aquela espelunca na Rua Sessenta e Um, esquina com Avenida Lexington.
- Você falou com alguém?
- Não queria conversa com ninguém. Meu rosto estava doendo e eu estava me sentindo péssima. Pedi um Zumbi triplo e fechei a cara.
- Como foi que você pagou pelo drinque?
- Acho... Acho que digitei o código da minha conta na tela de pedido.
Ótimo, pensou Luna. Haveria um registro da hora e do lugar.
- E depois, Luna, para onde você foi?
- Circulei por aí, fui em mais umas duas espeluncas. Estava muito injuriada.
- E continuou a beber?
- Devo ter bebido. Estava muito bêbada, quando tive a idéia de ir até o ateliê de Leonardo.
- Como você chegou no centro?
- Fui andando. Tinha que espalhar o porre, um pouco, então resolvi caminhar. Peguei uma passarela rolante, umas duas vezes, mas na maior parte do tempo andei a pé.
Na esperança de fazer surgir alguma lembrança, Gina repetiu todas as informações que Luna fizera até então e continuou:
- Depois de sair do ZigZag, para que direção você foi?
- Eu tinha acabado de entornar dois Zumbis triplos. Não estava nem andando, estava cambaleando. Não sei para que lado fui. Gina, não sei nem o nome dos outros bares onde entrei, nem que mais eu bebi. Tudo é um borrão na minha memória. Música, pessoas rindo... alguém dançando em cima de uma mesa.
- Homem ou mulher?
- Um cara. Fortudo, bem-dotado, com uma tatuagem, eu acho. Podia ser tinta de corpo. Tenho certeza de que era a figura de uma cobra ou talvez um lagarto.
- Como é que era a cara dele, desse cara dançando em cima da mesa?
- Droga Weasley, eu não olhei nem uma vez para cima da cintura!
- E você falou com ele?
Luna pousou a cabeça nas mãos e lutou para conseguir trazer os fatos de volta. Tentar lembrar de tudo era como segurar água por entre os dedos.
- Eu simplesmente não sei. - disse por fim. - Estava seriamente afetada. Só me lembro de andar e andar, sem parar. Lembro-me de chegar no ateliê de Leonardo e pensar que era a última vez que eu ia vê-lo. Não queria estar bêbada quando isso acontecesse. Então tomei um pouco de Sober Up para curar o porre, antes de entrar. Foi quando a encontrei, e foi muito pior do que se eu estivesse bêbada.
- Qual foi a primeira coisa que viu quando entrou?
- Sangue. Um monte de sangue. Coisas derrubadas, rasgadas, mais sangue. Fiquei com medo de que Leonardo tivesse se ferido, corri direto para a sua área de trabalho, e foi quando eu a vi. - Aquela era uma lembrança que ela conseguia trazer de volta com toda a nitidez. - Eu a vi. Só a reconheci por causa do cabelo e porque ela estava usando a mesma roupa de antes. Só que o seu rosto... na verdade, ele não estava nem mesmo lá, tinha desaparecido! Não consegui gritar. Ajoelhei ao lado dela. Não sei o que foi que pensei em fazer, mas eu tinha que fazer alguma coisa. Nesse momento, algo me atingiu, e quando eu acordei chamei por você.
- Você viu alguém na hora em que estava entrando no prédio, ou na calçada, lá fora?
- Não. Já era muito tarde!
- Fale-me sobre a câmera de segurança.
- Estava quebrada. Às vezes, os vagabundos da rua se divertem arrebentando uma câmera dessas. Não achei nada estranho.
- Como foi que você conseguiu entrar no ateliê?
- A porta não estava trancada. Eu simplesmente entrei.
- E Cho já estava morta quando você chegou lá? Você não falou com ela, vocês não discutiram?
- Não, já lhe disse. Ela estava lá, caída.
- Você já tinha brigado com ela duas vezes antes. Tornou a brigar com ela esta noite, no ateliê de Leonardo?
- Não. Ela estava morta. Gina...
- Por que brigou com ela nas outras duas vezes?
- Ela ameaçou arruinar a carreira de Leonardo. - As emoções começaram a aparecer no rosto machucado de Luna. Mágoa, medo, pesar. - Ela não queria que ele fosse embora. Nós estávamos apaixonados um pelo outro, mas ela não queria largá-lo. Você viu o jeito como ela estava, Gina.
- Leonardo e a carreira dele são muito importantes para você?
- Eu o amo. - respondeu Luna baixinho.
- E faria qualquer coisa para protegê-lo, para ter certeza de que ele não ia ser prejudicado, nem pessoal nem profissionalmente.
- Eu resolvi ficar fora da vida dele. - afirmou Luna, com uma dignidade que comoveu Gina. - Ela o teria machucado se não fosse assim, e eu não podia deixar que isso acontecesse.
- E ela não podia machucá-lo, e nem a você, se estivesse morta.
- Eu não a matei!
- Você foi até a casa dela, vocês brigaram, ela a atingiu, você revidou e as duas brigaram. Você foi embora e encheu a cara. Resolveu ir até o ateliê de Leonardo e a encontrou novamente lá. Talvez vocês tenham discutido novamente, talvez ela tenha atacado você novamente. Você se defendeu e as coisas acabaram escapando ao seu controle.
Os olhos cansados de Luna mostraram, a princípio, surpresa e depois mágoa.
- Weasley, por que está dizendo essas coisas? Você sabe que nada disso é verdade.
Com os olhos impassíveis, Gina se inclinou na direção de Luna e completou:
- Ela estava transformando a sua vida em um inferno, ameaçando o homem que você ama. Ela a machucou fisicamente. Era mais forte do que você. Quando viu você entrando no ateliê, veio com tudo em cima de você mais uma vez. Ela a derrubou, e foi nessa hora que você bateu com a cabeça. Então, como ficou com medo, pegou a primeira coisa que conseguiu agarrar. Para se defender. Você a atingiu com o objeto para se defender. Talvez ela tenha continuado a vir em sua direção. Em seguida, você a atingiu de novo. Para se defender. Então, perdeu o controle e continuou a atingindo, batendo sem parar, sem parar, até que reparou que ela estava morta.
Luna soluçou com força, com os lábios abertos. Balançou a cabeça e continuou balançando-a enquanto o corpo começou a tremer violentamente.
- Não, eu não fiz isso! Eu não a matei! Ela já estava morta! Pelo amor de Deus, Weasley, como é que você pode achar que eu poderia fazer aquilo com alguém?
- Talvez não tenha sido você. - Continue forçando, ordenou Gina a si mesma, com o coração sangrando. Force ao máximo, para ficar registrado. - Talvez Leonardo tenha feito isso, e você o está protegendo. Você viu o instante em que ele se descontrolou, Luna? Ele pegou a bengala de metal e atingiu Cho com ela?
- Não, não, não!
- Ou você só chegou lá depois que ele já tinha feito isso, quando ele estava em pé ao lado do corpo dela? Em pânico. Você quis ajudá-lo a encobrir tudo, então fez com que ele saísse dali e deu o alarme.
- Não, não foi nada disso! - Ela deu um pulo da cadeira, com as bochechas pálidas e os olhos arregalados. - Ele nem mesmo estava lá! Eu não vi ninguém. Ele jamais poderia fazer algo assim. Por que você não está me escutando?
- Eu estou escutando você, Luna. Sente-se. Sente-se. - repetiu Gina com mais gentileza. - Estamos quase acabando. Há alguma coisa que você gostaria de acrescentar à sua declaração ou alguma mudança que gostaria de fazer neste momento?
- Não. - murmurou Luna, e olhou sem expressão para um ponto além do ombro de Eve.
- Isto conclui o interrogatório um, de Luna Lovegood, arquivo de Homicídio, vítima, Cho Chang. Aqui fala a tenente Gina Weasley. - anotou a data e a hora, desligou a câmera e respirou fundo. - Desculpe, Luna. Eu sinto muito.
- Como é que você pôde fazer aquilo? Como é que pôde dizer aquelas coisas para mim?
- Eu tive que falar tudo aquilo para você. Tive que fazer aquelas perguntas e você teve que respondê-las. - e cobriu com firmeza a mão de Luna com a dela. - Pode ser que eu tenha que fazer aquelas perguntas novamente, e você vai ter que respondê-las mais uma vez. Olhe para mim, Luna. - e esperou até que Luna desviasse o olhar de volta para ela. - Não sei o que os técnicos vão encontrar, nem o que os relatórios do laboratório vão dizer, mas, se a gente não tiver muita sorte, você vai precisar de um advogado.
A cor desapareceu do rosto de Luna, até dos lábios, e ela ficou parecendo um cadáver com olhos tristes.
- Você vai me prender?
- Não sei se vamos precisar chegar a esse ponto, mas gostaria que estivesse preparada. Agora, quero que você vá para casa com Harry e durma um pouco. Quero que você tente com força, de verdade, mesmo, se lembrar dos horários, dos lugares e das pessoas. Se você se lembrar de alguma coisa, quero que grave tudo para mim.
- E o que vai fazer agora?
- Vou fazer o meu trabalho. Sou muito boa no que faço, Luna. Quero que você se lembre disso também e confie em mim para tirar tudo a limpo.
- Tirar tudo a limpo. - repetiu Luna, com amargor na voz. - Tirar e limpar a mim, você quer dizer. Eu achei que era "inocente até prova em contrário".
- Essa é uma das grandes mentiras do nosso tempo. - Levantando-se, Gina levou Luna, com gentileza, até o corredor. - Vou fazer o melhor que puder para fechar esse caso bem depressa. Isso é tudo o que eu posso lhe dizer.
- Você poderia me dizer que acredita em mim.
- Isso eu posso lhe dizer também. - Ela só não podia deixar que isso atrapalhasse as investigações.


Havia a papelada de sempre para preencher e procedimentos a seguir. Em uma hora, Gina já conseguira liberar Luna e fazê-la assinar uma declaração de que ficaria voluntariamente à disposição da polícia na casa de Harry. Oficialmente, Luna Lovegood estava ligada ao caso como testemunha. Extra-oficialmente, Gina sabia que ela era a principal suspeita. Pretendendo resolver esse problema de imediato, entrou de volta em sua sala.
- Tudo bem, agora me conte que história é essa de Luna detonar uma modelo de cara bonita?
- Oi, Neville. - Gina ficou com vontade de beijar cada pedaço daquela cara amarrotada. Ele estava sentado atrás da mesa dela; o indefectível saquinho de nozes com cobertura doce estava apoiado no colo e a cara enrugada tinha um ar sério e soturno. - As notícias voam.
- Foi a primeira coisa que eu ouvi quando fiz a parada matinal na lanchonete. Quando uma das amigas da policial mais famosa da cidade vai presa, a notícia causa rebuliço.
- Ela não foi presa. É apenas testemunha. Por enquanto.
- A mídia já caiu em cima. Eles ainda não têm o nome de Luna, mas já espalharam o rosto da vítima em todos os canais. Minha esposa foi me tirar do chuveiro só para ouvir a notícia. Cho sempre foi uma NPP.
- Sei. Notícia de Primeira Página. Viva ou morta. - Cansada, Gina encostou o quadril na quina da mesa. - Quer um resumo das declarações de Luna?
- E por que você acha que eu vim até aqui? Para ver a decoração da sala?
Gina entregou a folha com as informações taquigrafadas no jargão policial, que os dois entendiam, e o deixou com a testa franzida.
- Que droga, Weasley, acho que esta história não vai ser muito boa para ela! Você mesma já tinha visto pessoalmente as duas se pegando.
- Ao vivo e em cores. Por que foi que ela enfiou na cabeça essa idéia de se confrontar com Cho novamente?... - Levantando-se, começou a circular pela sala. - Isso piora as coisas. Estou com a esperança de que o laboratório pesque alguma coisa, qualquer coisa, mas não posso contar com isso. Como é que está a sua carga de trabalho, Neville?
- Nem queira saber! - e balançou a mão para o lado. - O que você precisa de mim?
- Preciso de uma varredura na conta bancária de Luna. O primeiro lugar em que ela se lembra de ter ido é o ZigZag. Se a gente conseguir provar que ela estava lá ou em um daqueles inferninhos da região na hora da morte, ela fica limpa.
- Dá para pesquisar isso sim, mas veja só... temos alguém que ainda estava na cena do crime e golpeou Luna na cabeça, quando ela chegou. Não temos muita chance de achar uma janela de tempo entre o momento da morte e a chegada de Luna.
- Eu sei, mas temos que cercar por todos os lados. Vou procurar pelas pessoas que Luna reconheceu na festa na casa da vítima e pegar declarações. Temos também que encontrar um dançarino de boate com um pinto grande e todo tatuado.
- Oba! A diversão não pára!
Gina quase riu.
- Tenho que encontrar pessoas que possam testemunhar que ela já estava andando com a roupa toda rasgada. Mesmo com uma dose de Sober Up, ela não ia estar tão sóbria a ponto de conseguir matar Cho, depois de ter bebido por todo o caminho até o Village.
- Ela afirma que Cho estava doidona.
- Essa é outra coisa que eu tenho de confirmar. E temos também o escorregadio Leonardo. Onde é que ele se meteu naquela hora? E onde está agora?




N/A: Galera, mais um capitulo no ar. Me desculpem a demora para responder aos comentários, foi uma semana louca e eu não consegui muito tempo. Mas respondo agora, Abraços.

Babi Mione: Que bom que esta gostando, espero que continue acompanhando. Beijos.
Bianca: E, a ruiva aceitou a proposta, mas também a maneira como foi feita, acho que nunca imaginei um pedido de casamento tão original quanto esse. Ta, eu sei que o Harry é tudo o que as mulheres querem, não vou negar, as mulheres gostam do irlandês, não é mesmo? ...... Cho apareceu e morreu, e agora, coitada da Luna, como que pode dar tantos bolas foras em tão pouco tempo. To com dó dela.
Gina e Mione juntas são uma dupla imbatível, o passado da Gina é um mistério, daqui alguns capítulos uma grande bomba vai cair nas mãos dela, que vai se lembrar de alguns fatos bem desagradáveis de sua vida... Com certeza vai ser prioridade depois da Chang ser literalmente amassetada na pancada, bem, eu nunca gostei dela mesmo... antes ela do que a Luna. Beijos.
Obs: quanto a pergunta que você me fez no final de Gloria Mortal.
Emprestar os livros dela eu posso até emprestar, mas tem um pequeno detalhe. No momento eu estou na cidade de Foz do Iguaçu, e estou iniciando o 2º Ano de Ciência da Computação na UNIOESTE e comigo tenho poucos livros dela, a maioria está na casa da minha família em Santo André – SP. Comigo eu tenho apenas Vingança Mortal, Trilogia da Gratidão 1 – Arrebatado Pelo Mar, Clã McGregor – Um Vizinho Perfeito, Um Novo Mundo e Rebelde, embora tenha a maioria dos livros dela no PC.


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