Capitulo I
Ela faria com que tudo fosse perfeito. Cada centímetro, cada recanto, cada detalhe seria elaborado do modo como dese¬java e visualizava, até que seu sonho se tornasse realidade. Afinal, contentar-se com menos do que a perfeição era per¬da de tempo. E Gina Weasley não se conformava em perder nada.
Aos vinte e cinco anos, já vira e experimentara mais do que muitas pessoas bem mais velhas. Enquanto as outras garotas ficavam cochichando sobre rapazes ou preocupan¬do-se com roupas, ela já viajara para Paris e para Bonn, usan¬do trajes glamourosos e fazendo coisas extraordinárias, já dançara para rainhas e até jantara com príncipes.
Sempre seria grata aos pais, que lhe deram a oportuni¬dade de ter esse estilo de vida. Devia a eles tudo o que ti¬nha e vivera. Mas chegara a hora de conseguir o que dese¬java com o próprio esforço.
A dança era seu sonho desde que se conhecia por gen¬te. Segundo o irmão Rony, era sua obsessão. Mas acha¬va que não havia nada de errado em ser obcecada, contanto que agisse com segurança e batalhasse muito.
Gina se dedicara muito à dança. Foram vinte anos de aulas, exercícios, alegrias e sofrimento, suor e sapatilhas de ponta. Sacrifícios também, dela própria e dos pais. Com¬preendia como fora difícil para eles deixarem a caçula da família ir para Nova York para aprimorar sua arte, com apenas dezessete anos. Mas eles só haviam lhe oferecido encorajamento e apoio.
Dançara como profissional durante seis anos, conhece¬ra a luz dos refletores e a excitação de subir ao palco. Viaja¬ra pelo mundo, representara todas as grandes personagens femininas do bale: Gisele, Aurora, Julieta, dezenas de pa¬péis, trágicos e triunfantes, e adorara cada momento, cada segundo.
Por isso, todos ficaram surpresos quando Gina decidiu abandonar o palco. Só havia uma explicação para tal atitu¬de: desejava voltar para casa.
Queria uma vida de verdade. Por mais que amasse o bale, não estava mais disposta a abdicar de tudo por ela. Aulas, ensaios, apresentações, viagens, publicidade... A car¬reira de bailarina era muito mais do que ficar na ponta dos pés sob os refletores. Dera-lhe muita alegria, mas ela desco¬briu que desejava dar algo de si para as pessoas, já que re¬cebera tanto. E poderia conseguir tudo que desejava abrin¬do sua própria escola de bale.
As alunas viriam, disse a si mesma, porque se tratava de Gina Weasley, e esse nome significava algo importante no mundo da dança e do bale.
Era o momento de novos sonhos, refletiu, enquanto percorria a enorme sala vazia. A escola de bale era sua nova obsessão, e pretendia que fosse tão compensadora, gratificante e perfeita quanto á antiga.
Com as mãos nos quadris, examinou as paredes cinzen¬tas, que um dia haviam sido brancas. Voltariam a clarear, decidiu. Seria ali que ela poria os pôsteres emoldurados dos grandes bailarinos, Nureyev, Margot Fontayne, Baryshnikov, Davidov e Bannion.
E as duas paredes mais longas seriam revestidas com espelhos por trás das barras. Essa vaidade profissional era tão necessária quanto respirar. Uma bailarina devia estu¬dar cada pequeno movimento, cada arco, cada flexão, para alcançar a perfeição.
Os espelhos em uma sala de dança eram como janela, pensou Gina, por onde a bailarina enxergava o bale.
O velho teto seria consertado ou substituído, conforme a necessidade. O mobiliário... Gina esfregou os braços gela¬dos. Bem, sem dúvida seria modificado. As tábuas do chão receberiam um tratamento para ficarem macias, lisas e per¬feitas. E havia ainda a iluminação e o encanamento, por certo teria alguns reparos elétricos a fazer.
Seu avô fora marceneiro antes de se aposentar, lembrou com afeição. Portanto não era tão ignorante a respeito de reformas. E o que não soubesse, aprenderia, concluiu. Faria perguntas, até compreender o processo e poder orientar o empreiteiro que fosse contratar. Era preciso conhecer os assuntos para poder comandar, pensou.
Em um esforço para imaginar como ficaria o ambiente, fechou os olhos, inclinando o corpo em uma posição de bale. Gina tinha muita flexibilidade e foi descendo o tronco até que as nádegas tocaram os calcanhares. Voltou a erguer-se e baixar de novo.
Fizera um coque no alto da cabeça, e com os movimen¬tos continuados, os cabelos se soltaram e algumas mechas onduladas, ruivas e brilhantes emolduraram-lhe o rosto. Quando soltas, chegavam até a cintura, emprestando-lhe um ar romântico que era o ideal para sua imagem no palco.
Sorrindo de modo sonhador, o rosto de Gina parecia brilhar. Herdara a pele alva da mãe e as maçãs do rosto salientes, os olhos escuros e o queixo voluntarioso, do pai.
Era uma combinação atraente e muito feminina. Um misto de cigana, sereia e fada. Os homens olhavam para Gina, percebiam a delicadeza de suas feições e concluíam que era uma mulher romântica e frágil. Que erro! Por baixo da feminilidade havia uma tempera de aço!
— Um dia desses não vai conseguir sair dessa posição e vai ter que pular como um sapo.
Gina deu um salto e abriu os olhos.
— Rony! — exclamou, atravessando a sala para ati¬rar-se nos braços do irmão. — O que faz aqui? Quando che¬gou? Pensei que estivesse jogando bola em Porto Rico. Quanto tempo vai ficar?
Rony era dois anos mais velho, fato pelo qual costu¬mava martirizá-la quando crianças, ao contrário da meia-irmã Hermione, mais velha que os dois, e que nunca se apro¬veitara disso para dar ordens. Entretanto, Rony era o preferido de Gina.
— Que pergunta deseja que responda primeiro? — Rin¬do, Rony a afastou, analisando-a de modo rápido, com um olhar divertido. — Ainda é uma magricela.
— E você é um bobo — replicou Gina, beijando-o. — Mamãe e papai não me disseram que viria para casa.
— Não contei. Soube que a nossa Gina estava de volta e achei que deveria vir fazer uma visita. — Relanceou um olhar pela sala enorme e suja e fez um gesto de desespero. — Mas creio que cheguei tarde demais.
— Vai ficar maravilhoso!
- Pode ser, mas no momento é um horror. — Rony passou-lhe um braço pelo ombro. — Então a rainha do bale vai ser professora.
— E a mais maravilhosa! Por que não está em Porto Rico?
— Não posso jogar beisebol doze meses por ano. Gina enrugou a testa, preocupada.
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