A Música



Ela acordou tão bem quanto nas noites em que sua mãe lia histórias para que adormecesse. Ainda de olhos fechados se lembrou de sua mãe lendo “Alva Neve e Rosa Rubra” aos pés de sua cama... até sentiu o perfume de sua mãe que impregnava o quarto. Era esse perfume que ela costumava associar com segurança antigamente. E, falando em perfume, que cheiro adocicado era aquele?

Abrindo os olhos e sentando-se rapidamente percebeu que o dormitório feminino estava repleto de rosas brancas... elas ocupavam cada espaço do chão, das mesinhas e das cinco camas de colunas, especialmente em sua cama.

Maravilhada, ela correu os olhos pelo quarto e descobriu suas amigas dando risinhos de camisolas.

- Quem...? – começou, mas perdeu o que falava ao escutar toques de violão entrando pelo quarto... correu até a sacada dos dormitórios, onde se podia olhar para a sala comunal lá em baixo.

Ele estava lá, sentado no braço de uma poltrona virada para a sacada, tocando o violão que havia ganhado de presente de 13 anos de seus pais... ela sabia que ter um violão havia sido um de seus maiores sonhos e ele sabia que ela adorava vê-lo tocar.

Ele estava um pouco nervoso, ela o conhecia muito bem para reparar... e reparou em seus braços agarrados ao instrumento, nas lindas mãos tocando as cordas e nos cabelos pretos e despenteados que lhe caíam nos olhos de vez em quando, mas com um aceno displicente ele os jogava para trás.

Ele levantou a cabeça e ela encontrou seus olhos verde-vivo bem na hora em que ele começou a cantar.

“ – You´re all smiles and silly conversation...” (Você é cheia de sorrisos e conversas bobas...)

Com um arrepio no corpo, ela sentiu os olhos se encherem de lágrimas. “Minha música preferida” pensou.

A primeira vez que havia escutado a canção, ela tinha uns 4 ou 5 anos e, passando pela porta aberta do quarto dos pais, escutou seu pai cantando a música meio sem ritmo e espaçada entre beijos com sua mãe.

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