Grifinória contra Corvinal



  Eram seis horas da manhã. O som revigorante da chuva tocando as janelas da torre oeste chegava aos ouvidos de Harry Potter, neste momento travado num sono profundo.
 O dormitório dos garotos só não estava completamente silencioso pois Rony Weasley roncava alto, fazendo trilha sonora com a chuva. Aquele era o primeiro dia de agosto, que pelo jeito iria apresentar um clima igual durante os seus longos trinta dias.
 Os segundos se passavam lentamente, e Harry já não estava completamente adormecido. Quando o raio de luz passou pela fresta aberta da janela e iluminou seu rosto, ele abriu os olhos. Acabara de amanhecer.
 Não resistindo à tentação de se virar de lado e tirar um cochilo, Harry fez um gesto com a varinha e a janela se fechou, levando o quarto à mais profunda penumbra. Deixou seu corpo cansado interagir por si próprio, e adormeceu novamente.

 Depois de algum tempo Harry acordou pela segunda vez naquele dia. Levantou-se com um sobressalto, e imediatamente colocou os óculos sobre seu rosto. Consultou temeroso o relógio: Eram oito horas e oito minutos. O jogo começaria às dez. Espreguiçou-se ao mesmo tempo em que se levantara da cama.
 Harry apressou-se em colocar as vestes da Grifinória e desceu para o Salão Comunal. Já fazia oito minutos que o café matinal começara, isso significava que ainda tinha bastante tempo, então resolveu largar-se na poltrona e refletir.
 Seus olhos estavam quase se fechando, o sono devagar ia tomando conta dele. Ele abriu os olhos e concordou com si mesmo que antes de ir tomar o café ele passaria em algum banheiro lavar o rosto.
 Mal se levantara quando escutou passos vindo das escadas. Esticou a cabeça e viu Rony descendo, espreguiçando-se e bocejando.
 -Que... Horas... Sããããããããããããoooooo...? – perguntou, num longo bocejo.
 Harry consultou o relógio pela segunda vez naquele dia.
 -Oito e quinze – respondeu. – Eu estava indo para o salão principal. Você quer ir?
 -Claro... – respondeu Rony, largando-se também na poltrona ao lado de Harry.
 Harry tinha encontrado um substituto para Dino, seu nome era Joey Blakeney, do quinto ano. Ele não era nada genial, mas seu modo de jogo assemelhava-se com o de Dino, isso significava que pelo menos no quadribol o fato do assassinato não iria interferir.
 Durante essas últimas semanas eles treinaram com muito empenho. Praticamente todos os dias eles se reuniram no campo, fosse pra conversar, fosse pra reconhecer o gramado, as balizas, até mesmo as bolas, fosse para armar novas jogadas, estratégias... Também já tinham esquematizada a marcação que usariam ao decorrer do jogo. Estava tudo pronto, tudo certo, não tinham como perder. O time de Corvinal não treinara nem com a metade do empenho deles, pois só vieram ao campo três vezes, nos quais Harry assistiu os três.
 Não era um time de se assustar. A melhor arma deles eram os batedores, que eram muito fortes e ambos possuíam uma Nimbus 2001. Os artilheiros não eram dignos de extrema preocupação, com a exceção do capitão Bob, que jogava na posição de Artilheiro central. Com o apanhador não precisavam se preocupar muito, pois era um aluno do segundo ano que montava uma Oakshaft 79, com certeza uma das piores vassouras que Harry já vira em sua vida.

 Carregando a leve Flying Rex no ombro, Harry desceu para o campo de Quadribol. Estava acompanhado de Gina, Rony e Hermione, e seguido de perto pelos demais jogadores grifinórios. A equipe da Corvinal vinha mais atrás, junto dos espectadores que se reuniam entusiasmados pelo primeiro jogo da temporada.
 A multidão já lotava as arquibancadas do campo quando a equipe Grifinória chegou aos vestiários. Descansaram as vassouras e se sentaram, esperando por mais um discurso do capitão Harry.
 -Muito bem – começou ele, sem jeito. – Deixou de ser brincadeira, agora é sério. Nós não estamos mais num treino, agora é pra valer. Precisamos nos empenhar, o time da Corvinal é um time... [i]razoável[/i], mas se jogarmos o nosso melhor eles jamais vão chegar ao nosso nível.
 Harry gostou de perceber que todos olhavam para ele, respeitando-o. Toda a atenção era dele, então resolveu continuar.
 Sara, Coote – chamou a atenção dos batedores. – Cuide para que nossos artilheiros possam chegar aos aros. E não se esqueçam, se forem desviar o balaço em algum deles, mirem o capitão, o artilheiro Bob, ele sim pode causar problemas.
 Harry apontou a varinha para o pequeno quadro-negro que se prendia na parede do vestiário, e com a varinha foi desenhando um campo como se usasse giz.
 -Hermione, Joey, tentem jogar pelas alas, tentem jogadas cruzadas, deixem Gina pelo centro, assim como treinamos. Usem e abusem da finta, façam lançamentos longos, disparem com a Goles, enfim, usem a criatividade.
 Ele fez um risco nos extremos ofensivos do campo, indicando em que posição os dois deveriam atuar.
 -Gina, tente desprender-se da marcação. Jogue fora do círculo defensivo, jogue perto do solo, assim eles não vão conseguir pegar você.
 O time foi para o campo. Harry sentiu-se mais confiante quando colocou o primeiro pé no gramado. Os Corvinos já voavam em volta do campo, jogando a Goles de um para o outro.
 Harry posicionou-se em sua Flying Rex e levantou vôo junto ao time. Madame Hooch já se aproximava, montando uma Shooting Star extremamente velha. Ao redor, a multidão bradava confiantemente, a espera do apito que marcaria o início do grande jogo.
 Harry já voava alto quando Madame Hooch trouxe a caixa com as bolas para o meio do campo. A voz clara e suave de Luna veio do alto:
 -O jogo está prestes a começar...
 Ela continuou a falar, mas Harry desprendeu sua atenção para o estalo que ocorreu metros abaixo. A caixa fora aberta, o Pomo sumiu, os balaços perseguiam os jogadores, a Goles foi jogada pra cima e Gina a pegara antes de Bob...
 Começara. Aquele era o momento. Um raio vermelho da Goles voando refletia a luz do sol, ao mesmo tempo em que a primeira gota de chuva cai nos óculos de Harry. As nuvens estavam escuras e espessas, dificultando a procura... Mas ele tinha de procurar, e no instante em que se deu conta disso o grito nas arquibancadas o fez virar os olhos.
 -Dez pontos para Corvinal! – a voz de Luna saiu abafada pelos gritos. – Grifinória zero, o time Corvino abre o placar aos cinco segundos de jogo!
 Harry suspirou. Aquele definitivamente não era um bom começo, e percebeu que quanto mais rápido apanhasse o Pomo, melhor seria. Mergulhou em direção ao solo, à procura de um brilho dourado.
 Mas mal chegara próximo ao chão, os novos gritos de Corvinal o fez parar, e observar a dolorosa cena.
 -Mais dez pontos para Corvinal! – informou Luna, sua voz inaudível aos gritos da multidão. – Bob marca seu segundo gol aos vinte segundos de jogo! Sim, é um mal começo para a Grifinória.
 Harry sentiu um resíduo de desesperança nascer dentro dele. Não era possível, o jogo só corria para o lado Corvino, os balaços fugiam dos batedores grifinórios e iam direto aos adversários...
 Blakeney e Hermione, que aceitaram marcar Bob, não estavam dando conta. Hermione voava atrás dele, mas sua vassoura não era páreo. Ele voava muito rapidamente, e sempre que Blakeney ia ajudar Hermione na marcação Bob lançava a bola para um companheiro.
 Enquanto os dez primeiros minutos de jogo se passaram muito rapidamente, Harry não tinha a mínima idéia de onde procurar pelo Pomo. Ele já voara pelo perímetro do campo dezenas de vezes, mas não vira nem sinal de um raio dourado cortando o céu.
 Quando Corvinal fez quarenta a zero, Harry começou a se sentir apreensivo. Foram quatro gols do capitão Bob. ‘’Ele está impossível hoje’’, não cansava de dizer Luna Lovegood.
 Durante os quinze primeiros minutos a Grifinória passou por um jejum de gols inacreditável. Dos quatro gols, quatro foram indefensáveis, mas isso não era desculpa para Rony deixar de se sentir culpado. O rosto corado, as orelhas vermelhas.
 O primeiro gol grifinório foi um alívio sem tamanho, e um belo gol, Harry pode ver. Joey jogou para Hermione, que subiu muito alto e deixou a bola cair para Gina, completamente livre metros abaixo, que só teve o dever de fazer o gol.
 Esse foi o momento da reação, ou pelo menos isso se pareceu quando Hermione driblou dois marcadores e jogou a Goles com tanta força no aro esquerdo que o goleiro da Corvinal não teve tempo nem de pensar. Naquele momento, quarenta a zero para Corvinal, e nem sinal do Pomo de ouro...
 A Grifinória só conseguiu o empate depois de longos trinta minutos de jogo, de modo que ambos ficaram empatados com sessenta pontos. Harry não parava de voar, próximo às nuvens, próximo ao solo, a procura da mínima bola dourada, mas era impossível encontra-la naquele momento. Ele nunca imaginara vê-la durante o segundo que marcou quarenta minutos de jogo.
 Hermione e Gina jogavam coreograficamente enquanto Joey chamava a marcação para si. A Grifinória começou a jogar com tudo, de modo que logo o jogo estaria cem a oitenta para eles.
 Pela primeira vez, Harry pensou ter visto um brilho dourado próximo ao seu braço esquerdo, e virou rapidamente o rosto para ver. Mas se enganara, o reflexo foi de sua vassoura, linda, dourada e brilhante, reluzente ao sol escaldante, mas inútil a partir do momento em que não tinha uma trilha traçada...
 Harry voltou a rodar o campo, cansado, olhando para os lados sem ver nada mais estimulante do que Gina dar um chapéu no goleiro e fazer um golaço.
 Aconteceu no instante em que o time Grifinório vencia por cento e dez a noventa: Uma circunferência brilhante e ligeira circulando a baliza esquerda do gol Corvino. Tinha uma chance, e não a perderia por nada no mundo.
 O apanhador adversário estava completamente desnorteado procurando muitos metros abaixo, do extremo oposto do campo. Ele sabia que não teria dificuldade, então se inclinou na vassoura e em poucos segundos, sentiu sua mão fechar-se sobre o a bola alada, sentiu as asinhas descontroladas baterem em sua mão direita. Com um grito de alegria que não foi ouvido por ninguém, pois a barulheira nas arquibancadas da Grifinória era inacreditável, Harry ergueu o braço, mostrando para todos que quisessem ou não ver, ele pegara o pomo, mais uma vez a Grifinória vencera.
 A euforia era inevitável. Cegamente, Harry voou a toda velocidade, erguendo e bradando o pomo, segundo em suas mãos. Naquele momento toda a equipe o rodeava, gritos para todos os lados, a comemoração, a vitória, o sabor de vencer novamente... Era algo indescritível, era demais, era o verdadeiro sabor.
 Os sete vencedores desceram na grama, nada mais nada menos do que um tapete, nunca foi tão belo. Harry, seus cabelos negros arrepiados para trás por causa do vento, deixava visível a cicatriz, que à quase seis meses não causara uma mínima dor em Harry. Mas não era aquela sua marca na história do Quadribol de Hogwarts, sua marca sempre foi e sempre será a faixa de capitão presa no braço e o número sete estampado em suas costas.
 Nada no mundo o deixaria mais feliz naquele momento. Aquele era um grande passo para a taça, um dos três passos essenciais para vencerem. Eles venceram a batalha, mas para vencer a guerra ainda tinham que batalhar muito. Teriam de jogar – e vencer – Lufa-Lufa e Sonserina.
 Harry só teve chance de ver o treino dos Sonserinos uma vez. Ele admitia, era um time... [i]considerável[/i]. Todos tinham vassouras espetaculares, sendo que a pior delas era uma Nimbus 2000.
 Já eram onze e meia e o sol não poderia estar mais forte, mas isso não era empecilho para a euforia se esvair. O time caminhou em direção ao castelo em meio de conversas, comentários sobre o jogo.
 É, o primeiro jogo, o primeiro passo. Aquilo era de grande importância, mas eles não se deixariam levar por [i]apenas[/i] um jogo. Ainda tinham muito à treinar, muitas jogadas à aprender e muitos gols à marcar, e aquilo era uma coisa que os sete sabiam.

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