Único



Capítulo Único


- Allie...

Ela nem ouviu a porta do quarto ser aberta pelo esposo. A janela, semi-aberta, permitia que os primeiros raios solares, ainda discretos, transpusessem a vidraça e se deitassem languidamente sobre o berço do bebê, enquanto esse tinha o sono velado pelos olhos atentos de sua mãe. Embora um tanto longe, com os braços cruzados, seu rosto irradiava amor e carinho.

Descansando com seus minúsculos olhinhos fechados, a boquinha rosada e brilhando mexendo-se de tempos em tempos, lá estava o pequeno fruto do amor entre os renomados aurores. Embrulhado cuidadosamente por um cobertor flanelado de ursinhos que também dormiam o sono dos inocentes, ele estava estrategicamente colocado logo abaixo de um grande e cinzento elefante de pelúcia. Suas orelhas poderiam ser consideradas vantajosas e por essa mesma razão davam um aspecto protetor e bastante infantil ao brinquedo.

Enfeitiçado para alertar quando a criança acordasse, funcionava como uma babá-eletrônica dos trouxas. Seus olhos eram castanhos e de vidro, grandes o suficiente para captar qualquer movimento e estavam sempre voltados para o pequenino. A tromba felpuda servia para distraí-lo, além de emitir os sons característicos se necessários fosse. Assim repousava o pequeno junto ao seu guardião cinzento.

Frank se aproximou da esposa e posicionou-se atrás dela.
Silencioso, abraçou-a pela cintura, envolvendo-a com um gesto terno e delicadamente depositou um beijo em seu pescoço desnudo.

- Acho que devemos trocar o berço de lugar – ela comentou com uma voz quase inaudível, para que não corresse o risco de acordar o anjinho.

- Qual seria o motivo? – perguntou o marido, depositando-lhe um novo beijo, agora próximo ao lóbulo de uma das orelhas dela.

- O sol Frankie. O sol daqui algumas horas pode pegar direto no nenê... vê? – apontou para a janela, de uma forma quase acusadora.

- E que mal teria nisso? – ele franziu as sobrancelhas, falando com os lábios colados ao pescoço dela – Estamos criando um bebê ou um bibelô de cristal? Só falta me dizer que depois disso vai querer mudar a cor do quarto para rosa... – seu tom era brincalhão e sugerir que a criança seria afeminada por conta disso, era uma forma bem humorada de criticar a idéia dela.

Alice meneou a cabeça e resmungou.

- Você não entende...

Nesse exato momento, o bebê se mexeu dentro do berço, emitiu um som e uma de suas mãozinhas livrou-se do cobertor. Em reação, o elefante sempre atento quedou-se para o lado como se vivo estivesse e sua tromba enrolou em torno da minúscula mãozinha.

Os pais não contiveram o sorriso.

- Viu? Neville pode não nos ter por perto o tempo todo, mas, se nossas intenções estiverem com ele, mesmo que não saibamos o que se passa em sua vida, o estaremos protegendo... Allie...

A auror sorriu. Sorriu e deu-se por vencida. Reconhecia que o esposo tinha razão. Virou-se para ele e depositou um beijo doce em seus lábios.
Em resposta, Frank alisou seu rosto e enquanto correspondia ao beijo, suas mãos subiram pelas costas da esposa. Delicadas, sem pressionar ou apalpar, apenas envolvendo-a ternamente.

- Tenho medo Frankie... muito medo... A profecia, você sabe...

- Eu sei meu amor. Apenas confie em mim quando digo que nosso filho não corre riscos. Vamos mandar aquele maldito para Azkaban antes que ele possa tocar num fio de cabelo de Neville, ou de Harry.

- Sim... eu também temo pelos Potter. É algo aqui... em meu coração...


Ele leva dois dedos até seus lábios e continua tentando contê-la.

- Shhh! Allie... Aquieta seu coração. O destino não é mutável, nós sabemos disso e nos cabe tentar transformá-lo. Acaso esqueceu tudo que Dumbledore nos disse?

- Não. Eu não esqueci. Só tenho medo de perder você e o bebê. De... separarmos-nos... De não... poder vê-lo crescer, fazer sua primeira magia...


Frankie abaixou a cabeça, desencorajado por um momento. Depois prosseguiu.

- Se tudo que tenho hoje, eu perdesse por qualquer motivo, não seria por falta de luta. E me refiro especialmente a vocês dois que são minha família. Cada segundo teria valido a pena... e nada eu mudaria para evitar o sofrimento Allie. Sofrer por aqueles que amo, pelas pessoas boas e tudo que respeito é uma honra. E a mulher que escolhi para ser minha esposa pensava como eu. Por acaso – seu rosto iluminou-se, um novo sorriso moldou seu rosto bonachão e brincando com Alice se desvencilhou dela e prosseguiu – você não a teria visto por aí, teria?

Allie lhe deu um tapinha no peito e fingiu-se de ofendida, entrando na brincadeira. Por fim, abraçou-o e sussurrou em seu ouvido:

- Ela está aqui. Não a culpe se ama tanto vocês dois a ponto de se acovardar... diante do perigo – Alice segurou o queixo de Frank e deu-lhe um selinho.

- É diante do perigo que mostramos o quanto podemos ser corajosos. E eu sei que no fundo ela não mudou. Está apenas assustada e isso é normal. Eu a entendo e não a culpo, a amo demais pra perder tempo com coisas tolas assim. Ela é uma excelente auror e tem os olhos mais belos que eu já vi...

Sem mais querer ‘atrapalhar’ o sono do pequeno herdeiro, o casal se retirou. Com passadas leves e silenciosas, eles deixaram o quarto. Encostaram a porta e desceram para o andar inferior. Foi realmente uma pena eles não terem ficado um pouco mais no quarto. Se olhassem para o berço uma vez mais teriam visto um pequeno sorriso - idêntico ao que costumava nascer nos lábios de Frank - crescer na boquinha inocente e por lá permanecer durante algum tempo, como se concordasse com tudo o que o pai dissera.

Esse poderia ter sido o primeiro momento em quê Neville Longbottom sentiu orgulho dos pais. O primeiro de muitos... como haveria de ser...





NA

Para Caw, com todo meu amor e carinho.

21/03 - 04:17 pm.

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