Único
Por companhia lhe seria suficiente apenas aquele prato com pudim de chocolate. Foi o que conseguiu resgatar da mesa durante o almoço e levar consigo para os terrenos da escola. Não conseguira comer nada e o estômago teimoso ainda revirava mesmo depois de ter conseguido com a Madame Pomfrey uma dose de poção anti-enjôo.
O frasco doado jazia reluzente sobre o gramado que cobria as margens do grande lago. Seu líquido branco-esverdeado tinha um aspecto que variava entre cintilante e esmaltado e o gosto de pepino-do-limo não lhe agradara nem um pouco. Largara-o após suas papilas sentirem o sabor bolorento e amargo do viscoso fluido.
Porquê diabos poções nunca lhe agradavam? Fosse para produzi-las... fosse para tentar aliviar qualquer doença que tivesse? Era... decepcionante. Meneando a cabeça e abrindo a pipeta com a medicação, sorriu amarelo e ouviu ecoar a voz desdenhosa dentro de sua mente:
“Simplesmente porque criaturas inferiores e acéfalas como você, senhor Longbottom, não tem o menor trato ou reconhecimento pela arte que é produzir e utilizar corretamente os elixires mágicos que são as poções” ... “Não! Não ouse sacudir o frasco, seu pequeno trasgo!”
Com um movimento brusco, como se pudesse eliminar qualquer vestígio daquela última repreenda, ele entornou a medicação e sentado como estava, resistiu bravamente ao desejo de regurgitar tudo aquilo sobre os próprios pés. Terrível. Poderia jurar que na receita, deveriam colocar pedaços de meias velhas.
- Olá Neville – com um sorriso discreto e seus badulaques balançantes pendurados ao corpo, se aproximava a garota Luna. O grifinório não pode deixar de notar que seu novo colar era feito com feijõezinhos de todos os sabores. Definitivamente hilário. Sorte ele não ser Rony ou um dos gêmeos. Aquilo poderia render uma piadinha tipicamente desagradável.
- Luna – falou terminando de limpar o canto da boca com a manga do uniforme – tudo bem?
- Tudo – após largar alguns livros que vinha segurando sentou-se sobre eles e a longa capa amoldou-se ao redor dela como se fosse um par de asas negras. Visão estranha. Neville poderia jurar que era como se estivesse chocando uma ninhada inteira de filhotes. Seus cabelos pareciam mais claros do quê nunca e ao redor dos olhos ele afirmaria ter visto alguma maquiagem.
- Ahn... já almoçou? – ele disse calmamente guardando a pipeta com algum vestígio da poção no bolso da calça. Embora fossem amigos, desde a fundação da Armada Dumbledore, não conversavam tão freqüentemente. Casas diferentes e a pilha de estudos e trabalhos para fazer dificultavam isso.
- Sim, eu já almocei – disse ela do alto de trono – Ah! Olhe só... um pudim! Eu adoro pudins!
Neville a olhou com incontida incredulidade. Seria difícil perceber que a sobremesa era dele? Já que estava ao lado do seu material. Não havia comido nada e seu estômago parecia querer expulsar algo que realmente não tinha para tal feito.
- Ah sim. Você quer um pouco? – educado, empurrou o prato cuidadosamente sobre as gramíneas.
- Hum... é seu? – os olhos dela cintilaram.
- Sim... eu trouxe. Não consegui almoçar direito, ficou para depois. Mas... se quiser...
- Não... não. Pensei que fosse uma oferenda. E se os nargoles não me vissem comendo, não teria problema algum... – com um certo esforço, ela se mantém equilibrada na pilha que parece começar a se desfazer – Algum problema, Neville?
- Problema? Não. Só acho que nunca vi um nargole, então não poderia fazer uma... errr... oferenda, entende? – ligeiramente envergonhado, sentiu as bochechas generosas esquentarem. Estava arrependido por seu pensamento anterior. Luna poderia ser excêntrica mas ele... ele tinha sido mesquinho.
- Bem, não são todos os bruxos que podem vê-los. E aqueles que os vêem precisam de muita, mas muita sorte mesmo, para não sofrerem as conseqüências. O canto das fêmeas só nos faz dormir quando acordamos, esquecemos que os vimos. O dos machos é tão perigoso e estridente que pode até matar. Eu, particularmente, acho que só vi fêmeas até hoje...
O sol vespertino banhava os dois e alguns alunos se já moviam rapidamente em direção as salas de aulas. Entretanto, a dupla parecia indiferente ao fato. A corvinal continuava falando sobre as tais criaturas e como sempre encerrava o assunto dizendo que tudo estava no Pasquim, caso ele quisesse conferir.
- Sinto falta do Harry, do Rony e da Hermione. Sinto falta do que já fizemos juntos. Eu me sentia realmente era útil, mas agora. Nenhum sinal deles... é como se eu fosse o garoto tentando não mijar nas calças ao ver o Snape-Papão – ele admitiu enquanto fitava o pudim.
- Eu também sinto. Meu pai disse que eles deveriam voltar para a escola e mostrar que embora Dumbledore tenha partido, a Ordem da Fênix ainda está sendo representada aqui.
Aos poucos foram ficando sozinhos e sequer deram conta disso. Sorte deles o zelador Filch estar ocupado com alguns quintanistas que resolveram armar uma festinha surpresa com o Pirraça, no salão principal.
- A Ordem de Fênix estará viva. Acho que não importa tanto se estamos na escola ou não. O que conta é o quê fazemos para enfrentar Você-Sabe-Quem e seus aliados – Neville completou e foi inevitável pensar naquela desgraçada comensal da morte. Baixou a fronte.
Os olhos de Luna mais uma vez cintilaram, em concordância. Depois se fixaram em um ponto invisível, e talvez tão despercebido por Neville, que aparentemente somente os Lovegood seriam capazes de enxergar.
- Apenas – a garota recomeçou com sua voz lenta e pausada, macia e levemente pastosa sem ainda desviar o olhar – espero que eles não venham para Hogwarts. Com Dumbledore fora do caminho acho... – ela finalmente desvia o olhar e torna então a encará-lo – não seria algo impossível.
O simples fato de pensar nessa possibilidade fez o coração de Neville bater descompassado. Isso representava estar próximo daquela mulher maldita uma vez mais e se sentia ligeiramente favorecido. Capaz de enfrentá-la, não de igual para igual, mas encará-la e vingar seus pais. Neville poderia ouvir os gritos histéricos dela e isso o fazia praticamente salivar.
- Pois que venham! – exaltado, se levantou com um supetão e quase pisou no prato com a sobremesa cremosa – estaremos aqui – pausou e sentindo a boca seca, fosse por conta da emoção ou da poção que tomara pouco antes, finalizou – não estaremos?
A loirinha apenas assentiu com a cabeça, admirando-se daquele romper de fúria e bravura. Se levantou também e pareceu se lembrar que a vida era mais do quê sentar-se a beira do lago e conversar com Longbottom.
- Bem... eu... devo ir, agora.
- É. Eu também já deveria estar lá dentro. Bom papo Luna.
Para a surpresa do rapaz, ela se aproximou, pegou prato e colocou-o em suas mãos. Ficou na ponta dos pés em seguida e alcançou com dificuldade o rosto do grifinório. Seus lábios rosados e contraídos tocaram a pele do garoto onde já nasciam pêlos que formariam uma rala barba, acaso não os aparasse.
Imóvel, Neville permaneceu. Não ousou virar o rosto e embora o desejo de se afastar fosse primal, aguardou para ver o quê aconteceria. Foi uma sensação totalmente nova. Algo pelo qual realmente não esperava, não enquanto estivesse acordado. E jamais com a ‘Di-Lua Lovegood’. Impensado. Angustiante. Ruborizante. Delirante. Apaixonante?
Após acariciar seu rosto com o singelo beijo, Luna se afastou lentamente. Deixou os calcanhares tocarem o solo novamente, fitou seus olhos e falou:
- Não deixe de comer. Não se culpe nem se cobre demais – Ela acaricia as costas das mãos dele, mantendo-as entre as suas - Já faz muito tempo que eles estão lá, Neville. 18 anos, não é? – Soltou-o então e recolheu seus livros, dando mostras de quê o momento havia acabado - Sei que andou chorando. Seus olhos, eles me dizem isso. Bem... chorar... é... bom mas, passa a ser ruim quando deixamos de fazer algo melhor para perder nosso tempo assim... tristes. Sinto muito que tenha passado por tudo isso e espero ser ainda sua amiga, apesar de ter sido tão... intrometida... Bom... papo... Neville...
Dando uma volta sobre si mesma, finalmente a garota de cabelos claríssimos se afastou. Caminhava devagar, como quem estivesse em Hogwarts para passeio. Não, ela não mais caminhava. Para Neville, agora ela desfilava. Não! Na realidade ela flutuava, como uma veela. Uma veela que ninguém jamais vira antes. Uma rara mistura de nargole e veela, sem sombra de dúvidas.
Quando Longbottom se abaixou, também para recolher suas coisas, percebeu o que acontecera. A razão dela perguntar sobre ele estar com algum problema. E quão delicada havia sido? Tão gentil como sua avó – quando orgulhosa dele -, como Gina ou Hermione, suas poucas amigas. Como fora tolo. Como fora cego!
Pendendo de um de seus livros de herbologia, havia um recorte de jornal datado exatamente a 18 anos atrás. Ele falava sobre o motivo do mal estar e tentativa de isolamento de Neville. Era uma reportagem de capa dO Profeta Diário e relatava que o ‘casal de aurores havia encarado a face da Morte, resistira bravamente e se encontrava hospitalizado por tempo indeterminado no St. Mungus.’
A foto que se mexia no papel bastante gasto e prestes a se desfazer apresentava um casal habitualmente sorridente. Frank estava abraçado com Alice e ela segurava um fofo e irrequieto bebê de feições rosadas.
Uma lágrima brotou forte. Anuviou sua visão e ardeu como tantas vezes antes havia feito contudo, ao contrário do quê ele mesmo esperava, dessa vez... ele a venceu. Não permitiu que rolasse por seu rosto, não depois daquele beijo. Ele lhe dera ... forças.
Neville ergueu os olhos ainda marejados e pode ver ao longe a figura daquela que acabara de adquirir um novo sentido em sua vida. Sim, agora ele sabia que já tinha visto uma nargole. Sua voz era doce e seria capaz de lhe ninar. Agora o patinho-feio da grifinória sabia que não a esqueceria. Jamais.
Nota
O quê dizer?
Essa é uma idéia antiga. Algo que me ocorreu em um período em que estive fora da FeB. Ainda investirei algum tempo nesses dois. Nada melhor do quê começar... pelo... errr... início? õ.o
Deixando as brincadeiras idiotas de lado...
Cito 3 razões para apoiar este shipper, e remar contra a maré que é a declaração da Tia Jô. [Para os que não sabem, na saga ele acaba se casando com Ana Abbott].
1) Pela pessoa per se. Ana teve atitudes falhas com relação a vários fatores no decorrer dos livros. Não sabe quais? Confira no Dicionário da Madame Pince.
2) *Tentando imaginar a química existente entre aqueles que sinceramente não me lembro de ter visto juntos* Dã... não consigo. Não julgo/me prendo tanto por isso. Afinal, nós, ficwriters arrumamos química para tudo. E a autora com certeza deve ter seus motivos para tal escolha. De qualquer forma... não imagino... não imagino... não imagino! E mesmo que imaginasse... não gosto. *Batendo o martelo*
3) Inovar. Fechem seus olhos, imaginem este casal vivendo um flerte, depois uma paixão, ou partam logo para o amor. O que importa é... inovem! Dêem uma chance ao ship. Comentários de quê eles são um casal de lesmas ou bruxos debilóides serão punidos com uma das 3 Proibidas. Advinhem qual?
;D
É isso. Aos que gostaram... : "Meu Deus! Alguém gostou, mesmo?"
*Sofre uma parada cardíaca antes de encerrar o discurso*
Comentários (1)
Fic perfeita, parece a tia Jô escrevendo, é uma pena que esse shipper não tenha se realizado, é umas das coisa que maus me decpicionam, sua fic é muito empolgante e eu torci por esse casal desde que li sobre eles, também estou escrevendo esse shipper, e sua fic me inspirou muito, amei de mais, espero mais um capítulo, e esses dois são lindo juntos, que se danem a Anna Abott e o Scamader. hahahaha ' Grande beijo, M.M
2011-04-21