Capítulo Um
Capitulo Um
- Ginny? Ginny querida?
A porta da biblioteca se abriu, revelando a imagem de uma mulher baixa e robusta, com um elegante vestido azul claro de babadinhos nas mangas. Seu sorriso era simpático, mas quem a conhecia muito bem, sabia da veia autoritária que a mulher tinha para com os filhos.
Ela encarava uma jovem sentada solitária em uma escrivaninha com uma pilha de livros de dois lados da mesma. O sol batia pelas janelas, revelando um dia maravilhoso, e iluminava a figura da jovem.
Ginny ergueu os olhos e estudou a mãe por um breve momento.
- Aconteceu alguma coisa, mamãe?
A mãe agitou uma das mãos, num gesto displicente. Depois, sorriu afetuosa para a filha.
- Não aconteceu nada, minha filha. – ela observou a pilha de livros ao lado da moça. – Querida, o que está fazendo?
Molly Weasley não percebeu Ginny esconder um livro em especial na gaveta.
- O que a senhora vive dizendo para que eu faça, mamãe. – Ginny respondeu calmamente. – Estou estudando arte.
A matriarca abriu um largo sorriso enquanto a filha parecia arrumar o coque de seu cabelo ruivo. Molly tinha os olhos brilhantes e orgulhosos para a filha.
- Oh, Ginny querida! Finalmente você está aceitando sua posição, então? Finalmente você deixou de contrariar nossas regras? – A mais velha suspirou, parecendo sonhadora. – Você será uma esposa incrível... Inteligente, submissa, doce... Oh! – Ela não percebeu Ginny girar os olhos. – Harry vai achar-lhe tão culta!
Agora a jovem deixou bem claro sua exasperação para com a mãe.
- Não irei me casar com Harry, mamãe – Ginny retrucou. Estava claramente exasperada. – E, vamos ser sinceras uma para com a outra... É provável também que Harry sequer esteja em nosso meio, ainda...
- Ginevra! – A mulher a repreendeu, como se Ginny houvesse dito um palavrão. – Já basta! Não quero mais ouvir um comentário seu sobre não querer se casar.
Ginny levantou-se. Estava educadamente indignada.
- Tenho o direito de reclamar! – protestou. – Estou sendo obrigada a ficar trancada dentro desta casa desde os dezesseis anos, com direito de visita apenas do frei, para que eu possa me confessar. E tudo isso – ela ressaltou, erguendo um dedo. – Por causa deste casamento idiota.
- Basta! – cortou-a Molly. Ginny calou-se imediatamente. – Você tem que obedecer. Isso foi um dos pedidos do acordo para o casamento entre você e o rapaz. Não existe direito para reclamar. Você apenas tem que cumprir a sua parte, e aceitar as suas obrigações para como futura esposa.
Ginny tornou a se sentar e cruzou os braços. Suas maças do rosto estavam levemente rosadas e o semblante fechado.
- O quê! Eu tenho que ser a doce esposa para um homem – que eu nem ao menos sei se está vivo, ainda – que, como todos os soldados que vão para a guerra, ficam frios e nojentos? Eu sou obrigada a ter que passar por esse sofrimento por causa de um casamento? Um casamento na qual eu não amo o homem com quem irei dividir a minha cama todas as noites? – Ginny dissera aquilo tudo muito rápido, para que a mãe não a interrompesse até que terminasse.
Molly parecia desgostosa com a filha, mas depois sua expressão suavizou-se quando Ginny deixou os ombros caírem.
- Odeio ter de aceitar ser o que não sou. – ela olhou para os livros. – Todas estas regras de etiqueta, submissão ao esposo... – ela soltou um muxoxo. – Eu nem ao menos gosto de história da arte!
Molly a encarou com falsa solidariedade.
- Temos de aceitar o nosso papel na sociedade, minha querida.
Ginny balançou a cabeça.
- Você realmente acredita nisto, mamãe? Que o papel da mulher em nossa sociedade é a completa submissão – mesmo que sem amor – e gerar descendentes?
- Querida...
- Eu não amo Harry, mamãe. – ela foi enfática. – Ele pode ser um homem corajoso por estar nesta guerra desde os dezoito, pode ser o bom partido que vocês tanto dizem, mas para mim não importa. Não o amo. – repetiu. – E você sabe que é um sentimento recíproco.
A mãe suspirou e caminhou até o lado da filha, colocando a mão sobre o ombro da jovem.
- Querida, casamento não é sinônimo de amor, e você sabe disto. – a mãe retirou um leque e começou a se abanar. – É uma troca de interesses. Nós e a família Potter estamos fazendo isso para aumentar nosso território, e para ajudar nosso povo na guerra. Você quer que percamos esta guerra? Que nosso rei perca esta guerra?
Ginny sacudiu a cabeça; parecia silenciosamente inconformada.
- Suas amigas aceitaram seu destino sem fazer todo este drama que estás fazendo. – replicou Molly Weasley. – Veja Luna Lovegood, por exemplo: Casou-se logo que completou quinze anos, porque fora nesta idade que seu esposo completaria a maioridade.
- E agora está viúva. – Ginny interpôs debochada. – Por causa da guerra.
- Mas aceitou sua posição. – a mãe pareceu enfurecida. – E você tem que começar a aceitar a sua. Não quero mais reclamações, Ginevra Weasley – Molly ergueu uma mão quando a filha pareceu reclamar. – Você vai se casar e submeter-se às condições de boa esposa. E vai continuar trancada aqui até que Harry Potter volte.
Antes que Ginny pudesse dizer mais alguma coisa, a mãe saiu da biblioteca, avisando-a que antes do por do sol, ela ainda precisaria ter sua aula de piano.
Ginny ficou encarando o lugar que sua mãe estivera à poucos minutos, antes de suspirar amargurada e pegar o livro que havia escondido. Era sobre médicos, e havia alguns comentários deles sobre a anatomia humana.
Sem se importar com as regras de etiqueta – ela nunca se importava quando sua mãe não estava presente. -, Ginny apoiou o rosto em uma das mãos e, com a outra, começou a folhear o livro.
Sim, ela pensou. Era isso que ela amaria fazer. Gostaria de estar como uma enfermeira e, de preferência, ajudando naquela guerra com os pobres coitados.
Quando criança, ela chegara a realmente amar a vida que tinha. Ora, e por que não? Ela era o que toda menina na idade dela desejava ser: uma menina nobre e rica.
Mas Ginny nunca refletira na infância o que isso significava realmente, até que completasse doze anos – e recebesse a notificação de que teria de se casar. Até antes disso, ela refletiu agora, ela sempre fora a garotinha mimada e que idolatrava sua vida.
A garotinha mimada morrera, ela pensou. Ginny não era mais uma garotinha mimada; deixara de ser desde os doze anos. Na verdade, surpreendia-se de como podia ser tão rebelde.
Rebelde, na opinião de sua mãe e de toda a nobreza, era a mulher ser dotada de opinião e não ter medo de expô-la. E também ser bastante ousada e atrevida.
Mas era a única coisa que ela tinha no presente momento. E não iria deixar que tirassem isso dela.
Folheou mais uma página, e se perguntou seriamente se não poderia ter nascido camponesa; ao menos, poderia ajudar na guerra como enfermeira, teria esta opção.
E também teria a opção de se casar por amor. Pelo menos, era isso que pensava.
A idéia de estar trancada dentro da própria casa por dois anos sem poder fazer nada, sem sair em publico nem para apreciar os jardins lhe causava náuseas. E uma inquietação sem limites.
A porta mais uma vez se abriu, fazendo Ginny ter um sobressalto e arrumar-se na cadeira, com postura. Fechou o livro e jogou-o dentro da gaveta.
Mas desta vez, era apenas Dorothy.
- Senhorita Ginny, trouxe seu chá. – Ginny sorriu para sua antiga ama.
- Sirva-o e o aprecie comigo, Dorothy.
A ama a obedeceu em silêncio e sentou-se frente à jovem. Dorothy já não era tão mais jovem quando antes; já existiam marcas ao redor de seus olhos e ela estava um tanto mais robusta. Mas uma coisa chamou a atenção da jovem: Dorothy tinha as maçãs do rosto vermelhas.
Ginny arqueou uma sobrancelha, antes de entender o que se passava. Conhecia a ama muito bem, assim como a própria a conhecia também. Reprimiu um riso, para não chamar a atenção da mãe.
- Por que está tão vermelha, Dorothy? – Ginny perguntou, mas ela mesma já sabia a resposta. Dorothy negou. Ginny arqueou uma sobrancelha. – Estava escutando a conversa entre minha mãe e eu, não foi?
Ela reprimiu mais um riso quando a ama assentiu envergonhada.
- Oh, eu sabia! Você não consegue mais esconder tão bem suas emoções quando antes, ama.
A ama sacudiu a cabeça.
- Juro que não sei para quem você puxou essa ousadia toda, Ginny. – ela observou a moça bebericar o chá – Se você continuar assim, logo madame Weasley não vai sequer permitir que a senhorita ande pela casa.
Ginny fechou o semblante.
- Isso seria apenas mais um pretexto para que eu tentasse realizar o que quero fazer. – A ama arregalou os olhos.
- Menina, você tem de parar com isso. – havia um sorriso matreiro nos lábios da ruiva. – Se sua mãe escutar você comentar uma barbaridade dessas...
- Ela vai me trancar no quarto, sei. – Ginny bufou. – Eles podem não respeitar minhas opiniões e desejos, mas ninguém pode mudar quem eu sou, Dorothy.
Dorothy suspirou. Sentia pena da moça.
Ginny sempre fora cercada pelo luxo, e quando criança todas as meninas camponesas sonhavam em ser como ela; mas Ginny era escrava da própria nobreza.
Ela estava obrigada desde os dezesseis anos a não sair da própria casa por causa do acordo entre seu pai e o conde Potter, de que ela teria que estar completamente inocente e ingênua para quando seu noivo retornasse da guerra; Eles acreditavam que se ela entrasse em contato com os camponeses, iria adquirir outros conceitos e se rebelar, ou se por ventura se apaixonasse por outro rapaz, então seria o fim.
Mas Dorothy duvidava que seus pais notassem que Ginny havia se rebelado mais daquela forma. Ela fingia estudar arte (como toda moça rica deveria fazer, para estudar seus pontos intuitivos e sensíveis), mas, na verdade ela lia contratos e cartas de seu pai sobre a guerra, e, principalmente, cartas médicas enviadas.
Ginny ainda entraria por sérios apuros se continuasse tão ousada como naquele momento, Dorothy pensou. Mas não podia deixar de sentir orgulho de sua menina.
- Mamãe discutiu comigo mais uma vez a questão de meu casamento. – Ginny comentou enquanto colocava a xícara de porcelana sobre a bandeja de prata.
- Sim, eu escutei a senhorita discutindo com ela.
- Ela insiste que eu me case com ele. – ela girou os olhos. – E, vamos ser sinceras, eu nem ao menos sei se ele está vivo. Potter pode estar muito bem a sete palmos de terra, coberto de vermes e minha mãe ainda acha que ele vai voltar e casar-se comigo, esperando que ela fique coberta com mais moedas de ouro e união de burgos.
- Ginny, sua mãe diz estar preocupada com esta guerra, por isto vem à união de você com o rapaz.
A ruiva riu debochada.
- Até parece. – resmungou. – Ela quer segurança não pelo rei, mas sim sua própria, assim como papai. Mas isto não vem ao caso – ela agitou uma das mãos displicentemente e inclinou-se na escrivaninha e encarou a ama. – Não irei me casar, de qualquer maneira, se meus planos correrem certos.
A ama pareceu desalentada.
- Oh, menina, você realmente está pensando em fazer isto?
O olhar determinado da moça fez com que a ama soltasse um muxoxo.
- Estou. Não vou ficar aqui presa nem mais um minuto sequer. Não, Dorothy - ela repreendeu a mulher quando percebeu que ela iria tentar convence-la de não fazer o que estava planejando fazer há meses.
Dorothy suspirou.
- Você vai fazer seus pais ficarem furiosos. – ela avisou. – E vai colocá-los em uma grande encrenca – suspirou. – E vai abalar a amizade deles com os Potter.
Ela pareceu pensativa.
- Meu noivo teve a opção de decidir casar-se antes ou depois desta guerra infundada. – sua voz voltou ao mesmo tom enérgico e decidido. – E, graças a sua opção, estou obrigada a ficar trancada aqui por dois anos. Quer dizer que ele tem o direito de escolher e eu não?
- Ginny, ele -.
- É homem, eu sei. – ela bufou. – Outra coisa que eu não concordo. Não, não quero saber. Vou colocar meu plano em prática.
Dorothy suspirou. Havia lágrimas em seus olhos.
- Não consigo suportar a idéia de que vai embora, e vai me abandonar aqui. – seus olhos brilharam. – Vi você crescer, e agora você vai me deixar, assim como Ronald e Carlinhos fizeram.
Ginny sentiu pena dela. Solidária, ela levantou-se e abraçou a ama.
- Não vamos ficar eternamente sem nos ver, minha ama querida. Você sabe, eu voltarei depois que esta guerra acabar. E estaremos juntas novamente. Mas não posso mais ficar aqui dentro presa, sem fazer nada. E não posso mais aceitar as ordens que meus pais colocam sobre mim.
Dorothy suspirou.
- Você está agindo sem pensar, Ginny.
A ruiva a interrompeu.
- Você trouxe o papel, Dorothy?
A ama assentiu, pesarosa.
- Sim. O bar fica perto do porto, e é lá onde as enfermeiras estão se alistando. – ela entregou o papel a Ginny. – As próximas enfermeiras seguirão para os campos amanhã, à noite.
Pela primeira vez, Ginny abriu um largo sorriso.
- Então eu estarei lá amanhã à noite.
Continua...
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!