Parte II
Oito feridas
Parte II
II - As rosas tinham espinhos. Isso é fato até mesmo para um homem meio insano, um homem como Severus Snape. Mas as rosas não eram só espinhos. Elas representavam fases:
I – À primeira vista, eram muito belas, e seu aroma agradável se espalhava pelo ambiente, penetrando sutilmente nos pensamentos, e tudo tem mais vida, mais cor, como se a mais sofrida existência fosse subitamente iluminada e a música a regesse tranqüila. A fase da esperança e da luz.
II- Com o tempo as pétalas, que certo tempo atrás ainda eram vivas, começavam a cair. O mundinho privado delas ainda não caíra, mas estava bem próximo disso. A fase da turbulência.
III- Depois, as pequenas e murchas pétalas sobreviventes iniciavam um tempo novo, o de seus últimos dias. A fase da desistência.
IV – A rosa morria, então. A vida das pétalas doces se esvaia completamente. Restavam só o caule insípido, as únicas lembranças, e os espinhos. Ah, os espinhos. E a dor. Essa fase era a derradeira, uma vez que as flores não renasciam. Poderia muito bem ser denominada pelos poetas mais sábios e mal-amados como “o resto: lembranças pungentes e dolorosas”. Quanta mentira.
Ele não estava em fase alguma. Até porque não havia motivo em dramatizar sua história ao máximo, pintá-lo como um heroizinho trágico que perdeu tudo o que mais almejava. Tudo era simples, muito simples. Nada além de uma dorzinha incômoda, um furinho minúsculo em seu orgulho, esculpido a ferro e fogo, só mais uma ferida, uma cicatriz insignificante, apenas mais uma pétala caída.
Apenas uma pétala caída.
Mais uma.
O nome Lily Evans fora muito bem escolhido. Era primavera, e ela estava exultante pelo simples e costumeiro fato da estação ter finalmente chegado. O aroma das flores parecia deixá-la ainda mais bonita, leve e feliz. Para o pequeno Severus, isso era inacreditável. Aliás, seria para sempre.
Naquela tarde quente em particular, a menina estava ainda mais alegre. Exigira que o amigo lhe acompanhasse num passeio pelo jardinzinho pouco bem cuidado da cidade. O garoto não tivera escolha, uma vez que o ar primaveril fazia mal para a relação já conturbada dos pais tanto quanto fazia bem para a ruivinha.
- Olha lá, Sev! – dissera ela, sua voz fininha transpirando felicidade, uma mão alva e pequena apontando para um campinho de flores coloridas. Eram tulipas, rosas e muitas outras.
Lily correu para lá, pegando a mão de Severus entre as sua. Ela não notou o leve rubor da face do menino, e continuou correndo para o campinho como se isso lhe mantesse viva.
Ao chegar ao local, ela observou o amigo enquanto este arrancava uma tulipa muito bela do solo. Ela abriu a boca, indignada, e ameaçou lhe dizer para deixar a flor ali, mas o amigo a colocou rapidamente atrás de sua orelha, as pétalas contrastando com as madeixas ruivas. A menina pareceu estar estupefata com o gesto, e então sorriu, seus lábios rosados contraídos como se lhe agradecessem.
Posicionou lentamente os joelhos na terra, e tirou uma rosa do campinho, suas mãos segurando o caule firmemente, e então, quanto tornou a se levantar, entregou-a a Severus. O garoto fitou-a por um momento, dois, talvez mais. Pegou a flor dos dedos dela, finalmente, mas não coma mesma delicadeza da menina.
Um único espinhou roçou em sua palma, e um filete de sangue escorreu por toda ela. Severus não esboçou reação, ao contrário de Lily. Ela tomou novamente a mão machucada entre as suas, e passou seus dedos longos pelo ferimento, curando-o com mágica. Observaram-se por um tempo, nenhum dos dois se atrevendo a quebrar o silêncio somente interrompido pelo canto distante dos pássaros, a luz forte do Sol batendo em seus olhos.
- Viu? – perguntou Severus, sua voz soprando muito suavemente. – Você é realmente uma bruxa, e das talentosas.
Ela sorriu e agradeceu. Então lhe plantou um beijo na bochecha, as suas próprias rubras, e seus olhos muito verdes, vivos como a grama que se estendia por todo o jardim, cintilavam tal qual diamantes.
O nome da ferida: Primeiro contato.
Isso tudo era deprimente, e o pior é que tinha plena consciência disso.
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(N/A): E aí, gostaram?
Hoje estou sem tempo para responder aos comentários, mas agradeço de verdade aos que leram e comentaram: Mary Lupin, Fer e Likass (do FF) e Rebeca_Potter (da Floreios). Muito obrigada!
Até a próxima
Lois Peverell
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