O Início do Fim
CAPÍTULO QUARENTA E UM – O Início do Fim
Harry sentiu a porta bater às suas costas e ao olhar para trás leu um quadrinho de acrílico verde com letras brancas, Enfermaria Privada; Harry voltou sua atenção para o corredor do Hospital mágico e pôde notar que ele estava realmente movimentado. Havia mais gente ali do que da última vez que visitara o local, um ano e meio atrás. Havia bruxos com cortes no rosto, o nariz sangrando ou então com horríveis expressões de dor. Harry não os conhecia, mas da forma como as vestes estavam úmidas, os cabelos despenteados e as varinhas ainda estavam em punho garantiu a Harry a certeza que aqueles haviam participado da primeira Grande Batalha da Segunda Guerra.
Harry olhou para cima a procura de plaquetas de instrução, mas lembrou-se que não sabia exatamente onde estava o diretor; ele olhou atônito para os lados e ficou confuso. Por fim, sentiu uma pesada mão prender-lhe sobre o ombro direito: era o curandeiro de feições brutas. Ele sorriu para Harry e guiá-lo até um andar acima, onde havia uma porta branca com um vidro esbranquiçado e escrito em negro, Enfermaria de Tratamento Intensivo; Harry não gostou do que leu, mas seu sentimento só piorou ao entrar no quarto.
Encontrou Lupin e Arthur Weasley parados próximos a única cama de hospital que ali havia. Ao fundo da mesma, uma enorme janela retangular fazia com que os quentes raios de sol do julho londrino adentrassem no quarto cinza e moribundo. Harry viu que sob os lençóis brancos havia um corpo, uma pessoa, um mago, mais que isso, um amigo; era Alvo Dumbledore. Parecia estar dormindo, mas Harry notou que sua respiração era algo de difícil execução; seu tórax inchava-se bufando e reduzia-se ao normal com pequenos engasgos e tosses secas. As rugas, antes intrincadas e rígidas, sinônimos de sua força e poder magistral, estavam molemente relaxadas, deixando-o mais velho ainda.
Lupin, que por segundos manteve os olhos no diretor, notou a presença de Harry e veio caminhando na direção do garoto. O enfermeiro, que aguardava postado ao lado de Harry, foi dispensado por um gesto circular de Remo e Harry ficou feliz ao ver que lobisomem estava saudavelmente bem, mesmo após as horríveis cenas com Rabicho. Lupin apenas recebera uma grossa bandagem amarelada no punho esquerdo, mas mesmo assim, isso não o impediu de abraçar Harry com o respeito e saudades de um amigo.
– Ele está muito inquieto. – afirmou Lupin, a voz muito seca e tristonha, ainda observando Harry – Delirou durante a noite dizendo que você devia encontrar-lhe. Acho que você deve se aproximar – iniciou cauteloso –, tenha cuidado, os curandeiros pediram que nós não o incomodássemos.
Harry confirmou com a cabeça e deu largos passos até a cama. Arthur Weasley estava visivelmente abalado, talvez não por Dumbledore, mas pelo filho, ou pela mulher, Harry não saberia dizer, por enquanto, o que Arthur Weasley sentia, seus olhos castanhos, pelo menos, expressavam um sentimento comum àquela sala, a tristeza. Ele viu Harry e deu um sorriso torto e amarelo, as vestes velhas pareceram mais encardidas que nunca, e os cabelos vermelhos, antes sempre tão penteados, estavam com fios soltos em queda pela fronte.
Harry tocou a cama de ferro com a palma da mão e sentiu o ferro solidamente gelado, parecia algo mágico, o sol incidia sobre as grades da cama e mesmo assim elas estavam gélidas e limpas; não havia calor algum. Harry, que até então, havia caminhado admirando o chão de pedra, finalmente ergueu os olhos para enxergar o diretor. Harry levantou a face, abriu os olhos ... e logo quis fechá-los.
Dumbledore estava mais branco do que costumava ser, chegava a parecer cinza, havia profundas orelhas sob seus olhos, outrora tão paternais e as rugas estavam flácidas e cheias de relevos. As pálpebras cobriam os olhos azuis de forma fúnebre, porém havia cor em sua pálida tez, um vermelho que não era carmim, um róseo quase branco tingia-lhe a face. O único sinal vivo no diretor. Na mesa de cabeceira ao lado, repousava os óculos dourados de meia-lua que por anos acompanharam-no.
Quando Harry se aproximou mais um pouco e tocou, ainda calado, mudo de tudo, com os dedos na fronte do senhor, ele sentiu o corpo quente do diretor; mais quente do que jamais Harry sentia, parecia ferver dentro de si, e mesmo assim tão imóvel. Harry retirou os dedos e recolheu os braços, sentiu o pé doer muito e lembrou-se de seu duelo com o diretor dentro da estação de metrô... Ele fora magnífico, pensou Harry. Uma gota, uma única lágrima caiu nas vestes de Harry e a pesada lã das vestes absorveu a gotícula de tristeza.
– Harry. – disse uma voz com dificuldade. Harry virou-se para trás para atender a Lupin e, viu que o mesmo descansava sentado, em uma velha cadeira de carvalho com quatro pés finos, a boca visivelmente fechada. O Sr Weasley permanecia calado e tampouco parecia ter aquela grave voz. – Harry. – chamou mais uma vez. E Harry não acreditou, eram os lábios pálidos de Dumbledore. Os enormes olhos azuis abertos, olhavam felizes para Harry.
– Professor? – exclamou Arthur atônito, acordando de devaneios próprios e reminiscências paternais. – Lupin! Lupin! Venha cá checar! Dumbled... – O Weasley tentou continuar a falar, mas Dumbledore parecia impedi-lo, mesmo que estivesse sem a posse de sua varinha.
– Harry. – recomeçou Dumbledore; Harry ficou muito atento. – Obrigado... Só o que tenho a dizer... Seu feitiço me salvou de uma morte rápida...
– Você esta bem? – perguntou Harry nervoso.
– Só me escute, Harry. – pediu Dumbledore com seus olhos fitando Harry; sua quente mão apertando-lhe o punho – Confie, em McLaggan, não desista confie em sua mãe – Dumbledore tossiu –, você pode bloquear sua maior arma. – Arthur parecia visivelmente aborrecido, Lupin não o ouvira ou não queria vir. – Contate Aberforth e mantenha sua chave consigo. – Dumbledore rolou a cabeça pelo travesseiro, olhou ao redor da sala e disse – Essas paredes... Escutam! Seja cauteloso. – Dumbledore selou os olhos.
O restante do dia foi extremamente pesado, não havia predisposição às férias iminentes e mesmo o término das aulas não era motivo de alegria para ninguém. Dumbledore voltara a dormir, os curandeiros ficaram muito aborrecidos por não chegaram a tempo de falar com o paciente, mas conformaram-se após Lupin explicar que Harry estava em um momento muito importante de sua vida.
E seus amigos não estavam para conversas; Gina e Rony pareciam inconformados com a morte do irmão e Hermione parecia abalada pela violenta forma com acontecera, Mione sempre vira em Percy um exemplo. Não que Harry preferisse conversar no hospital, mas o silencio era sempre mais amargo que o riso falso e forçado. Neville e Luna haviam batalhado com ardor e conseguido êxito nos duelos, por sorte, nenhum dos seis havia se ferido este ano, estavam mais preparados.
Naquela tarde mesmo, Harry tirou as vestes do Hospital e pôs as próprias, teriam de regressar a Hogwarts, para poderem finalmente, saírem de férias. Tonks encontrou os seis jovens próximos ao Saguão do Hospital e para desânimo de Harry, Draco adentrava no mesmo com uma mulher de cabelos louros envolta em cobertores verdes, era sua mãe, derrotada, Narcisa Malfoy.
Harry virou para trás e viu que Draco o desprezava com os olhos. Harry voltou sua atenção para o círculo de amigos e para Tonks. É melhor que vocês usem as mesmas portas que usaram para sair. Tonks repetiu o movimento retangular que Dumbledore executara na noite anterior. Uma porta de carvalho foi conjurada no meio do Hospital, ninguém parecia importar-se, aquilo parecia completamente normal à todos. Tonks enfiou uma chave rosa e circular e a porta se escancarou. Do outro lado, um belo gramado verde ondulava com o vento. Estavam de volta a Hogwarts.
Harry notou que a escola parecia a mesma, e que todos os alunos e funcionários, alguns talvez, desconheciam veementemente os acontecimentos fora das grossas muralhas do colégio. Os alunos ainda se divertiam jogando xadrez a margem do lago, ou então enfeitiçando pedrinhas e lançando-as nos amigos, apenas por chateação. Nenhum... Ninguém parecia se importar com o que acontecia lá fora, Harry se aborreceu muito com isso.
Os seis deixaram os agradáveis jardins e cruzaram as portas duplas de carvalho para rumaram para seus respectivos dormitórios e organizaram as malas. Harry e os demais subiram até o sétimo andar, com exceção de Luna que tomou o rumou para o Salão Comunal Corvinal. O silêncio era matéria constante entre eles e nada parecia retirar-lhes a quetidão. Mesmo a simpatia histérica da mulher gorda não os animou e quando Neville ameaçava falar, alguém o encarava repressivo; o mesmo ocorria com Harry.
Eles encontraram um salão comunal extremamente vazio que garantiu privacidade aos recém chegados. Neville logo subiu ao dormitório para arrumar as malas e não esquecer de nada, absolutamente nada, garantiu ele. Gina e Hermione caíram nos braços de Harry e Rony e desabaram a chorar. Foi realmente triste; Gina soluçava no peito de Harry e Hermione fazia o mesmo com Rony que a abraçava confusamente incompreendido. Harry também segurava sua fortaleza com força, e ficava feliz por tê-la ali com ele. Antes mesmo que o salão reenchesse de gente falante e eufórica, os quatro permaneceram juntos, unidos. Apenas Neville cruzou a quietude e saiu pelo buraco do retrato.
Assim que a primeira aluna entrou no salão comunal, Harry e Rony subiram até o dormitório masculino. Gina e Hermione seguiram para o feminino. Harry não comentou nada com o amigo, mas sabia que ele sentia pela perda do irmão. Ao pisaram no dormitório, ele não estava completamente vazio, como Harry esperava. Uma criatura baixa e verde estava sentada no chão; tinha largas orelhas molengas e enormes olhos amarelos.
– Sr. Potter! – disse uma voz fina e esganiçada. Era Dobby, definitivamente Dobby. – Que bom encontrá-lo em tempo. A professora McGonnagal pediu que lhe entregasse isso. – Dobby enfiou os finos dedos verdes dentro do abafador de chá e retirou um pergaminho negro. Estava escrito em prata.
– O que é isso? – perguntou Harry curioso, a voz seca pelo desuso.
– Dobby não leu carta dos senhores... Não! Quanta vergonha... Fui enviado para entregar, não para ler a carta de Harry Potter e seu amigo Weasley!
– Obrigado Dobby. – disse Harry recebendo o envelope e sentando-se na cama de coluna. O malão aberto aos seus pés. Harry pôs os dedos entre o selo e o pergaminho, abrindo o lacre branco no papel preto. Rony olhava fixo para a carta e Dobby parecia satisfeito com a entrega, saltitava no mesmo local. Harry puxou o pergaminho também negro e leu.
Querido Harry,
Ainda que com muito pesar, o convidamos para o sepultamento do terceiro Weasley dá septuagésima sexta geração, que ocorrerá no cemitério de Hogwarts. Às 15 horas do dia 31 de junho.
Obrigado,
Molly e Arthur Weasley
– Agora à tarde. – Harry terminou de ler entregou o envelope ao amigo. Ele ficou extremamente triste com o que leu, mais do que já estava. Harry levantou-se e foi ao malão. Rony continuava imóvel perante a carta. Harry deu uma última olhada pela janela e começou a arrumar as malas. Recolheu todos os seus pertences; as penas e pergaminhos foram devidamente enrolados e guardados no fundo do malão junto com seus antigo lembrol e um embrulho de papelão amassado, o espelho de Sirius.
Harry retirou o cachecol de perto do aquecedor, dobrou-o e o guardou dentro do malão. Harry arrolhou o caldeirão com meias sujas e frascos delicados para poções. Suas roupas de baixo foram compactadas ao meio de livros e tinteiros lacrados por magia. Harry por fim depositou no malão sua Capa de Invisibilidade e próximo a ela o Mapa do Maroto, ambos heranças de seu pai. Rony, para a alegria de Harry, já estava organizando seu malão, ainda que lentamente.
Após o término da arrumação das malas, Harry vestiu sua capa de inverno, embora não estivesse frio, ela era continuamente negra, e representaria de forma muito convicta o luto em nome dos Weasley. Rony parecia sentir o mesmo, parecia buscar uma forma negra de representar o desânimo. O garoto pôs a mesma capa de botões prateados que Harry, olhou mudo para o amigo e saiu do dormitório. Eles encontraram Gina e Mione, as duas de negro, com altos coques na cabeça. Na face triste de Gina, uma mecha vermelha viva iluminava seu semblante sombrio.
Os quatro amigos entreolharam-se, como se perdoassem uns aos outros por tantos erros já antes cometidos, fossem ditos ou não, praticados ou não, os quatro atingiram a redenção máxima, confiaram na força fraternal e prosseguiram por atribulações que muitos desacreditavam possui solução, mas eles haviam completado uma difícil jornada até ali. Todos retribuíram com um grato sorriso amarelo no rosto.
Eles desceram automaticamente, não escutaram sequer Pirraça berrar-lhes nomes grosseiros ou viram Filch resmungar sobre um vazamento de poção nas masmorras. Estavam tão acostumados àquelas escadas, curvas e corredores, que a planta do castelo estava mecanicamente entranhada no cérebro dos quatro. Eles apenas desceram até o Saguão de Entrada. McGonnagal os aguardava, vestia um longo conjunto de tweed negro e possuía o mesmo coque amarrado na nuca. Não parecia apreensiva, não sorria tampouco.
Eles saíram do castelo em um cortejo mudo e tristonho que não pronunciava palavra, gesto ou ruído algum, era tudo nada, e luz era sombra e o dia virara sombra eterna. Nos irmãos a perda de um ente, aos amigos o conhecimento ausente e a mestra o desejo ardente do alarde tardio. O farfalhar das capas na grossa grama do castelo sentenciavam seus pensamentos e ações passadas.
McGonnagal não utilizou a trilha pela floresta proibida. Quando Harry notou, três carruagens com dois enormes testrálios aguardavam os garotos. Eles subiram nas carruagens mais próximas e assim que as cabines se lotaram, as portas bateram-se sozinhas e a carruagem queimou o chão, veloz pelos portões com javalis alados. Harry virou-se para trás e vislumbrou o castelo, em sua imponente construção Harry o vislumbrou pela última vez até seu regresso outonal. As altas árvores da floresta ergueram-se a tal ângulo que taparam a mais alta das torres do castelo.
A carruagens de Harry sacolejava e não estava correndo pela lisa estradinha de Hogsmeade, as carruagens desbravavam uma estrada antiga; cheia de buracos com calombos e desníveis por toda sua extensão. Os galhos e arbustos aéreos entrelaçavam-se sobre a estrada criando um túnel natural de folhas secas. Harry temeu pelo que encontraria à sua frente, mas num abrupto solavanco o móvel parou. As portinhas se abririam e Harry, seus amigos e McGonnagal desceram. Estavam diante de um portão velho de ferro. No alto haviam frondosas letras floreadas escritas, Cemitério Hogwarts.
Era exatamente o mesmo cemitério que Harry descobrira, ainda quinze dias antes, quando ainda nem imaginava sobre a existência do feitiço de sua mãe, muito menos sua força. As inscrições, porém agora estavam de forma estranhamente organizada, como se tivessem se arrumado. A grama estava curta e as lápides não estavam sujas, os vasinhos de flores haviam sido preenchidos com rosas, cravos e margaridas. No entanto, a jovialidade sombria parecia à Harry muito artificial, como se alguém ou alguma coisa tivesse arrumado o cemitério ás pressas sabendo que haveria um sepultamento.
Ao aproximarem-se do portão férreo, este se abriu sozinho; rangia muito e era possível escutar gritos vindos das roldanas e dobradiças de metal velho e enferrujados. Houve um claque e o portão ficou imóvel, noventa graus com o ângulo original e a entrada finalmente aberta. Eles caminharam e avistaram um pequeno grupo de bruxos e bruxas, todos de negro, parados. Harry notou que em sua maioria onipresente, os bruxos possuíam cabelos vermelho-alaranjados. Havia um homem, com cabelos castanhos, virado de costas para o grupo; ao seu lado, envolta pelos braços do bruxo moreno, uma bruxa, um pouco mais baixa, com cabelos cor de chiclete.
Ali estavam reunidos todos os Weasley, Arthur e Molly; Carlinhos e Gui, Fred e Jorge; e por fim, Rony e Gina. Tonks, Lupin, Harry e Hermione eram os únicos que não faziam parte da família; McGonnagal também se juntava à este grupo. Havia, no entanto, uma mulher baixa, de cabelos crespos vermelhos com a pele muito branca e um olhar muito altivo. As sardas no rosto denunciavam que aquela era uma Weasley, mas Harry não a conhecia de lugar algum ou foto qualquer.
– Meus filhos! – exclamou Molly ao ver que eles haviam chegado. – Que bom que estão aqui comigo! – ela abraçou os filhos e ainda apegada aos mesmos ela observou Harry e Hermione. – Obrigado por terem vindo. – Harry sorriu, Hermione fez o mesmo. Ela virou-se de costas e voltou para o círculo que antes estava. Eles pareciam aguardar apenas Rony e Gina para que finalizassem o sepultamento.
Harry viu que havia no chão, um lustroso caixão de madeira nobre, com entalhes belos e vistosos, a tampa estava fechada, afinal Percy havia virado cinzas, e não havia um corpo real ali dentro. Por este motivo era muito triste ver todos saudarem aquele caixão que estava obviamente vazio. Os Weasley presentes, inclusive a senhora baixa, deram às mãos e disseram palavras que definitivamente não eram em inglês.
Algo mágico ocorreu. Cada Weasley libertou do próprio peito uma pequena bolinha de luz laranja. Elas movimentavam-se epiralmente de forma lenta e delicada, como pó dentro d’água, dissolvendo a luz no ar. As palavras continuaram a serem proclamadas, e uma bolinha de luz negra elevou-se do caixão de Percy. As bolinhas laranjas ficaram eletricamente excitadas e correram de encontro à bola negra que englobou as demais e voltou como um jorro para dentro do caixão que tremulou e voltou à calmaria inicial.
Arthur soltou a mão do círculo, ergueu a varinha e, trêmulo, ergueu o caixão centímetros do chão. Ao lado, uma cova já aberta aguardava o ocupante. O caixão flutuou até o buraco e uma rajada de vento perpassou-lhes o rosto. O caixão foi sendo descido, centímetro a centímetro, até que a escuridão o escondeu. A varinha de Arthur também fechou a cova com terra; uma camada de grama foi posta por cima. Uma lápide foi conjurada no chão, exatamente onde antes havia um buraco, havia uma pequena foto do falecido e sob a moldura oval e cor de bronze, inscrições floreadas que diziam:
– Harry, vamos. – disse Lupin fazendo com que as pernas imóveis do garoto se locomovessem – O Expresso de Hogwarts parte daqui a dez minutos.
– Eh? – Harry parecia confuso, as luzes riscando sua retina, os óculos escorrendo pela ponta do nariz e a varinha trêmula em seu bolso interno – Partir? Agora? Ah! Sim! O trem... – Lupin deu um sorriso paternalmente compreensivo e caminhou com Harry até os portões do cemitério. Hermione e McGonnagal vieram logo atrás com Tonks. Os Weasley permaneceram ali por mais alguns segundos antes que pudessem mover-se. Harry escutou um soluço de arrependimento e olhou para trás, Fred e Jorge estavam de joelho sobre a lápide do irmão, choravam pelo irmão. Arthur abraçava os filhos mais velhos, e os mais novos eram envoltos pelos braços da mãe.
– Foi o enterro mais triste de minha vida. – afirmou McGonnagal muito convicta. A feiticeira adulta conjurou um lencinho branco com a varinha e o levou aos olhos nitidamente úmidos. Tonks, continha-se com soluços discretos e Lupin procurava reconfortar Harry. Percy não era o real motivo da tristeza, na verdade ele era a causa para a tristeza dos Weasley, estes sim, amados por todos por serem éticos e leais às suas filosofias e crenças. O estado da pequena Ginevra e de sua mãe era lastimável, os gêmeos estavam profundamente arrependidos por todos os logros e pegadinhas que haviam pregado no ambicioso irmão e Arthur parecia ainda desacreditado das últimas notícias, Gui e Carlinhos tinham nos olhos o afeto perdido pelo irmão caçula, herdeiro de roupas, brinquedos e memórias. Á um canto, a senhora Weasley desconhecida choramingava.
A carruagem aguardava Harry e os amigos que entraram e foram correndo para a estação de Hogsmeade. Os testrálios galgaram e Harry sequer escutou os amigos o acompanharam. Hermione e McGonnagal escondiam os rostos com as palmas da mão e, Tonks admirava a paisagem obscura além das janelinhas quadradas do veículo. Lupin olhava para o chão e Harry apenas desejava que não voltasse para os Dursley.
A carruagem parou com um forte solavanco que fez com que Harry sentisse todos os seus músculos do pescoço de romperem. A portinhola se escancarou e eles desceram. Havia como de costume um enorme alvoroço de estudantes na estação. Jovens e crianças se amontoavam na estreita passarela de pedras. Uma enorme e robusta locomotiva vermelho-vivo lançava ao ar repolhudas nuvens de fumaça. Ao fundo um belo céu azul era tingido de branco e uma enorme obra monumental enfeitava a paisagem. O castelo de Hogwarts, com suas torrinhas e torreões, atrás era apenas mais um atrativo na paisagem.
– Boas férias Potter! – ofereceu McGonnagal ao garoto. – E a você também Srta. Granger! – a professora que não havia saído da carruagem, apenas acenou e o veículo regido por testrálio correu na direção do castelo. Harry apenas sorriu e voltou sua atenção para o trem. Hagrid destacava-se no mar de gente e pedia que todos entrassem no trem.
– Harry! – era possível delinear um sorriso amigável por detrás da barba desgrenhada – Vocês demoraram, Severo me avisou, – Hagrid veio caminhando na direção dos amigos e terminou a frase – mas achei que fosse demorar menos.
– É... – disse Harry inexpressivo.
– Foi uma manhã muito bonita. – terminou Tonks.
– Imagino... – disse Hagrid – Ele era um bom garoto, espero que Arthur e Molly superem, juntos, esta fase. – houve um ranger de rodas e um barulho oco de cascos – Aí vem eles. – Hagrid empertigou-se e disse delicadamente – Meus sentimentos Molly.
– O-obriga-d-da.
– Hora de partir. – disse Lupin a Arthur.
– Acredito que sim. – disse o Sr. Weasley a voz muito embargada. – Vamos Molly. – Houve uma rodada geral de despedidas silenciosas, e desaparataram: primeiro Gui, depois Carlinhos, Molly e Arthur e por fim Fred e Jorge. Lupin e Tonks aguardaram que todos entrassem no trem. Eles subiram os finos degraus da escadinha de metal e adentraram pelos estreitos corredores do trem.
Havia estudantes em todas as cabines, estavam quietos, outros falantes, outros chateados, mas em geral despreocupados com o mundo real; ainda que soubessem do perigo iminente e da batalha que era travada por seus pais, se negavam ou não conseguiam compreender a magnitude do que estava prestes à acontecer. O fim estava tão próximo e tão longe. Ainda procuravam por uma cabine e escutaram a voz eufórica de Neville.
– Hei! – disse acenando da porta de uma cabine mais à frente – Guardamos seus lugares!
– Que bom! – disse Harry em voz alta. Os quatro amigos caminharam, arrastando os pés até a cabine e tomaram seus lugares. Luna estava presente, os cabelos louros caindo-lhe na fronte, os olhos azuis ofuscados pelo sol da vidraça. Neville sentou ao lado da garota e passou o braço pelo ombro da Garota e a abraçou de forma muito mais que amigável. Luna sorriu.
Gina não pode deixar de rir, e Hermione ficou visivelmente contente. Pela janela Lupin e Tonks acenavam. O trem começou a andar, as rodas de metal fundido moviam-se magicamente pelos lisos trilhos de rebites. Um apito alto anunciou a partida, e logo o trem adquiriu velocidade, e os acenos de Tonks e Lupin tornaram-se invisíveis. O castelo foi diminuindo de tamanho até ser reduzido ao tamanho de uma noz e por fim o trem entrou em um túnel escuro que baniu as visões da escola.
A viagem de volta foi extremamente silenciosa, estavam muito abalados – todos eles – para conversarem felizes sobre as férias ou então sobre coisas fúteis. A perda era um sentimento onipresente, e a tristeza tomou conta de todos, principalmente de Gina. As montanhas que circundavam a paisagem do castelo agora começavam a transformar-se em morrinhos e lagos e pontes apareciam pela janela. Vilarejos eram vislumbrados e a viagem transcorria.
A mulher do carrinho de doce passou sorridente para todos, e Harry e Neville compraram juntos uma infinidade de bolos de caldeirão, litros de suco de abóbora, barrinhas de chocolate e caixas de sapos de chocolates. Ainda que comessem muito silencioso, risadas soltas eram escutadas, visto que o tempo parecia agir sobre eles. As nuvens brancas tornaram-se cinzas e o céu azul virou anil, o dia já era noite e estavam quase chegando.
– Esse ano foi realmente difícil. – disse Luna – Para todos nós. – ela respirou fundo e completou o pensamento – Mas não foi, nem será o pior. Algo grande está por vir.
– Pior que isso? – perguntou Rony descrente.
– Não vimos nada ainda. – disse Harry sério.
– Está só começando. – disse Hermione –, ele é capaz de coisas piores que nem imaginamos.
O trem deu um solavanco e parou. Estavam em King’s Cross, prontos para regressarem aos seus lares e seguirem para seus amados pais. Harry sentiu falta de Sirius e seus pais, como eles lhe faziam falta em momentos tão tristes; e agora Dumbledore. Mas ele ainda está bem, martelou uma voz em seu cérebro.
– Harry! – gritou a voz seca de tia Petúnia. Ela tinha o comprido pescoço esticado à procura do sobrinho. Era incomum ela ir buscá-lo, mas Harry ficou contente que sua única parenta estivesse ali. Algo quente o reconfortou. Ele ergueu a mão descontente a acenou. Puxou seu pesado malão e parou para despedir-se dos amigos.
– Rony... – Harry abriu os braços e abraçou o amigo com uma força e afeto inexplicáveis. – Conte comigo.
– Você também. – respondeu.
– Adeus! – disse Luna de longe para todos, um senhor alto de cabelos claros a acompanhava. Neville recebia os carinhos da avó e despediu-se de todos antes de sumir no ar com a avó.
– Harry, eu irei escrever. – disse Hermione com os pais, vestidos de branco, a abraçando. Gina estava a um canto conversando com Gui, o irmão mais velho que viera lhes buscar.
– Um minuto. – pediu ela ao irmão. Gina veio na direção de Harry. Tia petúnia a acompanhou com os olhos. Ela veio e o abraçou e beijou-lhe o lábio como se aquela fosse a última vez que aquilo fosse possível.
– Ah... – disse Rony sem graça – Nos veremos em breve. – afirmou.
– Sem dúvida.
Harry virou-se de costas pesaroso do que estava por vir. Ele olhou para frente e tio Valter e tia Petúnia o aguardavam, o carrinho malas vazio para que pudesse por seus malão e a gaiola e Edwiges, que se mantinha calma. Antes que dissesse alguma palavra ele escutou a voz de Gui.
– Harry! Lembre-se que você poderá sair de casa! – afirmou com uma piscadela.
– Obrigado! – e dizendo isso acompanhou os Dursley até o estacionamento. A poeira estava baixando, os movimentos se executavam por debaixo das linhas visíveis da sociedade. Era o início do fim.
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