Dresses
Vestidos. Rosas, azuis, verdes, vermelhos, pretos e brancos; de todas as cores. De seda, de cetim, malha; de todos os tecidos. Tomara-que-caia, frente única, longos e compridos; de todos os modelos e tamanhos.
Não consigo me lembrar de nenhuma lembrança realmente significativa que eu não tenha usado algum vestido; desde o mais simples ao mais sofisticado. Usei vestidos em aniversários, em noivados, em casamentos e em funerais. E usei um vestido em cada nascimento que houve na minha família.
Quando Sirius, meu primo, nasceu eu tinha apenas dois anos e meio e minha mãe vestiu-me de vermelho claro. Vermelho para o nascimento do garoto com os olhos mais azuis que eu já vi; vermelho para o garoto que acabou indo para a Grifinória e fugindo de casa.
Nunca gostei de vermelho.
Quando Andrômeda nasceu eu já completara os meus três anos, e insisti em usar um delicado vestido azul claro. Azul para a filha mais radiante da casa, a que mais brilhava e a que conseguiu brilhar mais longe; azul para a filha que fugiu de casa e conseguiu ser tudo o que a família não queria.
O azul sempre me ofuscou.
Logo depois de Andrômeda veio Régulo para fazer companhia à Sirius, que já estava cansado de brincar sozinho. No nascimento do mais novo garoto Black, eu usei um lindo vestido verde. Minha mãe me disse que o vestido traria sorte ao menino e o faria seguir todas as tradições da família, sendo um orgulho. Régulo nunca fez companhia a Sirius.
O verde já havia se tornado comum naquele lugar; me enjoava.
Já havia feito quatro anos quando ela nasceu e eu nunca poderia ter acertado melhor na cor do vestido. O branco tão puro e impecável como ela era. Fascinei-me assim que pus os olhos em seus cabelos que nasciam ralos e loiros, assim que toquei a sua pele alva de bebê. Assim que ela nasceu.
Afinal, o branco me perseguiria pelo resto da minha vida. Me perseguiria até que eu clamasse pelo negro e nele me enterrasse.
O meu pior medo sempre foi tocá-la ou chegar perto demais dela, apesar de eu sempre acabar fazendo-o. Tinha tanto medo de sujar tudo de intocável que ela representava para mim. Tanto medo que acabei por me vestir de branco na maioria das vezes, apenas pela ilusão que de dessa forma eu não a deixaria tão impura quanto eu.
Já havia completado quatorze anos, e ela ainda aguardava ansiosamente pela carta de Hogwarts. Nessa época tudo o que eu queria era que o tempo passasse devagar e que o dia dela ir para a escola jamais chegasse, por eu nunca suportaria que o pecado me perseguisse todos os instantes. Mas ela já me perseguia tanto em sonhos e devaneios que, quando as suas aulas começaram, eu percebi que já não adiantava lutar contra a nossa convivência. O pecado já havia se instalado em mim.
Tinha longos cabelos platinados descendo pelas costas, o seu corpo magro e bem feito chamando atenção de vários garotos quando a adolescência chegava e ela começava a virar uma mulher. Mas os olhos, em inúmeros tons de cinza, continuavam os mesmos de quando ela nasceu; me confortava saber que nenhum garoto com quem ela se envolvesse tinha visto aqueles olhos desde que eles se abriram pela primeira vez.
Apenas eu, que era irmã dela. Apenas eu que a amava descontroladamente e tinha uma obsessão por seus vestidos. Mal sabia eu que a minha obsessão era pelo corpo dentro dos vestidos; naquela época ainda não havia descoberto o prazer de desabotoá-los.
Tinha vinte anos quando a minha família decidiu marcar o meu noivado com o bonito Lestrange, que me cortejara por todos os meus últimos anos de estudo. Não tive escolha em nada, nem em aceitar ou não, nem em escolher o meu vestido. Escolheram um vermelho, que todos diziam combinar extraordinariamente comigo.
Não entendia como eles poderiam achar que sabiam alguma coisa de mim, já que nem ao menos eu sabia. Eu sabia apenas da minha obsessão por mínimas coisas, e da forma doentia que eu era capaz de amar. Eles só conheciam a minha forma rude de odiar.
Narcissa tinha tudo o que queria naquela época, desde todas as jóias que desejava até todos os espelhos que precisava ter em seu quarto. E foi através de um de seus espelhos que eu vi o pecado novamente atraindo-me. Ela havia voltado de Hogwarts para as férias. Os pesadelos voltaram. E dessa vez ela voltava com os cabelos curtos, com o corpo mais definido e, se é que isso seria possível, ainda mais apaixonante.
Mas naquele ano o pesadelo não era mais feito de obsessões emocionais; naquele ano as obsessões haviam se tornado físicas, e eu não agüentaria mais nenhum minuto sem tê-la para mim, sem manchá-la com a minha impureza. Queria lhe deixar tão suja como eu, talvez assim ela sentisse um pouco do que eu sentia.
Ela sempre gostou de toda a minha proteção e da forma carinhosa com que eu sempre a acolhia, mas naquele verão ela não era mais tão infantil como antes.
“Malfoy está me cortejando”, anunciou ela assim que me viu entrando em seu quarto, olhando-me pelo reflexo do espelho. “Papai disse que eu devo aceitar.”
Não parecia ter nenhuma opinião formada sobre isso, não parecia nem mesmo se importar com o que aconteceria entre ela e Malfoy. Comportava-se da mesma maneira que eu me comportei em relação a Rodolphus; e isso machucou. Ela havia sido intoxicada pelas nossas impurezas, mesmo com toda a minha proteção.
Agora só me restava sujá-la ainda mais, e dessa forma rezar para que tudo acabasse.
“Ele é bonito, mas patético.”, comentou enquanto jogava-se na minha cama, fechando os olhos.
Já era madrugada e os convidados da festa haviam ido para as suas casas, enquanto a nossa família recolhia-se e os elfos limpavam a casa. A minha festa de noivado havia terminado há pouco menos de uma hora e eu me sentia completamente cansada.
Da mesma forma que Narcissa não tinha opinião formada sobre Lucius, ela também não tinha nenhuma em relação a Rodolphus, apesar de ter achado-o rude demais. Talvez ela me achasse, de alguma forma, pura. Ou assim eu gostaria que fosse.
Narcissa não dava sinais de que iria levantar-se da minha cama tão cedo e, apesar de ela manter os olhos fechados, eu relutava em despir-me do meu vestido vermelho na sua frente. Mal conseguia me controlar em tê-la tão perto de mim, e na verdade não queria me controlar.
“Odeio vestidos.”, ela disse em voz baixa, em tom de desabafo.
Olhei-a de forma assustada, como se tivessem me anunciado o fim do mundo. O chão sob os meus pés poderia abrir-se naquele momento que eu não veria nenhuma diferença, já que a sensação que eu tinha era que iria cair a qualquer momento.
De alguma forma os vestidos de Narcissa haviam se tornado parte de mim, assim como ela. De alguma forma todo e qualquer vestido havia penetrado em mim de uma forma tão profunda que eu nunca conseguiria imaginar-me sem um. Era mais uma das minhas estranhas obsessões. Só conseguia perder para Narcissa.
Mas naquele momento eu queria machucá-la por sujar os meus vestidos com a sua pureza.
“Então não os use.”
Ela sentou-se na cama e me olhou de forma estranha, não entendendo o tom irritado que usei com ela.
“Só porque não gosto deles não significa que não deva usá-los.”, ela se levantou e foi até mim, olhando-me agora mais profundamente.
Seus olhos me queimavam, ao mesmo tempo em que me levavam ao céu em questão de segundos.
“Eu os amo.”, eu disse definitivamente, virando-me de costas para ela.
“Mais do que ama a mim?”
Novamente o chão parecia ter sido destruído, e a minha cabeça rodava. Talvez fosse pelo fato dela aproximar-se cada vez mais, ou talvez pela sua respiração que aproximava-se do meu pescoço com leveza.
Ou então a questão que ela havia levantado. Por qual a minha obsessão era maior?
Continuei imóvel por algum tempo, até que ela tocou as minhas costas e me virou com delicadeza, me obrigando a encará-la. No instante em que seus olhos cravaram-se nos meus, questionando-me silenciosamente, eu não quis mais sujá-la, já que se o fizesse ela não seria mais um ser místico e intocável para mim. Mas não restava mais nada a fazer, minha obsessão por ela sempre seria maior do que qualquer outra coisa, sendo ela pura ou não.
“Responda-me, Bella.” Sussurrou no meu ouvido, logo depois movendo o seu rosto para perto do meus lábios, deixando as nossas respirações próximas. Me deixando ofegante.
“Você, sempre você.”
Por mais que o meu desejo por aquilo tenha nascido no mesmo momento que ela, por mais que eu tivesse nutrido aquela obsessão antes mesmo de saber o significado dessa palavra e, por mais que eu tenha sonhado em fazer aquilo há anos, eu nunca poderia ter previsto como seria.
Na realidade os seus lábios eram muito mais macios do que nos meus sonhos, e os seus atos eram muito mais luxentos do que eu poderia imaginar que seriam.
Os meus lábios procuraram cada pedaço da pele alva dela, e beijei-a por inteiro. A minha mente trabalhava assiduamente, e tudo o que eu conseguia pensar era que todos os meus atos a impurificavam; mal sabia eu que quem estava se tornando suja ali era eu.
Destruir o alvo da minha loucura não foi uma boa escolha, já que fazendo isso eu tornei-a alvo do meu amor, e esse era ainda mais doentio.
O meu casamento nunca foi visto como um empecilho e realmente não foi um. A nossa relação nunca foi de muitas palavras, apesar de existirem algumas ocasiões em que conversávamos horas a fio. Mas o que nos nutria eram os detalhes; os botões, os vestidos, os tecidos e o ato de desfazer cada um deles.
Até que chegou o seu casamento. Este sim eu sempre soube que seria um empecilho, e talvez o fim. Não queria que ela usasse branco para outra pessoa.
Ela casou-se no final dos dezenove anos, na época em que a nossa família já questionava o motivo de eu não ter tido nenhum filho. Questionavam também o motivo de Narcissa ter se tornado uma garota cada vez mais obsessiva com coisas inúteis. Foi o que a impureza fez com ela, tornou-a tão obsessiva e insana quanto eu.
“Minha culpa.”, eu não cansava de repetir entre os gemidos, ou durante o sono. Em qualquer momento em que a insanidade misturava-se com o sublime; quando o inferno fantasiava-se de céu e colocava o seu pior demônio na minha frente. Sempre vestida de anjo, sempre de branco, sempre de vestido.
Na madrugada que antecedeu o seu casamento ela não deixou com que ninguém a perturbasse. Apenas a mim. Ela sabia que isto sempre seria essencial.
“A sua obsessão não é por mim”, começou num sussurro enquanto eu desabotoava lentamente o seu vestido, me fazendo parar brevemente com a minha tarefa. “Muito menos pelos vestidos.”
Demorei-me no ato de olhá-la, tentando entender o que ela dizia. Eu tinha muitas outras manias e fascinações, mas apenas ela me obcecava. Apenas ela e os seus vestidos.
“A sua obsessão está em nos destruir. Destruir os meus vestidos e destruir a mim.”
Suspirei pesadamente e desabotoei o último botão que ainda prendia o vestido leve que ela usava, fazendo assim com que o vestido caísse no chão, mostrando seu corpo completamente nu.
“Você sempre terá alguma pureza para ser destruída.”, murmurei, como se aquilo resolvesse tudo, apesar de não ser essa a minha intenção.
Na verdade eu nunca quis protegê-la, muito menos tê-la apenas para mim. Na verdade o que eu sempre desejei descontroladamente que ela fosse como todos os outros. Queria que ela fosse louca e suja como todos os Black deveriam ser; não era justo que ela se livrasse da nossa sina. Queria que ela se sujasse com o nosso próprio sangue naquela relação incestuosa que nós nutríamos tão fielmente.
Desejava desesperadamente que ela perdesse toda a pureza que ela tinha e que, dessa forma, não fosse mais digna de seus vestidos brancos.
Mas ela era uma de nós, sempre foi. Me enganou tão cegamente que eu nem mesmo percebi que ela nunca teve a pureza que eu imaginei. Ela apenas nutriu-se da minha obsessão para levar de mim o resto de sanidade que ainda tinha.
Não quis saber de nada que o meu cérebro me dissesse naquele momento, queria apenas esganá-la com as minhas próprias mãos. Mas a única forma que eu tinha de fazer isso era tomando os seus lábios para mim, para logo depois marcar todo o seu corpo com as minhas mãos, sentir a respiração dela ficar cada vez mais ofegante e por fim senti-la desfazendo-se nos meus braços.
Era a minha única forma de destruí-la, apesar de daquele jeito me destruir junto.
No dia seguinte ela casou-se. Com um longo e pesado vestido branco. Eu fui madrinha, e vesti negro. Nunca gostei da cor, mas, a partir daquele dia, ela passou a me fascinar.
Não era forte o bastante para se tornar uma obsessão, mas mesmo assim chamou a minha atenção e me distraiu. Após me ver sem ela a minha mania tornou-se tingir todas as minhas roupas de preto.
Não queria mais ter coisas que me lembrassem ela, e, por mais que o meu corpo clamasse por ela, não queria mais tê-la em meus braços.
Tingi cada vestido de preto e, depois de o fazer, passei a comprar vestidos coloridos apenas para ter o prazer de torná-los pretos; apenas pelo prazer de destruí-los e fazer com que eles não fossem mais dignos de nenhuma piedade. Eu não queria mais ser digna de nenhuma piedade, por isso nunca mais usei o branco e fechei-me no negro.
Como já não tinha mais ela para rasgar, desabotoar e destruir, juntei-me a pessoas que, como eu, também repugnavam a pureza. Matar tornou-se a minha nossa obsessão.
Destruí toda a pureza que um dia houvera em mim e, dessa forma, transformei-me na criatura que mais admirava a pureza no mundo. A criatura que mais admirava o ato de destruí-la e tomá-la para mim.
(N/A):
Surto criativo :D Ficou meio idiota, sem moral e chatinho, mas eu espero realmente que gostem. Comentem, votem, e essas coisas aí.
Beijos,
Lisi Black
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