A DIVIDA PERPETUA
Reconheceria aquela voz, mesmo que ela pronunciasse apenas um monossílabo, em qualquer circunstância. Enquanto girava o corpo para encarar os bruxos encapuzados postados à porta, o coração de Harry encheu-se de raiva e apreensão, logo acompanhadas pela auto censura. Visualizando os feitiços simultâneos que estilhaçaram o olho mágico e a perna de madeira de Olho Tonto, que tombou, desacordado pelo ataque e com sua varinha atirada longe, Harry flagrou-se da seriedade da situação: foram pegos desprevenidos, distraídos pela história de Aberforth e, após tanto tempo tomando tantos cuidados, desta vez haviam sido presas fáceis.
Lupin e Ron haviam esboçado reação, assim como ele mesmo, mas as varinhas inimigas diretamente apontadas para suas testas os impediram. E não havia como saber a localização de Hermione. Todas essas informações cruzaram por sua mente em poucos segundos, passando, tão rapidamente quanto, a segundo plano, no exato momento em que apontou sua varinha para Severus Snape, que retribuiu o gesto.
Subitamente, sua memória estava de volta à alta torre em Hogwarts e revia, como se acontecesse naquele instante, ao brutal e covarde assassinato de Alvo Dumbledore. A relevância da perda de seu grande amigo e mentor reascendeu e insuflou com maior ímpeto a ira surda em seu coração, e seus olhos dardejaram para seu ex professor, toda a mente tomada pelo instinto de atacá-lo sem piedade, até que não restasse um só fiapo de vida em Seboso. Os dedos fecharam-se com força em torno da varinha e uma infinidade de feitiços subiram-lhe à garganta. Mas o arquear de sobrancelhas de Snape em direção à Ron o fez engolir a raiva em seco e aquietar-se, sem no entanto baixar a varinha. A mensagem era explícita. Se atacasse, Ron sofreria.
Snape sorriu enviesado, puxando a capa para esconder sua horrível cicatriz do olhar minucioso de Harry, mantendo porém o costumeiro ar de desdém, os olhos negros brilhando debochados para o rapaz, a varinha erguida quase displicentemente na sua direção. Surpreendentemente, suas primeiras palavras não foram dirigidas à Harry, e sim a um de seus companheiros na invasão.
- Eu mandei que mantivesse sua nova varinha sob controle! Eu decido quem morre por aqui!
O encapuzado, que mantinha o silencioso e atento Lupin sob sua mira, grunhiu em resposta antes de baixar o capuz, revelando os cabelos platinados e os olhos frios de Lucius Malfoy.
- Você precisava do velho para alguma coisa, Snape?!? Então, deixe de histórias! Não foi para silenciá-lo que viemos aqui?... Ah...Olá, Potter! Que surpresa agradável encontrá-lo por aqui... – A voz arrastada destilava veneno e ironia.
Sem tirar os olhos de Harry, cuja mente trabalhava a todo vapor buscando uma saída para aliviar sua desvantagem, Snape ordenou para o terceiro comparsa, que se ocupara de Ron:
- Amarre esse aí e Moody! Lucius, pare de falar demais e cuide do lobisomem. Veja se não falha dessa vez... Não quero surpresas enquanto me acerto com Potter! E você... – Novamente o sorriso torto para Harry. – Um movimento só, e um de seus amigos morre.
- Se apresse com isso, Snape! Ou o Lord perceberá a demora...
Malfoy calou-se diante do tardio olhar de advertência de Snape, tardio o suficiente para que Harry percebesse o que se passava. Registrando que Moody e Lupin estavam bem amarrados e amordaçados àquela altura, mas Ron ainda não, disparou com voz sarcástica:
- Ele não sabe que estão aqui, Seboso? Agindo às escondidas de seu querido mestre?... Não seria a primeira vez, não é?
O capuz do terceiro bruxo caiu quando ele movimentou bruscamente a cabeça em direção à conversa. Harry reconheceu as feições apagadas de Rodolfo Lestrange, o marido de Bellatrix. Snape percebeu o interesse do comensal pelas palavras de Harry. Curvando os lábios desagradavelmente, sibilou:
-Crucio!
Harry preparou-se para a dor excruciante, mas... inadvertidamente, surpreendentemente, felizmente, ela veio em uma escala muito menor do que em suas outras viagens pela maldição Cruciatus. Outro presente de Riddle? Estaria mais resistente às maldições? Alheio ao fato de que Harry apenas representava curvar-se em agonia, Snape continuou, com a voz, antes fria, vibrando de satisfação.
- Cale-se, Potter! Ou seus amigos pagarão por sua verborragia...
Quer dizer que Snape também não conseguia espionar-lhe a mente, já que não percebera sua encenação... Isso com certeza devia-se aos talentos de Legilimência que adquirira de Riddle. Ainda fingindo mais dor do que sentia, Harry vasculhou com os olhos a sala, procurando por algum sinal de Hermione. Desejava de coração que a amiga tivesse corrido para Hogwarts, mas sabia que era improvável. Trocando um olhar cheio de significados com o ainda liberto, porém amordaçado Ron, concentrou-se em conseguir o que mais precisava: tempo. Snape nunca conseguira resistir à provocações, e era por aí que o distrairia, bom como a Lestrange e Malfoy.
Endireitou-se, e encarando sarcasticamente o ex mestre de poções, comunicou-se usando apenas os pensamentos:
- “Não está dando certo, Seboso! Sua técnica na arte das maldições é apenas medíocre...Bem como em Legilimência. Deveria ter se contentado com seu kit de química!... Se eu estivesse com tempo e vontade, lhe daria algumas dicas... Mas não é o caso!...”
Snape arfou, misturando no ato surpresa e indignação, e ergueu mais a varinha, dirigindo-a ao ponto entre os olhos verdes de Harry Potter. Este continuou com a provocação mental, ainda esperando pela manifestação de Hermione, e pela oportunidade de atacar com sucesso.
- “O que é isso em seu ombro? Foi Bicuço?... Sua velha carcaça ficou bem de acordo com seu caráter, agora...”
- Mantenha os bons modos, Potter! Ou eu lhe dou o mesmo tratamento que dispensei ao bom e velho diretor!
As entranhas de Harry endureceram de ódio, mas de algum lugar de sua repulsa visceral por Seboso veio a certeza de que tinha que manter o raciocínio alerta, sem desconcentrar-se.Com um tom de voz assustadoramente parecido com o que Riddle usava para falar com seus comensais, alternando frieza, maldade, divertimento e impaciência, concluiu.
- Se quisesse ou pudesse me matar, já o teria feito, Seboso. Provavelmente pelas costas, bem do seu jeito, cheio de traições e covardia... Mas morto não sirvo a seus propósitos, não é?
- Já lhe disse para não ousar me chamar de covarde! E baixe essa varinha! – Harry afrouxou um pouco o braço. – Isso... Tem razão, Potter! Encontrá-lo aqui foi mais que uma útil coincidência! Desde que soube que presenciara a conversa de Fletcher e Voldemort, soube que seguiria a meada e acabaria chegando até aqui. Sabe, avisei Mundungo para que não falasse nada, e em troca eu o salvaria... Mas o verme covarde se borrou na primeira ameaça do Lord, e eu vi meu precioso segredo às portas de ser descoberto...
- O que é que está acontecendo Snape? Caçar Potter sem o conhecimento de Lord Voldemort não estava no acordo... – Malfoy parecia bem preocupado.
- Vai levá-lo ao mestre? – Perguntou Lestrange, soando um tanto imbecil.
- Você os está usando, Seboso? Assim como fez com Regulus e Crouch? E Aberforth também? Trouxe-os para executarem o serviço sujo por você?
- Quietos os dois! E você, Potter, se não quiser que Weasley conheça a mesma morte de seus pais, pare de tagarelar! – Agora Snape já mostrava sinais de descontrole, e Harry quase vibrou quando, pela periferia de sua visão, vislumbrou a varinha de Moody, que estivera perto de si, desaparecendo repentinamente, para ressurgir dois metros adiante, próxima a Ron. – Hermione!
Lupin, que não perdia um só movimento de Malfoy, aguardando qualquer chance de soltar-se e partir em ajuda a Harry, também pressentiu a invisível movimentação, e rezou para que Hermione continuasse com cuidado, pois a varinha de Snape ainda apontava para Harry, e isto significava grande perigo. O rapaz, entretanto, continuou provocando, atraindo para si a atenção total dos três comensais, fornecendo a Hermione a chance de agir despercebida.
- O que prometeu aos dois otários? Salvação dos desmandos de Voldemort? Maior poder? Não avisou que a presença deles aqui significa sentença de morte?
Lestrange pregou os olhos em Harry, desligando-se de Ron, que aproveitou-se para prender a varinha sob um dos pés, escondendo-a .
- Do que ele está falando Snape? – Quis saber o marido de Bellatrix, enquanto Malfoy bufava, furioso. Lupin susteve a custo um movimento de surpresa nesse momento, pois sentiu uma varinha ser posta entre suas mãos, presas às costas, enquanto as cordas à sua volta e a mordaça soltavam-se lentamente, sem cair, entretanto. Sorriu discretamente para o vazio, sabendo que sua brilhante ex aluna andava por ali. Agora era esperar uma boa oportunidade. Concentrou-se em Harry, desejando que ele tivesse frieza suficiente para lidar com Snape...
- Não contou a eles sobre sua traição, anos atrás? Vocês realmente não sabem porque era tão urgente calar Aberforth? Lucius, Lucius, sua moral com Tom já não é das melhores, e você ainda desanda até aqui para ajudar o velho Seboso a esconder sua mancada?...
- Quieto Potter! Quieto! – A varinha de Snape girou e permaneceu apontada para Ron, e Harry realmente calou-se, sensatamente. Mas a intriga já havia se espalhado...
- Esclareça Snape! Não basta apenas mandá-lo calar-se! Viemos aqui atrás de Aberforth, porque você prometeu interceder junto à Lord Voldemort a meu favor e de Bellatrix se o ajudássemos. Agora o fedelho aqui o acusa de nos usar, colocando-nos de alguma forma ainda em pior situação diante do Lord Negro...
- Se você mantiver essa língua dentro da boca, Malfoy, logo entenderá. O que oferecerei a vocês é muito mais do que alívio nos castigos de Voldemort, e sim a oportunidade de verem-se livres de uma vez de seu comando e controle. Você também Lestrange, você e Bella. – Os dois bruxos silenciaram, os olhos brilhando calculistas. - Quanto a você, Potter, se esquecer por um momento a sua sede de vingar ao tolo Dumbledore, também tenho algo valioso a lhe oferecer...
- Nada que venha de você é valioso, Seboso. E eu vingarei Dumbledore sim, não tenha dúvidas.
- Não quer a localização de mais um dos Horcruxes de Voldemort, Potter?
Harry prendeu o fôlego. Por essa não esperava... Malfoy e Lestrange continuavam totalmente absortos na conversa, e Harry percebeu, mesmo sem desviar os olhos de Snape, Ron curvar os joelhos, pronto a abaixar-se para apanhar a varinha. Perguntou, com voz insolente.
- Por que me daria essa informação?
- Por causa do juramento inquebrável que fiz a Dumbledore de ajudá-lo a exterminar Voldemort. Ele me obriga a contar-lhe o que sei sobre os fragmentos da alma de Tom Riddle. Pois bem... Eu havia descoberto apenas um dos Horcruxes, apenas o medalhão na caverna, quando ocorreu aquele incidente em que você quase derrotou ao Lord. Depois de sua volta, Voldemort passou a esconder tudo de todos, inclusive de mim... Por muito tempo pesquisei e investiguei, sem muitos resultados. Mas agora, Voldemort deixou escapar que...
- Riddle não confia em você, Seboso! Nenhuma informação que ele lhe deu ou dá é confiável. E é um conforto saber que seu eu não acabar com a sua raça, ele com certeza o fará, cedo ou tarde...
- É aí que se engana, Potter! A minha informação é segura e verdadeira! Pensa que viemos aqui apenas atrás do velhote ou de sua preciosa pessoa? O próprio Lord Negro nos envia com freqüência para cá, para que sondemos o terreno. Ele precisa entrar em...
- Eu sabia que você fazia jogo duplo! – Rugiu Malfoy, triunfante, sem conseguir se conter por mais tempo. – Bella sempre alertou ao Lord... E o que diabos são esses Horcruxes de que falam?
- Cale-se, pela última vez, cale-se Malfoy! Eu não faço ou fiz jogo duplo. Sempre joguei apenas para mim! E se vocês são um pouco mais que obtusos, me ajudarão e sairão em vantagem...
- Claro! – Vociferou Harry. - Para Dumbledore você era um heróico espião perto de Tom Riddle, para Tom, era um comensal fiel infiltrado em Hogwarts. Esperou por anos o momento único em que Dumbledore estava fraco e doente, atingido pela sua poção, e enquanto ele suplicava por ajuda matou-o a sangue frio. Agora, me ajuda a eliminar Tom Riddle, para não ter concorrência em sua maldade... Mortos os dois bruxos mais poderosos desses tempos, o poder sobraria para o velho Seboso, não é isso?
- Ah, Potter... Você realmente acha que foi pela própria vida que Dumbledore suplicou? – Snape quase sussurrava, repleto de ironia. – Não, heroizinho... Ele suplicou para que eu salvasse VOCÊ! E foi o que eu fiz... pensando na destruição futura de Voldemort, que você tão prestativamente assumiu como seu encargo, é claro!
Harry empalideceu, e algo muito amargo e quente subiu de seu estômago para a garganta. Snape continuou.
- O velho sabia que estava morrendo... E a única coisa que tinha na mente era garantir a sua salvação, Potter... Minha única culpa ali foi abreviar um pouco sua partida, para cumprir com o juramento que fiz à Narcissa e ... ganhar um pouco mais de confiança da parte de Voldemort. Quanto a eliminá-los... realmente, é algo que eu sempre almejei. Embora não tenha a veia homicida de Voldemort, mato quem e quando for necessário. Talvez com a sua exceção, Potter. Você eu faço questão de mandar futuramente para o inferno, de encontro ao seus queridos pais, por puro prazer...
Nesse instante, uma tábua do velho assoalho de madeira estalou atrás de Snape, e ele olhou para trás, desconfiado. Num gesto rápido, levou a mão a frente e trouxe-a de volta, trazendo junto um punhado do tecido acetinado da capa de invisibilidade de Harry, descortinando diante de todos a imagem de Hermione. Harry não esperou mais. Seu feitiço atingiu Snape com força, jogando de encontro à parede e dando a oportunidade de Hermione se jogar para trás do comprido balcão. Ron, que alcançara a varinha sob seu pé, livrou-se da mordaça e distribuiu feitiços, iniciando um equilibrado duelo com Lestrange, as azarações trocadas e desviadas entre ambos estilhaçando cadeiras e mesas ao redor.
Malfoy voltou-se, pronto a atacar Harry, mas Lupin livrou-se das cordas rapidamente e encostou a varinha em suas costelas, ameaçando baixinho.
- Um movimento e irá rezar para ter o mesmo fim de Draco!
Snape tinha se recuperado e se protegia dos feitiços cada vez mais fortes de Harry, sem no entanto atacar.
- Não seja tolo, Potter. Você não precisa morrer agora... – Pulou para perto do atordoado Olho Tonto. – Mas ele ...– Encostou sua varinha na nuca de Moody, e Harry suspendeu o ataque. Lupin, que estava prestes a estuporar Malfoy, também estacou. Ron e Lestrange continuaram seu duelo.
- Seu rato de esgoto miserável! Atacando bruxos indefesos, sempre!...
Snape olhou para onde Lupin subjugava Malfoy e comandou:
- Entregue sua varinha à Malfoy, lobisomem! Agora! Lestrange, acabe logo com ele!
Antes que qualquer um obedecesse, Hermione saltou de trás do balcão e disparou contra Snape, que conseguiu desviar-se do feitiço. A azaração de Hermione acabou acertando Lestrange, que tombou de bruços, fora de combate. Malfoy atingiu seu captor com uma cotovelada, antes de jogar-se para a frente e conseguir afastar-se, aproveitando-se da preocupação de Lupin com Hermione. O ex lobisomem partiu em seu encalço. Enquanto isso, a varinha de Snape girou em direção à garota, e ele soltou uma curta e seca risada, antes de anunciar:
- É a última vez que se mete onde não é chamada, sangue ruim...
Harry e Ron gritaram ao mesmo tempo:
- NÃÃÃÃÃÃOOOOOO!
Harry, mais próximo, saltou na frente de Hermione, que jogou-se de lado. Embora conseguisse lançar seu feitiço contra o bruxo, que cambaleou apesar do escudo que conjurara, Harry não conseguiu desviar do ataque de Snape. Sentiu o corpo ser jogado longe, caindo pesadamente sob uma das mesas em lascas. A madeira pontiaguda rasgou sua carne até as costelas, e a dor foi tamanha que cegou seus olhos. Sentiu gosto de sangue quente na boca, e pode adivinhar que a estaca rompera o tecido de seus pulmões. Na confusão de dor, sons e cores que seguiu-se, ele escutou duas maldições equivalentes sendo lançadas.
- AVADA KEDAVRA!
Ambas atingiram o mesmo alvo , mas apenas a que o alcançou pelas costas foi eficiente. O corpo de Severus Snape ainda ficou parado por um instante, a varinha erguida sobre a cabeça, o braço e a boca prontos para desferir o golpe final em Harry. Depois desabou lentamente diante dos olhos surpresos de todos e do semblante pálido e repugnado de Ron, responsável por umas das maldições. Harry olhou para os lados de onde a segunda e definitiva maldição partira, e mesmo sentindo a inconsciência chegar, enquanto a dor e a hemorragia aumentavam a cada golpe de respiração, ainda conseguiu divisar a mão que reluzia prateada na escuridão, e que segurava uma varinha. Seu dono, um bruxo baixo e atarracado, resmungou apressadamente para Harry.
- Estamos quites, Potter! – E antes da frase soar até o fim, Rabicho já havia desaparecido novamente. E com ele se foi, como se absorvido por sua varinha, o desacordado Lestrange.
- Harry! – As últimas coisas que pôde assimilar foram passos aproximando-se rápidos, e dois olhares conhecidos, cheios de medo, sobre si. Fechou os olhos, respirando raso, e sentiu a mente esvair-se junto com seu sangue...
Lupin correu atrás de Malfoy até a rua, sempre cuidando para que ele não pudesse aparatar e desviando das maldições que o comensal lançava por sobre o ombro. Já no meio da rua calçada por pedras, Malfoy voltou-se para enfrentá-lo. Os instintos de lobisomem, ainda presentes em Lupin, farejaram o golpe baixo que se apresentava, e ele não se enganou. Lucius não mirou seu perseguidor, e sim uma casa próxima, onde provavelmente bruxos dormiam pacificamente, alheios ao que se desenrolava tão próximo às suas paredes. Ou Lupin ajudava aos inocentes adormecidos, ou perseguia o astuto e indigno comensal. Com expressão cheia de maldade e satisfação, Malfoy sibilou, mirando a porta da casa.
- Incêndio!
Entretanto, antes que a língua de fogo disparada pelo comensal chegasse até seu alvo, o feitiço lançado silenciosamente por Lupin o atingiu em cheio.
- “Glacius!”
Numa sucessão rápida de estalos, da cabeça para os pés e sem chances de resistência, a pele de Lucius Malfoy esticou-se e enrijeceu, ganhando o aspecto e textura de um grande bloco de gelo. A labareda de fogo destinada à adormecida casa teve o mesmo fim. O antes presunçoso e repleto de orgulho Lucius Malfoy ficou ali, a carne transformada em gelo, o rosto congelado ainda com a expressão triunfalmente maligna, precariamente acomodado sobre as pedras irregulares.
Antes que Lupin avançasse o suficiente para segurá-lo, uma rajada mais forte de brisa noturna agitou as folhas das árvores, e dançou em círculos pelo perímetro da praça, atingindo a recente estátua gelada, desequilibrando-a de vez e levando-a ao chão. Lupin assistiu ao corpo de Malfoy chocar-se com o solo, e transformar-se em milhares de pequenos cubos de gelo, que rolaram pelas pedras ,espalhando-se pelo chão irregular da rua de Hogsmead.
Remo ficou por algum tempo encarando os brilhantes pedaços de Malfoy que se alojaram sobre seus sapatos, abismado. Porém, o alto e aflito chamado por ajuda de Hermione o tirou de seu assombro. Varrendo o destino de Malfoy dos pensamentos, correu de volta para o Cabeça de Javali. Lá encontrou Ron ajoelhado, soerguendo um desfalecido Harry, mantendo as costas feridas do amigo longe do chão. Apavorado com a palidez mortal de Harry, Lupin registrou a grande mancha de sangue que circundava os dois jovens. Hermione, um pouco adiante, ajudava Moody a erguer-se, ambos quase tão pálidos quanto Harry.
- Temos que levá-lo para Pomfrey, já. – Disparou baixo Alastor Moody, tentando segurar seu olho estraçalhado na órbita, apoiado na única perna que restara. Hermione concordou e depois ergueu os grandes olhos cheios de lágrimas para Lupin, e sem palavras, mostrou os cantos da sala.
- Ah, não! – Sussurrou, contrariado. A noite terminava mal... Harry parecia seriamente ferido, e Severus Snape havia desaparecido, sem deixar vestígios.
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