Capítulo 2
O conde Granger não gostava de mudanças, principalmente em sua própria casa. Não gostava de ver até o corredor menos usado iluminado como o dia no meio da noite e inúmeros criados extras executando em alvoroço suas tarefas sem fim.
Sentia-se exposto à luz. As cicatrizes em seu rosto tornavam-se mais visíveis e era impossível ocultar sua compleição gigante. Mesmo trajando as melhores roupas, percebia a repulsa no olhar da sociedade, que o fazia sentir-se mais besta do que homem. Não que ligasse a mínima para a opinião dos outros a seu respeito, mas havia algumas poucas pessoas a quem lamentava afligir com sua feiúra e hospedá-las em sua mansão por vários meses era-lhe extremamente desagradável. Toda vez que lady Isabelle o fitava com aquele olhar firme, tinha vontade de cobrir o rosto com a mão. Tratava-se da única pessoa capaz de fazê-lo desejar ser alguém diferente do que era.
Abandonara o lar aos catorze anos e voltara só para o enterro do irmão. Durante os anos de afastamento, recebera notícias da família, incluindo a do casamento de George, mas nunca vira lady Isabelle antes daquele dia. Junto ao túmulo, vira uma mulher tão perfeita que, chocado, seus joelhos quase cederam. Estava lançado o feitiço e, desde então, toda vez que a via a paixão o devastava. Agora, contemplando-a junto ao fogo da lareira, com a cabeça recostada na cadeira estofada e os olhos languidamente fechados, mantinha-se na sombra, o coração mais errático do que diante dos espetáculos que sua amante e outras mulheres promoviam para seu prazer. Em seu descanso descontraído, Isabelle acalentava uma força maior do que a de uma avalanche.
- Divertiram-se, então? - indagou ele, desejando sentir-se mais à vontade com ela, achegando-se para conversar, como qualquer homem faria. - Hermione parecia satisfeita.
Isabelle abriu os olhos.
- Acho que sim. Fiquei tão aliviada quanto ela finalmente foi dançar. Cheguei a pensar que a noite seria um completo desastre. - Pensativa, continuou - Não foi o que ela esperava, assim como sabíamos que não seria, mas ela se mostrou tão feliz depois. Dançar a primeira valsa com o homem mais bonito do salão deve ter correspondido aos sonhos que ela vive me contando. - Adotou uma expressão conhecedora. - Como os sonhos de toda moça, imagino. Só gostaria que você os tivesse visto juntos, Richard. Formaram um lindo casal, e Hermione dançou com perfeição. Você teria ficado orgulhoso.
- Sempre me orgulho de Hermione - retrucou ele, tomando um gole de seu uísque. - Harry observou a etiqueta?
- Oh, sim, fez tudo o que se espera de um jovem cavalheiro, perfeito em todos os detalhes. Duvido de que alguma moça no Almack's não tenha se corroído de inveja quando ele convidou Hermione, e somente a ela, para valsar.
Rijo, Richard notou um certo fastio na voz da cunhada.
- Não gostou dele, Isabel?
- De forma alguma, Richard. Mal conheço o rapaz, como poderia desaprová-lo? Mas fico preocupada com Hermione. Não quero parecer pessimista, mas sei que vai entender o que vou dizer, eu quase gostaria que tudo houvesse se acabado esta noite mesmo, em vez de dar a ela um motivo de esperança. Mesmo que lorde Potter cumpra a promessa de levá-la para passear, temo que ela se magoe, talvez já no próximo evento social. Nenhum cavalheiro apresentado a ela convidou-a para dançar antes dele. Mas aí ela ficou com tanto medo de dançar com ele que tive de obrigá-la.
- Acho que ela se saiu bem da experiência. - A cunhada inclinou-se para a frente.
- Sim, mas...
- Temos de dar-lhe essa chance, Isabel - argumentou Richard, firme. - Nós a alertamos e ela não quis ouvir, mas a experiência é a melhor tutora. Agora ela já sabe o que vai enfrentar e pode decidir entre seguir adiante ou voltar para casa. Hermione não é fraca, nem covarde. Se fosse, eu nunca a teria deixado sair de Granger Hall.
Lady Isabelle encarou-o com aquela expressão zangada que sempre lhe provocava o desejo de beijá-la torridamente.
- Hermione não é você, Richard. Não é nem parecida. É uma moça ingênua, despreparada. Não sairia intacta das experiências que você viveu.
Richard não conseguiu suprimir o riso.
- Minha cara lady Isabelle, é impossível comparar uma temporada na sociedade com um período de quinze anos na companhia de piratas, ladrões e assassinos. Reconheço que há semelhanças entre os personagens principais, mas ao menos Hermione não tem que se preocupar com a possibilidade de a sra. Drummond-Burrell enterrar-lhe uma adaga entre os ombros se não fizer direito uma reverência.
- Palavras e atitudes podem ferir tanto quanto um ataque físico, Richard. Talvez ainda mais partindo de uma pessoa como a sra. Drummond-Burrell.
- A sra. Drummond-Burrell ataca Hermione por sua própria conta e risco - lembrou Richard. - Não precisa se preocupar com isso.
Lady Isabelle não se conformava.
- Então, vamos deixar Hermione ir em frente até que aconteça um desastre? A humilhação desta noite não bastou? Vamos deixar que continue até que a sociedade a ponha de joelhos?
Richard nutria uma paixão violenta por Isabelle desde que pusera os olhos nela pela primeira vez, mas, em momentos como aquele, quando ela cedia ao tempestuoso gênio irlandês, não conseguia pensar em nada além de levá-la para a cama e fazer amor com ela. Quão gloriosa não seria a visão de seus cabelos loiros soltos em contraste com a pureza dos lençóis brancos.
- A sociedade não fará Hermione se ajoelhar - garantiu. Saindo da sombra, foi pousar o copo numa mesinha. - Eu não permitirei.
Lady Isabelle levantou-se teimosa.
- Meu senhor, reconheço seu imenso poder, mas nem o senhor pode fazer toda a sociedade obedecê-lo.
- Não é preciso que toda a sociedade o faça. Bastam alguns de seus membros. Mas você está certa. Apesar do que posso fazer para facilitar as coisas, Hermione terá de encontrar seu próprio caminho. Eu não queria que ela viesse para Londres tanto quanto você, mas não podíamos mantê-la enterrada em Somerset contra a vontade.
- Ela não estava enterrada - protestou a cunhada. - Lá ela tem amigos que a amam e respeitam, e dias cheios de atividades que ela adora. Ela tem uma vida plena e feliz.
- Mas nada que a impeça de sonhar com Londres - observou ele.
Ela soltou um longo suspiro, evidentemente convencida. Quando se aproximou, ele mal pôde ouvi-la, tão intenso era o rufar de seu próprio coração nos ouvidos.
- Sei que está certo, Richard. Só gostaria de conseguir não me preocupar mais com isso. Há séculos discutimos sobre Hermione. - Isabel sorriu, mais descontraída. - Lembra-se de como brigávamos por causa dela?
- Jamais esquecerei. - Richard riu. - As únicas vezes em que senti medo de verdade foi ao ouvir sua convocação: "Meu senhor, temos de conversar".
Haviam discutido inúmeras vezes sobre Hermione, principalmente no início, à chegada dele a Granger Hall após uma ausência de quinze anos. Além de assumir os títulos e propriedades da família, vira-se diante de uma garotinha pálida e calada, a irmã por quem a mãe morrera ao dar à luz. Embora sua mudez se devesse a um incidente infeliz em tenra idade, ela crescera aos cuidados dos criados, tratada pela família como uma idiota de nascença. Mas ele adivinhara, ao fitar os olhinhos castanhos fulgurantes, que uma mente muito inteligente se escondia atrás daquele silêncio.
Já Hermione, diante do corpulento irmão mais velho com seu rosto cheio de cicatrizes, dera um sorriso tão encantador que conseguira tocar o coração inexpugnável, e Richard viu evaporar-se sua intenção de vender tudo o que herdara e retornar à vida de aventuras. Continuava odiando a nobreza por sua hipocrisia, bem como tudo o que se relacionava ao nome Granger, mas talvez ele e Hermione conseguissem realizar algo a partir dos destroços que haviam herdado dos ancestrais. Podiam ao menos tentar.
Isabelle contribuiu ao mudar-se para Granger Hall com Luna a fim de cuidar da casa e da pequena cunhada. E passaram os dois a discutir sobre tudo, desde os diagnósticos médicos quanto à mudez de Hermione, até os professores e métodos que poderiam beneficiá-la. Quando não discutiam entre si, discutiam com os médicos e professores.
- Sou tão amedrontadora assim? - questionou Isabel, tão próxima que ele podia sentir o calor emanando de seu corpo esguio. - Devo confessar que não confiei muito em você no início. Passei anos temendo que desaparecesse de repente, como fez na adolescência. Hermione o adorava e teria ficado desolada com o seu abandono. Foi duro quando você decidiu morar em Londres, obrigado por seus deveres como conde Granger, mas então ela já tinha idade bastante para entender.
Ele não ligava a mínima para seus deveres como conde e se regozijava imaginando os ancestrais revirando-se nos túmulos. Fora ela, Isabelle, e a tortura de vê-la todos os dias sem poder tocá-la, que o fizera sair de Granger Hall havia cinco anos.
- Visitei-as tanto quanto pude - mentiu. - Se soubesse que Hermione sentia minha falta, teria ido mais vezes.
- Oh, eu sei, Richard! - Gentil, ela apertou a mão sobre a dele na mesa. - Você é maravilhoso para Hermione, para Luna e comigo. Aprendi há muito tempo a confiar em você por completo.
Ele não conseguia falar. Mal conseguia respirar. Só sentia a delicada mão feminina sobre a sua, feia e peluda.
- Sentimos sua falta, Richard. Hermione, Luna... e eu.
O instinto apurado alertou-o de que a porta da biblioteca estava para ser aberta, de modo que libertou a mão. O mordomo entrou em seguida.
- Os cavalheiros esperados já chegaram, meu senhor. Estão no estúdio.
- Obrigado, Willis. Estarei lá num minuto. - Isabel já recolhia seus pertences.
- Vou deixá-lo para cuidar de seus negócios. Você atende em horários tão estranhos. - Deteve-se à porta. - Qualquer noite dessas, vamos jogar uma partida de xadrez. Lembra-se de quando jogávamos?
Ele aquiesceu.
- Lembro-me de que você sempre me derrotava. - Ela riu.
- A única área em que consigo vencê-lo! - Pegou na maçaneta. - Boa noite, Richard.
- Isabel - chamou ele. - Não se preocupe com Hermione. Tudo vai dar certo, eu prometo.
A cunhada o fitou séria.
- Sei que não nos acompanharia aos eventos sociais para os quais fomos convidadas, mas gostaria de lhe pedir uma coisa.
- O que quiser.
- Que dance com Hermione no baile de debutantes. Sei que já se passou muito tempo desde que tomou aulas de dança, mas consegue dançar uma música rural, não consegue? Significaria muito para ela.
Ele soltou um suspiro desolado. Se qualquer outra pessoa estivesse pedindo, negaria sem pensar duas vezes.
- Uma dança - concordou, rabugento. - Só uma!
O sorriso cálido que Isabelle lhe deu antes de sair mais que compensou seu arrependimento de ter feito a promessa.
O ar matinal estava frio demais, e os dois homens a cavalo no Hyde Park se encolheram no aconchego de suas capas.
- Espero que não se importe com o que vou dizer - declarou Rony, soltando nuvenzinhas de vapor - mas esta é a pior idéia que já teve.
- Não lhe pedi para vir junto - replicou Harry. - Nem para ficar aqui. Pode voltar para sua caminha quente, se quiser.
- E deixá-lo à mercê de duas moças criadas no campo? - desdenhou o visconde, desalentado. - Que espécie de amigo seria eu? Além disso, precisa de mim para ocupar lady Luna enquanto pede desculpas a lady Hermione. Não imagino aquela tagarela permitindo-lhe dizer mais do que bom dia, a menos que eu a distraia.
Harry sorriu.
- Você é um bom camarada, Rony, mas sou perfeitamente capaz de controlar duas moças sem a sua ajuda, obrigado.
- Talvez consiga controlar a irmã de Richard - concordou Rony - mas aposto um pônei como não consegue controlar lady Luna Lovegood, ainda que conseguisse acompanhá-la tempo suficiente para chamar-lhe a atenção, o que é improvável. - Mexendo-se na sela, contemplou o horizonte. - Ela cavalga como um demônio. Nem os pajens conseguem emparelhar-se com ela.
Harry encarou o amigo surpreso.
- Já a viu cavalgar?
Um leve rubor coloriu as belas feições do visconde.
- Ah, bem... já. Ontem. - Ante o sorriso conhecedor de Harry, explicou - Cerberus precisava se exercitar.
- A esta hora ingrata? - Harry riu. - Rony, em todos esses anos, nunca soube de um cavalo que o fizesse acordar tão cedo, ainda mais podendo mandar um cavalariço exercitá-lo. - Inclinando-se para o amigo constrangido, especulou - Está interessado em lady Luna, não está?
- Aquela grandalhona? - Rony mostrou-se indignado. - Perdeu o juízo? A simples idéia me faz estremecer.
- Eu a acho bastante charmosa - opinou Harry.
- Charme não é o que me vem à mente considerando lady Luna - resmungou Rony. - Céus, aí vem ela! Está vendo?
Harry assobiou admirado ao ver a figura de azul inclinada sobre o pescoço de um magnífico garanhão negro galopando a toda a velocidade pelo parque deserto.
- O que foi que eu disse? - Zangado, Rony puxou as rédeas de sua montaria. - Essa louca ainda vai quebrar o pescoço!
- Ela é maravilhosa! - elogiou Harry. - Que porte... deve ter nascido numa sela.
- Porte... Ela precisa é de umas boas palmadas. Oh, não... ela vai pular aquela cerca!
Espantado, Harry viu o amigo disparar na direção da moça com a óbvia intenção de salvá-la do perigo. Um esforço inútil, pois lady Luna era uma amazona habilidosa. Olhando para o local de onde ela viera, avistou lady Hermione, seguida por dois pajens, trotando num ritmo mais tranquilo. Ela já o vira e agora o olhava cautelosa, sem saber se devia prosseguir ou retornar,
- Lady Hermione - cumprimentou ele, quando se viram próximos - que feliz encontro. Bom dia.
Céus, pensou ele, estudando-lhe a beleza com novos olhos. Era estonteantemente bonita. O traje de montaria branco destacava seus cabelos dourados e os olhos castanhos. Uma beleza assim com certeza encantaria qualquer cavalheiro normal, enquanto que as damas da sociedade... bem, algumas talvez fossem sentir muita inveja. Percebeu então que ambos permaneciam em silêncio, expressando algo entre cautela e embaraço. De repente, ela ergueu uma das mãos para o punho, como se fosse pegar algo... a luva, ou, talvez, uma pulseira, mas então se deteve, mordiscando o lábio inferior com evidente pesar.
Confuso, Harry deu um sorriso exagerado e falou um pouco alto demais.
- Que feliz coincidência encontrá-la aqui!
Vendo o espanto nos olhos dela, ele recordou que já dissera algo semelhante. Até aquele momento, nunca se dera conta do quanto dependia das mulheres para entabular uma conversa.
Ele ia falar de novo, nem tinha idéia do que, quando ela ergueu a mão enluvada e tocou os lábios com o dedo indicador. Hesitante e muito corada, apontou para ele, depois para umas flores sob uma árvore próxima e, então, para si mesma. Apertando a mão aberta sobre o seio esquerdo, baixou ligeiramente a cabeça, numa mesura.
- Oh... sim - murmurou Harry. Não entendera absolutamente nada e a sensação era horrível.
Extremamente embaraçada, ela respirou fundo e repetiu os movimentos, apontando primeiro para ele, depois para as flores e então para si mesma. Ao final, ele de repente entendeu.
- As flores que mandei! - exclamou. - Gostou delas? - Ao vê-la confirmar, riu, aliviado. - Fico feliz que tenham lhe dado prazer.
Ela colocou a mão sobre o coração e fez a pequena mesura novamente.
- De nada - retrucou ele.
O sorriso dela o estonteou, como na pista de dança do Almack's, e ele se sentiu seguro. Talvez a experiência não fosse tão má quanto imaginara.
- Tenho uma confissão a fazer - declarou ele, e ela demonstrou interesse. - Não foi por acaso que nos encontramos aqui esta manhã. Soube que a senhorita e lady Luna cavalgam neste parque todos os dias a esta hora e vim esperando encontrá-la. - Viu-a expressar cautela e surpresa. - Eu lhe devo um pedido de desculpas por meu comportamento no Almack's outra noite e queria fazê-lo sem ninguém mais presente. Tive receio de que ficasse ainda mais constrangida se eu expressasse meus sentimentos ante outras pessoas.
Ela franziu o cenho, como se não o compreendesse; então, apontando para ele, balançou a cabeça negativamente.
- Não? - questionou ele. - Eu não a teria constrangido?
Hermione riu em silêncio e balançou a cabeça de novo, deixando claro que ele não entendera. Após pensar um pouco, largou as rédeas no colo e ergueu as duas mãos, convidando-o a juntar-se a ela em seu mundo de símbolos silenciosos. Harry aquiesceu e preparou-se para analisar o que ela faria.
Entrelaçando os dedos indicadores, ela deslocou as mãos em movimentos circulares.
- Dançar? - arriscou Harry, e ela confirmou. - Nós... dançando?
Ela concordou e expressou a palavra Almack's.
- Ah, no Almack's! Entendo.
Lady Hermione baixou um dos indicadores, deixando o outro só. Com uma tristeza exagerada, apontou para si mesma e suspirou. O indicador solitário vacilou para um lado e como que se sentou, concluiu Harry.
- Você ficou sozinha lá no Almack's, enquanto os outros dançavam? - interpretou ele.
Ela confirmou e soltou outro suspiro enfático. Virando a cabeça de repente, expressou surpresa ao ver o outro indicador, que mantivera aprumado a certa distância da outra mão, e engoliu em seco. Quando Harry começou a rir, mostrou-se severa e apontou para ele o indicador aprumado.
- Esse sou eu, correto?
Hermione confirmou muito séria antes de adotar uma expressão surpresa, o indicador aprumado atravessando o ar rumo ao triste indicador sentado. O dedo aprumado fez uma mesura polida, ao que o dedo sentado reagiu tímido e relutante, tudo habilmente transmitido por meio das expressões faciais e movimentos das mãos.
Fascinado, Harry assistiu aos dois dedos representarem com precisão o encontro de ambos no Almack's. Não conseguia deixar de olhar para o rosto expressivo de lady Hermione, que alternava rápida e facilmente as emoções dos dois personagens no teatro simples. Ela o tratava melhor do que ele merecia, seu personagem um nobre de estóico comportamento cavalheiresco. Ao sair do imaginário Almack's, o dedo aprumado conseguira transformar o triste dedinho sentado numa moça feliz. Baixando as mãos, o rosto enrubescido, lady Hermione quis saber se ele compreendera.
- Meu pedido de desculpas não é necessário, então? – arriscou Harry.
Com evidente alívio, ela confirmou movendo a cabeça.
- É muito gentil, lady Hermione. Eu receava que meu comportamento indecoroso a houvesse constrangido, ou dado uma impressão errada. É verdade que não percebi que era muda até estarmos dançando, mas garanto que meu embaraço não se referiu de forma alguma à senhora. Foi uma parceira agradabilíssima. Espero sinceramente que me brinde com muitos outros momentos como aquele durante sua estada em Londres.
Ainda mais rubra, lady Hermione expressou uma mistura de embaraço e prazer que encantou Harry, então, vozes zangadas anunciaram a aproximação de Luna e Rony.
- Meu senhor - disse Luna a Harry, sem esperar a saudação - pode pedir a esse seu amigo cabeça-dura que me devolva o controle de meu cavalo? - Percebendo que se esquecera de algo, cumprimentou - Bom dia.
- Bom dia, minha senhora - respondeu Harry, reparando que o amigo tinha mesmo nas mãos as rédeas da montaria da moça. - Anda roubando cavalos agora, meu senhor? - brincou.
Rony lançou-lhe um olhar abrasador.
- Uma mulher que cavalga como lady Luna não devia nem chegar perto de um cavalo!
Luna cerrou os punhos dentro das luvas.
- Seu ignorante, invejoso...
- Invejoso?!
- ...e idiota! - completou Luna, puxando as rédeas, mas sem consegui-las de volta. - Está bravo só porque não consegue me acompanhar! É inveja!
- Poderia baixar seu tom de voz? - gritou Rony. - Está agitando os cavalos. Imagino que esteja além da sua capacidade agir como uma dama, mas podia ao menos se esforçar para falar como uma!
Harry limpou a garganta.
- É... parece-me que é você quem está falando mais alto do que deveria, meu caro - repreendeu. - Não acha melhor devolver a lady Luna as rédeas de sua montaria? Pelo que pude ver, é uma excelente amazona e não precisa de cuidados.
- Obrigada, meu senhor. - Orgulhosa, Luna fitou Rony com desprezo. O rapaz injuriado endureceu o semblante.
- Não que eu me importasse se essa maluca quebrasse o pescoço, mas imagino se não seria bom escoltá-la até Wilborn Place e ter uma palavra com lorde Richard, alertando-o quanto ao comportamento indômito da sobrinha.
- Experimente! - desafiou Luna. - Saiba que foi meu tio quem me ensinou a montar.
Rony era puro mau humor agora.
- Isso não me surpreende. A senhora monta mesmo como a filha do demônio. Ou a sobrinha. Se dependesse de mim...
- Lamento, lorde Weasley - interrompeu Luna, por fim arrebatando as rédeas de seu cavalo - mas não depende do senhor. Gostaria de voltar para casa agora, Hermione.
Hermione respondeu com vários movimentos de mãos, rápidos demais para Harry entender.
- Pedir desculpas? - contestou Luna, sem a menor dificuldade para compreender os sinais da jovem tia. - Jamais!
Rony expressou desdém.
- Provavelmente nem sabe fazê-lo. - Luna paralisou-o com um olhar inflamado.
- Se lorde Weasley foi insultado e exige reparação, que me desafie a uma corrida e constate por si só quem monta melhor.
Hermione executou mais movimentos de mãos sob o olhar fascinado de Harry. Era sua maneira de falar, concluiu ele, mas tão fluida, tão rápida... como o bater de asas dos pássaros. Como lady Luna conseguia interpretar?
- Nós somos do campo, Hermione - replicou Luna, brava - e se lorde Weasley vê nisso motivo para provocação, não é um cavalheiro como lorde Potter. - Agraciou Harry com um sorriso arrebatador. - Se devo pedir desculpas, é a ele, por fazê-lo suportar uma cena tão deplorável. Lamento sinceramente, meu senhor.
- Por favor, não se preocupe com isso, lady Luna - replicou Harry. - Tento me divertir com os ataques de lorde Weasley, tal a frequência com que ocorrem.
- Sábia atitude - declarou Luna, enquanto Rony fazia uma careta para o amigo.
- Não vamos mais retê-las - finalizou Harry, sorrindo para as duas damas. - Se for conveniente, aceitariam meu convite para um passeio esta tarde? Seria uma honra mostrar-lhes parte de Londres.
Com um entusiasmo que Harry achou comovente e divertido, Hermone e Luna aceitaram.
Tão logo se afastaram das moças, Rony protestou:
- Ataques? Meus ataques frequentes? - Harry deu de ombros.
- Não sei descrever de outra forma sua perseguição a uma moça satisfeita que mantém sua montaria sob perfeito controle, como se ela fosse uma criança desmiolada. Francamente, Rony, você me espanta. Por que simplesmente não agarra lady Luna pelos cabelos e a arrasta pelo parque como um homem das cavernas?
Rony se aprumou na sela.
- Prefiro não falar mais dessa mulher, por gentileza. Nunca vi pessoa mais detestável em toda a minha vida. Todos em Londres vão estar cheios dela ao final da estação, escreva o que digo. E você fez algum progresso com lady Hermione?
Harry aquiesceu.
- Acho que vamos nos entender bem. É uma moça encantadora, e consegue fazer-se entender melhor do que eu esperava. Sua educação foi boa o bastante para dar-lhe confiança para se expressar. - Refletiu um pouco. - Talvez consiga a ajuda da srta. Patil nesse caso. Ela sempre se mostrou solidária para com os menos afortunados e vai simpatizar com lady Hermione. Não tenho dúvida de que tudo vai dar certo.
Rony aprovou a idéia.
- Com a srta. Patil como aliada, ninguém se atreverá a ser grosseiro. Mas o que vai dizer a ela?
- Ela já sabe que fui incumbido de introduzir na sociedade duas moças do interior. Não precisei dizer mais nada, mas é uma alma tão bondosa que não as desprezaria nem que soubesse de toda a verdade.
- Não, não conte! - advertiu Rony. - Detestaria passar os próximos dez anos visitando-o na prisão. E duvido de que a srta. Patil fosse gostar do programa.
Harry gargalhou alto.
- Não pretendo dar a Richard motivo de desgosto. Nada tema, Rony. Lady Hermione irá se divertir nesta temporada em Londres. Vou me dedicar a isso de corpo e alma.
- Pode ser mais difícil do que imaginei a princípio - alertou Rony. - Não entendi nada daquela linguagem de mãos dela. Lembra um truque de mágica.
- Nem eu, mas antes de você e lady Luna chegarem, ela usou uma outra forma de comunicação muito interessante. Se eu conseguir convencê-la a usá-la com os outros, ela irá conquistar até os membros mais impiedosos da sociedade.
- Você parece bem mais confiante do que antes de ontem após o baile.
- E estou. Tudo o que preciso fazer é levá-la a reuniões sociais e apresentar-lhe as pessoas certas. Sua beleza e o poder de Richard se encarregarão de garantir seu lugar na sociedade.
- Espero que sim, meu amigo.
- Eu também. Com todas as minhas forças.
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N/a: Isso ai, mais um capítulo postado, espero mesmo que vocês tenham curtido, e claro, agradeço a todos os comentários, adorei eles de verdade, e vou ficar aguardando que vocês continuem a comentar.
Bom, nada a dizer sobre o capítulo, quando eu tiver com menos preguiça eu comento sobre a história. Além disso tenho pouco tempo, então eu deixo todo o trabalho de comentário aos leitores XP
Até o próximo capítulo pessoas.
beijos.
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