Campo de força
Campo de Força
Por Anne Haze Granger
Ginny viu-se suja e maltrapilha. A guerra trazia desses prejuízos.Tomava-lhe todo o tempo e ela estava cansada. Precisava dormir.
Já não agüentava lutar em vão. Sentou onde estava. Aquele monte de lixo não a incomodava. O que incomodava era o medo da morte que pairava. Queria sumir por alguns segundos. Tirou, por desencargo de consciência, a moeda da ordem do bolso. Indicava que ela deveria ir para a sede. Ela não queria. Não estava com vontade de ver Harry ou Rony ou Hermione agarrada com Draco Malfoy. Queria dormir. Puxou o ar com toda a força e sentiu uma lágrima descendo. Expirou. Levantou-se devagar. Nem ter visto uma flor pelo caminho a alegrou. Matou-a sem dó. O lírio branco jazia ao lado de um gato que talvez dormisse, talvez tivesse sido atingido por algum feitiço de comensal sem dó.
Andou mais umas duas quadras. O salto da bota quebrou no caminho. Não era de se estranhar. Mais uma, duas, incontáveis lágrimas brotaram. A guerra mexia no fundo da alma e Ginny nem tinha em quem se amparar. Não havia tempo para sentir. Afinal, as regras eram ditadas por quem não ama, mata sem motivo aparente. Seria ela diferente disso? Sentia-se a vítima, mas tinha sido um canal. Não poderia esquecer-se disso. Nunca se esquecia de nada. Desaparatou a duas quadras da sede da ordem. Caminhando, enxugava as suas lágrimas e sentia nos ombros às que as nuvens derramavam.
Estavam todos na sala. Parecia que ela era a única atrasada. Harry olhava para baixo. Hermione, Rony e Neville andavam de um lado para o outro. Draco Malfoy ficava encostado na porta. Ginny não confiava nele, mas Hermione e Harry insistiam que ele não era Snape e que era fiel. Sentou-se sem falar com ninguém. Eles não percebiam que ela não queria nada daquilo?
Harry acenou e todos se aquietaram. Ele tinha algo a falar. Ginny ficou roendo as unhas enquanto ele fazia aquela introdução inútil. Em seguida ele começou a falar algo sobre um companheiro correndo risco. Ela começou a prestar atenção.
_Todo mundo sabe que ela é muito visada. Talvez pelo jornal, talvez pela coragem. Eu não sei. Mas a Luna anda sumida. E só você, Ginny, pode entrar na casa dela. Você é a fiel do segredo. Não sei se você se lembra. Você tem que ir lá e ver se tudo está bem. Leve Malfoy com você. _Harry concluiu, com a mão no cabelo.
“Eternamente o Malfoy”, Ginny pensou. Não gostava dele. Não gostava mesmo. Mas, se podia encontrar alguém rondando a casa de Luna, era melhor levar companhia. Sem tempo para um banho, os dois aparataram na porta da casa de Luna. Ginny bateu e ouviu de longe que podia entrar. O Malfoy se mantinha calado.
Entraram e Luna estava jogada no sofá. Os dois correram. A perna dela estava jorrando sangue. A chuva, lá fora, engrossava. Ginny se apressou em fazer um feitiço curativo. Nada adiantava. Luna estava pálida.
_Há quanto tempo está aí?_Ginny perguntou, enquanto tentava estancar o sangue da amiga.
_Umas duas horas. Consegui fugir do porão da casa do Snape hoje cedo. Tinha sido presa. Não deu pra avisar. Não entendi por que não me mataram. Tinha um cachorro no quintal. Ele era grande e tinha umas três cabeças. Eu não sei. Eu saí dali. E ele pegou a minha perna. Eu estou sem varinha. Eu corri o quanto pude e desaparatei. O ferimento piora a cada minuto. Aquele bicho deve estar enfeitiçado. Não sei. Acho que o veneno nas garras dele não é normal.
_Veneno?_ Ginny estranhou.
_Acho que sei do que se trata._ Draco, que até então estava calado, começou a falar._o cão era do meu pai. Minha mãe deve ter cedido ao Lord antes de morrer. Tenho, em casa, uma poção-antídoto. Preciso de algo escrito por você para voltar para cá, Ginny.
Ginny se levantou e foi atrás de um pedaço de pergaminho, onde escreveu uma autorização para Draco Malfoy voltar ali. Teve medo, não sabia se podia confiar nele. Não confiava. Nunca confiaria. Ele tentou matar Dumbledore. Aliás, não tentou, mas queria. E ele era um covarde. Não sabia o que ele estava fazendo na ordem da fênix. Não entregaria assim, de bom grado, aquela autorização.
_É o único jeito, Malfoy?_ Ela perguntou, séria.
_É o menos dolorido._ Ele respondeu.
_Luna, você se importa com a dor que o feitiço curativo te faça sentir?_ A ruiva disse, agressiva, com um tom elevado de voz.
_Eu preciso fechar isso rápido. Antes que eu seque, entende?_Luna segurava o ferimento e chorava de dor.
_Malfoy. Você não sai daqui até que ela esteja curada._ Ginny disse com as feições duras.
_A poção é menos dolorida e faz um efeito melhor._ Ele insistiu.
_Não adianta. Você sabe que eu não confio em você. Nem a pau. Não rola. Não confio e pronto. Foda-se o que a Hermione ou Harry digam de você. Pra mim você é como o Snape. E eu não tenho medo. Se você me matar aqui, seu trabalho de espião acaba.
_Você está fora de si._Draco tentava controlar a situação.
_Não vou deixar você envenenar a Luna e sair ileso, como se ela tivesse morrido por causa do machucado. Trate de fazer um bom feitiço. Eu não teria receio de te matar.
_Weasley._Draco passou, ansioso, a mão no cabelo._ Eu não viria aqui se fosse só um espião. Eu nem tenho mais contato com os comensais. E eu não te suporto. Inventaria uma desculpa. Diria ao Harry que a minha marca negra está ardendo. Como alguém saberia que não? Ninguém mais tem a marca.
_AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAIIIIIII_Luna gritou._Caramba! Foda-se se vocês não se gostam. Seres-humanos morrem se não tem sangue, sabiam? Faz essa porra desse feitiço, Malfoy. Não discute com ela. Não ligo pra dor. Eu tenho que viver, entende? Tenho que fazer alguma coisa contra você-sabe-quem. Tenho que continuar incomodando.
Draco virou as costas para Ginny e sussurrou algo enquanto balançava a varinha. Luna visivelmente se segurava para não gritar. Talvez ela não quisesse que a outra ficasse nervosa, se ela gritasse. Luna sabia como a sua dor incomodava à amiga. Em meia hora tinha restado apenas uma cicatriz na coxa esquerda de Luna. Malfoy era bom com feitiços. Ginny limpou todo sangue da casa. Os três ficaram parados. Ginny sentou-se no sofá, ao lado da amiga, que recostou a cabeça em seus ombros. O corpo todo de Luna doía, como a alma de Ginny. Malfoy andava de um lado para o outro. Não havia muito o que fazer, então.
_Lovegood. Amanhã você vai estar inteira. Até lá você não pode ficar sozinha. Daqui a 2 horas um feitiço pode ser feito pra sumir com essa cicatriz. Até então era bom que você ficasse deitada. Acho que eu não tenho mais o que fazer aqui. Weasley, Lovegood não pode ficar desacompanhada pelos próximos dois dias. O veneno tem chances de fazer algum efeito. No máximo vômito. Mas, é bom que Lovegood tenha quem a segure. Um de nós dois vai ter que ficar aqui. Era melhor que ficassem os dois, inclusive. Mas eu não estou com saco pra agüentar suas insinuações de ex-preferida do Potter.
_O que você está dizendo?_Ginny ergueu a própria cabeça sem prejudicar o recosto da amiga.
_Que você é insuportável. Que eu não tenho saco pra agüentar os seus caprichos e a sua desconfiança. A Hermione e o Harry têm motivos pra confiarem em mim. Eles já lidaram com Snape. Eles sabem que eu não sou um comensal. O que você pensa não é importante._ a ruiva fez menção de se levantar para falar e Luna recostou, calada, no sofá._ Cale a boca. É a minha vez de falar. Está na hora de você esquecer essa porra desse seu orgulho e encarar que existem outras pessoas que lutam contra aquele-que-não-deve-ser-nomeado. Larga de ser babaca. A Lovegood escolhe quem fica. Do seu lado eu não fico. Talvez volte pela manhã pra saber se tudo está bem. Isso se ela agüentar ficar do seu lado.
_Parem, vocês dois!_Luna voltava a usar aquela voz sonhadora de sempre._Draco, a Ginny está com cara de cansada. Creio que aqui, comigo, ela se cansará menos. Você está mais inteiro. Até mais lúcido._Ginny fez cara-feia._Se precisarem entrar em combate, creio que você se daria melhor. Eu a agüento, fique tranqüilo. Use seus dotes de animago-doninha pra combater você-sabe-quem. Promete?
_Prometo._Draco sorriu, fazendo uma reverência.
_Pode me levar para a minha cama antes de ir?
_É claro. É bom lavar a cicatriz antes de fazê-la sumir. Acho que disso a Weasley da conta._ Ginny bufou ao ouvi-lo.
Draco pegou Luna no colo e foi andando com ela até o quarto. A bruxa trajava um vestido cinza-escuro sujo de lama e rasgado. As coxas grossas estavam à mostra. Os cabelos lisos estavam pregados de suor. Ela estava imunda. Mas por algum motivo incrível não exalava um cheiro ruim. Draco posicionou-a da maneira mais confortável possível e deixou-a ali. Foi sozinho até a porta da casa de Luna, andou duas quadras e desaparatou.
Ginny sentou-se na beirada da cama. Luna tinha os olhos fechados e as pernas esticadas, conforme a orientação de Draco.
_Não precisava disso._ A loura disse baixinho.
_Eu sei, mas perdi a cabeça._ Ginny olhava longe, ao falar.
_Eu vi. Num dia normal eu até teria segurado as pontas entre vocês dois, mas... Hoje não deu, de verdade. Tudo tá doendo ainda. Essa coisa de guerra não faz bem. Tenho andado até com os pés no chão. A cada minuto uma verdade minha cai por terra. Como eu vou sonhar se tudo anda tão real?_ Lágrimas brotavam nos olhos de Luna, e Ginny lhe afagava os cabelos com as pontas dos dedos. Tocava onde podia. Sabia que não podia quase nada. Não pelas próximas duas horas.
_Se você não sonhar como vai ser?
_Não sei... Tudo anda tão confuso. Ainda não me recuperei. Faz dois dias que eu não como. Não tinha coragem de comer nada em cativeiro. E minha garganta agora dói. Tudo dói. Eu não agüento mais.
_Quem agüenta?
_Quem dita as regras disso?? É tudo tão injusto comigo. Com a gente. É desumano. Tem horas em que eu queria não ser mulher. O Harry e o Draco lidam tão melhor.
_Malfoy está muito confortável, eu diria._ Ginny deu um meio sorriso irônico depois da frase.
_Ele podia ter me matado agora.
_Eu o matava.
_Você não consegue matar.
_Se ele te matasse eu conseguiria.
_Você morreria antes.
_Não sou tão fraca assim. Não confio nele.
_Eu vi que não. Mas é besteira.
_Não é besteira.
_Ele está do nosso lado.
_Não confio!_Ginny se exaltou.
_Esquece!_ Luna gritou.
Ficou no ar um silêncio. Daqueles silêncios que incomodam e que não acabam com uma brincadeira. Fazia tempo que as duas não se encontravam e elas estavam discutindo por causa de Draco Malfoy. Ginny mordeu o lábio inferior olhando pra baixo, era tudo muito irônico. Ela estava morrendo de saudades da amiga e não a podia abraçar. Queria falar de tudo com ela. Queria relaxar e esquecer a guerra, mas o clima estava pesado. A guerra tinha culpa de tudo.
A ruiva se deitou, sem pedir permissão, na cama de Luna. Estava de frente para a amiga. Ambas estavam imundas. Olhavam-se, e riram juntas ao constatar a sujeira. Por maior que fosse o tempo de afastamento entre as duas, não importava. Para sempre se entenderiam num olhar.
O Silêncio parou de incomodar. Voltavam a ser as amigas que adolescentes discutiam sobre como salvar o mundo num misto de inocência e paixão. A diferença era que ambas estavam visivelmente tristes e cansadas. Ginny voltou a afagar os cabelos de Luna.
_Isso é muito bom, sabia?_ A loura disse, com os olhos fechados como se a única preocupação fosse relaxar e receber um afago amigo.
Ginny sorriu. Sempre gostou de todo e qualquer elogio, mas quando eles vinham de Luna, tornavam-se mais especiais. Num dia normal essa seria a hora em que ela perguntaria para a loura a quantas anda a vida dela. As duas falariam horas sobre a vida de uma amiga de Luna. Reprovariam cada atitude. Concordariam em tudo. Inventariam fofocas. Mas isso era antes. Então, continuavam deitadas uma de frente para a outra, sem se mexer.
_Eu estava com saudade de você..._Ginny disse, sorrindo.
_Eu também. Você não aparece.
_E dá tempo?
_Sei como é... Eu também não apareço muito em casa._ Luna abriu os olhos e deu um sorriso sem dentes.
_Me conta, como anda a sua vida?
_De mal a pior. Fui atacada por um bando de comensais. Não posso mexer minhas pernas. O mundo bruxo está em guerra.
_Mas e você? O que se passa na sua cabeça.
_Ando precisando de um ombro pra chorar. Ando sozinha. Parece hogwarts. Mas não é por que eu sou esquisita. Viver está me deixando louca, Ginny. Cada dia piora..._a ruiva pegou na mão da loura e começou a massageá-la.
_Eu sei como é. Faz parte da guerra. Estamos todos sós.
_E não há com quem conversar.
_Não há ombro pra chorar...
_Isso tudo vem com a guerra? Parece que é só comigo.
_Parece que é só comigo.
_É só você. Você demora a vir. Demora a me procurar. Mas entende. Parece que eu só posso demonstrar pra você que eu sou fraca. Eu sou fraca._Luna falava e lágrimas teimavam em brotar de seus olhos._ eu juro que preferia pensar que isso tudo é uma tpm coletiva. Que eu apenas sonhei que fui seqüestrada. Que tudo não passou de um pesadelo. Que aquele seboso não colocou as mãos em mim.
_Snape fez o que?
_Fez o que quis. Quebrou a minha varinha depois que eu perdi o duelo. Eu fiquei indefesa. Ele me deixou mole. Me fez tomar uma poção sob ameaça de morte e eu..._Luna começou a chorar compulsivamente. Ia com as mãos aos olhos enxugando, em vão, as muitas lágrimas que desciam. Viu-se tremer. Ginny afagava-lhe os cabelos e se aproximava como que para ninar a loura, que suspirava no contrafuxo, como criança, ou mulher.
_Quer me contar.
_Só pra você. Isso está entalado... Foi..._Soluços_ cruel. Estou suja, Gin, imunda. Estou indigna de qualquer coisa. Eu não sei como me agüentei por tanto tempo sóbria. Tem uma pedra na minha garganta. Eu estou com nojo de mim.
_Logo você vai poder tomar um banho. Falta menos de uma hora. Me conte o que houve.
_Ele... Ah... O Nojento do Snape me fez tomar uma poção que me deixou o corpo inerte. Eu ia morrer se não tomasse. Tentei cuspir. Tentei tudo. Me debati. A varinha dele estava apontada para mim. Eu senti meus dedos e pernas e mãos e braços ficarem dormentes. Perdi o total controle dos meus músculos e ossos. O Snape..._Luna soluçou alto e limpou as lágrimas._ Ele arrancou a minha roupa sem qualquer cuidado. Arrancou as próprias calças. Ficou nu na minha frente. Me colocou de quatro e me comeu. Comeu o que quis.
Luna terminou de contar e desabou, junto com Ginny, num misto de raiva, dor e nojo.
_Era como se eu fosse a bonequinha dele. Eu nunca fui boneca de ninguém, Gin.
_E não vai ser agora. Você fugiu. Está viva. Vai recuperar as forças e matar o desgraçado do Snape. Ele não consegue comer ninguém sem ser forçando.
_Eu estou suja.
_Não teve culpa.
_Fui fraca.
_Não.
_Fui pega. Fui pega de todos os jeitos._Luna chorava e falava meio cuspido de nojo._Preciso me lavar. Preciso voltar ao normal. Eu não queria. Eu não queria. Eu quero matar o Snape.
_Eu também quero._Ginny disse bem baixo.
_Preciso melhorar. Tenho que sumir com essa cicatriz. Já estou até conseguindo me mexer. Só o repouso, né? Foi o que o Malfoy disse...
_Daqui a meia hora você pode se lavar.
_Preciso de um banho agora Ginny. Se eu não conseguir sozinha, você cuida disso pra mim. Preciso me limpar. Que seja em água fervente.
Ginny entendeu o pedido da amiga. Foi até o banheiro e encheu, com um feitiço, a banheira de água. Misturou alguns sais. Com o cuidado de uma poção que valesse a vida, preparou o banho.
Voltou ao quarto, tentou levantar Luna com um feitiço. Levou-a no ar até a banheira. Ela disse não precisar mais de ajuda e a ruiva entendeu que devia deixá-la sozinha. Foi, então, até a cozinha, onde havia uma grande e aconchegante janela.
Ao longe dava pra ver algumas montanhas que pareciam pães salpicados de sal ou açúcar no topo. O sol se punha naquele instante. Não era vista pra se ver sozinha, nem pra se ver triste. Mas Ginny, como Luna, não estava em condições de dar um sorriso sincero. Devia ter percebido que a amiga não estava bem. Sentia-se sendo a pessoa mais egocêntrica do mundo. Pensava no seu banho e na sua dor e não tinha sequer imaginado que a dor de Luna ia além da física. Aquela raiva do Lord. Aquela vontade louca de incomodar. Aquele desejo de não morrer. Até a confiança no Malfoy. Tudo passava a fazer mais sentido que antes.
A imagem de Snape na mente de Ginny aparecia pintada de raiva, de nojo, de revolta, de tristeza e de ciúme. Era como se ele tivesse quebrado alguma coisa sua. Era como se Luna fizesse parte de Ginny. Tudo estava tão torto. O sol incidia diretamente nos olhos de Ginny. Talvez pela luz as lágrimas descessem mais rápido de suas pálpebras. Era melhor que fosse ali. A ruiva não podia se mostrar fraca perto da loura. Não naquele dia, não ali. A outra precisava de apoio. Precisava dela. Que laço era aquele? A imagem de Snape voltava à cabeça e Ginny sentia no sangue um impulso assassino inédito. Nem Draco Malfoy, nem Voldemort, ninguém a tinha feito sentir-se assim. Snape mexeu com o que era puro, com o que era sagrado. Entrou sem consentimento. Fez sem nem olhar nos olhos. Isso machucava mais que a pele. Feria a alma por falta de amor. Sentia uma navalha que lhe raspava toda a pele. Vinha a raiva e era como álcool sobre o corpo em carne viva. Ardia, doía, torturava. A vista do começo de noite na janela simplesmente deixou de ser importante.
Ginny caiu no chão e começou a chorar compulsivamente. A amiga não tinha culpa de nada. A que ponto chegava a imundice da guerra. Queria limpar a amiga com álcool, desinfetá-la e devolver a ela a pureza e alegria que lhe eram peculiares. Queria de volta a sua Luna Lovegood. Soltou, sem querer, um soluço alto demais e a lembrança de tudo parecia uma mão que lhe adentrava as costelas e espremia, sem dó, o coração, lutando pra pulsar, doendo sem dimensão. Voltou ao quarto de Luna. A amiga ainda não estava lá, bateu à porta do banheiro.
_Está bem?
_Entra. Preciso de você._ A voz de Luna era chorosa e Ginny não deixaria de obedecer à amiga. Luna chorava, ainda, e Ginny se ajoelhou ao lado da banheira, perto da cabeça de Luna. Colocou a cabeça da amiga em seu colo sujo. Acariciava-lhe os cabelos molhados e chorava junto com ela, desta vez silenciosamente.
_Calma. O pior já passou._A ruiva tentava consolar, falando baixinho.
_Eu vou morrer. Sabia?_ Luna se afastou um pouco da amiga, ao dizer.
_Não vai. Tudo vai dar certo. Nunca mais vai acontecer disso com você.
_Você acredita mesmo nisso?_ A loura perguntou num tom de voz mais alto e estável. Falava firme. O que antes era pranto, então fez-se silêncio. Um silêncio que durou até Luna achar que devia acabar._ Eu sabia que não. Nós duas vamos acabar morrendo nesta guerra.
_Ninguém vai te achar aqui. Eu sou fiel do seu segredo. É só você não sair de casa. Está segura.
_E você, me conhecendo, acha que eu vou abandonar a causa assim? Se eu morrer levo uns quarenta comensais comigo. E eu não sou de aço. Não tenho a pedra filosofal. Vou acabar morrendo sim.
_Não vai. A guerra acaba antes.
_Não acaba. Não precisa ser tão otimista assim. Não é o que eu estou te pedindo. Eu só quero um ombro pra chorar agora. Ou nem isso mais. Acho que já chorei o suficiente. Acho que aprendi. Não vou me deixar pegar tão fácil da próxima vez. Mas caso aconteça...
_Não vai acontecer._Ginny interrompeu.
_Me deixa terminar de falar. Antes que eu perca a coragem.
_Não precisa ter medo de falar nada pra mim.
_Ah... Se você soubesse...
_O que eu tenho que saber?
_Eu escrevi algumas cartas até... Desde Hogwarts você sempre foi tão gentil comigo. Nunca tive coragem de entregar. Mas depois de ser pega o medo vira uma coisa inerente. Cada dia de vida passa a ser realmente o último. E eu passei a me arrepender pelas coisas que eu não fiz. Coisas que eu tenho que fazer. Eu não vou esconder mais nada de você. Talvez hoje não seja hora. No entanto, eu não quero mais saber de hora, entende?
_Entendo.
_Se sempre acharam que eu sou louca. É hora de ser um pouco mais. O difícil é conseguir seguir os meus impulsos. Que por vezes me parecem tão errados... Eu não quero morrer.
_Não vai.
_Vamos sim. Vamos a qualquer minuto. Você não sabe o que é uma varinha permanentemente apontada pra você, a fim de te matar.
_Pare de drama.
_Troca a água da minha banheira, por favor._Ginny fez o feitiço que secaria a banheira e o que a encheria de água.
Luna permaneceu muda até terminar o banho, que era o mais longo de sua vida. Foi sozinha até o quarto e se sentou na cama que Ginny já tinha tido o cuidado de limpar. O Malfoy tinha razão. A perna já estava consideravelmente melhor. Talvez a alma não estivesse. Mas naquele momento não era o que importava. Falou com a amiga para ir tomar o banho dela e que depois vestisse uma roupa sua. Simplesmente não saia muito o que fazer. Estava tudo muito torto, muito confuso. As certezas caiam por terra. Mas não tinha tempo. Tinha que falar. Pegou, no armário, uma caixa de madeira um tanto empoeirada. Fazia muito tempo que Luna não abria aquela caixa.
Todas as cartas estavam ali. Todas as cartas que Luna tinha escrito ao longo desses anos. Enquanto a amiga se lavava, leu o pergaminho mais antigo:
“Gin,
Bem, eu não agüento mais. Sinto-me sufocando ao chegar perto de você. Sinto que a minha pele adquire um tom arroxeado. Está tudo entalado. Eu não sei quando isso começou. Não sei mesmo. Mas eu acho que não te quero como amiga.
Legal você estar com o Harry. Legal que eu não esteja com ninguém. Eu torço, sinceramente pra que vocês sejam felizes com filhos ruivos de olhos verdes, ou morenos de olhos castanhos. O que seja!
Acontece que eu torcia mais pra você estar comigo. É a pessoa mais gentil, Ginny, a mais carinhosa, a mais amiga. Sim. Estou com ciúmes de vocês. A gente quase não passa o tempo juntas. Fico sozinha.
Me vejo tão egoísta agora.
Me desculpe,
Luna ”
Ginny sentou-se ao lado de Luna, ao sair do banho, de toalha. Isso ainda incomodava a loira. Vestiu-se como se Luna não existisse. Viu a caixa. Perguntou o que era e a outra apenas fez sinal para que ela seguisse em frente e lesse o que quisesse.
“Ginny,
É. Era mentira. Eu agüentava mais. Nunca tenho coragem pra nada. Não ia mesmo conseguir te entregar a outra carta. Esclarecia tão pouco. Dizia tão pouca coisa. Você podia entender errado. Ou então entender exatamente o que era para ser entendido.
Talvez fosse esse o meu medo. Ser entendida. Receber uma recusa. Sim. Quando eu te abraço não é por saudade ou amizade. Se eu te consolei quando o Harry te deixou para lutar contra aquele-que-não-deve-ser-nomeado não foi por querer te ver mais feliz.
Me sinto suja, egoísta, nojenta, e infelizmente, me sinto sua. Nunca fui de curtir meninas. Nunca fui de nada disso. Mas você, além de não perceber como eu me sinto, é extremamente gentil e carinhosa. Não acho normal que você se deite junto comigo. Não acho normal que me afague os cabelos como sempre faz. Gosto disso. Gosto mais do que devia gostar.
Não vou te entregar isso até sentir que é certo. Se te entregar, entrego junto com a primeira carta. Não posso fazer isso comigo. Nem com você. Ainda existe, como sempre existirá, uma amizade. Não posso jogá-la no lixo.
Mas ainda posso esconder o que sinto.
Luna”
Ginny não tinha expressão alguma no rosto. Não dizia nada. Manteve-se fria enquanto lia as cartas todas. Luna não podia saber o que se passava na cabeça da amiga. Mas não poderia adiar quilo nunca mais. Não poderia esperar até ter morrido.
“Um beijo. Eu queria apenas um beijo. Um dia eu achei que isso fosse uma coisa errada. Que eu devia, como todas, amar em francês um belo rapaz. Não acho mais nada disso. Eu tenho certeza que o que eu quero, por agora, é um beijo de uma certa ruiva.
A ruiva não vem comigo pra onde eu vou. Estamos no mesmo lado, mas em campos de batalha diferentes. Somos boas nas mesmas coisas. Não há que se perder tempo tendo duas de nós na mesma missão.
Então eu fico querendo por querer. Sem nada acontecer. Sem sequer ter coragem de me expor. Ou de me denunciar em atos. Eu não sei qual é a dela. Eu só sei qual é a minha. Só sei que sou dela sem pestanejar. Dou o sangue sem que ela precise salvar-me a vida. Que a minha vida não vale nada, se não pela dela.
Se eu morrer em batalha e vierem limpar a minha casa, entreguem isso à Guinevere Weasley. Talvez em vida eu nunca reúna coragem suficiente para fazê-lo.”
Ginny parou de ler, buscou a varinha, na sala, e começou o feitiço que faria a cicatriz na perna de Luna sumir. Ginny sabia que aquilo doeria. Sabia que Luna não esperava e talvez nem lembrasse do feitiço. Mas ele era a única coisa que ela podia fazer naquele momento. Estava confusa. Não sabia onde aquilo iria parar. Onde Luna queria chegar e não sabia o que iria fazer com relação a isso. A cicatriz demorou meia hora para sumir. Ginny ainda não tinha coragem de olhar Luna nos olhos. Pegou mais um pedaço de pergaminho dentro daquela caixa. Se tinha se metido naquilo, que se atolasse até o pescoço.
“Miss Weasley,
Queria que esta fosse uma carta mais formal. Te chamar pelo sobrenome não muda muita coisa. Quando é com você, eu não consigo ser formal. Tudo foge a qualquer norma pré-estabelecida. Eu precisava te agradecer. Você aceitou ser fiel do meu segredo.
Eu precisava também (e eu sei que isso é menos importante), dizer que te amo. Que é com você que o meu mundo fica completo. Que não há homem ou mulher cujo beijo me faça esquecer o que você me deu em sonhos. Sim. Eu sonho.
Não há ainda quem me impeça de sonhar.
Luna Lovegood ”
“Gin,
E todas as estradas pelas quais temos de caminhar são sinuosas,
E todas as luzes que nos conduzem até lá estão nos cegando.
Existem muitas coisas que eu gostaria de dizer,
Mas eu não sei como...
Porque talvez
Você vá ser aquela que me salva...
E no final das contas
Você é o meu muro das maravilhas.
Por que é sempre em você que eu me apoio
Mesmo contra a sua vontade.
E é sempre você que me mostra os meus erros sem sequer perceber.
Você faz a diferença.
Eu não sabia que era, assim, tão capaz de amar. Eu não sabia que quando acontecesse de eu me apaixonar seria logo por você. É tudo tão puro. Eu quero dar pra você o que eu não tenho e eu sei que você nem precisa disso. Eu torço pra que você não se machuque. Torço pra não morrer antes de te contar como eu me sinto. Não precisa me devolver o amor.
Se não for caso de você me amar. É claro que eu vou ficar decepcionada. É claro que eu vou implorar, me arrastar, ficar brava com você. Sou mulher. Amo. Seria impossível dizer que não. Mas eu não queria, de forma alguma, que a nossa amizade acabasse. Que você deixasse de me consolar.
Todo amor por si só já é egoísta. Eu sou sim egoísta. Não há que se dizer que não. Talvez essa seja mais uma carta não entregue. Talvez vire meu testamento.
Tudo que eu tenho vai pra você. Se já sou sua não há nada mais lógico que isso.
A guerra a cada dia nos afasta mais. Quero continuar te vendo. Só você pode entrar sem bater.
Te amo,
Luna”
Ginny abaixou a cabeça, sentada na cama. Sentia-se confusa. Um turbilhão de coisas lhe vinha à cabeça. Snape e Malfoy, o cachorro de três cabeças, Harry, Hogwarts. Uma vez, há tempos atrás, em que, deitada na cama de Luna de frente para ela, Ginny lhe acariciou a face com as costas da mão esquerda e viu um sorriso no rosto da amiga. Talvez a culpa fosse somente de Ginny. Talvez não houvessem culpados. Ficou sem chão. Não tinha o que dizer. Não tinha tido tempo pra saber o que queria. A idéia não lhe era absurda. Mentiria se dissesse que nunca lhe tinha passado pela cabeça. Olhou para o rosto apreensivo de Luna.
_Como você conseguiu esconder isso por tanto tempo? Por que nunca me contou?
_Coragem...
_Mas... Como conseguiu fingir por tanto tempo?
_Sempre fui uma boa atriz.
_E como eu vou saber quando você está mentindo, como eu vou confiar em você?
_Por que deixaria de confiar?
Ginny perdeu o ar. Por que deixaria de confiar? A amiga, afinal, não tinha mentido. Omitira um sentimento, o que, aliás, Ginny era mestre em fazer. Não ficou mais dois segundos dentro do quarto, andou, de cabeça baixa, até a porta e voltou à aconchegante janela da cozinha.
“Apenas um beijo”
“Eu sei que isso é menos importante”
“Sou mulher.”
“Te amo.”
“E todas as luzes que nos conduzem até lá estão nos cegando”
“É em você que eu me apoio.”
“Como eu vou sonhar se tudo anda tão real?”
“Ele me comeu”
“É besteira.”
“Sou egoísta”
Todas as palávras e lágrimas e lembranças se fundiam numa bola macissa. Tudo era uma coisa só. E todas as luzes que lhe conduziam até Luna Lovegood continuavam a cegá-la. Não era cedo demais?
As estrelas no céu diziam o contrário. Talvez fosse tarde. Fosse hora de uma noite de sono. Esquecer da vida por míserar três horas. Em guerra não dava tempo de dormir mais que isso. Naquela janela não havia guerra. O dever ali era cuidar de Luna. A guerra, única existente, se travava na mente de Gina entre o sim e o não. É claro que ela queria saber onde aquilo ia dar. Mas talvez não fosse justo com a outra brincar de amor. E se não fosse possível amar? Se tudo desse errado? Se Ginny não gostasse de beijo de mulher? Se as duas fossem obrigadas a voltar para a guerra? Se a amizade acabasse com um não? Se tudo morresse? Se tocasse uma valsa qual das duas faria papel de guia?
Todas as dúvidas não pareciam ter respostas imediatas. O céu talvez respondesse por si. Era noite de lua nova. Era noite de brilho de estrelas espalhadas no céu. A chuva, enfim, tinha cessado. Passava da hora das lágrimas cessarem também. Já não haviam acontecido coisas ruins o suficiente? Havia ainda o medo. Havia a punição pelo pecado original. Havia o fruto proíbido. A via Láctea se postava ainda bordada ao céu. Um dia faria um vestido de estrelas, como o que Luna fez. Ouvir estrelas... Não era loucura ouvi-las. Poesia talvez. Estrelas, como drogas, entorpeciam e faziam com que qualquer problema fosse esquecido. Estrelas traziam paz. Talvez ninguém, trouxa ou bruxo, se sentisse como ela ao ouvir estrelas. Mais uma lágrima escorreu pelo seio da face de Ginny. Era tudo tão pequeno. Qualquer coisa que acontecesse naquele mundo. Qualquer feitiço, qualquer explosão. Seria impossível acabar com todas as estrelas. Tudo voltaria a ser uma maça única e haveria mais um big bang. A vida não passava de um grande buraco negro, que sugava e fazia com que as pessoas perdessem o rumo. E depois de tudo, nada restaria. Não tinha por que temer o futuro. As estrelas, para sempre, restariam. As estrelas sempre a fariam dormir em paz. Talvez ainda houvesse coisas a serem ditas. Sempre há um rabo preso, mas olhando e ouvindo as estrelas, Ginny podia voar sem medo em si. Lágrima de emoção, culpa das estrelas.
“Um beijo, apenas”.
“Amar em francês”
“Não vai comigo onde eu vou”
“Dar pra você o que eu não tenho”
“Eu não aguento mais”
“Fico sozinha”
“Não acho normal”
“Amar em francês”
“Eu não sei como”
“Estão nos cegando”
“Me salva”
“Francês”
“Rapaz”
“Normal”
“Um beijo”
“Faz a diferença”
“Entrar sem bater”
Era, então, pra ser assim. Por culpa das estrelas, da valsa, da morte, do medo, da ânsia, do amor, do beijo, da vida, da flor esmagada no começo da tarde. Não mataria mais nenhuma flor. Não esmagaria mais nenhum amor. Não se deixaria tomar pela guerra. Não mataria ninguém.
Amaria.
Faria-o em qualquer que fosse a lingua. Faria do jeito que fosse pra fazer. O que a vida mandasse. O que as estrelas indicassem. Não importava que elas não dissessem do futuro. Da vida não havia quem entendesse melhor. Ginny se debruçou na janela, olhava o mais longe que podia. Alguém olhava de volta? Qual seria a cor daquilo tudo? Luna não podia ser, assim, tão boa atriz. Aquela noite, ao menos, tudo parecia extremamente sincero.
De volta ao fruto proibido, sem ter quem guiasse a valsa, Ginny se levantou e foi até o quarto. Luna ainda estava sentada na beirada da ama. Já não lia as cartas. Estava em estado de transe. Os olhos arregalados que não olhavam para lugar nenhum, os lábios contraídos de quem está preocupada.
Ginny não pode deixar de sorrir. A raiva que sentira de Snape era mais que pela impunidade. Ajoelhou-se na beirada da cama, de frente para Luna. Foi com as duas mãos ao rosto da amiga, afastou-lhe os cabelos, pondo-os de qualquer jeito atrás da orelha dela. Aproximou-se de olhos abertos, como se para ter certeza. Puxou para si a face de Luna.
Restavam dois centímetros. Restavam poucas dúvidas. Os lábios se roçaram secos. Os lábios se abriam devagar. A lingua de Ginny invadia de leve a boca de Luna. A lingua de Luna era macia, tímida e delicada. As mãos de Luna não tentavam alcançar a bunda de Ginny. O beijo era apenas um beijo. As duas davam o que não tinham a quem não precisava.
As bocas se separavam, as testas mantinham-se unidas. As mãos de Ginny cobriam as orelhas de Luna e as de Luna seguravam os ombros de Ginny. Ambas sorriam a testas coladas. Sorriam e se olhavam como só elas podiam entender. Quanto tempo se passou não era sabido. O mundo talvez girasse. As estrelas, a milhões de kilômetros dalí, davam a explosão final. Alguém morria na guerra. Mais um bebê nascia. Em outro canto alguém chorava. Os sinos da igreja badalavam em alguma cidade onde já era manhã.
A noite passava enquanto as duas dormiam, uma de frente para a outra, de mãos dadas. Sabiam que tinham com quem contar, afinal. Se tinham com quem contar, não lutavam em vão. Enquanto houvesse amor, que a vida fosse preservada.O medo da morte continuaria por sempre. Fazia parte da vida. A paz talvez nunca viesse. É tudo, sempre, uma grande guerra. A paz faz parte da guerra. Nunca, nada daquilo acabaria. Bastava uma noite.
O sol nascia, colorindo o céu de tons róseos. Ninguém parava para ver. Em guerra não havia tempo. Se não houvesse tempo, como a vida ficava? Ginny assistia o sumiço das estrelas, engolindo uma xícara de café. Luna ainda dormia. E era bom que dormisse. Era bom que as duas descansassem. Ainda havia coisas a fazer. Pessoas a socorrer. Vidas para devolver aos donos. Afinal, as regras da guerra, quem faz, é quem sobrevive.
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