Prólogo



Prólogo

Era inevitável a mudança da lua. Tonks podia vê-la no céu, cercada de estrelas, mas há muito tempo parara de sentir o romantismo que ela provocava. Lá estava ela, no alto, majestosa, banhando de luz as ruas e as copas das arvores que balançavam lentamente com o sopro do vento. Linda e temida, pensou. Amaldiçoada.

Ela tinha medo. Observava a lua cheia com o coração apertado, com um frio incontrolável que não vinha da noite agradável de verão, e sem saber o que a esperava na manhã seguinte. Nunca sabia. Permanecia em si a incerteza, o pânico que a invadia sempre que pensava que ele podia não voltar quando o sol nascesse. A transformação podia ser muito dura; talvez aquela noite fosse a que o levaria para longe dela. E isso a consumia por dentro.

Chorava baixinho às vezes, para não acordar a filha, a pequena Sylvie, de apenas cinco anos. Gostava de pensar que a menina não sabia de nada e que podia desfrutar um sono tranqüilo, enquanto ela era atormentada por pesadelos. Mas, no fundo, tinha certeza de que Sylvie sabia, sempre soubera, e apenas fingia para confortá-la. As crianças sempre são mais espertas do que se imagina.

Era por isso que a garotinha mimava o pai, fazia carinhos e dormia ao seu lado por quase uma semana antes que a lua ficasse completamente cheia. Ela sabia que ele sofreria em breve, e sabia que teria de se manter longe. E então, naquelas noites malditas, Sylvie se afastava do pequeno escritório no primeiro andar, onde via o pai entrar ao entardecer. Nunca perguntava o que ele fazia lá. Ela sabia. E isso fazia ainda mais com que o coração de Tonks doesse. Não queria que a filha tão nova sofresse por suas escolhas. Mas amava Remus e de alguma forma tudo valia a pena quando ele voltava na manhã seguinte.

Era sempre igual. Ela fingia para a filha que tivera uma boa noite de sono, embora tivesse olheiras sob os olhos devido à insônia. Juntas elas preparavam o café da manhã, com tudo o que encontravam na geladeira e nos armários. Divertiam-se bolando pratos extravagantes sabendo que, embora nem mãe nem filha fossem boas cozinheiras, Remus comeria tudo e elogiaria. Então iam em silêncio até o escritório, e Tonks entrava primeiro. Pedia que Sylvie esperasse do lado de fora, mandava-a se trocar e ficar bonita para o pai.

Era nesse momento que todos os seus medos podiam se tornar reais. Ela abria a porta com hesitação, temendo encontrá-lo a beira da morte... ou pior. Mas ele estava sempre lá, cansado e muito ferido, mas vivo. E lhe sorria com o que restava de suas forças antes que ela começasse a cuidar dele e limpar os cortes em seu corpo, para depois fechá-los. Vestia-o com seu pijama mais confortável, azul com mini-pufes desenhados (escolha de Sylvie) e deitava-o no sofá. Só então ia até a porta e via a filha ali, sentada com o melhor comportamento que exibia no mês inteiro, usando normalmente seu vestido de festa – laranja e cheio de fitas e contas que mudavam de cor – ou alguma outra roupa muito colorida que escolhera.

- O papai está melhor? – ela costumava perguntar, embarcando na mentira da mãe de que Remus estava doente. Tonks se sentia imensamente grata por isso, e reprimia o impulso de esmagar aquela pequena coisinha rosada em seus braços.

- Está sim, e morrendo de saudades suas!

Era o ponto alto do seu dia ver a pequena Sylvie correr pelo cômodo até os braços do pai, que a abraçava e beijava como se não a visse há anos. Ele a chamava de meu anjinho, meu amor, minha linda, minha princesinha, e nessa hora ela dizia para ele: “Só se você for o príncipe!”.

- E o que a mamãe vai ser? – ele perguntava. Era um ritual que acontecia quase a cada recuperação de Lupin. Era o jogo deles, e Tonks nem se incomodava de ser escalada para ser o cachorro ou o elfo doméstico.

Depois eles comiam o que quer elas tivessem preparado, e ela agradecia a ele pelo olhar por comer a gororoba do dia. E continuava observando os dois brincarem, as duas pessoas que ela mais amava no mundo. Não se importaria de passar o resto da vida amedrontada pela lua cheia, se pudesse ter aquilo em troca. Sabia que agüentaria qualquer coisa com eles ao seu lado.

Porém ainda era noite, e Tonks continuava angustiada. Respirou fundo várias vezes, visualizando o dia seguinte. Tentou se convencer de que tudo funcionaria bem como sempre.

Deitou-se na cama e fechou os olhos, preparando-se para uma noite mal dormida e cheia de sonhos ruins.

O que não esperava era acordar algumas horas depois com os gritos de sua filha.

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