Uma tal Luna

O nome não fora difícil de escolher. Bendito sobrenome, esse Crucificatti, que logo seria carregado pelas mais valiosas peças mágicas de todo o mundo! Meus planos de trabalho já estavam traçados, desde os planos de produção de cada uma das varinhas e vassouras até a lista dos contatos necessários para manter todo o negócio no mais subterrâneo possível. Ora, caros leitores, nenhum de nós quer que aquele Exército sujo e mesquinho ponha seus ranhosos dedos em um projeto tão promissor, não é mesmo? Além do mais, eles não entenderiam. Não não, aqueles ratos sujos não tem capacidade de compreender que toda a minha vontade, todos os meus esforços não poderiam ser ignorados em vão! Um dia ainda, juro, cada um daqueles porcos imundos pagará, e os que sobrarem imploraram prostrados no chão que suas mortes sejam as mais rápidas possíveis!
Suava nas mãos enquanto pensava. Sempre tive o costume de sonhar alto, e, nesses momentos, minha mente se torna um poço profundo dos sentimentos mais fortes que já senti em minha vida. Toda a glória que poderia ser alcançada, toda aquela vingança que ocupava a maior parte do meu coração, toda a raiva, isso tudo fez com que o tempo voasse e, quando voltei a mim, percebi-me em frente àquela cabana de pedras bem cortadas, com o telhado recoberto por galhos e palha pesada, com suportes de madeira das melhores; enfim, aquele lugarzinho onde pode-se viver sossegado. A cabana fora construída por mim mesmo, não digo sem ajuda, em um bom canto da Floresta Proibida, área cujos corredores eram pouco conhecidos até pelos mais notáveis habitantes daquelas florestas, os centauros. Aliás, e por que não dizê-lo, fora o próprio Montímuno que me indicara o local, por constituir-se de uma clareira aberta em uma parte densa da floresta, por isso de difícil visualização inclusive aérea. Lá, em alguns poucos dias, levantamos o lugar onde passaria a maior parte do meu tempo de estudos e confecções, e por esta razão planejamos inclusive cômodos projetados para a biblioteca e oficina, ambas pequenas aparentemente, mas suficientes para meus propósitos. Um bom lar, essa cabana, todavia constituir-se-ia vazia e solitária, se não fosse pela presença de uma pessoa, digamos, bem especial.
Luna, e apenas assim apresentara-se, pode-se dizer que foi fruto de minha profunda repulsão por elfos domésticos. Nunca fui de acreditar em boatos, mas aquele que diz respeito ao caso de um tal Monstro, elfo doméstico dos Black, mas que traiu o jovem Potter a pedido da irmã - ou prima, não me recordo - de seu padrinho, me atingiu profundamente, e minha criativa mente fértil fez com que eu imaginasse barbáries que uma daquelas criaturinhas verdes e repugnantes poderia cometer contra mim. Bem, o fato é que decidi não lidar com esses seres desprezíveis, e resolvi-me que ia buscar uma alternativa para a bagunça que se apresentava em minha casa. Alternativa essa se mostrou extremamente mais vantajosa e agradável quando conheci Luna, praticamente desnorteada de sua vida e largada numa calçada de Londres. De início, mediante minha apresentação como caixeiro viajante, apresentou-se rude, entretanto, conforme a conversa se estendia, chegamos à conclusão de algo em comum: a magia em nossas vidas. Já mais aberta, Luna falou-me um pouco de sua vida, insistindo ainda que muita coisa permaneceria oculta por seus lábios. Dirigimo-nos a uma casa de chá, daquelas bem tradicionais da velha Londres, e papeamos por horas, ao som de uma agradável brisa sibilante. Ouvi histórias descontraídas sobre sua estada na capital britânica, porém, sempre que questionava sua vida no mundo da magia, presenciava uma cara fechada e melancólica, como se existisse uma linha limite em sua vida, por ela estabelecida como intransponível.
A noite estava agradável, com aquele aroma de chá que só os londrinos têm o prazer de conhecer de perto em seu dia-a-dia. Luna, figura cujos olhos permaneciam ainda misteriosos a mim, mas, ao mesmo tempo, me cativavam com sua extrema delicadeza e, por que não dizer, sensualidade inocente. Observava-a a cada sorriso, a cada viagem que ela fazia enquanto refletia em sua vida, e cada vez mais sentia que qualquer milímetro distante daquela ninfa era distância demais para eu suportar. A curiosidade que eu havia sentido no momento de seu encontro na calçada da Rua Thompson nº 89 transformava-se em um desejo incomensurável por aquela linda jovem de seus 25 anos, não muito mais que isso, com seus cabelos loiros de um dourado cativante, olhos de um cinza prateado e indecifrável, corpo com todas as curvas por onde desejava profundamente derrapar. Enquanto perdia-me em seus traços, ela perdia-se em pensamentos e reflexões, ora concentradas, ora vagas, até que deixou escapar um bocejo:
-Estou com sono, já é tarde.
Realmente, eu não prestara atenção ao passar do tempo, e concluí que meus objetivos iniciais em Londres, de conseguir contatos com comerciantes locais indicados por um velho companheiro sangue-ruim e extremamente metido a galanteador, não haviam sido cumpridos. Percebi que seria melhor pernoitar por aquelas paragens, mas não pretendia me deitar sozinho aquela noite.
-Para onde vai agora? – indaguei, com um natural tom de galanteio.
-Vou para casa, se é que posso chamar aquilo de casa. – Luna proferiu as últimas palavras em um tom mais extravasado, mas logo retomou seu suave sorriso e ligeira desatenção, como se sua pequena fúria repentina não devesse ser levada em consideração.
-Insisto em te acompanhar, e não aceitarei um não como resposta!
Parece que minhas palavras decididas apenas adiantavam um convite inevitável que já iria ser feito, pois ela demonstrou, através de um sorriso, uma satisfação considerável. Pegou minha mão e me puxou da cadeira onde me via sentado, deu-me o braço e juntos passamos pela porta do estabelecimento, onde o sujeito do balcão roncava recostado no mesmo como nunca nenhum outro ser na face da terra conseguirá jamais roncar. Andamos calados pelas ruas vazias, e logo chegamos ao lugar onde eu havia a encontrado, em frente a uma estreita portinhola de madeira, já um pouco carcomida por cupins. Ela tirou da bolsa uma varinha e girou-a, abrindo a porta, e dirigiu-me um sorriso. Realmente esta fora a primeira comprovação de que eu estava diante de uma bruxa, e isso de certa forma me confortou. Entramos então em seu aconchegante apartamento.
Realmente, percebiam-se três cômodos distintos na casa: o banheiro, notado por uma porta visível da sala; esta mesma sala, que parecia servir como quarto e quaisquer outros cômodos do tipo; e a cozinha, que, para a minha surpresa, estava inacreditavelmente arrumada e limpa. Aliás, ao invés de encontrar uma esperada bagunça, via tudo em seu devido lugar, tudo limpo, nem mesmo um ponto onde se pudessem encontrar vestígios de sujeira, poeira ou mofo. Ela sorriu com minhas feições de admiração.
-Espero que se sinta confortável e à vontade.
Seu rosto mantinha um sorriso tímido, enquanto sentava-se na beirada de sua cama, de lençóis vermelhos de uma ceda tão suave quanto os cabelos loiros da garota dos olhos prateados e misteriosos. Larguei minha pasta surrada, com proposital aspecto de não importante, em uma poltrona que se dispunha perto da entrada para o ambiente da cozinha, não separado por nenhum tipo de porta. Aproximei-me da cama e me sentei do seu lado, com os olhos fixos no colo extremamente sensual de Luna. Nesse olhar, nossos olhos se encontraram, levantamos os rostos, e ela manteve uma feição ainda misteriosa, com um sorriso indecifrável e provocante. À medida que, com minha mão, tocava seu rosto, seus olhos pareciam querer se entregar completamente a mim, e a inocência que aquela garota guardava confundia-se com suas intenções presentes, cada vez mais próximas de se realizarem. Lembro-me com detalhes desses momentos! Aproximei meu rosto do seu, e nenhum gesto meu encontrava agora resistência. Aqueles lábios, finos e suaves como os lençóis de sua cama, tocavam calmamente os meus, e, sem interrompermos esse eterno beijo, nossas mãos se seguravam, como se quisessem mostrar toda a energia que emanava daquele momento. Ela vagarosamente abandonou seu corpo a deitar-se na cama, e, sem desencostar os lábios, acompanhei-a perdidamente. Nossos corpos procuravam uma forma de estarem cada vez mais unidos e em contato, e as mãos habilidosas de Luna começaram a despir apressadamente minha casaca, depois minha camisa, e, soltando meu sinto, minha calça. Estava completamente nu, e aqueles olhos misteriosos e prateados agora brilhavam, pedindo calorosamente que eu retribuísse o gesto. Minhas mãos, a cada curva que percorriam, faziam-me enlouquecer de tentação e prazer, e, com agressividade, comecei a tirar cada peça de roupa que cobria aquela obra de arte. Meu Deus, como era maravilhosa! Seu pescoço, seus seios, sua barriga perfeita, suas pernas, tudo ali era um poço de gozo e calor. Naquela noite, foram-se horas seguidas de amor suave e compassado, e depois extremamente descontrolado e animal. O prazer para nós dois foi deveras incomensurável, e quando o Sol já ameaçava raiar, pusemo-nos a dormir, abraçados de modo que nem um milímetro sequer separava nossos corpos em total fogo e paixão.
Ao acordar à tarde, vi Luna na cozinha, preparando algo que exalava um cheiro agradabilíssimo. Acompanhava aquela bela figura com os olhos fixos, e divertia-me com uma melodia que ela cantarolava baixinho. Como me encantava, todo aquele jeito! Repentinamente, virou-se para mim e, reparando que já estava acordado, veio até a cama e me cobriu de carícias e beijos, com um alegre bom-dia. Eu via cada vez menos aquela melancolia em seu olhar, à medida que aquela linda garota sorria e falava sobre qualquer coisa que não me recordo agora. Em um de seus momentos calados, olhei para Luna e falei:
-Você poderia vir morar comigo.
Não houve resposta nem reação imediata. Ela levantou-se, ainda cantarolando baixo, foi à cozinha e olhou o forno. Depois voltou à beira da cama e sentou-se, com ar estranhamente sério. Olhou para mim, e fitamo-nos durante alguns instantes, quando então ela abriu um inesperado sorriso e gritou a meia voz:
-Odeio esse lugar!
Não demonstrando nenhuma raiva em seu comentário, agarrou-se em mim, ainda deitado, e permanecemos nos beijando e mordendo carinhosamente durante infindos momentos. Entendia eu isso como um sim, e realmente não podia esconder minha satisfação em ter este encanto em pessoa perto de mim, em minha aconchegante cabana nos cantos inatingíveis da Floresta Proibida. Ela saiu sem levar nada, até por não ter muita coisa, e nos dirigimos ao centro de Londres, onde cumpri meu objetivo inicial ao ir àquela cidade, travando uma agradável conversa com o tal de Sr. Karlton Mendel, cujos objetivos e interesses em uma possível parceria de negócios muito me agradaram. Depois disso nos dirigimos à velha estação de Londres, onde ainda saiam os Expressos para a Velha Escola, embora, acredito eu, eu fosse o único a permanecer no trem até lá. Que tempos, quando aquelas centenas de alunos lotavam esse trem, para depois lotarem os salões imensos de Hogwarts! Agora, e como poderiam eles imaginar?!, o trem cumpria todo o trajeto apenas por tradição, parando por inúmeras outras estações criadas no caminho, e para minha sorte fazendo ponto final no velho castelo abandonado, em cujos aposentos ninguém mais, depois de sua interdição, ousara entrar. Muitas são as lendas sobre o evento do fim da Escola, mas nenhuma delas nunca teve total comprovação, não obstante a proximidade temporal do fato. Bem, leitores, não vou ser eu a querer desvendar mistérios e histórias sobre um castelo empoeirado e cheio dos mais variados tipos de ratos e animais repugnantes, por mais que particularmente o admire como imponente construção. Deixe-o quieto, como está, digo-me eu sempre que por ele passo. Deixe que as memórias lá guardadas, pelo tempo sejam imortalizadas ou apagadas, que assim seja.
Sem mais filosofar, enfim chegamos eu e Luna à minha cabana, depois de um passeio de caminhar lento pela Floresta Proibida. Antes disso, porém, não pude deixar de perceber a forma como ela olhou para a Velha Escola. Por alguns instantes, foi como se seu olhar de melancolia e mistério a tomasse novamente, e como se ela refletisse dentro de suas mais profundas lembranças algo que lá lhe ocorresse, fosse em realidade ou apenas em sonho. Bem, fato que apenas foi perder o castelo de visão, que ela retomou seu ar jovial e animado, logo comentando sobre cada árvore e criatura que via, e eu sempre lhe contando sobre todas as aventuras e episódios por ali vividos. Na cabana, após a apresentação dos cômodos, Luna pôs-se a arrumar algo aqui, retocar algo ali, sempre cantarolando sua canção indecifrável, e me dirigindo sorrisos e carícias. De tarde preparou café e chá, com bolinhos de todos os tipos que eu nem imaginava possíveis de serem feitos com o que a natureza daqueles bosques dispunha. De noite, ela fez com que minha cama se tornasse ainda mais aconchegante, e revivemos todas as emoções e prazeres da noite passada, com uma paixão crescendo cada vez mais calorosamente. Estávamos realmente felizes, e assim continuamos até esses dias, de onde escrevo essas linhas. Ora caros companheiros, resolveram-se assim dois problemas irremediáveis antes da chegada de Luna: o vazio que sentia-se naquela cama, e a bagunça que um torneador e comensal dissidente não tinha tempo de arrumar! A propósito, ainda não me esqueço dos mistérios que guarda em seus profundos olhos a misteriosa Luna, a maneira como olha para a Velha Escola, e um dia, um dia bem em breve, prometo-lhes que respostas terei. Por enquanto, contento-me com o doce mistério que habita as profundezas dos olhos da maravilhosa garota que é Luna.

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