Você não é tão inocente!
Ele caminhou por entre os corredores procurando o rosto conhecido há muito. Sua parceira estava perdida em algum lugar daquele prédio cheio de trouxas. Provavelmente com ódio dele.
Sorriu quando a imaginou com nojo de toda aquela gente, procurando por ele. Ela precisava dele.
Avistou seus cabelos espessos e brilhantes se movendo rapidamente e logo sumindo. Ela estava correndo.
Ele apertou o passo. Ela poderia estragar tudo.
Ela sempre agira por seus impulsos, e ele gostava disso nela. Mas, às vezes, seus impulsos a levavam a um problema. Ele sentia que, então, ele deveria estar por perto para livrá-la daquilo.
Ele viu os cabelos se movendo em direção a um corredor longo e deserto.
Ele correu atrás dela o mais rápido que pode, derrubou algumas esculturas. O corredor dava na cobertura do prédio alto de escritórios. Ele passou pelo batente da porta e a viu debruçada no parapeito.
-Bella?
Ela demorou um pouco para virar-se, mas quando olhou o marido estava com o rosto profundamente marcado com olheiras e rugas. Sua esposa já não tinha mais a beleza de antigamente. Apenas seus olhos: eles continuavam com o brilho febril e sarcástico de quando se conheceram.
Vidrou o marido com ódio.
-O que quer? - Disse entre os dentes, virando-se para o parapeito novamente.
-O que está havendo, Bella?
Ela não respondeu de imediato e ele percebeu que ela vomitava.
-Você está bem?- Disse se aproximando
Ela empurrou os braços do marido e se afastou para a direita.
-Por que está desse jeito?
-Sabe que não consigo ficar perto deste tipo de gente por muito tempo...Sabe que não pode me deixar aqui...
-Me desculpe, o Lorde me deu ordens, tive de ficar de tocaia.
Ela jogou-se no chão encostada na parede, o rosto branco como papel; limpou a boca com as costas da mão esquerda e com um pouco de água tirada da varinha lavou o rosto.
-Alguém fez algo para você?
-Me ofereceram chá!
Rodolphus segurou-se para não rir. Imaginou Bella num grande dilema. Enfeitiçar ou não o pobre e infeliz trouxa. E pela reação da mulher sabia que havia se decidido por não enfeitiçar quem quer que fosse.
-Você bebeu?
-Não! - Disse mirando o nada como se algo de importante fosse surgir da parede pixada do prédio vizinho.
O sol batia nos cabelos escuros da mulher e os tornavam brilhantes. Seus olhos cor de céu nublado estavam turvos e ela parecia mais seca e fria do que de costume.-Mas sentir o cheiro dessa gente, e de qualquer coisa que venha deles é um total martírio.
-Acabou Bella! Vamos pra casa agora...
-Não vou com você...
-E por que não?
-O Mestre pediu para que eu voltasse para sua casa. Parece que tem mais um serviço pra mim.
-Posso te esperar acordado então?
-Não me ouviu dizer? Vou trabalhar esta noite...
-Eu poderia acompanhá-la então...
-Rodolphus, o Mestre confia em mim, e vai me confiar uma missão...Será que eu poderia ter um pouco de privacidade com ele? Só um pouco...
-E quando você pensa em voltar pra casa? - Disse ele, por fim, também se rendendo ao muro pichado do outro lado da rua.
-Não sei. Só não me espere.
Ele olhou os grandes olhos esbugalhados e febris da mulher. De repente sentiu ódio. Sentiu que deveria tê-la deixado à mercê dos trouxas e que ela se virasse para sair dali.
Ela se levantou sem a menor cerimônia. Ia deixá-lo com seus pensamentos.
-Aonde vai?
-Será que precisarei explicar de novo, Rodolphus? - Reclamou impaciente ao ajeitar os longos e armados cabelos num rabo de cavalo.
-Por que não pode ser um pouco grata?-Perguntou antes que pudesse se segurar.
-Grata? A quem?- Disse com um pequeno sorriso sarcástico riscado em seus lábios.
-A mim! - Uma coragem crescia em seu peito como um monstro alimentado.
-Não faz muito mais do que deveria Rodolphus. Você deve se preocupar comigo, é meu marido.
-Acho que eu não deveria! Pois eu me preocupando ou não você vai sempre seguir o mestre não é mesmo?
-E você acha que eu não deveria seguir o mestre então?
-Acho que deveria ser grata a quem dedica a vida por você. E não dedica a própria vida para acabar com a sua...
-Então você está me dizendo que o mestre na verdade se esforça para tirar a minha vida?
-Bellatrix! Não estou dizendo nada contra o mestre. E não tente virar o jogo para que eu me sinta culpado. Sei que faz isso muito bem! Mas não vou cair mais nessa. Sabe que me deve um pouco de gratidão. Não estou pedindo muito.
Ela se aproximou fatalmente do marido.
-Se merecesse gratidão eu seria grata. Mas como já disse, você não faz muito mais do que deveria fazer.
E dizendo isso se afastou sem dar chance ao homem de argumentar.
Ele correu e segurou os braços dela com força. Não foi muito difícil impedi-la de continuar, era magra e fraca.
-Espere!
-O que quer? Solte-me!
-Sou um marido fiel e dedicado e acho que mereço um pouco de compaixão...
Ela olhou-o dentro dos olhos. A força daquele olhar fez com que ele soltasse os braços dela.
-Sei que não é fiel, não venha me dar lições de moral...
Disse isso com uma nota de amargura em cada palavra.
-Então não sou pior que você porque sei que também não é fiel...
-Sigo as ordens do mestre...
-Segue suas próprias ordens... e seus desejos.
Ela virou as costas e continuou a caminhar.
Ele seguiu-a e não deixou que passasse pela porta.
-Se vai jogar na minha cara tudo o que faço podemos fazer isso em casa. Agora estou ocupada.
-Onde chegamos, Bella? Onde está nosso amor? Em que parte de nossa vida juntos perdemos o respeito um pelo outro?
-CHEGA! Pare de colocar seus sentimentos a frente de qualquer coisa, Rodolphus.
Ele olhou a face febril e doentia de sua esposa.
-Tenho algo a fazer agora e se não se importa preciso me apressar!
Empurrou o marido para o lado e continuou seu caminho. Mas ele já não tinha mais forças para segui-la ficou ali contemplando a porta aberta e o corredor agora vazio.
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