LIVROS, RABISCOS E FEITIÇOS
CAPÍTULO XX
LIVROS, RABISCOS & FEITIÇOS
Após sair do Ministério da Magia sem conseguir um resultado positivo para o nome de sua loja, Hermione resolveu visitar o local onde ela funcionaria. Olhou para o seu relógio trouxa e constatou que, apesar de ter perdido um tempo precioso com aquelas bruxas, ainda era cedo para almoçar. Dirigiu-se ao Beco Diagonal e de lá desaparatou para Hogsmeade.
Ronald Weasley saiu do hospital trouxa com a sensação de dever cumprido e orgulhoso de si mesmo. Mas ainda precisava resolver muitas coisas e tinha ainda algumas tarefas difíceis a cumprir. Como, por exemplo, ajudar a retirar os corpos dos mortos do local e transferir para onde seriam identificados. Tinha que tentar localizar também os pais de Eileen Keltoi ou algum parente próximo. Com o nome da menina anotado num papel, Ronald dirigiu-se a um grupo de policiais que estavam ajudando na identificação dos sobreviventes, pedindo-lhes prioridade naquele caso por se tratar de uma criança.
Hermione chegou ao local onde instalaria sua loja no centro comercial de Hogsmeade e examinou a parte externa. O prédio era novo, recém construído. Próximo a Dedosdemel. Uma excelente localização. Pensou na grande quantidade de caixas com livros que havia lá dentro, prontas para serem abertas a fim de que seus conteúdos pudessem ser distribuídos nas prateleiras. Ela teria muito trabalho dali até a inauguração da sua livraria. Precisava arrumar tudo o quanto antes e iria começar naquele exato momento.
Duas horas depois de ter voltado ao local do atentado, Ronald não se surpreendeu muito quando um dos policiais o chamou e disse-lhe que não havia localizado os pais da menina, pois os únicos Keltoi que eles haviam encontrado pelo sistema de informação da polícia estavam viajando para a América. Qualquer pai ou mãe que soubesse daquela situação já teria aparecido por ali procurando notícias da filha desesperadamente, o que não acontecera até aquele momento. Provavelmente eles até estariam sabendo do que acontecera, mas tão cedo não poderiam retornar, pois os vôos para Londres estavam todos cancelados por tempo indeterminado.
Hermione gostava do que via. Só faltava agora colocar o nome bem no centro da parte superior do prédio, que era como um sobrado. No andar de cima, ela faria seu escritório. Lá, havia uma sacada com alguns jarros de flores. Na parte inferior, duas vitrines, esperando para exibirem seu mostruário, separavam a porta de entrada onde ela mandara instalar uma pequena sineta que a avisasse da entrada de um cliente. Pensando que precisava voltar logo ao Ministério para saber se aquelas bruxas tresloucadas haviam se decidido por um nome, ela resolveu entrar na loja e começar a trabalhar.
Rony olhou para o céu e viu que o sol ainda estava a pino. Era por volta de uma hora da tarde. Apesar de ainda ser primavera, o calor em Londres estava insuportável. Suado e com vários arranhões pelo rosto, ele passou a mão pela testa e bebeu de um só gole o refrescante copo d’água que o policial lhe estendera. Não havia encontrado mais nenhum sobrevivente. O saldo daquele terrorismo já era de 200 mortos e 150 feridos. E a avó de Eileen provavelmente estaria morta, pois nenhum dos feridos perguntou ou falou da garotinha quando questionados. O jeito era esperar pelas identificações... “Céus! Isso poderia levar semanas, talvez meses...” – pensou Rony.
Ao entrar na loja, Hermione olhou em volta e franziu a testa desanimada. Ela sabia que era uma grande quantidade de caixas, mas não imaginou que fossem tantas, prontas para serem abertas e esvaziadas. Centenas delas, empilhadas ou espalhadas pelos cantos. O pessoal da entrega de seu fornecedor havia feito um bom serviço. Mesmo com todos os feitiços do mundo, ela iria trabalhar bastante... E o pior, não podia contratar ninguém para lhe ajudar, pois ainda não começara a vender. Todo o capital que tinha estava investido ali. Suspirando profundamente arregaçou as mangas, literalmente, empunhou sua varinha e começou a abrir aquelas caixas e a separar os livros por gênero literário, autor, título, ordem alfabética, essa coisas...
O supervisor do grupo de bombeiros que estava no local, chamou-os para uma reunião e avisou que aqueles que estavam ali desde a hora do atentado seriam substituídos por outro grupo e que eles poderiam ir para casa almoçar e descansar, já que a situação estava sob controle naquele momento. Porém, pediu que eles ficassem em alerta. Caso houvesse necessidade, seriam chamados novamente. Agradeceu a presença, o trabalho, o esforço, a dedicação e a cooperação de todos e dispensou-os. Rony ainda insistiu para ficar, mas o supervisor foi categórico dizendo que ele havia feito um excelente trabalho e que precisaria dele descansado. Rony pensou na pequena Eileen e seu semblante se anuviou. “Como iria dizer-lhe que ela estava sozinha, por enquanto, e que a avó não fora localizada?” – O estômago do bruxo ruivo roncou, anunciando que ele estava faminto e lembrando-lhe que não se alimentava desde que levantara para atender ao pedido de ajuda. Ainda não havia saído da cama quando recebera uma coruja expressa. Estava lá, deitado, simplesmente pensando em Hermione. Resolveu, então, ir a Hogsmeade a fim de comprar uns doces para a garotinha antes de voltar ao hospital e iria depois almoçar. Saindo do metrô, caminhou a passos largos até o Beco Diagonal e de lá desaparatou para a Dedosdemel.
A pequena sineta que colocara no alto do sistema de segurança bruxo, ainda por instalar, soou, alertando para a entrada de alguém na loja. Exausta, Hermione tentou entender por que as pessoas nunca paravam para ler placas e cartazes. Havia um deles anunciando a inauguração da loja em uma semana. Devia ter trancado a porta depois que entrara, mas ficara tão entusiasmada com a arrumação que nem pensara nisso. Forçando um sorriso, levantou-se de trás do balcão coberto por livros de todas as espessuras e tamanhos, que tentava inutilmente organizar.
_ Lamento, mas ainda não inauguramos a loja.
O sorriso desapareceu de seus lábios. O nervosismo e a surpresa enrijeceram os músculos de seu rosto.
Rony, vestido num uniforme de bombeiro trouxa que revelava os fascinantes contornos de seu corpo e uma musculatura impressionante, olhava em volta enquanto se aproximava carregando um saco com os mais variados tipos de doces. Ela não sabia em que ele estava pensando, mas um forte sentimento de proteção brotou em seu peito, antecipando qualquer crítica.
_ Esperava que você pudesse abrir uma exceção. Afinal, temos uma ligação e... – Rony tentou dizer.
_ O que está fazendo aqui? – cortou Hermione, furiosa.
_ Estava saindo da Dedosdemel e passando pela rua quando vi a loja com seu nome na porta. Notando que estava aberta, resolvi entrar - Rony olhou novamente em volta e viu que Hermione trabalhava como uma alucinada. Havia caixas abertas em todos os cantos e ela se dirigia a uma prateleira na parede dos fundos. Se algum dia decidisse levá-la ao seu apartamento, teria que limpá-lo antes.
Hermione detestava confrontos diretos com Rony, mas precisava tomar uma atitude firme para por um ponto final naquilo.
_ Por que está me seguindo? – perguntou ela.
_ Não estou. Como pode ver, estou saindo do trabalho – ele respondeu-lhe, abrindo os braços e dando uma volta ao redor de si mesmo.
Hermione lançou-lhe um olhar desconfiado, mas constatou que ele estava dizendo a verdade e, que provavelmente o trabalho a que ele se referia havido sido uma experiência muito ruim, pois ele estava com uma aparência cansada, as roupas amassadas e sujas e o rosto arranhando, além de...
_ Seu nariz está com fuligem – falou instintivamente e uma terna lembrança de quando se conheceram no Expresso de Hogwarts a invadiu.
Rony, rapidamente, passou a manga da camisa pelo nariz e sorriu para ela. Hermione desviou o olhar... Aquele sorriso a perturbava por demais.
_ Além de vassouras, está vendendo doces também? – ela provocou.
_ Os doces são para Eileen – ele falou distraído – Posso olhar os livros? Gostaria de procurar um para ela também...
Hermione parou surpresa.
_ Sua namorada?
Ronald sorriu novamente. Sua distração causou confusão em Hermione. Como ela poderia pensar que ele tinha uma namorada? Mas, antes de desfazer o mal-entendido, resolveu provocá-la também... Estava ficando mestre nisso. Adorava vê-la perturbada e sem ação. Contanto que não chegasse à explosão da raiva...
_ Não exatamente, embora ela tenha conquistado meu coração desde a hora em que a carreguei em meus braços. Ela é doce e linda e eu fiquei hipnotizado.
_ Não estou interessada em seus relacionamentos, Ronald Weasley! – ela esbravejou e olhou para o outro lado, já visivelmente perturbada. Parecia tremer.
_ Não? Pensei que gostasse de crianças.
_ E gosto... – Virou-se e viu que ele apoiara os cotovelos no balcão. O rosto estava tão próximo do dela que os lábios quase se encontraram. E, então, como num replay de um filme, teve a impressão de ouvir suas próprias palavras novamente – O que tudo isso tem a ver com crianças?
_ Tudo. Embora Eileen não goste de ser tratada assim. Ela tem três ou quatro anos, mas acha que já é adulta... E adora livros. Como você... – Era divertido ver a surpresa, a confusão e o constrangimento desfilarem pelos olhos castanhos – Ela está no hospital, Mione. Gostaria de levar alguma coisa para ela.
_ Eileen... Como você a conheceu? – ela perguntou já mais relaxada e menos nervosa, mas afastou-se do balcão. Se não pudesse chegar perto dela, Rony também não poderia beijá-la. Não poderia forçá-la a mais uma noite de insônia.
_ Conheci ela hoje cedo. Tirei-a dos escombros do metrô, onde houve um atentado terrorista.
_ Oh, Rony! Que bom que você conseguiu salvá-la. Fiquei sabendo do atentado. Seus colegas me contaram... – quase falou que ficara preocupada com ele também. – Ela está bem?
_ Está sim. Tinha quebrado a perna, mas eu a consertei logo usando feitiços.
_ Rony! Não podemos interferir assim... Você sabe!
_ Não me olhe assim, Mione. Eu só queira tirá-la logo do sofrimento e ela é muito pequena para saber o que aconteceu de fato.
_ Talvez – respondeu ela pensativa – Mas não se exponha tanto.
_ Prometo. Ela acha que sou um bombeiro mágico – Ele voltou a mostrar aquele sorriso encantador – Eu quero ter filhos, Mione – continuou ele sonhador – Você quer?
Não era justo... Se essa conversa continuasse ela ficaria acordada por um bom tempo novamente esta noite. E como estava disposta a dormir como uma pedra até o fim de sua vida, não se deixaria envolver por uma conversa de caráter íntimo como essa. Não mesmo!
_ Ter ou não ter filhos não faz a menor diferença. – ela voltou a ficar séria.
Rony resolveu parar de falar sobre aquilo e aliviar a tensão. Olhou novamente em volta tentando decidir por onde começaria sua pesquisa. Era como estar isolado em uma pequena ilha no meio de um mar de livros e caixas de todos os tamanhos – E então? Tem algum livro infantil no seu estoque? – E aproximou-se de uma caixa aberta onde havia um punhado de livros coloridos.
Hermione sabia que não devia se aproximar dele, mas o instinto de comerciante e um sentimento de compaixão a fez segui-lo. Havia uma caixa por ali que tinha uma coleção de histórias infantis sobre animais. Achou a caixa e a entregou a Rony.
_ Você só não pode dar um livro mágico para ela, Rony.
Rony pegou um livro da caixa que falava sobre gorilas. Era bem original e divertido.
_ Eu li para ela, Mione e gostei bastante – ele comentou.
_ Está falando sério? – perguntou ela surpresa – Ronald Weasley lendo? – provocou.
_ Eu gosto de ler, Mione. Só não tanto quanto você... E eu nunca havia lido para uma criança antes. É bem legal.
Disposta a preservar a atmosfera de negócios, ela começou a abrir algumas caixas e arrumar os livros nas prateleiras. Ela tinha uma predileção especial por livros de animais, mas não precisava revelar particularidades.
_ Por que não leva Contos de Fadas? Ou algo mais exótico como “As mil e uma noites”? Ou o “Livro das Criaturas Mágicas”?
Sorrindo, ele pensou em outro sentido para a palavra exótico e fitou-a com expressão sugestiva, insinuante. O rubor que atingiu o rosto dela alimentou seu interesse.
_ Por que não me mostra o que tem? Estou certo de que não será difícil escolher.
Umedecendo e mordendo os lábios, ela se virou e mergulhou as mãos e braços na caixa, oferecendo uma visão que tornou a espera muito agradável. Depois de alguns instantes ela se levantou exibindo uma versão pitoresca de “Cinderela”.
_ Que tal isto?
_ Acho muito bobo. – respondeu ele.
_ Mas ela é uma criança pequena, Rony. E menina. – ela enfatizou essa última palavra.
_ Ela é inteligente. Como você. – Antes que ela pudesse responder, Rony olhou em volta examinando todo o espaço da loja. O cartaz do lado de fora anunciava a inauguração para a semana seguinte, o que significava que ela teria que trabalhar muito para cumprir o prazo, mesmo com todos os feitiços do mundo. As prateleiras estavam vazias como as vitrines, e muitas estantes permaneciam no chão esperando por alguém que as montasse. Rony tinha um estilo de vida bem calmo e previsível, tirando as emergências do trabalho. Poderia ajudá-la se ela quisesse. E sabia que ela aceitaria sua proposta.
_ Precisa de ajuda aqui?
Então ele encontrara um bom argumento para convencê-la a aceitar sua presença. Ignorando a pergunta, Hermione voltou ao trabalho. A história de estar procurando um livro devia ser só uma desculpa.
_ Não, obrigada.
_ Pense bem, Mione. Juntos terminaremos tudo a tempo.
_ Não se você insistir em ficar no caminho.
Ele se colocou exatamente na frente de Hermione e abriu os braços.
_ Diga o que devo fazer. Sou obediente.
“Merlin! O que fizera para merecer isso? Talvez ele sentisse um prazer perverso na rejeição.”
_ Por que quer ajudar-me?
_ Porque sou um bom guarda-bruxo – respondeu ele mostrando seu melhor sorriso.
Pensando bem, estava desperdiçando uma oferta tentadora. Não podia contratar alguém para ajudá-la, uma vez que ainda não estava lucrando com a loja, e havia pelo menos umas quatrocentas caixas para abrir, esvaziar e arrumar. Com um suspiro resignado ela se rendeu.
_ Desde que não esteja escondendo outras intenções, acho que posso fazer bom uso de seus braços e músculos.
_ Estão todos a seu dispor. – Rony imitou a pose de um halterofilista, exibindo os bíceps com orgulho. “Santo quadribol e menos um peão!”
Hermione pretendia dar uma resposta espirituosa, mas parou de raciocinar ao vê-lo naquela posição. Era como estar diante de uma rocha. Só vira algo parecido em museus de arte contemporânea e nos livros de História da Arte. Vencido o impacto inicial, ela conseguiu dizer:
_ Você pode ir abrindo as caixas que ainda estão fechadas, esvaziá-las e trazer os livros para cá, por favor.
_ E depois? Sou capaz de seguir duas instruções consecutivas. Experimente!
Experimentar. Por que a palavra soava tão provocante e tentadora? Com um gesto, indicou que ele devia ir abrir as caixas. Pensou em conjurar um feitiço para resfriar o ambiente. De repente sentia um calor insuportável. Mas isso podia prejudicar seus livros. Só poderia fazer isso depois que os protegesse.
Na opinião de Rony, a vista de onde estava compensava o desconforto de trabalhar como um louco numa loja quente, onde a temperatura beirava o intolerável. Ela teria que providenciar um feitiço de refrigeração para o verão. Hermione era linda e tinha um corpo maravilhoso. Cuidou de esvaziar mais algumas caixas. Nunca vira tantos livros antes, talvez só na biblioteca de Hogwarts.
Virando-se para perguntar onde deveria deixar os livros de Feitiços Estuporantes, encontrou-a no vigésimo degrau de uma escada corrediça, ajeitando alguns livros nas prateleiras intermediárias. A camiseta justa e clara revelava seios pequenos e acompanhava o movimento dos braços deslocando-se até uma região perigosa e tentadora. Era difícil respirar. O guarda-bruxos que lidava com situações de emergência e salvava pessoas que ficavam presas em prédios em chamas tremia ante aquela visão. Só que ficou apreensivo e deixou de admirar a paisagem.
_ Tome cuidado! – disse, correndo na direção dela.
Mas era tarde demais. No instante em que ouviu o grito Hermione virou-se e perdeu o equilíbrio. Mal deu tempo de Rony retirar a varinha e lançar um feitiço em Hermione.
_ Aresto Momentum! – Não se lembrava de como havia conseguido percorrer o restante do caminho em menos de um segundo, mas chegou a tempo de evitar o pior. Usando o próprio corpo para amortizar o impacto da queda, segurou-a antes que atingisse o chão. E o que sentia não era apenas alívio. Não. Foi assaltado de um sentimento muito mais intenso. Difícil de descrever.
Agitada, com o rosto vermelho e a respiração arfante, Hermione removeu os braços de seu pescoço. Não fosse a presença de espírito e a experiência de Rony, o tombo a teria tirado de circulação por um bom tempo, impedindo a inauguração da loja e a entrada do necessário capital para que pudesse recuperar o dinheiro investido na loja. Ele a salvara do desastre. Mas fora ele também quem provocara a queda.
_ Vai ter de parar de me cercar desse jeito. – ela esbravejou.
_ Eu gritei do outro lado da loja porque vi a escada deslizando. Chama isso de cercar? – Ele respondeu bravo. Ela parecia assustada e Rony ainda não sabia se provocara algum ferimento ao ampará-la. Acalmou-se e perguntou analisando-a – Você está bem?
A raiva perdia intensidade diante do óbvio. Rony a impedira de cair e ferir-se seriamente.
_ Estou bem, Rony. Exceto pela minha dignidade.
_ Vai recuperá-la em alguns minutos.
Coisas estranhas aconteciam dentro dela, coisas que não a agradavam. Não tinha tempo nem disposição para percorrer um território que já havia conhecido antes, por maior que fosse a insistência de sua mãe.
_ Não tem um incêndio para apagar? – ela sussurrou.
Os olhos dele buscavam os dela, despertando desejos que Hermione não queria experimentar.
_ Estou me esforçando para isso. – ele respondeu.
O tom de voz provocou o curto-circuito que ela tentava evitar. Hermione respirou fundo várias vezes, mas foi inútil.
_ Pode me pôr no chão, por favor?
Ele hesitou, mas atendeu seu pedido.
_ Desmancha-prazeres. – Passando as mãos nos cabelos molhados de suor, sugeriu: _ Por que não fazemos um intervalo?
Hermione olhou em volta e constatou que Rony tinha razão. Com sua ajuda, havia feito grandes progressos. Tanto que cumpriria o prazo para inauguração com alguma folga. O que significava que teria mais tempo para enfeites e outras ornamentações.
_ Boa idéia – concordou – Alguma sugestão?
Rony deixou escapar uma gargalhada rouca, sexy, provocante. Foi difícil evitar um rubor.
_ Não faça essa pergunta de novo, Mione. Eu posso responder.
“Desde quando Ronald Weasley a deixava embaraçada? Era o contrário...” Ela assumiu uma expressão severa.
_ Só queria saber se prefere comer, beber alguma coisa ou simplesmente sentar-se e respirar. – ela respondeu tentando passar indiferença.
_ Eu ainda não almocei, Mione. Você já? Poderíamos ir ao Hogsfoot Taney. Você conhece? A comida é maravilhosa. Que tal?
_ Ótimo, então. Mas você está precisando se lavar... – Ao sentir a mão dele em seus cabelos, não foi capaz de manter a calma – O que está fazendo? - Ela quase gritou.
_ Você tinha uma sujeira nos cabelos – E mostrou-lhe os resíduos em seus dedos. _ Só quis removê-la.
Rony devia considerá-la um pesadelo mesmo! Não que sua opinião tivesse importância. Aborrecida, recuou um passo.
_ Gostaria que não insistisse em tocar-me.
Para deixá-la mais calma, Rony pôs as mãos nos bolsos. Mas não mentiria. Os olhos continuavam fixos nela, acariciando e explorando. Há muito tempo perdera a vontade de brigar com ela. Pelo contrário... Ele tinha que recuperar a confiança dela e o tempo perdido.
_ Lamento, mas acho que teremos um problema. Gosto de tocá-la. Além do mais ainda não aprendi um feitiço ou técnica de salvamento que exclua o uso das mãos. E você ia cair da escada.
_ Tudo bem – ela suspirou – acho que estou um pouco nervosa – e ele era a razão de sua tensão. Mas preferia não revelar aquele pequeno detalhe – Você pode lavar-se no banheiro que fica na parte superior da loja. Deixe suas roupas do lado de fora e daqui a cinco minutos eu subo e as limpo para você.
_ Você tem trabalhado muito com a mudança e a organização da loja. Tem todo o direito de estar nervosa.
Quando algo parecia bom demais para ser verdade ou não era tão bom, ou não era verdade. Aprendera a velha regra da pior maneira possível.
_ Está fazendo muito esforço para parecer mais generoso e gentil do que é? Esse não é o Ronald Weasley que conheço.
_ Não exatamente, mas... Como estou me saindo?
Esse era outro segredo que ela não pretendia revelar. Apontou para a escada.
_ Por que não sobe logo e se lava?
Hermione aproveitou que Rony subiu as escadas e tentou relaxar. Disse repetidas vezes para si mesma, em mente, que agora eles seriam simplesmente amigos. Mais nada. O beijo de ontem não iria se repetir. Seu braço começou a fervilhar. “Que droga!” – resmungou Hermione passando a mão no pulso – “Quando será que isso iria parar? Talvez devesse ir ao St. Mungus...”
Ao escutar barulho de água caindo no andar superior, ela subiu as escadas e, pegando o uniforme de Rony, lançou um feitiço para limpá-lo. Satisfeita com o resultado, tratou de limpar-se a si mesma e arrumar os cabelos que estavam totalmente desalinhados. Já ia preparar-se para descer quando Rony entreabriu a porta do pequeno banheiro e perguntou a ela se havia alguma toalha por ali, ao que ela respondeu que não.
_ Desculpe-me, Rony, mas ainda não trouxe objetos de higiene pra cá. Você terá que secar-se usando algum feitiço. – ela evitava olhar na direção da porta.
_ Passe-me uma varinha, então. Acho que deixei a minha lá embaixo. E minhas roupas também, por favor.
Ao entregar sua varinha a Rony, seus dedos se tocaram e ela sentiu aquela onda de choque já tão conhecida percorrer-lhe o corpo. Ele entreabriu mais um pouco a porta, deixando parte do seu peito à mostra e os cabelos ruivos, completamente molhados... Hermione tratou de entregar-lhe o uniforme e sair dali o mais rápido possível. Não suportaria vê-lo em trajes sumários. E assim o fez.
Minutos depois ele descia as escadas já vestido, sentindo-se refrescado e limpo. Hermione evitou olhar em sua direção, mas sentia os olhos azuis sobre ela. Levantou-se e aguardou ele se aproximar.
_ Vamos, então? – ele perguntou já segurando a mão dela.
_ O que está fazendo?
_ É a segunda vez que me pergunta isso hoje. Estou segurando sua mão. O comportamento é aceitável no mundo inteiro e, hoje em dia, já não é mais punido com a pena de morte.
Hermione soltou-se com um movimento brusco e ficou tensa pela milésima vez só naquele início de tarde. Rony não tentou retomar o contato.
_ Só queria dizer que precisa afastar-se do calor, da poeira e do trabalho por alguns minutos. Nem que seja só pra comer alguma coisa. Prometo não tocar em você. - “Não hoje” – disse pra si mesmo e saiu porta afora.
O protesto que se formou no cérebro de Hermione não ultrapassou a barreira dos lábios. Quando percebeu o que fazia, já havia passado pela porta da loja atrás de Ronald Weasley e fechando-a, desaparatou com ele para o restaurante Hogsfoot Taney.
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No restaurante, Hermione insistiu em pagar pelo almoço de ambos. A determinação com que entregou as moedas ao elfo que os servia foi suficiente para fazer Rony entender que seria inútil discutir e ele guardou seu saco de sicles antes que ela o olhasse novamente com aquela maneira mandona de ser que era só dela.
_ Prefiro não discutir com uma dama... Em público – disse ele colocando uma generosa garfada de seu ensopado de carneiro na boca – Mas estaria mais contente se houvesse deixado a conta comigo.
_ Está me ajudando na loja. O mínimo que posso fazer é pagar seu almoço. _ disse ela achando que essa forma de conduzir as coisas faria com que Rony entendesse que o relacionamento deles não mais passaria de amizade, no entanto, vendo o sorriso malicioso que se desenhou nos lábios do ruivo acrescentou: _ Sei que você quer que eu faça muitas outras coisas para demonstrar minha gratidão, mas não irei além do almoço.
Rony sabia que ele era a razão do medo que havia nos olhos dela. Ele agora estava mais maduro, mais aberto para entender e perceber os sentimentos da ex-namorada. Procurou tentar conversar sobre o que os afastou... Eles ainda se deviam essa conversa.
_ Você não confia mais em mim, não é mesmo, Mione?
Ela terminou de mastigar a porção de alimento que colocara na boca e ergueu os ombros certa de que seria analisada por ele. Rony só sabia fazer isso agora...
_ Se quer saber, a resposta é sim. Não confio mais em você.
_ Nem como amigo? – Rony continuava comendo.
_ Não sei, Rony. Talvez sim. Talvez não. Mas você quer ir além disso.
_ Eu sei que te fiz sofrer, Mione, mas acredite, eu sofri também. – ele procurava os olhos dela.
Por alguma razão, a afirmação de Rony não provocou a dor esperada. Talvez por estar se esforçando para colocar a maior distância possível entre o passado e o presente. Talvez por ter atingido um estado de torpor depois de mais de dez meses de solidão e lembranças amargas.
_ Não que seja da sua conta, mas... Sim eu sofri muito. Acreditei que nosso... relacionamento fosse eterno e verdadeiro, mas foi pura ilusão.
Rony parou de comer. De repente o ensopado perdeu o sabor e a cerveja amanteigada não o agradava mais.
_ Você não me ama mais, Mione?
Mesmo depois de tanto tempo, Hermione ainda não conseguia pronunciar a palavra. “Amor”. A idéia de que aquele sentimento tão puro e sublime tivesse sido destruído era simplesmente horrível. Saber que Rony a descartara tão facilmente por uma outra moça, totalmente desconhecida a fazia acreditar que ele não a amava como dizia e que facilmente a abandonaria ante qualquer ínfimo problema que aparecesse. Ele fugia da maturidade. Ela não respondeu a pergunta dele diretamente, mesmo porque não tinha certeza de nada.
_ Pensei estar namorando o homem perfeito e descobri que você era uma espécie de “Peter Pan”. Infelizmente, Rony, nunca fui parecida com a fada Sininho. Eu já cresci e você foge da maturidade – Mione abaixou a cabeça para esconder as lágrimas que inundavam seus olhos. Não estava gostando nada do rumo daquela conversa.
_ Mas você não leva em consideração que os meses que passamos juntos foram os mais felizes de nossas vidas? – ele perguntou.
_ Sim, naquela época eu pensava ser feliz. O problema é que eu estava vivendo com uma pessoa que só existia na minha imaginação. Você foi imaturo, egoísta e irresponsável! – ela estava começando a se irritar – Bem, vivendo e aprendendo.
_ Estamos sempre aprendendo, Mione. E você precisa aprender a perdoar. Eu não tive culpa pelo que aconteceu... Não totalmente... – encarou-a para provar que não escondia nenhum segredo.
_ Como não!? Merlin, proteja-me dos fantasmas de Peter Pan. – resmungou ela.
_ Não sou Peter Pan – respondeu ele irritado. - Você precisa saber e acreditar no que aconteceu naquele dia. Eu amadureci com a nossa separação, com o sofrimento que isso me causou e com o meu trabalho.
_ É difícil acreditar em qualquer coisa depois do que vi. – disse ela categórica e respirou fundo, tentando manter a calma.
_ Eu também vi coisas, Mione. Que não eram verdadeiras, e entendi depois.
Hermione sabia que ele se referia a Krum e ao fato de tê-lo visto cumprimentá-la na festa e achar que tivesse havido algo mais entre eles.
_ Não tente me confundir, Ronald Weasley! – ela estava vermelha e já começava a falar alto – Eu não beijei o Krum como você me acusou, mas eu VI você beijando aquela moça e me descartando como se eu fosse uma qualquer.
Rony resolveu parar com as comparações, pois soube que não chegaria a lugar nenhum com aquela conversa. A situação só iria piorar... Uma outra hora tentaria contar para ela o que realmente aconteceu...
_ Não vamos mais falar disso, certo? Pelo menos, por enquanto. Mas outra hora você precisa me ouvir.
Hermione já ia dar uma resposta atrevida para ele quando viu alguém que se aproximava da mesa acenando para eles.
_ Rony, parceiro! Tudo bem? – e voltando-se para Hermione disse: - Srta. Granger, que prazer revê-la – tomando a mão dela, beijou-a.
_ Olá, Nick. – disse Rony fazendo uma careta para aquele beijo – Vim mostrar o restaurante da sua mãe para Mione.
_ Olá, Sr. Taney. – cumprimentou Hermione.
_ Nick. Para você – e encarou-a de modo perturbador.
Rony começou a irritar-se com a atitude do amigo e foi logo dizendo.
_ Já estávamos de saída, Nick. Depois conversamos. Vamos, Mione?
_ Mas já? Fiquem mais um pouco. Agora que cheguei poderíamos conversar...
_ Lamento, Sr. Taney... Nick. – Hermione falou – Mas não será possível. Preciso terminar de arrumar minha loja. Mandarei um convite para a inauguração.
_ Então outro dia, poderemos sair... – disse Nick olhando para ela. Ao encarar o amigo, emendou: _ Digo, eu, você, Rony e Samanda. Que tal?
_ Veremos, Nick, veremos – disse Rony já puxando Hermione para a saída sem deixar que ela respondesse. “Controle os seus monstros, Rony” – ele se lembrava das palavras de seu amigo Harry.
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_ O que é isso? – Rony retirava da caixa um livro em forma de bruxa, com vassoura e tudo mais.
Haviam retornado do almoço há três horas e trabalharam com afinco durante todo o tempo, transformando a loja em um lugar capaz de encantar adultos e crianças. Rony nunca conheceu ninguém que trabalhasse tanto quanto Hermione. Aliás, tudo que ela fazia era com muita responsabilidade e dedicação. Ficara surpreso também quando, alguns minutos antes ela anunciara que dariam o dia por encerrado e que ele podia ir, se quisesse.
_ É um livro de histórias infantis – Olhou para o livro que havia procurado nos últimos vinte minutos. – A expressão no rosto de Rony a fez sorrir. Uma careta hilária – Tem vários contos e outras histórias bruxas para crianças. Não é enfeitiçado, mas bastante colorido e divertido. Acho que sua amiga Eileen irá adorar.
_ Creio que sim. Certamente ficará apaixonada pelo livro. – Rony pegou seu saco de sicles – Quanto custa?
_ Considere um pagamento pelos serviços prestados.
_ De jeito nenhum – E abriu o saco pegando vários sicles – Não vai conseguir sobreviver como comerciante se começar a distribuir a mercadoria antes mesmo da inauguração. Veja Fred e Jorge. Não dão nada de graça, nem para a família. É tudo vendido.
Hermione ignorou o dinheiro. Em vez de aceitá-lo, pegou uma das sacolas ainda sem o logotipo de sua loja e colocou o livro dentro dela. Depois entregou a sacola a Rony.
_ Gosto de pagar minhas dívidas.
Nunca havia considerado a teimosia de Hermione uma característica atraente, antes. Mas depois que se apaixonara por ela, sempre a observava erguer o queixo e empinar o nariz e isso o deixava encantado pela ousadia. Adorável. “Será que ela não percebia o quão menor do que ele ela era?” – “Se ele quisesse a levantaria nos braços agora mesmo sem fazer a menor força.”
_ Você já pagou meu almoço, Mione. – limitou-se a dizer.
“Por que ele tinha que discutir sobre um assunto tão simples? Só queria ser gentil e justa.” – pensou ela nervosa.
_ Se houvesse contratado alguém para ajudar-me, certamente estaria pagando mais de oito sicles por dia.
_ O almoço e a cerveja custaram dezesseis sicles. – retrucou ele.
_ Mas eu consumi a metade do que compramos. – Hermione insistia.
_ Entendo. E o livro é o restante do pagamento. – disse Rony.
- Exatamente – Hermione disse essa palavra como se respondesse a uma questão de uma prova em Hogwarts.
_ Muito bem. – Rony colocou a sacola sobre o balcão – E quanto à gorjeta? – ele aproximou-se. Era a hora de derrubar mais um peão naquele difícil jogo de xadrez.
_ Gorjeta? – Hermione olhou em volta imaginando se Rony havia se interessado por algum outro livro. – Quer mais alguma coisa?
_ Sim. - Rony gostava da escolha das palavras.
“Oh, não. Aquele tom de voz... Sabia o que Rony queria. A mesma coisa que ela desejava. Mas já havia errado antes. E não queria errar de novo.” Hermione não suportava errar. Prendendo o fôlego cravou os olhos nos dele.
_ O que é? – arriscou-se na pergunta. O sorriso de Rony era provocante, atraente, irresistível. Ela tremia. Ele a estava acuando.
_ Adivinhe. – a voz era cheia de provocação, tentação, sedução.
_ O livro de histórias de animais?
_ Não. Gelado – disse ele preparando-se para dar o bote, os olhos azuis fixos nos dela.
_ Contos de Fadas, talvez? – Hermione estava quente. Muito quente. E tonta. Gostaria de por a culpa na cerveja que provara na hora do almoço, mas só havia consumido meia caneca e há muito tempo. Talvez fosse a falta de refrigeração na loja.
_ Continua gelado – ele segurou-a pela cintura e a ergueu nos braços colocando-a sentada no balcão. Ela era leve. Delicada. E deliciosamente perfumada. Ele aspirou aquela fragrância exótica tão sua conhecida.
O calor, a tontura, a confusão mental... A culpa era dele. Não podia mais negar as evidências. Nem a rigidez do corpo pressionado contra o dela. Então os lábios de Rony tocaram os dela e Hermione soube que estava perdida. Cedendo às sensações, abraçou-o e correspondeu ao beijo, que logo tornou-se mais profundo. Entre os pulsos dos dois novamente circulava em forma de oito uma luz branca fosforescente como poeira cósmica. “Céus! Como desejava aquele homem!” A clareza do pensamento dela foi com uma força que o empurrou pra trás. O movimento foi tão brusco que Rony quase perdeu o equilíbrio. A luz branca apagou-se.
O sorriso nos lábios dele sugeria uma enorme satisfação. E por que não estaria contente se agora ele tinha a certeza de que ela ainda o amava? Mais um peão ao chão no tabuleiro alvinegro da vida.
_ Você vai ao Ministério? – disse ele pegando a sacola. – Preciso voltar ao hospital e poderíamos ir juntos. Gostaria que você conhecesse Eileen. – ele achou que tocar nesse assunto a faria esquecer momentaneamente do beijo.
Hermione tossiu. Tudo nela parecia prestes a explodir em chamas, o que causaria o incêndio devastador. Tentou convencer-se de que era só o Rony que estava ali. Um velho amigo de infância.
_ Talvez – foi só o que ela conseguiu responder já pegando sua bolsa sobre o balcão. Preciso ir logo ver se as bruxas da Ficsorkut já têm o nome da minha loja. Não vejo a hora de pendurar a placa.
“Deu certo” – pensou Rony – Para vencer uma batalha, às vezes é melhor recuar um passo na hora certa, para depois avançar dois ou três no momento oportuno. Uma boa estratégia.
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Rony estava certo. Eileen era encantadora. Uma menina esperta e inteligente. Viva. Essa era a palavra certa. E transmitia a todos que a cercavam uma energia pura, cristalina, inocente. Hermione gostara dela imediatamente e a recíproca era verdadeira. Eileen estava radiante com o presente e com a nova amiga.
_ Você também é mágica? – perguntou Eileen ao ver a varinha que Hermione tentara esconder dos olhares curiosos da menina, mas em vão. E explicou: _ O Rony é um bombeiro mágico... Ele consertou minha perna – Eileen esticava a perninha para Hermione.
_ Eu sou bruxa. – Hermione decidiu que não havia problema em falar aquilo para Eileen. Sorriu ao ver a careta que a menina fez, incrédula.
_ Você não parece uma bruxa. – concluiu Eileen. Para ela aquela era uma possibilidade muito remota em sua mente infantil. As bruxas que conhecia eram feias e asquerosas. – Parece mais uma fada, não é Rony?
Rony que assistia ao encontro das duas, enlevado, saiu momentaneamente de seus pensamentos ao ouvir a pergunta de Eileen.
_ Sim, Eileen, uma doce fada. Mas ela é uma bruxa mesmo. Uma boa bruxa que enfeitiçou meu coração – disse ele piscando para Hermione que enrubesceu e baixou a cabeça.
A preocupação de Rony agora girava em torno de onde Eileen iria ficar quando recebesse alta, pois seus pais não poderiam retornar a Londres tão cedo, devido a problemas com a proibição do tráfego aéreo e outros meios de transportes. Por enquanto ninguém poderia entrar ou sair da Inglaterra. Pelo menos, até que as investigações policiais estivessem concluídas. Mas os pais de Eileen já estavam sabendo que ela estava bem, no entanto, a morte da avó da menina havia sido confirmada por uma vizinha poucas horas antes. A mulher até se oferecera para cuidar da menina, mas Rony não a considerava alguém confiável, e não sabia explicar por quê. Parecia rude, fria e severa demais a seus olhos e sem condições de tratar bem Eileen. Cochichou para Hermione:
_ Não estou gostando dessa mulher. – a velha senhora a quem Rony se referia ficara na recepção do hospital conversando com alguns policiais e médicos. – Não quero que Eileen seja obrigada a ficar com ela.
_ E o que você pretende fazer, Rony? – Seus rostos estavam muito próximos e Hermione sentiu dificuldade em respirar. Um leve rubor voltou a atingir sua face.
_ Ainda não sei.
Eileen olhava de um para outro sem entender nada. De repente a menina bateu palmas e ficou em pé na cama onde estava e começou a pular.
_ Os bombeiros mágicos podem namorar bruxas boazinhas?
_ Não faça isso, Eileen! Sente-se! – A voz alta e esganiçada vinha da porta do quarto. O sorriso da menina desapareceu de seu rosto e ela sentou-se prontamente, assustada.
Hermione teve que concordar com Rony. Seria terrível demais ter que deixar Eileen com aquela mulher. A expressão de seu rosto macilento era fria demais, os olhos injetados. O cabelo parecia que não via um pente há semanas. A roupa que vestia só servia para confirmar seu ar austero: A blusa verde musgo de mangas compridas abotoada na frente tinha uma gola alta e rendada que lhe cobria todo o pescoço e estava mal enfiada por dentro de uma saia de pregas alaranjada enfeitada de flores azuis que ia até o meio das pernas. “Aquelas estampas eram flores?” – pensou Hermione ainda analisando o visual da velha senhora. Completando o traje havia um colete... - “Merlin! Que cor era aquela?” - ...coberto por bolinhas amarelas. Sapatos tipo mocassim, rasos, pretos. As pernas estavam calçadas por meias marrons. Hermione saiu de seu transe ao escutar Rony gritar.
_ Não fale com ela desse jeito! – Rony aproximou-se da velha com os olhos arregalado, as faces vermelhas, já bufando feito um touro bravo – Já não basta o que ela passou hoje?
Hermione correu e segurou Rony pelo braço tentando acalmá-lo. Rony era uma pessoa tranqüila, mas se transformava em uma fera quando estava irritado. A velha analisou o ruivo alto a sua frente, mas não se deixou intimidar por aquela imponência.
_ As crianças precisam de limites e você é muito jovem para entender isso, meu caro. Fui professora durante anos e...
_ Não quero saber de sua profissão! Sua vida não me interessa – Rony estava prestes a estrangular a velha senhora. Hermione tentava segurar o braço que ele sacudia enquanto praguejava. Ele era muito ciumento das coisas que gostava e isso não iria mudar.
_ Rony! Rony! Não fale assim na frente da menina. Não vale a pena! Venha! Vamos lá pra fora conversar com os médicos e com a assistente social e ver o que podemos fazer, sim? – E virando-se para Eileen disse:
_ Nós vamos aqui fora e já voltamos, querida, certo?
A menina limitou-se a assentir com a cabeça, ainda assustada pela discussão que observara. A velha aproximou-se da cama e começou a conversar com Eileen fazendo-a se deitar e puxando as cobertas até seu pescoço.
Hermione saiu porta afora puxando o ruivo teimoso pelo braço e o repreendeu:
_ Acalme-se, Rony! Por Merlin! Por que não tenta conversar de vez em quando?
_ Aquela mulher, Mione. Não fui com a cara dela. Ela não é boa companhia para Eileen. – decidiu ele. – Preciso tirar ela daqui. Vou levá-la comigo!
_ Rony! Você não pode. Pense bem. Como você vai trabalhar? Não tem com quem deixá-la e...uma criança exige cuidados, atenção...
_ E o que você quer que eu faça? Que eu a deixe nas mãos daquela mulher?
Hermione teve que concordar que também não aprovava aquela situação, então, quase sem se dar conta do que estava fazendo, virou-se para ele e disse:
_ Tudo bem. Eu ajudo você. – suspirou deixando os braços cair ao longo do corpo numa atitude de derrota. Não adiantava brigar quando Rony colocava uma coisa na cabeça. Ele era muito insistente e convincente. De repente foi erguida do chão. Ele rodopiava com ela pelo saguão do hospital e beijava todo seu rosto. As enfermeiras que passavam lhes lançavam um olhar de inveja, mas cúmplice: “Que mulher de sorte! Ah, eu com um homem maravilhoso desses...”
_ Obrigado, Mione. Obrigado. Eu te amo! – e correu para falar com os médicos e a assistente social.
Hermione ficou ali parada, meio que abobalhada lutando contra a profusão de sentimentos e dúvidas que a assaltavam. Lutava entre o desejo de se entregar novamente àquele amor e a razão que dizia para que quebrasse o encanto de qualquer jeito. Mas agora era meio tarde para isso... Já havia concordado em ajudá-lo, e seus planos de se manter afastada dele estavam cada vez mais indo por água abaixo. Isso a preocupava, pois a tentação de ceder a tudo que ele lhe pedia era irresistível. Aliás, ele era irresistível... Assim como o amor que sentia por ele... Mas depois ela pensava nisso. Agora tinha que ajudá-lo a preencher os papéis para tentar conseguir a guarda provisória de Eileen, enquanto os pais da menina não voltavam.
No interrogatório que se sucedeu, Hermione deu o endereço da casa de seus pais, em Londres, pois o lugar onde realmente morava não existia para os trouxas. Hoje mesmo ela explicaria tudo para eles. A assistente social lhes informou que estariam analisando a situação e que o desejo da menina também seria levado em consideração. No entanto, teriam que aceitar a decisão final, fosse qual fosse. Rony concordou apesar de não ter gostado dessas palavras.
Rony decidiu ficar no hospital com Eileen. Despedindo-se de todos, Hermione foi para casa de seus pais. Foi um dia intenso para ela, cheio de fortes emoções. Ela ainda precisava resolver algumas coisas, pois se fossem ficar com a menina por uns dias, haveria também muitas responsabilidades. Não tinha certeza se Rony estava realmente atentando para isso, mas agora não havia como voltar atrás.
Emocionada, lembrou-se do impacto que ele causou nas bruxas do Ministério quando apareceu lá, horas antes, acompanhada dele. As bruxas congelaram e não foi difícil conseguir delas o nome de sua loja. “Se soubesse disso antes...” Numa atitude solene, as bruxas Renata – cheirando seu pote de orégano, Mariana – aspirando profundamente seu pó de flu, Gabi - sorridente, Panddorie – vestida de baiana e Priscila – cheia de tênis molhados pelo pescoço, aproximaram-se com um pergaminho nas mãos e anunciaram em coro, seguidas por todas as outras bruxas do Ficsorkut:
_ Srta. Hermione Jane Granger. De hoje em diante sua loja terá o tão brilhante e fabuloso nome por nós escolhidos de: RABISCOS & FEITIÇOS.
Seguiram-se vivas, urras e aplausos em geral. Rony a abraçou. Interessante que ele participasse desse momento, tão importante para ela.
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