Capitulo único ;



A última dança.



Eu era jovem, muito jovem quando a conheci.Costumava passar horas sentado na porta de minha casa num vilarejo bruxo pouco conhecido.Recordo-me agora que, foi sentado exatamente aqui, nesse degrau, que vi a garota dos cabelos dourados pela primeira vez.Ela havia se mudado há pouco tempo com a família, e costumava se sentar na sombra da macieira que havia no fim da rua, sempre escrevendo febrilmente num pequeno caderno de desenho.Eu passava horas apoiado a cerca, fitando cada traço delicado de seu rosto e aos meus olhos de menino ela era um anjo.Ela devia ser mais jovem que eu, e era mais baixa também.Tinha cabelos longos e ondulados, que lhe caíam até a cintura numa bonita cascata dourada.Ela apressava-se a sorrir para mim quando voltava para casa e me via ali, fitando-a. Até que, em uma bonita tarde de verão, ela foi falar comigo.Sua voz era doce, calma, como se nada no mundo pudesse deixa-la triste ou zangada.E eu me sentia calmo e feliz ao lado dela.

Passávamos horas e horas, conversando e rindo. Ah, a risada dela.Era melodiosa, soava como música aos ouvidos alheios, como eu adorava ressaltar.Eu costumava espera-la todas as tardes embaixo da macieira, sentado e então, ela vinha sorrindo ao meu encontro, dizendo o quanto ansiara por me ver novamente.E eu sentia o mesmo.Mas foi numa tarde nublada que tudo pareceu voltar as trevas para mim.Eu a esperei, como sempre, mas ela não veio. As horas passavam rapidamente, e só percebi que ela não viria quando o sol começou a se pôr. Preocupado, desci a rua até sua casa, em frente a minha, e bati na porta, esperando e desejando que ela corresse e dissesse que havia esquecido e somente isso.Mas o que veio fora muito pior. Aparentemente a senhora que me olhara com extremo nojo era a mãe de minha amada, e ela rapidamente me mandou embora, dizendo-me para ficar longe de sua filha. Ela descobrira que eu era um amaldiçoado. E então, lançando um último olhar a minha dama, que derramava várias lágrimas ao me ver partir, sai de sua porta, cabisbaixo, mas não fui para casa.

Passei a noite embaixo da macieira, os olhos fechados, pensando se algum dia ouviria a risada dela novamente. Amanheceu e eu voltei para minha casa, alimentei-me, fiz minha higiene diária e sai novamente, rumo a árvore que fora testemunha de toda a felicidade que, por um minuto, eu achei que duraria para sempre. A chuva fina começava a cair e eu, encostado a árvore, senti o vento frio tocar-me a face.Permaneci lá, somente minha dor e eu, quando algo quente e confortante tomou meu rosto, acabei por abrir os olhos e sorri inconscientemente ao reconhecer os traços delicados do rosto dela.Ela sorriu para mim, e eu lhe tomei nos braços, selando o amor que eu sabia haver entre nós, com um longo beijo.Seus lábios eram quentes e doces, sua língua brincava com a minha em perfeita sintonia e então, senti que ela se afastava.Mas ela sorria. Puxou-me pelas mãos até a pequena cabana onde, um dia, havíamos imaginado morar ali.Havia uma cama improvisada no chão, milhares de cobertores e dois travesseiros, e quando nos deitamos, finalmente entendi o que ela murmurara em meu ouvido.

Entre juras de amor, gemidos de prazer e calorosos beijos, tornei-a minha, e somente minha.Percorri suas curvas com calma, beijando-lhe toda e cada parte de seu belo corpo, sentindo-me completo a cada suspiro de prazer que escapava de seus lábios rosados. O sol não chegara na manhã seguinte, por isso, permanecemos abraçados, esquentando-nos como podíamos, enquanto ela beijava meu pescoço docemente, de um jeito dela e somente dela. Ela então, tempos depois, vestiu-se e me pediu que fizesse o mesmo.Saímos, ambos rindo para fora da cama, como dois bobos apaixonados e era o que éramos.Dois apaixonados que somente queriam curtir o amor que havia ali, entre nós.Ela, contando-me que aquele dia, vinte e dois de Julho, era seu aniversário, pediu-me com seu melhor olhar que dançasse com ela sua valsa, como dançaria com o príncipe encantado em seus quinze anos recém completados.E ali ficamos, os corpos molhados encostados um ao outro, trocando caricias até que a chuva cessou.

Passaram-se dias depois disso, e eu não mais a vi.Esperava, novamente abaixo da macieira, que ela corresse para meus braços e novamente dissesse que me amava tanto quanto eu a amava também.Mas isso não aconteceu. Em uma manhã fria, ao fitar sua casa pela janela embaçada, pude ver sua criadora correr e berrar em total desespero que ela havia amanhecido morta, coberta pelo próprio sangue. Juro que tentei correr até lá, mas meus pais me impediram. Imploraram que eu não lá fosse, e que não contasse a ninguém sobre nossa relação, ou teríamos que sair dali.Claro, novamente a injustiça. A mãe dela era a culpada, e ela mesma sabia disso, mas preferiu dizer que um monstro como eu havia matado-a. E claro, porque a sociedade acreditaria em mim?

Pedi a mamãe, que fazia força para não chorar, que me desse uns minutos sozinho na cabana onde havíamos passado nossa primeira e ultima noite de amor.Parado a porta, jurei ouvir sua voz doce e melodiosa dizer novamente as três palavras que eu sempre quis tanto ouvir.E assim, parti daqui.Mas agora voltei, disposto a recordar-me de cada traço de seu rosto antes de começar nova vida.Encaminho-me agora, mais uma vez sozinho em meio a forte chuva que cai, para a cabana onde passei o melhor momento de minha vida, com a mulher, a única mulher, que amei.Andei até o canto, onde jaziam os cobertores e os travesseiros, que ninguém havia tido coragem de tirar dali.E então, um pedaço de papel me chamou a atenção.Peguei-o e o desdobrei, sorrindo tristemente ao ler as ultimas palavras de minha amada, enquanto várias lágrimas deixavam meus olhos.Imaginei que ela sorria ao escrever aquilo, e então, coloquei a carta ali, embaixo das cobertas, arrumando-as.Seria a lembrança concreta de que, um dia, ela fora minha.

Sai então daquele lugar, carregando comigo um coração mais leve. E parti para sempre daquela vila, com uma certa mulher de belos cabelos dourados em minha mente, onde ela ria e me abraçava, sendo feliz ao meu lado.

~

A carta permanece na cabana, como uma breve recordação, e foi achada pela mãe da garota, que acabou se arrependendo pelo que fez a pobre apaixonada passar.

”Querido Remus,

É com um sorriso enorme que lhe deixo minha mais preciosa lembrança.O desenho do garoto que me observava, apoiado a cerca de madeira.Saiba que, em momento algum, arrependi-me dessa decisão.
Saiba que, desde o dia em que seus olhos amendoados me fitaram, percebi que lhe amava mais que tudo em toda minha vida.E descobri com você o que é amar e ser amada.Saiba que cada beijo, cada palavra, cada toque foi mágico para mim. Só, por favor, não chore.Prometemos um ao outro que jamais choraríamos, a não ser de felicidade, lembra-se? Eu me lembro.
Pense que, agora, estarei ao seu lado não importa o que aconteça, e desejo do fundo do meu coração que encontre um grande amor, pois mereces toda felicidade do mundo.

Com todo amor da sua, e pra sempre sua,
Dorcas J. Meadowes.”

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