Capítulo I
Aquela era sem dúvida a pior noite dos últimos tempos. Lá fora uma chuva intensa, retirava a visão da paisagem londrina, que graças à tempestade, apenas era adornada por um ou outro gato, que em vão, se tentava abrigar da chuva.
Numa pequena casa em Baker Street uma mulher observava a chuva, com o olhar perdido em memórias. Era alta, com cabelos ruivos flamejantes, e olhos de uma mistura harmoniosa cor de avelã e mel. A sua beleza sempre a deixara ter o luxo de ter quem quer que fosse, mas a sua maior arma era o sorriso. Sincero e inocente, que punha qualquer um hipnotizado e produzia uma força invisível que os atraía até ela, e o seu olhar sempre tivera um brilho peculiar, que fazia as delícias dos homens.
Ela sabia de tudo isso, mas mesmo assim não se achava superior aos outros. Isso estava completamente fora das coisas que ela considerava serem correctas. Sempre odiara as pessoas arrogantes, e isso fazia dela uma das pessoas mais respeitadas da cidade.
Mas há muito, que o seu olhar já não tinha o mesmo brilho, e que o seu sorriso já não era tão cristalino. Muitas coisas tinham mudado desde o mês passado. Em apenas uma noite, tinha visto a sua vida desmoronar. O seu casamento com o homem que ela mais amara na vida, tinha acabado tão bruscamente, como inesperadamente.
[b][i]Flashback[/i][/b]
Tinha chegado mais cedo da sua viagem de negócios, e resolvera fazer uma visita surpresa ao marido. Entrou em casa sorrateiramente, e com um sorriso nos lábios dirigiu-se ao quarto. Ao abrir a porta foi como se o seu coração tivesse parado.
Ali estava o homem a quem tinha jurado dedicar a sua vida, loiro, com os olhos de um leve tom de cinza, e com o corpo musculado, resultado da carreira profissional em futebol, aos beijos com uma mulher de aspecto levemente oriental, com longos cabelos negros brilhantes, tal como os olhos. Ele sorria enquanto ela dava ligeiras mordidelas no seu pescoço.
A custo, os olhos dele abriram-se, enquanto se preparava para voltar aos lábios daquela mulher, quando se apercebeu de uma nova presença no quarto. Observava aquela mulher encostada à ombreira da porta que tinha o olhar fixo nele, com a consciência e o coração pesados. Ao contrário do que ele pudesse imaginar, ela não deixava transparecer, ódio nem fúria, mas sim, desilusão, desprezo e frieza, o que para ele era muito pior, pois fazia com que ele se sentisse ainda mais culpado.
Agilmente, livrou-se da companheira, que só naquele momento é que se apercebeu da presença da mulher, e aproximou-se da única pessoa que nunca o abandonara em momento algum. Foram até à sala, com um silêncio pesado abatido sobre eles.
-Conseguimos acabar antes do previsto -disse ela quebrando o silêncio, sem deixar de o olhar nos olhos.
-Ginny… eu só… não sabia que…-gaguejou ele enquanto olhava atentamente para os pés, à procura das palavras certas.
Como é que ele queria encontrar palavras? O que ele fizera não tinha perdão, e ele sabia disso. Tinha passado todas as barreiras do aceitável. Ele sempre fora um grande mulherengo, e Ginny sabia disso. Uma vez enquanto os dois ainda namoravam, ele tinha beijado uma rapariga da claque, mas os seus remorsos tinham sido tantos, que ele acabara por contar a Ginny. Ele estava à espera dela acabar o namoro, que o proibisse de estar a menos de dez metros dele, mas ela apenas lhe tinha agradecido pela honestidade, e o tinha feito prometer que nunca mais o faria.
Desde esse dia que ele cumpria a promessa. Amava demasiado aquela mulher para a perder, mas desde que conhecera Cho Chang, ele percebera o que era realmente esse sentimento, e o que sentia por aquela mulher à sua frente não passava de respeito e amizade. Todavia, devia lhe ter dito isso, mas adiava constantemente por nunca achar o momento certo. Agora nada podia fazer, tinha deixado escapar muitos momentos, e interiormente ele sabia que já era tarde demais, estava na hora de finalmente admitir os seus erros…
-Ginny… eu sei que nada… do que eu vou dizer… vai diminuir os meus erros… nem estou à espera… que me perdoes… apenas que não me odeies – disse ele, mas como a rapariga nada disse continuou –a promessa que te fiz… desculpa se não a consegui cumprir, mas quero que saibas que és muito importante para mim, mas acho que me estou a apaixonar pela Cho…
O silêncio dela era pior do que os gritos dela. Ginny sempre fora assim. Poucas eram as vezes em que ela se descontrolava, e ele sempre a admirara por causa disso. Sabia que era uma pessoa de sorte por ter aquela mulher a seu lado. Quando Lucius Malfoy conhecera a namorada do filho, ficara maravilhado, e a única coisa que tinha dito ao filho tinha sido “Finalmente arranjaste uma rapariga decente, agora vê lá se não a perdes Draco”. [i]Não a percas[/i] dissera ele. Agora era tarde.
O silêncio da rapariga irritava-o.
-GINNY EU TRAÍ-TE E FUI APANHADO. TU DEVIAS ESTAR AOS GRITOS, A DIZER QUE ME ODEIAS, QUE EU SOU UMA PESSOA NOGENTA, NÃO FICAR CALADA COMO SE NADA ESTIVESSE A ACONTECER! – acabou ele ofegante. Tinha dito tudo o que não devia ter dito, e isso fez com que ele não tivesse coragem de a olhar nos olhos.
-Há quanto tempo estão juntos? – perguntou ela por fim, com uma voz extremamente calma.
-Um mês – respondeu ele envergonhado. A voz dela era calma e segura, e isso punha-o ainda pior.
-Porquê que não me contaste?
-Porque nunca era o momento certo…
Ela dirigiu-se à porta, que dava acesso à rua e abriu-a. Uma suave brisa nocturna acariciou-lhe o rosto, fazendo com que ela ficasse mais calma. Com um gesto de mão, indicou a saída ao marido e à amante que agora se lhes juntava.
-Podem sair, e não te preocupes Draco, eu falo com o meu advogado e ele rapidamente trata dos papéis do divórcio.
Sem mais nenhuma palavra, ambos saíram de casa, mas não antes de Draco lhe sussurrar um “desculpa” ao ouvido. Bateu levemente com a porta e deitou-se no sofá da sala. As lágrimas que ela conseguira controlar, escorriam agora livremente pelo seu rosto, sem que ela as tentasse deter. Ela tinha perdido o amor da sua vida, e nada mudaria isso. Foi com esses pensamentos que se rendeu ao cansaço e adormeceu profundamente.
[b][i]Fim de Flashback[/i][/b]
Tinha se divorciado nessa mesma manhã, e apesar da tristeza que sentia, não derramou uma única lágrima. Encaminhou-se lentamente para o quarto e rapidamente vestiu o pijama. Deitou-se vagarosamente na cama, e olhou para as malas à porta do quarto.
Decidira no dia anterior que iria tirar uns dias de folga, sugestão dada pelo próprio patrão, que alegava que ela estava demasiado cansada para trabalhar durante o resto da semana. Ela sentia-se grata por isso. O seu patrão sempre fora um grande amigo e ajudava-a o mais que podia. E com um sorriso nos lábios, adormeceu…
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!