Cerveja Amanteigada
Levando em conta a aproximação dos últimos exames antes do feriado natalino, Harry decidiu gastar o resto da sua tarde de domingo estudando no salão comunal da Grifinória, que não estava tão vazio e silêncioso quanto ele gostaria.
Um trio de alunos do quarto ano passara as últimas duas horas construíndo uma grande fortaleza com o que deviam ser uns seis baralhos Explosivos Multicoloridos Weasley, o mais novo sucesso da loja de Fred e Jorge que já estava virando uma febre entre os estudantes de Hogwarts - todos queriam ter o seu.
Ninguém mais jogava Snaps Explosivos, e Harry começava a perceber que estava, de fato, ficando velho - aquele era um dos jogos que ele e Rony mais jogavam... Depois de xadrez, é claro.
Com um estampido de dar inveja a uma manada de trasgos furiosos, a "obra de arte" dos quartanistas explodiu, e quando a fumaça baixou ficou bastante claro para Harry o motivo do produto se chamar "multicolorido": os três garotos responsáveis pelo acontecido e mais metade das pessoas atingidas pela explosão estavam coloridos.
Harry não pôde conter uma risada ao contemplar a careta de horror de Parvati, que estava completamente pintada de verde da cabeça aos pés. A garota estava prestes a esganar um dos meninos, quando Hermione entrou pelo buraco do retrato. Ela examinou a cena e, após recuperar-se da surpresa inicial, começou a colocar ordem na baguça.
- Quantas vezes eu vou ter que repetir - ralhava Hermione, e os garotos escutavam de cabeça baixa. Ela era, decididamente, o terror da molecada. - Produtos da Gemialidades Weasley são estritamente proibidos dentro das dependências do castelo! Como vocês já estão cheios de saber, eu e o Sr. Filch tomamos a decisão de acrescentar este ítem à lista de proibições, afixada a porta da sala dele, logo no começo do ano letivo, visando acabar justamente com esse tipo de incidente!
- Ah, qual é, Hermione - resmungou um dos quartanistas, que estava laranja. - A cor sai em algumas horas...
- Algumas horas? Algumas horas? - indagou Parvati, desesperada e histérica.
- Bom, não é tão ruim - disse o outro menino, colorido de vermelho. - Ao menos você não está fedendo ou coisa do tipo...
- Não ouse me dirigir a palavra, seu projeto humano mal formulado e mal feito - sibilou Parvati, em fúria. - Meu namorado é monitor da Lufa-lufa, e vou providenciar para que ele faça da sua vida um inferno!
- Uh, olha como eu tremo - caçoou o moleque.
- Chega! - berrou Hermione. - Calem a boca, por Merlim!
Parvati se empertigou, lançando um olhar assassino ao menino. Harry riu. Realmente, não era nada fácil ser monitor, que o diga monitor-chefe, que era o caso de Hermione.
Após uma longa discusão com os quatro - Parvati parecia convencida de que os meninos mereciam cumprir detenções pelos próximos três séculos, e não se conformou quando Mione limitou-se a descontar cinco pontos de cada um -, Hermione conseguiu algum controle da situação. Parvati correu para o dormitório feminino aos prantos, e o trio de moleques responsável por toda a confusão deixou o salão principal sob o olhar exausto de Hermione.
A garota soltou um longo suspiro e largou-se em uma poltrona de frente para Harry, que já havia desistido de seus estudos.
- É simplesmente demais, não é? - Hermione disse sacudindo a cabeça. - Mesmo depois de saírem de Hogwarts, aqueles dois ainda me trazem problemas.
- Quem? - Harry perguntou distraído.
- Ora, Fred e Jorge! - exclamou a menina. - Dois terços dos alunos usam os produtos da loja deles para infringir regras e todo o tipo de regulamento da escola. É dor de cabeça em dose dupla, eu lhe digo.
- Bem, ao menos eles estão lucrando, não é mesmo? - Harry disse com um meio sorriso. Era estranho estar ali, sentado perto da lareira conversando naturalmente com Hermione como se nada tivesse absolutamente mudado. Por algum motivo, ele sabia que ela estava pensando a mesma coisa.
- Quem tenham lucro bem longe de Hogwarts - concluiu Mione, encolhendo os ombros.
Depois disso, nem Harry e nem Hermione conseguiram pensar em algo mais para dizer. Como de costume, o assunto simplesmente morreu entre eles. Nem parecia que tinham passado os últimos anos em companhia um do outro.
- Então - Harry disse, procurando quebrar o silêncio. - Onde anda o Rony?
- Detenção - ela respondeu com ar aborrecido. - Não deve voltar tão cedo... Por quê, você tem algo importante para tratar com ele?
- Não, nada - Harry respondeu procurando parecer natural. - Eu só fiquei curioso... Vocês estão sempre juntos - e forçou um sorriso.
Hermione murmurou algo que ele simplesmente não conseguiu entender, então apressou-se em mudar de assunto.
- O que você está estudando?
- Poções - Harry levantou a capa do livro para que ela comprovasse a veracidade de sua resposta. - Sempre poções...
Hermione arriscou um sorriso.
- Se você precisar de ajuda...
- Não - Harry disse rapidamente. - Não, obrigado. Na verdade, eu já estava desistindo quando você chegou. É impossível se concentrar com todo esse barulho.
-Eh...
Harry percebeu que não poderia manter aquela conversa fluindo por mais um único minuto, de modo que fechou seu livro e pôs-se de pé com um movimento apressado.
- Acho que vou... vou... - Harry disse, mas não conseguiu pensar em nenhum lugar para estar indo. - Bem, eu vou - ele deu um sorrisinho. - A gente se vê depois.
E dizendo isso, ele se afastou lentamente em direção ao retrato da Mulher Gorda. Mal descera cinco degraus para o corredor, Harry ouviu a voz de Mione lhe chamar. Ele se virou, um pouco confuso.
- Espera, Harry! - ela estava parada no alto da escadaria.
- Mione - ele disse, erguendo a sobrancelha em indagação.
Ela mordeu o lábio inferior, como se ponderasse se devia realmente fazer o que quer que estivesse planejando. Então desceu até ficar um degrau acima de Harry, de modo que ele precisava levantar a cabeça para encará-la.
- Você vai fazer alguma coisa importante agora? - ela perguntou.
- Na verdade - Harry disse calmamente. - Não.
- Porque - Hermione apressou-se. - Eu estava pensando em te levar num lugar. - A expressão no rosto de Harry era a da mais completa incredulidade. Não. Ele certamente escutara errado. - Nós podemos... Beber umas cervejas amanteigadas, conversar...
- Acabamos de conversar - foi a única coisa que ele conseguiu dizer.
- É, eu sei - Hermione disse. - Mas existem alguns assuntos que não é apropriado tratar no meio do salão comunal, não é mesmo - O coração de Harry deu um pulo. Será que ela estava falando de... - Como o aletômetro - ela sussurrou, e o rapaz sentiu o balão em seu peito murchar.
- Ah... É claro - Harry disse atordoado pela frustração. - Talvez outro dia.
- Oh, por favor - Hermione disse, e colocou a mão sobre o ombro de Harry com alguma relutância. - Eu não suporto mais tudo isso...
Ela desabafou, e imediatamente se arrependeu disso. Harry fechou a cara e afastou-se bruscamente.
- Acho que vou recusar o seu convite.
- Harry, não faça isso - pediu a garota, e ele sentiu uma onda de revolta dominar seu corpo, fazendo suas orelhas queimarem.
- Escute aqui, Hermione, eu não sou hipócrita - Harry disse com raiva. - Eu não vou sentar e beber uma cervejinha com você como se nada estivesse acontecendo. Não vou pisar em mim mesmo, e nos meus sentimentos dessa maneira.
- Não estou pedindo para você fazer isso - protestou Hermione, desesperada. - Só gostaria de uma trégua! Nem que seja somente essa noite, durante algumas poucas horas! Oh, Harry, você foi o melhor amigo que eu já tive... Em nome disso... Por favor...
Harry encarou Hermione durante alguns momentos, pensativo. Ela parecia realmente sincera em suas palavras, e ele tinha que admitir que, de fato, estava insuportável continuarem agindo do jeito que estavam. Talvez fosse interessante baixar as armas por algumas horas, afinal.
- Está bem - Harry disse de repente. - Uma trégua.
Hermione mal podia acreditar.
- Sério?
- É - Harry confirmou. - Mas é bom a cerveja amanteigada estar bem quente.
***
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