Redenção
Capítulo 19 – Redenção
Redenção: Ato ou efeito de redimir
Redimir: Conseguir a libertação de outrem ou de si
Um ser de vestes negras andava por entre as grandes árvores da floresta que circulava um esconderijo. Ele andou silenciosamente até a entrada de um gigantesco túnel. Parou a alguns metros e se ajoelhou. Esperou alguns minutos até sentir a terra tremer. Então, da entrada do túnel, saiu a cabeça de um dragão. Ele inclinou a cabeça, como forma de aparente submissão.
“Levante-se.” – falou uma voz grave e poderosa na mente do ser – “O que te traz aqui, Dragão Negro?”
Ele se levantou e olhou nos olhos vermelhos do Dragão Ancião das Trevas.
- O que são essas energias que crescem a cada dia? – perguntou Voldemort, direto e calmo.
O Dragão rugiu com ira e, de suas narinas, uma fumaça negra e espessa começou a ser expelida.
- Já está na hora de me contar! – a voz de Tom saiu com mais força – Há mais de três meses as três primeiras energias despertaram e a mais de dois meses a última também despertou.
O Dragão rugiu mais uma vez e parte de seu corpo saiu ameaçadoramente do túnel.
- Essas energias me preocupam. São energias puras, as mais puras que eu já senti em toda a minha vida. – Voldemort fez uma pausa – Se essas energias continuarem a crescer na mesma velocidade que vêm crescendo, logo o equilíbrio mágico voltará a se nivelar.
O Dragão ergueu a cabeça para o céu e rugiu com força, disparando um jato poderoso de chamas negras.
- Não me intimidarei desta vez!
O Dragão se abaixou e aproximou-se do homem, mostrando seus afiados dentes.
- Conte-me!
O Dragão deu um leve rugido e se afastou, colocando parte de seu corpo dentro do túnel novamente.
“Há alguém que pode nos deter.” – Tom ouviu a voz do Dragão em sua mente.
- Quem?
“O Herdeiro Luz.” – a voz do Dragão soou baixa.
- Quem é esse afinal? – Tom já estava cansado de não saber quem era aquele ser que trazia tanto “medo” ao Dragão Ancião das Trevas.
“Tu ainda não te recordas dos últimos instantes da nossa antiga existência.” – houve uma pausa – “Durante a última batalha, os auto-intitulados Dragão Negro e Dragão Branco...” – sua voz ficou mesclada de repugnância ao pronunciar o “nome” do Guerreiro de seu antigo rival – “...discutiram verbalmente. O primeiro dizia que estava adorando poder matar o Dragão Branco.” – novamente sua voz foi cheia de repugnância – “O outro respondia que não iria sozinho para o inferno e que ambos continuariam a lutar depois da morte.”
Tom escutou cada palavra com atenção, sentindo uma sensação estranha.
“Maldito sejas por todas as existências.” – o Dragão falou para si mesmo – “Ele cumpriu com a palavra. Ambos morreram. Eu... tu... ele... e o...” – ele parou.
Tom achou que ele não iria mais falar.
“Tu sabes que havia outro Dragão Ancião. Não sabes?” – perguntou o Dragão, depois de muito pensar.
- Sim. – foi a única coisa que Tom conseguiu dizer.
“Pois bem...” – o Dragão fez uma pequena pausa, como que buscasse algo que Tom não conseguia decifrar – “o outro Dragão Ancião...” – o Dragão soltou uma fumaça negra e muito espessa pelas narinas – “Sempre existem dois.”
- Como?! – Tom não entendera.
“Existe um equilíbrio, tu sabes.” – o Dragão o olhou nos olhos – “Sempre existe e sempre existirá o Lado Negro e o Lado Puro. Como vós humanos costumas dizer: O Mal e O Bem.” – a voz dele ficou repentinamente cansada.
- Não compreendo. – Tom foi sincero, mas não gostou de ser comparado aos humanos.
“Sempre existe algo ou alguém dos dois lados. Nós estamos no Lado Negro. O Dragão Branco e o outro Dragão Ancião do Lado Puro. – expôs o Dragão como se explicasse o porquê do sol surgir todos os dias.
- Isso eu entendo. Mas o que isso nos liga a eles? – Tom ficou irritado.
“Eu e o outro Dragão Ancião surgimos da mesma energia.” – falou o Dragão, por fim, e outra espessa fumaça saiu de suas narinas – “Como vós humanos dizem: nós somos irmãos.”
Tom finalmente se surpreendeu, pois nunca pensara que os dragões poderiam ter irmãos. Muito menos os Dragões Anciãos. Quanto mais o “seu” Dragão Ancião.
- Como... – ele fitou os olhos vermelhos do Dragão.
“Não me pergunte como, pois nem eu sei.” – o Dragão se endireitou e saiu por completo do túnel.
- Então volte ao começo. Volte à última batalha. – Tom praticamente ordenou.
“Não. Ainda não terminei.” – o Dragão abriu as asas e bateu-as levemente.
- Então termine! – Tom, definitivamente, já estava irritado.
“Acalme-se, Dragão Negro.” – o Dragão fechou as asas e se colocou ao lado da entrada do túnel, voltando a olhar para seu Guerreiro.
- Não me peça o que eu não tenho. Calma é um dom humano. E você sabe muito bem que eu praticamente não sou humano. – involuntariamente, Tom acabou por liberar parte de sua aura, sua irritação estava se elevando demais.
O Dragão percebeu o eminente ódio do seu Guerreiro. Ele abriu as asas e rugiu, aproximando-se assustadoramente do humano. Tom realmente acreditou que seria atacado pelo Dragão. Sua aura, como defesa automática, se materializou por completo e criou uma grossa proteção entre ele e o Dragão. O que ele mais temia - sim, ele temia - era que a proteção não aguentasse caso o Dragão realmente quisesse atacá-lo.
“Vá embora.” – a voz do Dragão foi inferior a um murmúrio, era rouca e muito perigosa.
- Eu... – começou Tom.
“Vá embora!” – o Dragão rugiu e a fumaça negra voltou a ser exalada de suas narinas.
- Nós ainda não terminamos. – Tom recuou alguns passos, sem desfazer a proteção.
O Dragão ficou ereto, olhando-o ameaçadoramente, como se esperasse o momento certo para “dar o bote”. Tom, sem nem ao menos se curvar, como sempre fazia, se virou e sumiu por entre as árvores. A proteção permaneceu ali por alguns minutos.
O Dragão rugiu o mais alto que pôde, dando um alerta ao seu Guerreiro. A proteção sumiu. O Dragão fechou as asas e olhou para os céus. Suas garras se alongaram, como sempre faziam em batalhas, involuntariamente.
“Falta pouco. Mais três meses.” – ele olhou uma parte do céu estrelado com muita atenção – “Eu posso vos sentir. Sim. Vós ainda estais presos. Contudo, isto não durará muito. Apenas três meses. Os astros não mentem.” – ele abaixou o olhar e se encaminhou para o túnel.
Porém, antes que entrasse, ele voltou o olhar para o céu, a tempo de ver quatro estrelas “cadentes”. O Dragão abriu suas asas e voltou a ficar ereto, olhando aquelas estrelas “cadentes”. Rugiu alto, não alto o suficiente para seu Guerreiro e os seguidores dele o ouvirem.
“Vós também me sentis.” – rosnou ele – “Não demorará muito agora. Nossa batalha ocorrerá.” – ele se abaixou e começou a entrar no túnel, murmurando antes de sumir na escuridão – “E ela ocorrerá antes mesmo que os humanos possam prevê-la.”
O céu estava negro, como sempre fica durante as madrugadas. Não havia nuvens e a lua era nova. As estrelas brilhavam fortemente, como se tentassem repor a falta de luz do luar.
Havia algumas estrelas, que normalmente não brilhavam tanto, que agora eram como miniaturas da lua cheia. Entre as constelações da Ursa Menor e Hercules, uma constelação de quatorze estrelas brilhava intensamente. Esta constelação era a de Dragão.
O que os humanos não viram será sempre um mistério para eles. Entretanto, o que o Dragão Negro vira iria ficar gravado em sua mente por toda a eternidade.
Em um momento, que passara despercebido aos olhos dos telescópios e humanos, aquelas quatro estrelas “cadentes” surgiram. Uma em cada extremidade do céu. Elas se unirão à constelação de Dragão, modificando o “traçado” da mesma. Depois, voltaram para as extremidades do céu e desapareceram no horizonte.
A “nova” constelação, que existiu por poucos segundos, deixou o dragão, pronto para se defender e, principalmente, revidar qualquer ataque.
=.=.=
Finalmente as folhas começavam a ganhar o tom avermelhado comum do outono. Em breve as mesmas começariam a cair e a forrar o solo. Isso era perfeitamente visível no campo cheio de vida da região de Windermere. Nessa região, em meio aos montes e montanhas, havia uma pequena e rústica bacana.
Dentro dessa, um homem alto de cabelos loiros e olhos verde-oliva estava sentado em uma confortável poltrona, perto de um telescópio, que apontava para a janela logo à frente. Ele vestia vestes negras e segurava imponentemente uma belíssima taça de vinho tinto. Levou o liquido a boca, preso em seus pensamentos.
Há semanas que era atormentado por certas lembranças.
*- Flashback -*
- Vem filho, está na hora. – seu pai o chamou da porta.
Ele sorriu enquanto se levantava, pegou o malão e saiu do quarto. Seu irmão já esperava no hall. Eles se despediram dos elfos domésticos e foram para o carro, que já estava fora da garagem. O pai colocou os malões no espaçoso porta-malas e entrou no carro em seguida.
Ele se sentou no banco traseiro, atrás do pai, com o irmão ao seu lado na outra janela. Ele acenou pela janela para a elfa chorosa, que lhe acenou de dentro da casa.
Algumas horas entediastes de viagem se passaram, onde seu pai não parara de dar instruções ao seu irmão. Ele nunca recebera aquelas instruções. Afinal, não era ele que aprendia uma das mais puras magias da historia. A única ordem que recebeu – sim, ordem, porque era sempre isso que recebia do pai - era para não contar a ninguém sobre sua família e sobre sua própria vida.
Quando chegaram à Londres eram quase dez horas da manhã, o que fez seu pai dirigir mais rápido e perigosamente. Eles entraram correndo na estação King’s Cross e cruzaram-na com muita pressa.
A única coisa que ouvia, além dos passos deles e das rodas dos carrinhos, era a voz murmurante de seu pai, a qual ele não entendia.
Ao chegarem à passagem entre as plataformas nove e dez, seu pai parou de murmurar e os olhou com seriedade.
- Vocês sabem o que aconteceu com a amiga de vocês e também sabem que não devem contar a ninguém. Ela precisa de apoio agora. Estejam com ela sempre que possível. – ele se abaixou e os abraçou – Agora vão. Espero as cartas de vocês.
Ele foi o primeiro a cruzar a passagem. A locomotiva vermelha ainda estava ali, apesar de já ser mais de onze horas. Alguns homens andavam de um lado para o outro. Ele ouviu um dizer.
- Temos problemas com a fornalha.
Então, ouviu seu irmão murmurar divertido ao seu lado:
- Papai.
Um dos homens os viu e os ajudou com as bagagens. Agradeceram e, assim que entraram no vagão, outro homem gritou em alto e bom som.
- Funcionou! Rápido, temos que tirar esses dez minutos de atraso. - mal o homem terminou, o trem partiu.
Eles andaram por todo o trem até acharem uma garota de cabelos negros sentada sozinha no canto de uma cabine. Sua feição era de pura preocupação.
- Oi. – falaram ele e o irmão, ao abrirem à porta.
A menina se levantou com um pulo e os abraçou.
- Que susto que eu levei. Se a fornalha não tivesse pifado vocês teriam ficado. – falou ela com apenas um fôlego.
- Calma – ele sorriu, abraçando-a com forca.
A viagem foi tranquila. Não tocaram em nenhum assunto que lembrasse o pai dela. Quando a mulher dos doces chegou, trouxe alguns colegas de seu irmão, que se desculpou com a garota e seguiu os amigos.
Enquanto eles comiam os sapos de chocolate, ela soltou um suspiro. Ele a olhou e se surpreendeu ao ver que lágrimas preenchiam os olhos acinzentados dela.
- O que foi? – perguntou ele.
- Meu pai amava sapos de chocolate. Ele colecionava as figurinhas. Só faltava uma, mas eu não me lembro qual.
- Ah. Não fica assim. – ele se sentou ao lado dela e tocou seu ombro com carinho.
Com a ação dele, as lágrimas começaram a rolar. Ele a abraçou com força.
- Meu pai morreu. Meu pai foi morto por aquele maluco do Voldemort! – falou ela entre os soluços.
- Calma. – pediu ele, mesmo sabendo que não seria atendido.
- Eu vou atrás dele. – rosnou ela, fazendo-o assustar-se.
- Não! Você está louca! Se for atrás dele vai morrer! – retrucou ele, apavorado, soltando-a e se levantando.
- Pouco me importa. A morte é bem vinda! – ele se assustou ainda mais.
- Pare com essas idéias absurdas! – pediu ele, a voz quase implorando.
- Não são absurdas! Vou terminar Hogwarts e me tornar uma bruxa poderosa. Depois irei atrás dele! – ela se levantou.
- Ele é muito forte! Mesmo se você for forte, ele será muito mais. Eu sei, meu pai me falou. A cada dia ele fica mais forte!
- Não tente me convencer de não ir porque não vai adiantar. Eu vou! – gritou ela no mesmo tom que ele gritava.
- Então me deixa ir junto! – murmurou ele, cansado, assustando-a.
- Que? – ela também abaixou o tom da voz, olhando-o profundamente.
- Isso mesmo. Você não vai sair por ai atrás de um maluco super-poderoso sozinha. – ele sorriu marotamente.
- Tem certeza? – perguntou ela, sem jeito.
- Claro! – ele sorriu ainda mais – Nós dois ficaremos fortes e iremos atrás dele. Vamos vingar a morte de seu pai. – ele terminou.
Ela o abraçou com carinho. Ficaram assim por longos minutos e apenas um pensamento tomava-o:
“Vou provar ao meu pai que posso ser tão bom quanto o meu irmão. Irei vingar a morte do pai dela. Vou matar Lorde Voldemort e todos me amarão. Finalmente todos olharão para mim.”
*- Fim do Flashback -*
Ele riu.
Era engraçado como as coisas haviam mudado. Uma grande ironia do destino. Ele jurara que mataria Lorde Voldemort e o servia.
Ele riu novamente. Porém, ficou sério de repente. Bebeu mais um gole de vinho em silêncio.
Não. Não fora uma ironia do destino. O destino nada tinha a ver com aquilo. Fora tudo culpa do irmão. Sim. Aquele maldito. Se não fosse aquele maldito, ele estaria ao lado da mulher que sempre amou e teria cumprido sua promessa.
Apertou com tanta força a taça que ela se partiu em sua mão, derramando vinho e sangue. Ele franziu a testa, mas não era pela dor, ele sequer a sentia. A raiva que o tomava era anestesiava seu corpo.
Ele sentiu vontade de sair daquela cabana e caçar o irmão. Queria achá-lo e torturá-lo, até que ele pedisse pela morte. Sorriu perversamente, imaginando as torturas que aplicaria no irmão.
Conjurou outra taça com vinho tinto e bebeu uma grande quantidade de uma vez. A noite que mudara toda a sua vida voltava a sua mente. Lembrava-se dela como se tivesse terminado a pouco, embora tivesse acontecido há mais de doze anos.
*- Flashback -*
Antes de anoitecer, ele e a namorada estavam nos jardins, abaixo de uma árvore, aproveitando à tarde de sábado. Ele havia notado uma pequena diferença no jeito dela. Ela estava estranha com ele já fazia mais de uma semana. Às vezes ele sentia que ela rejeitava seus beijos e abraços. Definitivamente, ela estava estranha.
Havia nuvens negras no céu e relâmpagos deixavam o pôr-do-sol menos belo. Algumas gotas de chuva começaram a cair. Eles se levantaram e começaram a correr na direção do castelo. Entretanto, eles estavam muito longe.
A chuva começou a cair com força. A cabana de Hagrid era logo ali. Eles decidiram pedir abrigo ao guarda-caças. Bateram com força na porta, mas não havia sinal de ninguém ali dentro. Nem mesmo Canino, o cachorro.
- E agora? – perguntou ela, puxando as vestes para mais perto do corpo, já completamente encharcada.
- Não sei. Temos que nos abrigar. – respondeu ele, jogando o capuz por cima da cabeça e olhando em volta.
A chuva era tão forte que ele não conseguia ver muito longe. Um raio caiu no Lago Negro e a chuva piorou, transformando-se numa verdadeira tempestade.
- Vamos pro castelo. – gritou ela, alto o suficiente para que ele ouvisse.
- É muito longe. E com essa chuva não sabemos em que direção ir. – gritou ele de volta, abraçando-a para se manter quente.
- Para onde vamos então? – o tom de voz dela possuía um leve toque de pavor.
- Só tem um jeito. – ele a soltou e contornou a cabana de Hagrid.
- Não! – ela correu até ele, jogando o capuz sobre a cabeça – Você enlouqueceu? A Floresta é proibida!
- Você quer se abrigar ou não? – ele se virou e a encarou – As árvores são tão próximas que a chuva deve estar mais fraca lá dentro. É o único jeito.
Ela pareceu pensar por alguns segundos e com um aceno positivo da cabeça, eles saíram correndo para dentro da Floresta Proibida. Correram por alguns minutos. Ele estava certo, a chuva era mais fraca ali, no entanto, o vento era muito mais intenso.
- Temos que achar abrigo! – falou ela, tremendo de frio.
- Eu sei! – concordou ele, olhando para todos os lados.
Correram por mais algum tempo, entrando cada vez mais na floresta. Ele parou de repente, com um sorriso no rosto. Ela acompanhou o olhar dele e deu um grito de felicidade.
Havia uma pequena cabana a mais de vinte metros. Eles correram e entraram nela. Estava seco e quente.
- Temos que acender algo. – disse ele, olhando em volta.
- Tem madeira aqui. – ela se aproximou de um monte de lenha.
- E ali tem uma lareira. – ele apontou para um canto.
Cinco minutos depois, a lareira estava acesa. Eles se sentaram na frente dela, para se esquentarem.
- Não vamos conseguir nos esquentar com essas roupas molhadas. – falou ele, retirando a capa.
- Eu sei. – ela pareceu envergonhada.
- Não precisamos retirar tudo sua boba. – ele riu, dando-lhe um selinho.
Eles retiram o essencial. Ele permaneceu apenas com a calça e ela com a camisa e a saia.
A chuva piorou. Contudo, eles estavam aquecidos ali e não se preocuparam com ela. De tempos em tempos ele colocava mais lenha no fogo para mantê-lo vivo. Eles ficaram ali durante horas. A chuva cada vez mais forte.
Ele se aproximou dela, para abraçá-la. Porém, instintivamente, ela se afastou. Ele a olhou, surpreso.
- O que você tem? – perguntou.
- Nada. – respondeu ela, evasiva.
- Nada uma ova. Você está estranha comigo desde a última visita à Hogsmeade semana passada. O que aconteceu?
Ele não tinha ido ao vilarejo, pois cumprira detenção, mas insistiu para que ela aproveitasse a visita.
- Eu... – ela o olhou, mas desviou o olhar para as chamas, abraçando as próprias pernas.
- Por favor, me diz o que aconteceu. – pediu ele.
- Perdoe-me. – suplicou ela, chorosa.
- Pelo que? – ele se aproximou.
- Por isso. – ela se levantou e retirou a aliança prateada do dedo.
- O que você está fazendo? – ele se levantou surpreso.
- Estou terminando. – respondeu ela com lágrimas nos olhos, estendendo a aliança.
- Não! Por quê?! – ele não se atreveu a pegar a aliança.
- Eu não... – ela fez uma pausa, como se pensasse – Eu não te amo mais. – ela passou a ponta dos dedos abaixo dos olhos, onde algumas lágrimas tinham escorrido.
- Por... por quê?! – ele sentiu toda a sua vida se esvair com as palavras dela.
- Eu... – ela suspirou – Eu amo o Ow...
- NÃO! – gritou ele, transtornado – NÃO PRONUNCIE O NOME DELE PELO AMOR DE MERLIM!
- Mas é ele quem eu amo. – murmurou ela.
- Por que ele? Poderia ser qualquer outro. Por que ele? – perguntou ele com raiva.
- Não sei. Só sei que de uns tempos pra cá, eu tenho olhado-o com outros olhos. Eu... eu sinto por ele algo que eu não sinto por você. – ela mordeu o lábio inferior – E você mudou. Está diferente. Desde o começo do ano você está estranho. Está mais triste, mais reservado. Mais... sombrio.
- SOMBRIO?! EU?! – gritou ele, a raiva fazendo o sangue subir à cabeça.
- Por favor, fique calmo. – pediu ela.
- FICAR CALMO? COMO EU POSSO FICAR CALMO QUANDO A MULHER QUE EU AMO ME DIZ QUE AMA O MEU IRMÃO? COMO EU POSSO FICAR CALMO? HEIN?! – berrou ele com todas as suas forças.
Tudo o que aconteceu depois foi muito rápido.
As toras de madeira levitaram e voaram para todos os lados. As chamas se descontrolaram, queimando o exterior da lareira e, de repente, se extinguiram. As janelas se quebraram e o vento gélido tomou tudo.
Uma sensação nova o tomara. Ele fechou os olhos e gritou de ódio. Ouviu o grito dela, um misto de pavor e de dor. No entanto, não se importou, apenas continuou a gritar e a sentir aquela nova sensação. Era como se algo dentro dele tivesse despertado.
Ao abrir os olhos, deparou-se com uma cabana quase destruída. Ele olhou as próprias mãos e se assustou. Algo as circulava. Ele olhou para o próprio corpo e perceber que algo o circulava por inteiro.
Ele parou e colocou as idéias no lugar. Já havia visto algo parecido com aquilo, mesmo não era daquela cor. Piscou os olhos quando se lembrou o que era aquilo. Era uma aura. Era a sua aura. Sorriu feliz. Seu pai sempre dissera que ele não possuía uma aura.
Gargalhou sombriamente, seu pai estava errado.
Ele analisou a própria aura e gostou dela. Ela dizia tudo sobre ele. Era verde escuro, quase negra. Sorriu ainda mais. Ele era um sonserino de corpo e alma e, agora, de aura também. Gargalhou sombriamente pela segunda vez. Concentrou-se e viu sua aura voltar para seu corpo, desaparecendo.
Sentiu frio. Retirou a varinha das vestes e, com um amplo movimento, concertou todas as janelas e reacendeu o fogo. Só então, com a cabana iluminada, foi que ele viu-a.
Ela estava ao chão. Desmaiada. Um filete de sangue escorria pelo canto dos lábios rosados. Ele sentiu raiva novamente. Sentiu raiva dele próprio e do irmão. Sentiu raiva de si por tê-la machucado, mas a raiva contra seu irmão era maior. Quis sair dali e matá-lo. Entretanto, respirou fundo e controlou-se. Depois, abaixou-se ao lado dela e ergueu a varinha.
- Enervate! - murmurou.
Ela acordou assustada e, antes que pudesse distinguir onde estava, a voz dele preencheu todo o lugar.
- Obliviate! - gritou ele com força.
Os olhos dela se arregalaram. Ela sorriu abobada e fechou os olhos. Dormiu.
Ele se levantou e guardou a varinha no bolso da calça. Ficou andando em círculos enquanto a chuva castigava as janelas. Ele precisava que se vingar.
“Como? Qual será a vingança que me saciará?”
Ele olhou para ela. Era um anjo, um anjo sombrio com aqueles cabelos negros e a pele branca. Deparou-se com o corpo dela. Era a primeira vez que ele a olhava assim. A blusa branca estava quase transparente. Ele se recriminou pelos pensamentos que lhe vieram à mente e mudou o rumo do olhar.
Contudo, antes mesmo de pensar em uma vingança, A Vingança se apresentou a ele. Ele arregalou os olhos com a própria idéia, depois gargalhou friamente.
- Perfeito. – murmurou ele, andando na direção dela.
Puxou as capas deles e forrou o chão perto da lareira. Tomou-a em seus braços e a deitou. Abriu alguns botões da blusa dela, não o suficiente para ver seu corpo perfeito. Sorriu friamente e se deitou ao lado dela, abraçando-a por trás. Respirou profundamente, sentindo o perfume dela. Ele sabia, aquela era a última vez que a abraçaria. Porém, não se importava. Não naquele instante.
Logo ela voltaria para ele. Depois que seu irmão fosse para o inferno, ela voltaria para ele. Ele sorriu ainda mais, se segurando para não gargalhar. Tudo já estava traçado em sua mente.
Puxou o corpo dela para mais perto do seu e fechou os olhos. Estava muito cansado.
“Tenho que mandar uma carta amanhã. Só espero que Lucio Malfoy acredite nas minhas intenções.” – pensou ele, antes de se entregar ao sono.
*- Fim do Flashback -*
Tudo ocorrera conforme o seu plano. Ele escrevera à Lucio Malfoy e fora muito bem recebidono seio da família Malfoy. Fora treinado pelo próprio Lucio em Artes das Trevas. Fugira de casa e passou a viver com seu mestre. Esperou pacientemente até a volta de Lorde Voldemort. Pouco tempo depois que ele voltou, apresentou-se e foi incorporado aos Comensais da Morte.
E ali estava ele. Ainda era um Comensal da Morte. No entanto, crescera entre os comensais e se tornara um membro da Elite. Tinha a marca em seu peito para confirmar.
Gargalhou com frieza enquanto tomava mais vinho. Chegara aonde queria. Agora só faltava a morte de seu irmão. Seu odiado irmão. Bebeu mais um gole do liquido vermelho e mudou o rumo de seus pensamentos.
Já fazia três meses que estava naquela “missão”.
“Missão. Essa é boa. Isso não é uma missão. É uma brincadeira. Eu sou o único que poderia “cuidar” dela?! Essa é ótima.”
Durante o primeiro mês, sua adrenalina de ficar espiando-a foi ao limite. Porém, depois do bendito mês, tudo pareceu igual e tedioso. Ela mal saia da casa. As janelas, quando abertas, possuíam as cortinas fechadas.
“Será que ela me descobriu?” – questionou-se ele, várias vezes – “Não. Não mesmo.” – era o que sempre respondia – “Tomei todas as providências.”
De fato, a cabana em que se encontrava era escondida por um feitiço forte e quebrável somente por ele.
“O que diabos estou fazendo aqui?!” – perguntou ele, irritado.
Ele se levantou com um salto e jogou a taça contra a parede. Os cacos de vidro cobriram o chão. Seus punhos estavam cerrados, os olhos completamente fechados e apertados. Ele sentia que seus dentes começariam a trincar se continuasse a pressioná-los. Uma aura verde escura o circulou e fez à cabana tremer. Ele se controlou com dificuldade e, minutos depois, abriu os olhos.
Passando as mãos nos cabelos loiros levemente cumpridos, caminhou até a janela. Abriu as cortinas negras com força. Viu o céu estrelado e sem lua com os olhos verdes-oliva, abriu a janela e sentiu a brisa fresca do outono. Ao abaixar os olhos, deparou-se com algo inusitado.
A mulher que andara vigiando nos últimos três meses estava do lado de fora da casa. Ele correu até o telescópio e o ajeitou à janela. Depois de arrumar o telescópio, focalizou a mulher. O que viu era algo que nunca diria ser possível. Sua surpresa foi tamanha que gritou sem ao menos pensar:
- Por Merlim!
Ele parou. Assustado consigo mesmo.
- Eu... eu mencionei o nome dele?! – sussurrou com terror – O que diabos deu em mim?! – completou em tom alto e com ira.
Voltou à olhar a mulher. Reparou no corpo dela. Seu coração deu um salto e permaneceu acelerado. Um suor gelado escorreu de sua nuca. Aquilo não podia ser possível e também não devia ser.
- Merlim, como isso pôde acontecer?! – parou de falar e se recriminou mais uma vez – Mas que diabos. Merlim não! Drake!!!
Olhou a mulher entrando na casa. A última imagem do corpo dela sob a luz do lugar o fez tremer. Ele se largou na poltrona, ofegante.
- Como?!
Ficou ali durante vários minutos pensando naquilo. A cada minuto que passava, seu coração acelerava mais. Cada minuto que passava, ele chegava perto da resposta que não queria realmente descobrir. Quando a resposta tornou-se nítida e ele não conseguiu pensar em outra solução, o desespero o tomou.
- Não! Não pode! – ele se levantou com um salto – Ele não pode fazer isso. Não! Não é dele! Não pode!
Ficou ali, murmurando negativas durante outros vários minutos. Qualquer um que o visse diria que estava louco. Entretanto, ele não estava. Para dizer a verdade, nunca estivera tão lúcido. Ele saiu da cabana e olhou o céu da madrugada. Tudo agora lhe fazia sentido. Tudo!
Se estivéssemos falando de um jogo de cartas, ele seria aquela carta que o jogador descarta antes mesmo de levá-la à mão, antes mesmo de pensar no que fazer com ela.
Ele se sentiu humilhado e menosprezado. Sentiu-se pior do que quando criança. Sentiu-se no lugar de Dobby, o antigo elfo-doméstico de Lúcio Malfoy. Queria que o chão sumisse aos seus pés, para lhe poupar daquela sensação.
Então gritou, não alto o suficiente para que alguém o ouvisse, mas com toda a sua força:
- Eu desisto!!! – deixou-se cair de joelhos e abaixou a cabeça – Eu desisto. – completou, sussurrando, enquanto grossas lágrimas saíam de seus olhos.
Ergueu o braço onde se encontrava a sua tão amada Marca Negra. Rasgou a manga do sobretudo negro e a contemplou. Estava parada fazia dois meses. Nunca mais a vira mover-se.
“Agora tudo estava claro, agora eu entendo.”
As lágrimas ainda lhe caiam dos olhos com incrível abundancia. Ele olhou o céu. Contemplou a constelação de Dragão. Viu-a como todos os outros humanos a viram em suas curtas existências. Porém, olhou-a de outra maneira.
A partir daquele momento, a constelação não era um simples grupo de estrelas distantes, ela era exatamente o que descrevia. Ele não via mais os pontinhos luminosos das estrelas. Ele via o Dragão. Tinha certeza que não era o Dragão Negro, pois sua expressão era de perdão.
Ele se sentou e, ainda chorando, falou, em tom de suplica:
- Merlim, perdoai esse humano que de nada sabe. Perdoe essa minha existência para que na próxima eu a faça melhor. – sua voz foi sumindo pouco a pouco – Merlim, eu sempre te amaldiçoei e, pior, vangloriei Drake. Perdoai. Perdoai-me.
Ficou ali parado, apenas olhando a constelação de Dragão.
O sol estava nascendo quando ele percebeu que não conseguia mais ver o Dragão. Uma sensação boa o tomou. Ele se levantou e sorriu. Sorriu verdadeiramente, como não fazia desde os seus anos de adolescência.
Ele entrou na cabana e se sentou na poltrona. Olhou o céu que mudava constantemente de cor. Sorriu mais ainda. Parecia que há séculos não via o sol nascer.
O astro já estava alto quando ele ficou novamente sério. Tudo mudava a partir dali. Ele sabia de tudo e não podia mais continuar agindo daquela maneira. Não mais.
- Mas como vou voltar? – suspirou – Ainda odeio o meu irmão. E odeio ainda mais o meu pai. Como voltar sem ficar do lado deles?! Para poder matá-los? – parou por alguns segundos e completou com uma voz mais baixa – Perdoe-me por isto também, Merlim, mas a vida me fez odiar esses dois.
Suspirou longamente e pensou por um tempo interminável. Então, olhou para o telescópio e sorriu.
- Vou ficar aqui. Vou esperar para ver o que acontece. E no momento certo, atacarei e eliminarei o Herdeiro.
Sorriu vencedor. Até que o seu plano não era tão difícil. Devia apenas esperar, e torcer para que Lorde Voldemort não o chamasse.
- No final das contas, eu cumprirei minha promessa. – ele moveu a mão direita e uma taça de vinho tinto surgiu, ergueu-a e pronunciou antes de beber – À você, minha amada Black!
=-=-=
Estava tudo escuro. Mais escuro que o normal naquela floresta tenebrosa. Ele corria. Corria o mais rápido que podia. Algo o perseguia. E era algo grande. Esse algo rastejava por entre as grandes árvores. Ele não sabia dizer a quanto tempo já corria. Suas pernas mal aguentavam dar o próximo passo. Elas já doíam até os ossos. Em todo o corpo havia arranhões e hematomas.
De repente, o que o perseguia parou e ele não ouviu mais o seu rastejar. Ele olhou para a escuridão às suas costas e não viu nada. Quando voltou a olhar para frente, viu o chão. Uma raiz estava erguida acima da terra e foi nela que o seu pé se prendeu, levando-o ao chão.
Com o rosto banhado em terra ele se ergueu. Sentiu algo quente escorrer pelo lado esquerdo do rosto. Sentou-se e retirou a terra do rosto com as mãos já limpas nas vestes. Tocou o liquido quente que escorria pelo seu rosto e constatou que era sangue.
Foi quando ouviu o rastejar novamente. Porém, antes que pudesse ficar desesperado, uma gargalhada fria e cruel ecoou pela floresta. Ele olhou em volta procurando o dono da gargalhada. O que viu deixou tão assustado quanto à gargalhada que soava.
Dois pares de olhos o fitavam. Um era amarelo e estava muito próximo do solo. Já o outro era vermelho sangue e pairava à quase dois metros de altura.
- Achou mesmo que ia conseguir fugir de mim, moleque? – o par de olhos vermelhos se aproximou.
Ele soltou um grito involuntário de pavor.
- Ah, sim. – o corpo do ser de olhos vermelhos se revelou – Eu causo isso. O pavor. Ele é meu aliado, sabia? O pavor é aliado do Dragão Negro.
O par de olhos surgiu aos pés de Lorde Voldemort, era Nagini. Ela sibilou algo e um frio subiu pela espinha dele.
- Espere Nagini. – Voldemort riu – Ele será seu. – e gargalhou.
- Milorde... eu... eu não... – ele tentou falar.
- Quieto! – Voldemort urrou, erguendo a varinha – Calado!
Ele engoliu em seco.
- Bom. – Voldemort riu – Você achou mesmo que eu não o descobriria? Ninguém passa despercebido aos olhos do Dragão Negro.
Voldemort andou em torno dele, com Nagini enrolada em seu corpo.
- Eu nunca iria imaginar que alguém como você, cuja família pertence à Elite, iria me trair. Mas, depois do fiasco da sua primeira missão, acho que algo já me dizia que isso ia acontecer. Você pensou em tudo, não é? Desde que chegou aqui. As sessões de torturas. Ah! Ser torturado pelo próprio pai deve ser algo muito doloroso e humilhante. - gargalhou.
Ele abriu a boca para falar, mas sua voz havia sumido.
- Passou informações para o outro lado! Que idéia mais original, não acha?! Mas você deve estar se perguntando quando que eu finalmente descobri. Depois do último ataque falho ao expresso, eu percebi que as informações dos ataques estavam vazando. Mas quem possuía as informações dos ataques?! Somente a Elite! E olhe só, toda a sua família é da Elite!
O tom de voz de Voldemort era indecifrável.
- A partir daí, foi fácil. Seu pai confessou-me que, após todas as reuniões da Elite, ele e você bebiam em seus aposentos. – Voldemort se aproximou ameaçadoramente, fazendo-o recuar – Veritasserum! Onde conseguiu tal ferramenta? Esta é a única duvida que tenho. Veritasserum é uma poção muito complicada para um moleque de dezoito anos fazer. Sem falar que os ingredientes são muito limitados pelo maldito Ministério da Magia. Então, como consegui a poção? Diga e eu garanto que terá uma rápida e indolor.
Os olhos da cobra brilhavam. Ele abriu a boca e se surpreendeu ao ouvir a própria voz.
- Você nunca cumprirá com a palavra. – sua voz saiu forte e determinada.
- É verdade. – Voldemort sorriu e se afastou – Nagini, ele é todo seu.
Ele mal teve tempo de piscar. Uma dor dilacerante tomou todo o seu corpo a partir do pescoço. Ele sentiu as presas afiadas de Nagini varando sua carne. Ouviu a gargalhada fria e cruel do Dragão Negro.
Então, tudo ficou negro e frio.
- Aaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!
Ele se sentou e levou a mão ao pescoço. Nada. Olhou em volta. Nada, exceto o minúsculo quarto sombrio.
- Foi apenas um pesadelo. – disse para si mesmo – Graças à Merlim.
Suas vestes estavam coladas ao corpo. Um suor frio ainda escorria pela sua testa. Decidiu por tomar um banho quente. Levantou-se, vestiu o sobretudo negro e colocou a varinha no bolso. Calçou os chinelos e caminhou a porta. Abriu-a lentamente e olhou o corredor escuro e vazio. Saiu e trancou a porta com um feitiço.
Olhou novamente pelo corredor onde, não havia nada visível. Caminhou com passos rápidos e silenciosos. Estava chegando à primeira bifurcação quando algo o fez congelar no lugar. Uma voz gelada, mas muito conhecida soou às suas costas.
- Vai a algum lugar, criança?
Ele se virou e vislumbrou o vulto negro do homem que se aproximava. Achou estranho que o homem estava completamente vestido. A capa farfalhando às costas dele.
- O senhor pode não ter reparado, mas eu já não sou mais criança. Não lhe devo satisfações. – falou ele, a voz firme e cortante.
Virou-se e voltou ao seu caminho.
- Pode não dar satisfações a mim, mas deve-as ao Lorde das Trevas. – a voz do homem pareceu divertida.
Ele parou de novo e se virou. Seus olhos não conseguiam esconder o espanto. O homem estava a poucos centímetros dele e sua expressão era incompreensível.
- Teve pesadelos, criança? – o homem ergueu a mão e tocou seus cabelos loiros completamente suados, olhando profundamente em seus olhos azuis acinzentados.
- Pare de me chamar de criança. – falou com ira e se afastou – E isso não te interessa, professor. – a última palavra soou sarcástica e divertida.
O homem enrijeceu e ficou muito sério.
- Eu preciso falar com você.
- Não há nada que necessite de tamanha urgência. – retrucou ele, pronto para continuar seu caminho.
- Então um traidor não é assunto urgente?
Ele parou novamente.
- O que quer dizer com isso? – ele olhou profundamente nos olhos negros do homem.
- Agora que sabe o assunto. – um sorriso sarcástico tomou os lábios do homem – Podemos conversar?
Ele apenas acenou positivamente. O homem se virou e começou a andar velozmente. Ele o seguiu a certa distancia.
“Será que ele descobriu? Será que ele me vigiou tempo suficiente para descobrir?”
Eles andaram por intermináveis minutos. Descendo e descendo cada vez mais. O homem parou na frente da última porta do corredor, virou-se para ele e apontou para a porta. Ele tocou a maçaneta com indecisão, mas girou-a com firmeza e abriu a porta. Antes que pudesse ver o que tinha no aposento, o homem o empurrou com brutalidade. Com um estrondo, a porta foi fechada.
Ele se levantou com rapidez, temendo o lugar. Tudo estava escuro. Ele não via nada a mais de um palmo a sua frente. Um pavor começou a tomá-lo e a lembrança o sonho tornou-se mais viva.
- Pare de tremer.
Para seu alivio ou perdição, quem falou não era Lorde Voldemort.
Uma grande lareira ardeu em chamas. Ele viu o aposento com perfeição. Havia uma vasta escrivaninha com três cadeiras no canto da parede direita. A lareira ficava na parede esquerda, com um tapete verde-musgo todo bordado em prata e duas poltronas de igual tecido e cor. Ao lado da lareira havia uma porta de madeira escura, que ele supôs levar ao quarto do homem. Em todo o resto das paredes haviam prateleiras lotadas de livros, ingredientes e frascos com líquidos de inúmeras cores e viscosidades.
- Você nunca veio até aqui, não é?
Ele olhou para o homem que estava sentado em uma das poltronas na frente da lareira.
- Não. – respondeu ele, calmo.
- Sente-se. Eu preciso falar com você. – o homem apontou para a outra poltrona.
Ele avançou e se sentou. Ficou olhando o homem, que passou a encarar as chamas quentes da lareira. O homem parecia pensar por onde começar. Ele próprio olhou as chamas e se encantou pela cor avermelhada que elas produziam. Nunca havia visto uma chama vermelha tão quente.
Na Sala Comunal da Sonserina as chamas das lareiras eram azuladas. Ninguém gostava de vermelho, lembrava Grifinória. Em sua casa não era diferente, todas as chamas eram azuladas. Quando Lord Voldemort voltou, há quase quatro anos, elas passaram a ser acinzentadas e negras.
Ele se arrepiou com a lembrança da sua antiga casa. E isso trouxe o olhar do homem sobre ele.
- Vou ser bem direto. – falou o homem em um tom mais baixo.
- Fale como quiser. – ele respondeu cortando e sem olhá-lo.
- Eu sei o que você anda fazendo.
Seus músculos enrijeceram. Ele tentou não demonstrar sua surpresa, mas seus olhos perderam todo o brilho.
- Não se apavore. – o tom da voz do homem não foi divertida nem sarcástica.
Ele olhou nos olhos do homem. O negro daqueles olhos refletia as chamas da lareira, dando um ar sombrio sobre o homem.
- Do que você está falando? – perguntou em voz alta.
- Fale baixo! – o homem advertiu com um sussurro – As paredes têm ouvidos.
- O que você quer comigo? – ele ignorou a advertência, falando mais alto.
- Fale baixo! – o homem se ergueu e em um segundo estava com a mão sobre a boca dele.
Seus olhos deixaram transparecer sua surpresa.
- Fique quieto pelo amor de Merlim. – sussurrou o homem, olhando para a porta.
Eles ficaram assim por algum tempo.
- Eu não sei você garoto, mas eu não quero ser pego e morto como um traidor. – advertiu o homem, o mais baixo que pôde, e se afastou, sentando-se na outra poltrona.
- Como é que é? – sussurrou o outro com curiosidade e surpresa.
- Eu sei o que você andou e anda fazendo. – falou o homem, olhando várias vezes para a porta.
- E imagino que vai me entregar. – supôs ele com frieza.
- Não.
- Que?! – ele se espantou e falou um pouco mais alto.
- Você não sabe falar baixo?! – o homem o olhou com raiva.
- Desculpe. – ele pediu com sinceridade – Mas não entendi. Você é um membro da Elite. Um dos mais leais ao Lorde das Trevas. Por que não vai me entregar?
- Primeiro: pare de chamar o Riddle de Lorde das Trevas, por que já teve gente pior que ele e com certeza ainda terá. Segundo: porque estamos no mesmo barco. – o homem olhou profundamente nos olhos azuis acinzentados do garoto.
- Como assim estamos no mesmo barco? – sussurrou ele sem entender.
- Não sou leal ao “Lorde das Trevas”. Deixei de ser antes da queda dele. E nunca voltei a ser.
- Mas... e o Dumbledore?! – ele se surpreendeu.
- Isso eu ainda não posso te contar. Não é o momento. Muito menos o local. – o homem não parava de olhar para a porta e uma insegurança era percebida em sua voz.
- O que você quer então? – ele percebeu que o homem não o chamara somente para isso.
- Quero ir embora. – informou o homem com calma.
- Como assim?
- Eu sou um espião aqui dentro. Todo esse tempo eu estive coletando informações. E agora eu já tenho todas as informações que precisava. Todas as informações que queria.
- E vai dar essas informações para quem? – ele se sentiu aliviado por saber que o homem realmente estava junto com ele.
- Para quem você acha? – o homem o fitou.
- Potter?! – murmurou ele.
- Sim. – o homem olhou para a porta mais uma vez.
- O que você quer que eu faça então? – ele finalmente entendeu tudo.
- Você sabe muito bem que Riddle começou o planejamento do ataque final semana passada, depois que ele e o Dragão “discutiram”. O ataque final será à Hogsmeade e à Hogwarts.
- Sim, eu sei.
- Você vai para esse ataque. – informou o homem, assustando-o – Eu falei que seria bem direto. Não temos tempo.
- E o que eu devo fazer?
- Quando chegar lá, esconda-se. Fique fora do fogo cruzado.
- Não sou um covarde! – ele se irritou, mas falou baixo.
- Eu sei que não. E é por isso que se começarmos a ganhar, você vai entrar na batalha do outro lado e atacará os comensais. – o homem olhou para a porta por vários segundos.
- E se nós já começarmos perdendo?
- Duvido muito. Acho que Riddle vai com tudo. Ele deve querer tomar Hogwarts antes do Potter aparecer.
- Ele se preocupa com o Potter?
- Não sei. Mas ele se preocupa, e muito, com aquelas energias que ele vive falando que sente. – agora o homem não tirava os olhos da porta.
- E ele quer atacar e ganhar a guerra antes que essas tais energias venham impedi-lo?
- Isso. – o homem respondeu e ficou em silencio.
- E quando o ataque finalmente falhar?
- Você vai fazer o seguinte... – o homem começou a falar.
- Você é louco. – ele sorriu depois de alguns minutos ouvindo – Mas pode dar certo.
O homem acenou positivamente.
- Mas para que ninguém do outro lado descubra que eu sou o que eu sou, porque eles não devem saber até que eu saia daqui, eu vou alterar a sua memória. Você não vai se lembrar dessa nossa conversa. Para o meu e o seu próprio bem. Com certeza o outro lado vai querer fuçar na sua mente para saber se você está falando a verdade ou não. E eles não devem achar a lembrança dessa nossa conversa.
- Certo. E daí?
- Isso daqui. – o homem retirou um pequeno pergaminho do bolso do sobretudo e entregou à ele – Essa é uma informação crucial para o Riddle. Você deve entregá-la ao Potter, quando ele voltar.
- Como vou saber que devo entregar isso pra ele se eu não vou me lembrar dessa nossa conversa? – a duvida o tomou, enquanto pegava o pergaminho.
- Nisso eu dou um jeito. Agora, você vai se lembrar da nossa conversa quando você e o Potter, somente você e o Potter, forem até este lugar.
- Tudo bem. – ele colocou o pergaminho no bolso – Mas ainda não sei como eu vou saber que somente eu e o Potter devemos ir até este lugar.
- Eu já disse que disso eu cuido. Confie em mim. – o homem olhou mais uma vez para a porta e se levantou.
Ele também se levantou e olhou para a porta.
- Agora. – o homem se aproximou dele – Eu não vou conversar com você até o dia do ataque. Para não levantar suspeitas do Riddle, nem as suas.
- Tudo bem.
- Boa sorte, criança. – o homem pegou a varinha e apontou para ele, sorrindo.
- Boa sorte, professor. – ele sorriu largamente e fechou os olhos.
=-=-=
Acordou assustado.
Ele se sentou e percebeu que estava com o sobretudo. Achou estranho. Tentou se lembrar da noite anterior. Sua última lembrança era de estar voltando para o quarto depois de ter ido procurar informações no quarto de seu pai.
Espreguiçou-se e bocejou. Saiu de cima da cama e retirou o sobretudo. Jogou-o sobre a cama e se virou. Foi até o guarda-roupa e se trocou. Voltou para a cama. Pegou o sobretudo e vestiu. Ao fazer isso, sentiu algo em seu bolso interno.
Retirou de dentro dele um pequeno pergaminho. Desenrolou-o e leu. Não pôde conter o sorriso. Aquela informação era a melhor que já havia conseguido. Tinha que entregá-la ao outro lado.
Mas antes que desse um passo na direção da porta, algo o fez parar. Algo o dizia que não era o momento. Tinha que pensar direito. Queria sair daquele lugar há meses. E agora ele possuía o queijo e a faca nas mãos, como diziam os trouxas.
Tinha a oportunidade em mãos. Logo eles atacariam Hogsmeade. Ele só tinha que arranjar um meio de ir ao ataque. Eles perderiam. E se começassem a ganhar, ele atacaria os próprios comensais. Eles perderiam de qualquer jeito. Então ele se entregaria. Diria à Ordem da Fênix que ele é ele.
Então esperaria o Potter voltar. Aquele lugar deveria interessar mais ao Potter que à Ordem. Ele levaria o Potter até aquele lugar. Somente eles. Assim ele ganharia a confiança do Eleito.
=-=-=
O Dragão Negro estava sentado em seu trono. Pensava seriamente na última “conversa” que tivera com seu Dragão. Desde aquele dia, ele decidira por atacar Hogwarts em três meses. Tudo já estava sendo planejado. Tudo em seus mínimos detalhes.
Primeiro, um ataque à Hogsmeade. A devastação da vila.
Depois, o seu prêmio. Hogwarts! Se tomasse Hogwarts, nada o deteria. Nem aquelas energias. Muito menos o tal Herdeiro Luz.
Ele gargalhou.
Herdeiro Luz. Esse nunca mais o deteria. Com Hogwarts como fortaleza infiltrável, seu exército manteria o Mundo Bruxo sob seu domínio.
Ele ergueu o olhar e fitou seus novos guerreiros.
Aqueles antigos guerreiros feitos de sua própria aura eram o exército sob o comando de seus novos guerreiros. Seus novos guerreiros eram os aprimorados. Não precisaria estar na batalha para controlá-los, nem para controlar o exército.
Ele olhou um por um. Na aparência nada os diferenciava, mas cada um era único. Eles eram os generais de seu exército negro. Eram nove. Possuíam dois metros de altura. Vestiam mantos negros de um tecido rústico. Sob os mantos, armaduras negras os protegiam. Espadas e adagas de bainhas e lâminas negras estavam presas em suas cinturas. Capuzes dos mantos cobriam suas cabeças e escureciam seus rostos.
Ele os nomeou Generais Sombrios. Eles possuíam inteligência própria e saberiam comandar o ataque a Hogsmeade. Apesar de terem inteligência, eram leais. Eles nunca o trairiam, pois se o fizessem, desapareceriam na hora.
Gargalhou novamente.
Quando Potter aparecesse com o mínimo de esperança em detê-lo, ele o prenderia e o torturaria por dias a fio. Potter iria clamar pela morte. E como um Lorde, ele atenderia ao pedido.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!