O Primeiro Beijo



Decididamente, a sorte não estava do lado deles. Voltaram a falhar. Mas, desta vez, foi mais frustrante, estavam a um passo de entrar na passagem e mais uma vez, tiveram de adiar a tão esperada surpresa que queriam fazer a Remus.

Quando Remus regressou à torre, dois dias depois de se ausentar, encontrou-os juntos da lareira, sentados nos cadeirões. Estavam calados de olhos fixos nas labaredas que aqueciam a sala comum.

— Que se passa com vocês? Até parece que o Snape passou a fazer parte dos Gryffindor.

Com cara de poucos amigos, Sirius olhou para Remus, o que fez com que ele se arrependesse do que tinha dito.

— Não faltava mais nada! — replicou James, sem desviar os olhos da lareira. — Não chega aturar o cabeça oleosa nas aulas conjuntas, ainda ter de o aturar aqui.

— Estava brincando! — defendeu-se Remus. — Mas, alguma coisa se passou na minha ausência para estarem com essa cara? — questionou enquanto se sentava junto deles.

— Precisamente isso. Não aconteceu nada na tua ausência! — resmungou Sirius.

— Hogwarts, em certas épocas, é um autêntico tédio. — desabafou Peter.

Pensando que eles estavam aborrecidos por não haver nada para fazer, não voltou a fazer perguntas. Era fim-de-semana, no dia seguinte era domingo e Remus aproveitaria esse dia para tomar nota dos apontamentos.


No final de Novembro teriam a primeira partida de Quidditch, Gryffindor versus Slytherin. Os Slytherin estavam mais fortes, queriam ganhar a todo o custo. Já não ganhavam o campeonato há mais de dois anos.

No sábado de manhã, a escola, em peso, dirigiu-se para o estádio de Quidditch. Nos vestiários, o capitão dos Gryffindor, Frank Longbottom, dava as últimas instruções.

— Este jogo vai ser difícil! Os Slytherin estão mais fortes do que nos anos anteriores. Têm um novo keeper e um novo capitão.

— Quem? — perguntou Ellen Smith que conversava com Sally Colbert, ambas excelentes chasers.

— Walden McNair e Lucius Malfoy.

— Lucius Malfoy?! — questionou James admirado. — Lucius Malfoy, é o novo capitão? E quem é esse tal McNair?

— Não o conheço bem! — respondeu Frank. — Só sei que é novo na equipe.

— Não tem importância. Nós venceremos! — disse, bastante entusiasmado, Bartemius Crouch, que tinha entrado para a vaga de chaser e cursava no segundo ano.

A sua opinião não convenceu o capitão, que continuava a andar, de um lado para o outro, dando instruções à equipe.

Os alunos estavam entusiasmados. Os Gryffindor, como sempre, tinham o apoio dos Hufflepuff e dos Ravenclaw. O tempo estava favorável para o jogo. Dentro de momentos, entrariam no campo e, aí sim, mostrariam toda a sua perícia, o resultado de várias semanas de treinos.

— Bem vindos, ao primeiro jogo do ano! — O jogo estava sendo comentado por Ludo Bagman. Fanático por Quidditch, comentava os jogos desde o primeiro ano, mas dizia, muitas vezes, que o que queria era jogar como beater pelos Hufflepuff. — Começamos a temporada com um grande jogo: Gryffindor versus Slytherin.

Os gritos dos alunos, das respectivas equipes, ecoaram pelo campo. James espreitou pela porta do vestiário. As bancadas estavam completamente cheias. Todos os professores estavam presentes. Hufflepuff e Ravenclaw ostentavam faixas carmesins de apoio aos Gryffindor.

— Pronto, está na hora! Peguem nas vassouras e que vençam os melhores! — balbuciou Frank.

— Então, já ganhamos! — disse Barty, com cara de gozo, que fez com que os outros elementos da equipe rissem.

As portas dos vestiários abriram-se, e eles entraram no campo. Do outro extremo, saíram os Slytherin. Madam Hooch aproximou-se do centro do campo, com a caixa que contém as bolas debaixo do braço. Pousou a caixa no chão e olhou para as duas equipes.

— Quero um jogo limpo, principalmente da sua parte! — disse de olhos postos no capitão dos Slytherin. — Malfoy, Longbottom façam o favor de se cumprimentarem.

Frank e Malfoy deram um aperto de mão forçado. Depois afastaram-se e colocaram-se nos seus lugares. Madam Hooch, abriu a caixa e soltou as bludgers, que se precipitaram no ar. Em seguida, soltou a pequena snitch dourada. James ainda a viu por breves momentos, antes de ela desaparecer. Por último, levou o apito à boca e deu início ao jogo, enquanto lançava a quaffle ao ar.

— E o jogo começa! A quaffle está no poder dos Gryffindor, nas mão de Crouch, o elemento mais novo da equipe. — relatava Ludo Bagman.

Barty lança a quaffle a Sally. Esta, escapa de uma bludger lançada pelo beater dos Slytherin, Vincent Crabbe, e dirige-se a toda a velocidade para os arcos dos Slytherin. Finta McNair, lança a quaffle a Ellen e esta marca os primeiros dez pontos dos Gryffindor.

Os Slytherin não ficaram contentes com a marcação do gol. Malfoy, dava instruções à sua equipe, enquanto procurava a snitch. Começavam a fazer um jogo sujo, tentavam, a todo o custo, ter a posse da quaffle e marcar golos. Nem que, para isso, tivessem de cometer faltas.

Os Gryffindor, continuavam a marcar golos. As bludgers eram arremessadas com toda a força, por Vincent Crabbe e Gregory Goyle, contra os chasers dos Gryffindor. Estes, por sua vez, eram defendidos por Joseph Pearce e Edgar Wood, que as lançavam com toda a força contra os Slytherin.

Os Gryffindor lideravam o jogo, cinquenta a vinte. James percorria o campo à procura da snitch. Numa tentativa de possuírem a quaffle por mais tempo, os chasers dos Slytherin, Igor Karkaroff, Roy Lestrange e David Nott, começaram a dar encontrões aos chasers dos Gryffindor impedindo-os de marcar golos. Todo este esforço estava a dar resultado. O resultado estava mudando, mais dois golos e empatariam com os Gryffindor.

James começava a desesperar! O jogo estava renhido: setenta contra sessenta, a favor dos Gryffindor. Tinha que encontrar a snitch o mais rápido possível. Malfoy perseguia-o. De repente encontrou-a, estava entre os postes de marcação dos Slytherin. Pressionou a vassoura e dirigiu-se a toda a velocidade ao encontro da snitch.

— O Potter viu a snitch! Malfoy segue-o de perto. — O estádio estava em silêncio, todos os olhos estavam postos em James e Malfoy. — Potter aproxima-se, Malfoy tenta interceptá-lo, mas ele desvia-se, estica o braço e agarra a snitch... O Potter agarrou a snitch! O jogo terminou! Gryffindor vence aos Slytherin!

Os Gryffindor gritavam de alegria. Hufflepuff e Ravenclaw, também manifestavam a sua alegria ao verem, mais uma vez, os Slytherin a serem derrotados.

Na torre dos Gryffindor reinava a alegria e a boa disposição. Sirius e Remus tinham ido à cozinha surrupiar suco de abóbora e uma grande variedade de doces. A diversão decorreu toda a tarde. James era felicitado por todos os membros da equipe pela sua excelente captura.

— Viram a cara do Malfoy? — comentou Frank. — Estava fulo. Resmungou com toda a equipe. Parecia que queria bater neles!


A euforia do primeiro jogo já tinha passado. O período estava terminando. O tempo arrefecera drasticamente, e os primeiros flocos de neve começavam a cair. O mês de Dezembro apresentou-se branco e gelado. Por todo o castelo começava-se a sentir a euforia do Natal.

A professora McGonagall afixou a lista e aqueles que queriam ficar no castelo, durante as férias de Natal, começaram a assinar. James, Sirius e Peter, que pretendiam fazer uma nova tentativa, assinaram a lista.

Na última semana de aulas, Remus recebeu uma carta da mãe. Seu pai estava doente e pedia a sua volta para casa. Há muito que andava atrás de um motivo para se afastar da escola. Sirius e James, com segundas intenções, insistiam com ele para ficar no castelo e lhes fazer companhia nas férias.

Remus decidiu não contar aos amigos o conteúdo da carta. Naquela noite, saiu do castelo e dirigiu-se para a margem do lago, queria ficar sozinho. A noite estava limpa, o que era quase impossível em Dezembro. A lua crescia, daí a quatro dias seria lua cheia. Estava frio, mas ele não se importou. Sentou-se, abraçou as pernas e pousou a cabeça sobre os joelhos. Uma lágrima escorreu pelo seu rosto. Era bom estar sozinho de vez enquanto.

Fechou os olhos e pôs-se a pensar na carta que a mãe lhe mandara. Há muito que sabia que o seu pai estava doente. Resultado de uma maldição do último Devorador da Morte que derrotou. Mas, nunca pensou que o seu fim estivesse tão perto...

— Ahtchim! — alguém espirrou perto dele. Afinal, não estava sozinho. Quem estaria por ali àquela hora? Pensou. — Ahtchim!

Olhou para o lado à procura de quem tinha espirrado. Uma aluna estava sentada a poucos metros toda encolhida, provavelmente estava com frio.

Remus não ligou e continuou a olhar para o lago, contemplando a lua reflectida na superfície da água. Pensando em tudo que aconteceu com ele e com a sua família.

A figura que estava perto dele voltou a espirrar. Mas, agora não foi só um espirro que ele ouviu. Fosse lá quem fosse, estava chorando. Remus ficou na dúvida: ignorava o que estava ouvindo ou se aproximava para tentar saber o que se passava. A sua consciência não o deixava tranquilo. Levantou-se e aproximou-se. Começava a reconhecer a pessoa. Aqueles cabelos não enganavam ninguém.

— Mary... — deixou escapar.

— Deixe-me em paz! — Foi o que ouviu, numa voz abafada.

Remus aproximou-se. Mary, encolhida junto ao lago, abraçava os joelhos e tinha o rosto escondido sobre eles. O seu corpo estremecia a cada soluço que dava.

Remus colocou a mão sobre o seu ombro e voltou a perguntar:

— Mary, o que está acontecendo com você?

— Vá embora, Remus. Deixe-me em paz! — Respondeu sem levantar a cabeça.

— Não saio daqui, sem antes você me contar o que está acontecendo! — E, dito isto, sentou-se junto a ela.

Mary nada respondeu, continuava encolhida. Remus olhava-a em silêncio. Queria saber o que se passava. Porque é que, ao vê-la assim, sentia um aperto no coração? Com carinho, colocou a mão sobre o seu ombro.

Mary estremeceu ao seu toque, sem saber se era pelo frio que sentia, ou pelo gesto de carinho por parte de Remus.

— Mary, por favor me conta? — suplicou. — Pode desabafar comigo. Sou teu amigo e quero te ajudar.

Mary levantou a cabeça, mas não olhou para Remus. Fixou os olhos na lua e permaneceu calada. A luz da lua projectada nos seus olhos, tornava-se mais fascinante. Remus ficou embriagado com o brilhos que os olhos de Mary emanavam. As lágrimas deslizavam suavemente pelo rosto tornando-o, por incrível que pareça, ainda mais bonito e misterioso. Os pensamentos de Remus foram afastados por aquele momento único.

— Não aguento mais aqueles dois! — desabafou Mary, ainda com os olhos postos na lua. — Quem é que pode viver naquela equipe de hipócritas? Quem é que pode suportar o sarcasmo dos colegas e ficar calado? Quem...? Porque é que eu não sou dos Gryffindor, ou de outra equipe? Porquê, Remus? Porquê...?

— Não se culpe por ser diferente. Se, o Chapéu Seleccionador, te colocou nos Slytherin é porque há algo em você que o fez tomar essa decisão.

— O que pode haver em mim de especial?! Slytherin nunca aceitou na sua equipe os filhos do Muggles. Como é que uma sangue de lama...

— Nunca, mas nunca mais diga isso! — disse bruscamente, enquanto a agarrava pelos ombros. — Lá, por seres filha de Muggles, não quer dizer que não seja uma óptima feiticeira. Que não consigas executar qualquer feitiço ou fazer qualquer coisa no mundo da magia.— e, depois de a abraçar, concluiu: — Há quem goste de você, tal e qual como você é...

Mary continuou a chorar encostada ao ombro de Remus. Ele apertou-a mais contra si e sentiu o seu corpo gelado. Era impressionante sentir o quanto uma pessoa podia ser frágil, por mais forte que mostrasse ser.

Mary estava, nesse momento, mais frágil do que nunca. Malfoy e Snape continuavam a gozar com ela. Nunca a aceitaram como colega. Continuavam a insinuar que ela não pertencia aos Slytherin. Slytherin, jamais aceitou sangues de lama no seu meio.

Remus, queria ficar naquela posição por toda a sua vida. Sentia-se feliz junto dela. Por um momento esqueceu os seus problemas e desejou que a noite jamais acabasse. A carta, enviada pela mãe, jazia no bolso das calças, sem incomodar ninguém.

Mas, esse momento durou pouco tempo. Mary, apercebeu-se do que estava fazendo e afastou-se de Remus. Podia se ver que estava corada, mesmo que a luz que existia fosse fraca. O embaraço de Mary foi visível com a luz da lua.

— Desculpe, Remus. — disse, enquanto escondia o rosto. — Mais uma vez estou metendo você no meio dos meus problemas.

— Não faz mal — sossegou —, não se costuma dizer: os amigos são para as ocasiões!
— Amigos... Eu não tenho amigos! — sussurrou. — Eu não posso ter amigos! — concluiu com um ar sério.

— Você pode ter amigos, Mary. — afirmou Remus. — Você tem amigos. Você tem todo o direito de se expressar. Não pode se deixar influenciar pelas ideias dos outros. — e, depois de agarrar as mãos de Mary, concluiu: — Eu sou seu amigo.

— Obrigado, Remus. Obrigado por ser meu amigo.

Voltaram a largar as mãos e ficaram olhando para o lago. Mary, que estava com frio, voltou a encolher-se. Remus tirou a capa e colocou-a sobre os ombros de Mary. Esta, esboçou um sorriso como agradecimento e continuou a contemplar a lua.

As vozes no castelo começavam a diminuir. Os alunos começavam a se recolher para os dormitório. Começavam a procurar o conforto das salas comum e o calor das lareiras, que nesta altura do ano estavam sempre acesas.

Mas, nada disso parecia afastar Remus e Mary, que continuavam sentados na margem do lago.

— Sabe o que é que eu mais gosto de fazer quando estou aborrecida, Remus? — questionou Mary.

— Não.

— Contemplar a lua cheia. Adoro sair do castelo e ficar aqui sentada a olhar para a lua reflectida na superfície do lago. Alguma vez você assistiu a um espectáculo destes?

— Não. — respondeu, quase sem voz, ao pensar no medo que as noites de luas cheia lhe provocavam.

— Numa noite de lua cheia você tem de vir comigo. Irá gostar.

Remus permaneceu calado, tinha a certeza que gostaria de passar essa noite com Mary. Mas, o seu problema afastava a possibilidade de ser feliz.

Mary, aceitou o silêncio de Remus como um sim. Mal podia acreditar na proposta que acabara de fazer a Remus. O seu coração estava acelerado e um calor começava a percorrer-lhe o corpo. Um calor que se transformou num sorriso sincero de alegria.

— Remus — disse Mary, para quebrar o silêncio —, não costumo ver você por aqui sozinho. Onde estão os outros?

— A esta hora, já devem estar no dormitório. Mas... eu queria ficar sozinho.

— O que aconteceu? Estás com algum problema?

— O meu pai... — meteu a mão no bolso e entregou-lhe a carta. — Recebi hoje de manhã.

Mary, olhou para a carta, que agora estava na sua mão. Em seguida, olhou para Remus, mas este estava olhando para o lago. Abriu o envelope e tirou a carta. A carta estava escrita com uma bonita caligrafia. Começou a ler e ficou sabendo que fora enviada pela mãe dele.


“Querido filho

Espero que este ano esteja correndo bem. Que continue feliz na companhia dos seus amigos. E quem sabe, não é este ano que irá encontrar a sua metade? Também foi no quinto ano que encontrei o seu pai.

E, por falar no seu pai, tenho um pedido a lhe fazer em seu nome. Ele quer ver você, antes de partir. Está piorando, a maldição está terminando o seu trabalho.

Não fique triste, a vida continua. Se você consegue ultrapassar o seu problema, que ainda é mais complicado, também conseguirá ultrapassar este.

Bem, meu filho, espero você nestas férias. O seu pai manda cumprimentos.


Um beijo da tua mãe

Márcia Lupin


P.S.: Se precisar de ajuda, procure o professor Dumbledore. Ele está a par dos acontecimentos, já que tentou de tudo para salvar a vida do seu pai.”


Mary não sabia o que dizer. Dobrou a carta e voltou a coloca-la no envelope, ficou com a carta na mão. Mas, quando olhou para Remus, para lhe entregar a carta, reparou que ele estava chorando.

Os homens são fortes, mas também frágeis. Um homem também chora. E, nesse momento, Remus estava mostrando todas as suas emoções, todas as suas fraquezas. Foi forte durante anos, mas agora não aguentava mais. Talvez, fosse a última vez que veria o pai. Talvez, fosse a última vez que conversaria com ele, que ouviria os seus conselhos, que riria, que partilharia os seus problemas... O seu pai estava fraco e a sua vida por um fio.

Um homem faz tudo para proteger a sua família. E, foi isso que o pai de Remus fez. Para defender a sua família, de um Devorador da Morte, colocou a sua vida em risco. Conseguiu derrotá-lo mas, antes de morrer, o Devorador da Morte lançou-lhe uma maldição. Iria sofrer devagar até que, um dia, a morte lhe tiraria a vida.

— Remus, — disse Mary, com carinho — você está bem? Quer dizer... Como é que pode estar bem... — tentou justificar-se.

— Eu estou bem — disse Remus enquanto limpava as lágrimas com as mãos. — Não se preocupe.

— Não sabia que o seu pai...

— Ninguém sabe! — interrompeu Remus. — Nunca contei a ninguém. Já era de esperar. Há treze anos que sabia que um dia iria nos deixar... — e quase num sussurro concluiu: — E eu ainda lhe trouxe mais problemas.

— Seja qual for o problema, com certeza que ele sente o mesmo amor, que sempre sentiu, por você. Não fique triste, ele estará sempre ao teu lado, esteja onde estiver.

— Eu sei, só que... não será a mesma coisa. Eu preciso dele. Preciso da sua ajuda na minha transf... — calou-se de repente, tinha falado demais. Olhou para Mary mas parecia que esta não tinha percebido o que acabava de dizer.

— O que estava dizendo? Não percebi, desculpe.

— Não era nada de importante! — respondeu atrapalhado. Depois olhou para o relógio e comentou: — Já é tarde, acho melhor voltarmos para o castelo ou ainda somos apanhados pelo Hagrid. E ele não anda de bom humor.

— Acho que tem razão — E, quando olhou para as mãos, reparou que ainda tinha a carta de Remus. — Remus.

— Sim?

— Tome. — Disse ao entregar-lhe a carta da mãe —, não se esqueça dela. É sua. E, mais uma coisa... Não esqueça que ainda terá a sua mãe para lhe ajudar.

— Obrigado, Mary! — Disse enquanto se levantava. Estendeu a mão para ajuda-la a levantar-se.

Mary aceitou a ajuda. Agarrou-lhe a mão e levantou-se. Mas, ao dar o primeiro passo, tropeçou no manto e foi de encontro ao peito de Remus. Este segurou-a com um abraço e Mary ficou encostada ao seu peito.

Mary gostou de sentir o quanto era reconfortante o seu abraço. Não queria que aquele momento acabasse. Já há muito tempo que sentia alguma coisa por Remus, mas tinha medo de assumir os seus sentimentos. Não só por ser uma Slytherin, mas por causa do que os outros diziam. Era ao que levava a rivalidade entre as equipes. Muitas vezes o preconceito dos outros estraga tudo.

Mas, o que Mary não sabia era que Remus nutria o mesmo sentimento por ela. Mas este não tinha medo da rivalidade nem do preconceito das pessoas, tinha medo de a magoar. Tinha medo de a perder quando soubesse toda a verdade a seu respeito. Instintivamente, apertou-a mais contra o peito. Queria ficar com ela pelo resto da noite. Queria sentir o seu cheiro, o seu calor, a leveza dos seus cabelos...

Os seus corações batiam no mesmo compasso. Uma pequena brisa começou a levantar-se. Uma brisa fria que fez com que, os dois, se juntassem mais um contra o outro à procura do calor dos corpos. O cabelo de Mary esvoaçava ao sabor da brisa executando movimentos ondulatórios.

Mary ergueu o rosto e fixou os olhos de Remus. A lua estava reflectida neles. Começaram a aproximar os rostos, um do outro. O inevitável estava prestes a acontecer. Mary fechou os olhos e naquele momento é tocada nos lábios. Remus a beijava, não queria acreditar no que estava acontecendo. Colocou os braços em volta do pescoço de Remus e entregou-se ao beijo. Ao seu primeiro beijo.

Podia-se sentir que precisavam um do outro. Remus precisava de conforto e Mary de ser salva de um mundo ao qual não pertencia.

Mas Remus tomou consciência do que estava fazendo e afastou-se. O encanto daquele beijo acabava de ser quebrado e Mary não queria que ele acabasse. Tentou beijá-lo mais uma vez, mas Remus soltou-se dos seus braços e afastou-se. Virou-lhe as costas e começou a dirigir-se para o castelo.

Mary via-o afastando-se, sem reagir. Não entendia o que estava acontecendo. Não entendia o porquê daquela mudança tão brusca. Talvez não gostasse dela. Talvez... Remus afastava-se cada vez mais. Tinha que fazer alguma coisa. Precisava saber o que se passava.

— Remus! — chamou. —Remus, o que aconteceu? O que se passa com você?

Remus parou de caminhar, mas ficou em silêncio. Continuava de costas e de cabeça baixa. Um turbilhão de pensamentos invadia a sua mente. “O que é que eu fiz? Eu não posso... Não devo... Não quero que ela se envolva comigo. Posso magoa-la e isso eu não quero. Preciso de afastar este sentimento, para o seu bem”.

— Remus! — ouviu atrás de si. Mary tinha-se aproximado. — Remus o que se passa com você?

— Nada. Não se passa nada! — disse ainda de costas voltadas. — Não quero magoa-la. Todas as pessoas que se aproximam de mim acabam sofrendo. — concluiu olhando nos olhos de Mary.

— Eu não me importo de sofrer, desde que você... — Mary não conseguia falar. Não queria confessar o seu amor, não naquele momento.

Remus esperava que Mary completasse o que queria dizer. No fundo, ele sabia o que queria ouvir, mas não podia correr o risco de a fazer sofrer. Tinha que afastar Mary de sua vida, antes que fosse tarde de mais

— Desde que continue meu amigo. — Disse por fim, talvez fosse melhor assim. Talvez aquele beijo fosse uma demonstração do carinho que os dois estavam precisando. E, era melhor recordar o primeiro beijo do que estragar uma amizade.

O coração de Remus despedaçou-se, ainda tinha esperanças de ouvir o que mais desejava. O que Mary falara parecia sincero. Mas, o verdadeiro sentimento de Mary estava escondido no olhar fixo no chão.

— Eu serei sempre seu amigo. Você sabe isso. Anda, vamos entrar no castelo! Está esfriando rapidamente.

Estendeu a mão e Mary agarrou-a. De mãos dadas caminharam para o castelo. Não pronunciaram uma única palavra durante todo o caminho. Subiram os degraus de granito, empurraram as grandes portas da entrada e entraram no vestíbulo. Tinha chegado a hora de se separarem. Remus tinha que subir a escadaria de mármore, para ir para a torre dos Gryffindor, e Mary tinha que descer às masmorras.

— Bem... — começou Remus. — É aqui que nos separamos. Boa noite, Mary! — e deu-lhe um beijo na testa.

— Boa noite, Remus!— disse Mary corada. Mas, esta surpreendeu Remus ao dar-lhe um forte abraço. Depois afastou-se e dirigiu-se para as masmorras.

Remus já estava subindo as escadas quando Mary voltou a chama-lo: — Remus! Remus espere, esqueceu de uma coisa.

Parou e olhou para trás. Mary estava subindo as escadas e trazia o manto que tinha lhe emprestado, junto do lago, na mão.

— Não é aconselhável que entre com ele na sala comum. Imagina a confusão e o tumulto que provocaria. Me confundiriam com uma Gryffindor.

— Seria engraçado. Mas tem razão, não é nada aconselhável. — disse Remus enquanto estendia a mão para pegar no manto.

As suas mãos tocaram-se e um calor percorreu os corpos de Remus e Mary. Ficaram olhando-se nos olhos, até que foram acordados por um miado.

— Mrs. Norris! — disse Mary assustada, soltando a mão de Remus.

Afastaram-se rapidamente em direcção opostas. Serem apanhados pelo Filch era a pior coisa que podia lhes acontecer depois de um momento, embora pequeno, de felicidade.

Mas, não era Mrs. Norris que andava a vaguear pela escola àquela hora. A professora McGonagall percorria a escola todas as noites, na sua forma de Animagus, para apanhar os alunos que infringissem as leis. Assim passava despercebida e muitas vezes era confundida pela gata do Filch, mesmo sendo de cores diferentes.

Quando Remus entrou na sala comum encontrou-a vazia. À excepção de James e Lily que estavam sentados de frente para a lareira a gozar os últimos dias antes das férias do Natal. Lily também passaria o Natal em casa, na companhia dos pais e da insuportável irmã, Petúnia.

Subiu directo para os dormitórios e encontrou Sirius e Peter dormindo. Sentou-se na cama, apoiou os braços sobre as pernas e fitou o chão do dormitório, levou uma mão aos lábios e tocou-os de leve. Fechou os olhos e tentou sentir o doce sabor de Mary. O cheiro do seu cabelo a delicadeza da sua pele...

— Porquê? — questionou-se Remus. James acabava de entrar no dormitório naquele momento mas permaneceu à entrada. — Porque é que tenho de ser diferente? Porque tenho este mal dentro de mim? — disse enquanto esfregava os braços, como se quisesse livrar o corpo de impurezas.

Mesmo vestido, deitou-se. O desespero era tanto que as lágrimas desciam sem controle, molhando a almofada. Deixou escapar um suspiro. Colocou os braços debaixo da cabeça e fixou os olhos no teto.

James permanecia à entrada, iria esperar que Remus adormecesse. Não queria que soubesse que o vira chorando. Continuava a ouvir Remus a murmurar, mas não o entendia.

Remus continuava a falar sem perceber que era observado. Num momento ou noutro, deixava escapar, mais alto, o que o atormentava.

— ... Não posso ter este sentimento por ela. Quando souber a verdade, não vai olhar mais na minha cara. Quem, no seu juízo perfeito, amaria um lobisomem? Quem...? Oh! Mary, como eu...

James, então percebeu o que o perturbava. À cerca de um mês, fez a mesma pergunta quando os encontrou atrás de uma estante na biblioteca: “O que acontecerá quando descobrir a verdade? O que Mary fará quando souber que Remus é um lobisomem?” . Os mesmos pensamentos voltaram a aparecer na mente.

Ainda permaneceu à entrada por algum tempo. Só quando ouviu um profundo silêncio, apenas interrompido pelos roncos de Peter, é que percebeu que Remus tinha adormecido. A noite estava fria, por isso, James cobriu Remus com um cobertor que tirou do malão que estava aos pés da cama. Deitou-se, fechou os olhos e pôs-se a pensar o quanto seria triste amar sem poder manifestar esse amor, só porque temos algum problema.

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