Se Escondendo



— CAPÍTULO QUINZE —
Se Escondendo




Com o recomeço das aulas, Hermione tinha nos estudos uma desculpa legítima para não ver Vítor Krum com tanta freqüência. Sempre antes de vê-lo, ela planejava dizer-lhe que gostaria de terminar o relacionamento que tinham começado no baile, embora nunca o tivessem definido com palavras. Na hora de pôr o plano em prática, porém, perdia a coragem.
— É uma situação confortável — ela comentou com Gina, certa noite em que ajudava a amiga com os deveres na sala comunal. — Ele é agradável, me trata muito bem, evidentemente gosta muito de mim... Ele sorri de um jeito quando está comigo que me tira a coragem de dizer qualquer coisa.
— Eu acho que você deveria aproveitar esses momentos com ele sem se preocupar tanto. Por que terminar agora?
— Porque eu não gosto dele. — Hermione disse, como se lembrasse à amiga que o céu era azul e não vermelho.
— Mas você não acabou de dizer que gosta de ficar com ele?
— Mas não é justo continuar com ele se eu não o correspondo... Não acha?
— Eu acho que se ele gosta mesmo de você, para ele seria pior ficar sem você. Além disso, ele sabe que vocês não vão ficar juntos para sempre, afinal, ele vai ter que voltar para a Bulgária no fim do ano letivo, não vai?
— É... — Hermione murmurou, com o olhar perdido, absorvendo as palavras de Gina e observando-a enquanto ela escrevia em seu dever de Poções.
— Sem contar — a outra acrescentou com um sorrisinho. — que você ainda não se vingou o suficiente de Rony.
— Como assim?
— Ora, Mione... “Neville tem razão, você é uma garota”.
— É verdade... Francamente!
As duas riram. Hermione era obrigada a reconhecer que assistir a Rony tentando controlar os ciúmes em cada vez que o encontrava depois de voltar de um encontro com Krum era um entretenimento e tanto.
Já Hagrid era uma preocupação bem maior do que Krum; não era visto nos terrenos da escola cumprindo suas tarefas de guarda-caça e as aulas de Trato das Criaturas Mágicas continuavam a cargo da profa. Grubbly-Plank. Malfoy fazia questão de mostrar sua satisfação com o efeito que causara juntamente com Rita Skeeter e sua matéria. Em momentos em que Hermione, Harry e Rony não pudessem responder, como no meio de uma aula, ele os provocava dizendo coisas como:
— Sentindo falta do seu homem-elefante?
Na metade de janeiro houve uma visita a Hogsmeade, e os três tinham esperanças de encontrar Hagrid por lá. Hermione sugerira que Harry ficasse no castelo tentando desvendar a pista do ovo de ouro, mas ele a tranqüilizara dizendo que já a tinha quase totalmente decifrada.
Saíram os três juntos, então, na manhã de sábado. Fazia um frio cortante, e conforme contornaram o lago, puderam ver Krum em pé no convés do navio de Durmstrang, vestindo apenas calções de banho, pouco antes de mergulhar na água com um salto preciso.
— Ele é doido! — Harry exclamou, horrorizado. — Deve estar congelando!
— É bem mais frio de onde ele vem — Hermione informou. — Acho que ele até sente calor aqui.
— Mas ainda tem a lula gigante. — Rony comentou, mais falando consigo mesmo do que com eles, uma nota de esperança na voz.
— Ele é realmente legal, sabe — Hermione disse, agora com a intenção de instigá-lo. — Diferente do que se esperaria de alguém de Durmstrang. Ele me disse que gosta muito mais daqui.
Rony guardou silêncio, com um olhar meio desanimado. Hermione ficou dividida entre a pena e a satisfação.
Já em Hogsmeade, Hermione, Rony e Harry puseram-se a procurar Hagrid pelas ruas e lojas do povoado, sem sucesso. A parada final foi no Três Vassouras, onde ele também não estava, e onde resolveram descansar um pouco e tomar cervejas amanteigadas. Hermione reparou em Ludo Bagman, que conversava perto deles com um grupo de duendes.
— Será que ele nunca vai ao escritório? — comentou.
Bagman aproximou-se, cumprimentou os três e começou a puxar conversa com Harry. Hermione chamou Rony e sentou-se com ele a uma mesa, observando. Seus pensamentos ainda estavam em Hagrid, entretanto.
— Será que Hagrid tem passado esse tempo todo trancado em casa, se escondendo por causa daquela matéria idiota? — perguntou, com um certo desespero na voz.
— Não é possível que ele não saia nem para vir beber alguma coisa em Hogsmeade. — Rony comentou.
— Pois é, mas talvez ele não quisesse vir num dia em que os alunos de Hogwarts viessem visitar o povoado.
Rony concordou, pesaroso, e pouco depois Harry sentou-se junto com eles.
— Bagman disse — contou ele — que os duendes estavam procurando Crouch, que não aparece no trabalho há duas semanas.
— E Percy continua a representá-lo? — Rony perguntou, o cenho franzido em desconfiança.
— Parece que sim, e segundo o próprio Percy, Crouch está doente. Bagman ainda falou sobre Berta Jorkins, que continua desaparecida. Parece que foi vista pela última vez na Albânia.
— E ele disse mais alguma coisa? — Hermione perguntou, sorvendo um gole de sua cerveja amanteigada.
Harry hesitou por um instante antes de responder.
— Ele me ofereceu ajuda com o ovo.
Foi a vez de Hermione franzir o cenho.
— Mas por quê?
— Ele disse que se afeiçoou a mim por eu ter sido obrigado a participar do torneio.
— Mas ele é um dos jurados! Espero que não esteja ajudando Cedrico também... E, de qualquer forma, você já está com a pista do ovo quase pronta, não está?
— Estou — Harry respondeu vagamente, e ela poderia jurar que viu um brilho de culpa nos olhos dele.
Pouco depois que Ludo Bagman deixou o bar, uma bruxa usando vestes amarelas e unhas rosa-choque entrou junto com um homem barrigudo que segurava uma câmera fotográfica.
— É Rita Skeeter — Harry murmurou.
Rita Skeeter vinha trazendo bebidas para uma mesa próxima à deles, comentando com o fotógrafo sobre Bagman.
— Tentando estragar a vida de mais alguém? — Harry perguntou, agressivo.
— Oh, Harry! — exclamou a bruxa, abrindo um enorme sorriso. — Por que não se junta a nós?
— Por que você fez aquilo com Hagrid? — Harry disse, levantando a voz e chamando a atenção das pessoas ao redor.
O sorriso de Rita Skeeter vacilou, mas ela o manteve e disse:
— As pessoas têm o direito de saber a verdade, estou apenas fazendo o meu trabalho...
— Quem se importa que ele seja meio gigante? Não há nada errado com ele!
Depois de superar um momento de surpresa com a agressividade de Harry, Rita abriu a bolsa e tirou dela um pergaminho e uma pena verde, com uma expressão de excitamento no rosto.
— Que tal conceder-nos uma entrevista sobre o Hagrid que você conhece? Você o chamaria de um pai-substituto?
Hermione sentiu o sangue ferver ao limite diante de tanta frieza.
— Sua horrorosa! — exclamou, levantando-se com a caneca de cerveja amanteigada apertada na mão. — Qualquer coisa vira artigo; qualquer um serve, não é? Até Ludo Bagman...
— Sente-se, menininha, — Rita Skeeter disse, com desdém. — e não fale do que não entende. Sei de coisas sobre Ludo Bagman que deixariam seus cabelos em pé. Não que eles já não estejam...
Hermione colocou a caneca de volta na mesa com violência.
— Vamos, Rony, Harry — sibilou entre dentes e saiu em alta velocidade, os garotos quase correndo para alcançá-la. — Vamos ver Hagrid agora mesmo! — anunciou, andando ainda mais rápido e resmungando insultos a Rita Skeeter.
De volta a Hogwarts, os três pararam ofegantes em frente à cabana do amigo, e Hermione bateu com força na porta.
— Hagrid, saia já daí! — gritou, batendo insistentemente. — Queremos falar com você, não estamos nem aí se sua mãe é giganta ou não é! Nos deixe entrar! Pare já com essa bobagem, você não pode deixar aquela Skeeter nojenta fazer isso com você, e...
A porta abriu-se, mas foi Dumbledore quem surgiu por trás dela. Hermione recuou, empertigando-se, pigarreou e disse em voz bem baixa: — Queremos ver Hagrid.
— Percebi — disse Dumbledore sorrindo e abrindo passagem para eles.
Hagrid estava sentado à mesa em um estado deplorável; os cabelos e roupas estavam bagunçados e o rosto muito inchado. — Você ouviu, Hagrid, o que a srta. Granger estava gritando? Acho que um pouco mais de chá faria bem, a propósito. — o diretor fez surgir uma bandeja com chá e bolo. — A julgar pela maneira como tentavam derrubar a porta, Hermione, Rony e Harry continuam querendo vê-lo.
— Como você pôde pensar que íamos nos importar com o que aquela mulher escreveu sobre você? — Harry perguntou a Hagrid, que deixou escapar uma enorme lágrima ao longo da barba desgrenhada.
— A prova viva do que eu estava tentando lhe dizer, Hagrid. — disse Dumbledore. — Já lhe mostrei as cartas dos pais indignados que disseram que não irão ficar calados se eu o mandar embora.
— É, mas não são todos. — disse Hagrid, a voz embargada.
— Bem, Hagrid, se você procura aprovação universal, receio que vai ficar trancado nessa cabana por muito tempo. Não há semana, desde que eu assumi a direção de Hogwarts, em que eu não receba pelo menos uma coruja reclamando da maneira como a dirijo.
Vez ou outra uma lágrima descia lentamente pelo rosto de Hagrid. Hermione levantou-se e pôs as duas mãos sobre a dele, dizendo:
— Hagrid, volte a ensinar, por favor... Nós realmente sentimos sua falta.
Mais lágrimas escorreram pelo rosto de Hagrid. Dumbledore levantou-se, dizendo:
— Me recuso a aceitar seu pedido de demissão, Hagrid, e espero que você volte ao trabalho na segunda-feira. Boa tarde a todos.
O diretor se retirou, e Hagrid começou a soluçar.
— Ele está certo, vocês estão certos... Tenho agido como um idiota nestes últimos dias, meu pai se envergonharia de mim. — ele levantou-se, foi até uma cômoda e tirou da gaveta uma foto, que trouxe para mostrar. — Este é meu pai.
O homem na foto era realmente parecido com Hagrid, apesar de aparecer sentado no ombro do filho, que não parecia ter mais do que onze anos. — Foi tirada logo depois que entrei em Hogwarts, papai ficou tão orgulhoso... Ainda bem que ele não me viu ser expulso, morreu quando eu estava no segundo ano. Harry me lembrou de mim mesmo quando entrou na escola... Os pais desaparecidos e um medo enorme de não se adaptar... E agora é campeão da escola! Adoraria ver você vencer... Como meu pai dizia, não podemos nos envergonhar do que somos... Mas tem gente que nega o que é, inventa desculpas, "ossos grandes"! Mas eu prometo a vocês que não vou mais me importar com ela. Ossos grandes, vou mostrar para ela os ossos grandes.
Hermione viu Rony e Harry entreolharem-se, mas não comentaram nada, afinal, Hagrid não sabia que os garotos tinham ouvido sua conversa com Madame Maxime, e eles aparentemente não queriam admitir.

— Tenho um monte de coisas para contar — Harry anunciou, quando sentava-se junto com Hermione e Rony no fundo da sala de aula de Feitiços.
O prof. Flitwick destinou a aula daquele dia à prática do feitiço expulsório, contrário ao convocatório, e mandou que praticassem com almofadas para evitar maiores acidentes. O objetivo era acertá-las dentro de uma caixa próxima à janela.
— Comece logo, então — Rony disse, acertando sem querer sua almofada na cabeça de Lilá Brown, que olhou para ele irritada.
— Bem, o Cedrico me deu uma dica sobre a pista do ovo, por eu o ter avisado sobre os dragões, e eu fui verificar ontem à noite. — ele olhou para Hermione.
Ela franziu o cenho; desconfiava que ele tinha mentido sobre já ter descoberto a pista do ovo, e agora ele estava prestes a confessar. — A dica era abri-lo debaixo d'água, e aí aquele grito faria sentido. Foi o que eu fiz, e era uma música, que tem uma frase, que é a dica para a segunda tarefa.
— Harry... — Hermione começou, mas ele interrompeu-a com um gesto, pedindo calma.
— O mais importante não é isso, Mione. Depois eu falo da pista. O que eu quero contar é o que aconteceu depois.
— Você levou o ovo aonde para pôr embaixo d'água? — Rony perguntou, curioso.
— No banheiro dos monitores, mas isso não importa agora — Harry respondeu, corando.
— Você me disse que já tinha decifrado a pista do ovo! — Hermione exclamou, indignada.
— Por favor, fale baixo! Só faltam alguns retoques... De qualquer maneira, o que importa é que eu saí escondido com a capa da invisibilidade e levando o mapa do maroto para cuidar onde Filch estava. Mas quando eu estava saindo do banheiro, vi um pontinho indicado como Bartolomeu Crouch na sala de Snape.
— Bartô Crouch? — Rony perguntou, espantado. — Mas ele não estava doente?
— Foi o que eu pensei, mas estava no mapa. Aí eu resolvi ir atrás para ver... E acabei ficando preso num degrau solto da escada, o ovo caiu da minha mão, abriu e soltou aquele grito horrível... E Filch veio, pegou o ovo e achou que Pirraça tinha roubado.
— E você preso na escada? — Rony parecia excitadíssimo com o suspense.
— E o mapa caído fora da capa, alguns degraus abaixo, e eu não conseguia alcançar. Ainda por cima, daqui a pouco Snape apareceu dizendo que alguém estivera revistando sua sala. Depois chegou Moody, e ele me salvou, pois Snape já estava querendo revistar o castelo à procura do invasor da sua sala. Como Moody vê através da capa, ele percebeu o que estava acontecendo e convenceu Snape a ir embora. Só que Moody viu o mapa do maroto, achou que era de Snape e já ia entregando a ele. Fiz sinal por baixo da capa a tempo de ele não entregar e dizer que se enganou, mas Snape olhou para o mapa, para o ovo e juntou dois mais dois. "É o Potter", ele disse, e quis procurar de novo. Moody acabou por espantá-lo, e a Filch também, e aí me ajudou a sair do buraco. Mas ele ficou com o mapa.
— Quê? — Rony perguntou. — Como assim ficou com o mapa? Por que você deixou?
— Ora, eu pensei que ele ia me perguntar onde eu arranjei, não é, e já comecei a entrar em pânico por causa de Sirius, mas ele só me pediu emprestado, então acabei deixando... Moody ainda disse que Dumbledore está dando uma segunda chance a Snape.
— Quê? — Rony perguntou, novamente. — Será que ele acha que foi Snape quem colocou o seu nome no cálice de fogo?
— Por que será que Crouch está fingindo que está doente? — disse Hermione, de repente. — É meio estranho que ele não possa vir ao baile de inverno mas venha revistar a sala de Snape quando tem vontade, não é?
— Você não gosta dele por causa daquele elfo doméstico, Winky. — disse Rony, desdenhoso.
— E você quer desconfiar de Snape a todo custo. Dumbledore confia nele, e Dumbledore não é burro.
— Eu só queria saber o que foi que Snape fez na primeira, se está na segunda chance. — disse Harry.

Naquela noite, Harry foi ao corujal enviar uma carta a Sirius contando o mesmo que contara a Hermione e Rony, enquanto os dois concentravam-se na pista do ovo. Ele deixara com Hermione um pergaminho escrito com a letra da música do ovo.
— "Procure onde nossas vozes parecem estar, — ela começou a ler, em voz alta. — não podemos cantar na superfície, e enquanto nos procura, pense bem: levamos o que lhe fará muita falta, uma hora inteira você deverá buscar, para recuperar o que lhe tiramos, mas passada a hora - adeus esperança de achar. Tarde demais, foi-se, ele jamais voltará."
— Que trágico — Rony comentou.
— Bem... Harry já falou de sereias, que ele descobriu no banheiro, e as vozes delas só podem estar na água. Deve ser o lago, então, suponho. E evidentemente algo vai ser roubado, que precisa ser recuperado em uma hora.
— Então, basicamente, o que Harry tem que fazer é achar um jeito de respirar embaixo d'água por uma hora para salvar essa tal coisa?
— Presumo que sim...
Harry entrou naquele momento na sala comunal, e durante a próxima hora os três discutiram maneiras de respirar debaixo d'água por uma hora, sem conseguir chegar a nenhuma conclusão definitiva.
Durante os próximos dias, eles aproveitavam todo o tempo livre que tinham para procurar na biblioteca algum feitiço que Harry pudesse usar. Quem não gostou muito foi Krum; ele abordou Hermione um dia depois do almoço, quando ela se dirigia com os garotos para as escadas.
— Hermi-ônini — ele disse, tocando no braço dela.
Rony, que andava ao seu lado, fechou a cara no mesmo instante e puxou Harry para continuar andando com ele.
— Que foi, Vítor? — Hermione perguntou.
— Pem, querro saper quando vamos nos verr de nofo.
— Já disse que tenho andado ocupada... Sinto muito, mas eu estou ajudando Harry.
— Ajudando Harry com o quê?
— Já disse, a pista da segunda tarefa.
— Eu posso ajudarr — ele disse, num tom um tanto desesperado.
— Não! — Hermione saltou. — Você está concorrendo com ele, não pode ajudá-lo!
Ela subitamente assustou-se com a idéia de que ele estava disposto a ajudar Harry só para vê-la mais vezes.
— Hermi-ônini...
— Vítor, assim que eu puder eu falo com você. Você também deveria estar dedicando seu tempo à segunda tarefa.
— Eu já estou pronto para ela. Vou usar...
— Não me conte — ela disse, com um gesto de impaciência. — Por favor, não quero mais falar sobre o torneio com você. Eu estou do lado de Harry, e isso não vai mudar.
— Mas eu não pedi a focê que...
— Eu só queria deixar isso claro, Vítor. Eu... falo com você, certo?
Ela soltou-se do braço dele e andou apressadamente por onde os garotos tinham ido.

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