O Báltico



Quando o dia um de fevereiro chegou Arthur não conseguia mais esconder sua animação. Passara grande parte da noite anterior acordado sonhando com as maravilhas que por de certo encontraria no dia de hoje – em Palas.
Contudo, ele tinha que manter certa discrição. Sua mãe o obrigara a não contar nada, absolutamente nada, sobre bruxos e mundo mágico para seus irmãos, o que ele cumpriu sem dificuldades. Mas de verdade ele não concordava com a atitude dela já que provavelmente no futuro eles iriam para a Escola de Magia também.
Mas isso não importava agora.
O importante era que o momento em que ele, Arthur Mortense, pisaria numa escola mágica chegasse logo. Não agüentava ficar na sua casa nem mais um minuto, enquanto sua mãe parecia que estava enviando o filho para guerra.
Mesmo com tudo isso, Arthur imaginara que sua mãe seria pelo menos razoável em sua partida, o que, constatou com certa tristeza, não fora possível. A cena que Denise fizera quando Freidel veio buscá-lo na altura das três da tarde fora no mínimo constrangedora.
Por sorte seus três irmãos-pivetes estavam passeando por aí como sempre. Em lágrimas Denise despediu-se do filho, recomendou mil vezes que ele se cuidasse e ameaçou Freidel dizendo que se algo acontecesse a Arthur ela o mataria em nome de Deus.
Para Denise, Arthur acabara de ir para um lugar onde 24 horas por dia sua vida estaria por um fio, um lugar horrível e perigoso. Para os três irmãos de Arthur, ele havia ido para um colégio interno qualquer em um lugar qualquer para fazer qualquer coisa, não os importava mais detalhes de fato. E para o próprio Arthur, ele estava indo para um lugar de sonhos onde tudo era bom e correto.
O que logo descobriria não ser verdade.
De alguma forma Denise pressentira o que estava por vir. Palas esse ano realmente seria perigosa, haveria horrores que a teriam feito pegar Arthur pela camisa trancá-lo no banheiro do cubículo de seu Cafofo e jogar a chave fora.
Em todo caso, a viagem de Arthur para Palas começou bem.
Assim que ele e Freidel viraram a esquina já não havia mamãe ou irmãozinhos pirralhos para lhe atormentar. Não, senhor. Agora Arthur Mortense era um bruxo, um bruxo analfabeto é verdade, mas ainda um bruxo. Via um novo futuro a sua porta – um futuro de glória.
Seu pensamento foi interrompido por Freidel:
- Arthur, temos que nos apressar. – avisou. – a partida é às 5:00h em ponto.
- Ainda temos tempo, não?
- Prefiro não arriscar.


Por volta das 4:30h, Arthur e Freidel se encontravam no porto da Praça 15. Para Arthur todos ali eram meras pessoas comuns. Trouxas em outras palavras. Mas pensou que se não fosse assim, como as pessoas comuns seriam privadas de Seu mundo mágico?
Provavelmente existia alguma porta ou passagem mágica e secreta por onde ele e os outros meninos-bruxo pudessem passar – que só eles pudessem passar. E que os trouxas, meras pessoas comuns ao qual o mundo mágico permaneceria escondido para sempre, ficassem de fora.
Pensou se iria querer voltar para casa depois de ir para uma escola de magia. Acreditava que não.
Notou que alguns dos trouxas olhavam de nariz torcido para ele, seu acompanhante e seu malão. Talvez fosse pelas roupas nada elegantes que os dois usavam, talvez não. O fato era que Arthur odiava ver aqueles míseros mortais, sem um pingo de mágica, olhá-lo daquela maneira.
Esse tipo de pensamento havia consumido o jovem Mortense por todos os dias que se arrastaram até hoje. Por que ele tinha se esconder dos trouxas se eles eram mais fracos? Por que tinha que permitir que eles o olhassem daquela maneira?
Decidiu que tinha de aceitar se visto como um lixo até que tivesse algum poder de bruxo. E quando o tivesse, ninguém, bruxo ou não, o discriminaria de novo. Arthur Mortense, descendente do criador de Palas, mostraria para eles... Sim, ele mostraria.
Esqueceu esse tipo de coisa quando Freidel parou ao descer por uma escada de concreto que dava para o lado da água suja e fedorenta da Baía de Guanabara. Não havia nada de mágico ali.
- E então? Como vamos pra Palas? – disse Arthur sarcástico. – voando?
- Sim, pode se dizer que sim. – respondeu Freidel. – Acho que você já sabe que Palas é uma ilha, não é, Arthur?
- Vi umas fotos num dos livros...
- Bom... – Freidel estava pensativo. – temos que pegar o Báltico para chegar nela, é o único transporte capaz de achar a ilha.
Arthur sorriu admirado.
- Somente com o Báltico chegamos a Palas? – indagou. – um barco ou um avião não chegaria lá?
- Digamos que sim, mas não veriam nada. – disse Freidel orgulhoso. – nas raras ocasiões que os barcos trouxas vão de encontro com a ilha invisível aos seus olhos, eles são transportados direto para o outro lado. Para todos os efeitos não há nada naquela parte do oceano...
Era um método bastante bom pra Arthur. E quando estava, neste momento, contemplando a genialidade do mundo mágico é que se lembrou: não tinha idéia do que era um Báltico.
Perguntou a Freidel, mas este preferiu o suspense.
- Prefiro que veja com seus próprios olhos. – disse sorrindo.


Faltavam apenas 5 minutos para a partida do Báltico quando Freidel chamou Arthur para uma reentrância entre o final do porto das barcas e um velho prédio sujo e empoeirado. Ao saírem da reentrância se depararam com uma elevação sobre o mar.
Era uma vista bonita.
- É aqui que ele vai surgir. – avisou Freidel. – Temos vários pontos de embarque espalhados pelo país, ficaria muito chamativo reunirmos num só local.
Mal Freidel terminara de falar e outras 10 ou 15 pessoas surgiram no lugar. Todos eles estavam vestidos de maneira esquisitas, com cores berrantes. Cumprimentaram Freidel assim que o viram.
- Como vai o braço, Sr. Brandevil? – indagou Freidel rindo. – espero que melhor desde o nosso último joguinho...
- Sim, sim, caro Freidel. – disse o Sr. Brandevil sorrindo. – logo estarei pronto para derrotar você e os outros bastardos!
Os dois homens riram debilmente. As outras pessoas ali olhavam para a cena indiferente. Arthur observou um menino e uma menina que discutiam do outro lado. Eram os únicos com a mesma idade deles.
O Sr. Brandevil, um homem de idade média e de cabelos castanhos curtos, despediu-se de Freidel e voltou-se para sua família. Ele interrompeu a discussão dos garotos que Arthur observava. Um homem loiro de olhos claros e cintilantes se dirigiu ao Sr. Brandevil com ar presunçoso.
- Acho que essas crianças precisam de modos, não acha Greg?
- Talvez, primo. – respondeu o Greg Brandevil meio irritado.
- Ainda levando em conta nossas velhas rixas, primo Greg? – disse o homem loiro. Ele se chamava Afonso Rivers.
- Não! – retrucou o outro. – apenas não as esqueci.
- Que pena. – disse Afonso em tom solene. – Ana querida, pare de discutir com seu primo, e venha se despedir de sua mãe, o Báltico está chegando.
- Claro papai. – disse a garota correndo em direção a mãe logo depois de lançar o último olhar feio para seu primo Thiago.
Arthur observou o garoto Thiago Brandevil abraçar sua família em despedida com certa inveja. Desejou ter sua mãe ali – não sua mãe exatamente como ela era. – desejou ter uma família de bruxos, isso sim era verdade. Uma família inteiramente mágica.
Num segundo havia a aglomeração de pessoas diante do mar e no outro havia parado diante delas uma espécie – realmente estranha – de barco. De fato, pouco lembrava um barco. A Arthur lembrou a Arca de Noé (embora ele não tivesse certeza de como ela era) com vários andares e compartimentos tortuosos que seguiam em cores variadas.
O Báltico não parecia ter sido planejado. Era como se os andares superiores tivessem sido acrescentados na estrutura principal de maneira desgovernada, ao acaso da necessidade. Arthur de toda forma achou a coisa o meio de transporte mais interessante que já vira até então.
- Dois minutos! – gritou um homem de azul com um cap prateado com a inscrição: “Báltico de Palas”.
Freidel apertou os ombros de Arthur sorrindo.
- Está na hora, meu rapaz. – proferiu ele, de certa forma, emocionado. – espero que esteja gostando.
- Estou um pouco assustado. – confessou o garoto. – é tudo tão... diferente, acho...
- Se acostumará logo.
Arthur puxou o malão para junto de si. Apertou a mão calosa e grande de Freidel e seguiu com a aglomeração de alunos para o Báltico. Já estava quase no “veículo” quando o garoto que vira há certo tempo atrás comentou com ele:
- Legal, não acha?
Arthur sacudiu a cabeça afirmativamente. Os dois entraram pela portinhola do veículo. Os pais acenavam do lado de fora – alguns até choravam emocionados.
- Nem acredito! – disse uma senhora. – meu filho já está indo para Palas, como o tempo passa depressa!
- Não sei como agüentarei até o próximo ano. – disse outra.
Logo que todos embarcaram o Báltico se ergueu sobre as águas. Grandes velas, que se estendiam como asas, içaram magicamente. A mais ou menos 20 metros das águas escuras o Báltico começou a avançar. Em pouco tempo estavam voando em oceano aberto, sem nenhum sinal de terra a vista.
Arthur observava o pôr-do-sol solitário na proa do Báltico. Olhava atento a espera de Palas, enquanto se sentia mal. Estava tão triste de repente, estava tão fora de “seu mundo”, que era quase assustador. Como podia estar desejando voltar a sua vida trouxa e comum? Como podia estar se sentindo tão diferente das pessoas que esperara dia a pôs dia para conhecer?
Seus cabelos castanhos esvoaçavam com a brisa do mar. Pelo menos a viagem era boa e tranqüila. Ao seu lado os garotos que também viajavam pela primeira vez no Báltico riam maravilhados conversando sobre coisas que ele não entendia ainda.
Uma garota de cabelos lisos e pretos presos num coque mal-ajeitado se debruçou na beirada ao lado de Arthur. Sua pele branca radiava com os raios alaranjados do sol poente.
- Triste? – perguntou ela a Arthur.
Este pego de surpresa acabou por não responder, ficou apenas fitando a garota sem saber o que dizer.
- Sei bem o que é isso. – prosseguiu ela. – também me sinto assustada com isso, é bom estar aqui, sabe? Mas ao mesmo tempo me sinto tão temerosa fora da vida que costumava ter. Você é de família de Bruxos?
- Quê? – disse Arthur, se sentindo idiota.
- Você tem pais Bruxos?
- Ah. Tenho... quer dizer, não. – Arthur se lembrou a tempo do que Freidel dissera: “ninguém deve saber que descende de Octavio Mortense, e nem que seu pai era um bruxo”. – nasci trouxa se é o que quer saber.
- Eu também! – bradou a garota radiante. – Liana Almeida, prazer. – e lhe estendeu a mão.
- Arthur Mortense.
Liana apertou sua mão sorrindo. O óculos da garota vibrava em seu nariz miúdo.
- Tem certeza de que nasceu trouxa? – ela perguntou ainda rindo.
- Claro, porque?
- O seu nome, não me parece um nome trouxa...
Arthur ficou imaginando se o comentário fora feito devido ao nome do fundador de Palas também ser Mortense (lógico, eram parentes). Poderia ela ter feito tal ligação? Ele acreditava que não.
- É um nome Alemão. – explicou Arthur. Sabia que seu pai viveu na Alemanha e pensou que talvez seu nome fosse de lá, no mais, era uma saída para essa pergunta. – minha família é de lá.
Liana assentiu e se voltou para a paisagem. Parecia ter engolido a história de Arthur. O garoto se perguntou se faria diferença se ela engolisse ou não. Para ele não, pelo menos.
Na altura de 5 e meia da tarde, Palas apontou no horizonte. A principio só se conseguia distinguir um monte inerte e disforme de verde, mas pouco a pouco, as torres altas do castelo de Palas tomaram forma.
O Báltico deu rasante leve para baixo chegando quase a tocar a água. As velas tornaram a baixar e os comissários da embarcação começaram a correr de um lado para o outro avisando aos alunos para se preparem para o desembarque.
Enquanto rumavam para fila Arthur se perdeu de Liana que passara toda viagem ao lado dele, comentado qualquer coisa volta e outra. Um grupo de alunos veteranos quase derrubou Arthur ao passarem cantando rumo à fila de desembarque. Algumas garotas os olhavam admiradas.
- Nada de ficar se exibindo com a varinha na ponte de desembarque, Sr. Blackheart. – avisou um dos comissários. Um homem negro e corpulento.
Felipe Blackheart, o líder do grupo terceirianista que quase atropelara Arthur, olhou de cara amarrada para o negro. Seus olhos azuis demonstravam sua insatisfação. Virou-se indiferente e rumou com seus colegas para a fila.
O Báltico deu ¼ de volta e parou ao lado de uma ponte que se erguia do porto num ângulo de 15º. A um centímetro das águas calmas da Ilha de Palas, o Báltico parou. O encaixe entre a portinhola do veículo e da ponte do porto fora perfeito.
Um dos comissários seguiu na frente e os alunos o seguiram prontamente. Arthur vinha meio sem jeito com seu malão no meio dos alunos mais velhos. Sentia-se como um peixe levado pela correnteza. Tentava abrir espaço entre os estudantes corpulentos com sua carcaça magra e miúda quando todos se dissiparam para os lados.
Antes que o pobre Arthur soubesse o que se passava, Felipe e seu melhor amigo – e capacho – Diogo Linz, vinham disputando uma luta com suas varinhas. Disparavam feixes dourados e prateados para todo lado. Como um estouro, Arthur foi atingido e jogado para fora da poente caindo nas águas rasas.
Quando tomou consciência do que ocorrera, Arthur já estava mergulhado na água salgada da praia, seu malão já estava tombado na areia, e o grupo de alunos acima dele, incluindo Felipe que estava à frente de todos, riam com gosto.
Arthur nunca se sentira tão humilhado em toda sua vida. Sentiu-se incapaz de sair de onde estava. Um homem vindo sabe se lá de onde, chegou até ele e o conduziu pela praia. Pegou o seu malão enquanto murmurava alguma coisa que o garoto ouvia muito ao longe.
Por que tinha que ter acontecido isso justo no seu primeiro dia em Palas?
Os rostos sarcásticos refletiam em sua mente, se sentiu com vontade de chorar. Queria voltar para sua mãe e nunca mais olhar para um bruxo de novo. Queria nunca ter estado ali, o pensamento latejava na sua cabeça.
Arthur e seu condutor chegaram numa rua larga de paralelepípedos, onde casas e lojas se erguiam com vigor e alegria. Contudo, as coisas pareciam deprimentes e errôneas para o menino, mas pelo menos não havia aquela gente rindo-se dele.
- Você está bem garoto? – perguntou o negro que ralhara com Felipe. Ele acabara de chegar ao seu encontro. – se machucou?
Arthur meneou a cabeça debilmente.
- Ele só precisa limpar-se. – disse o homem que ajudara Arthur. – está coberto de sal e areia.
- Sorte que ele não estava com o uniforme da escola. – lembrou o negro. – aliais de toda forma deveria tê-lo o posto no Báltico garoto... – observando o rosto tristonho de Arthur acrescentou. – fique tranqüilo garoto, darei uma lição naquele infeliz que o derrubou... Esse Blackheart já estava me devendo umas, e agora com mais essa, farei ele se arrepender de um dia ter estado nessa ilha!
O negro se afastou irritado a fim de cumprir sua promessa. O outro homem sacudiu a cabeça sorrindo.
- Ah, esse Josías, ainda leva a sério essa traquinagens de colegiais. – disse. – você não deve levar a sério – dirigiu-se a Arthur. – essas coisas são comuns, acabara fazendo isso com alguém algum dia, acredite em mim, ainda se lembrara com felicidade deste tombo.
Arthur não respondeu ao homem, mas não concordava com ele em certos aspectos. Um era que jamais iria fazer algo desse tipo com alguém enquanto vivesse, e dois é que nunca conseguiria rir de um vexame como este.
- Vamos logo, se não você se atrasara para a apresentação. – o homem pôs o braço sobre o ombro de Arthur e o levou para se trocar.
O sol estava por uma linha ao longe. O calor assolado sumiu sem qualquer explicação. As árvores da ilha curvaram-se com a corrente fria de ar que chegara sem aviso. Grandes nuvens começavam a se ajuntar acima de Palas.


Quando deram 6 horas todos os alunos se encontravam amontoados a frente das grandes portas do Salão de Jantar. As portas de madeira detalhadas com cobre e ouro mediam mais de sete metros de altura por três de largura e pesavam quase 300 quilos.
Arthur foi o último a chegar. Vinha desengonçado, ainda não tinha se acostumado as vestes cumpridas da escola. Era um traje peça única negro, com detalhes azul escuro nas bordas. O Símbolo de um leopardo prateado pendia na altura do peito.
Ele achou perceber uns risos cínicos entre o ajuntamento de alunos. Enfiou-se no meio deles tentando não ligar, e reparar, em qualquer um que fosse. A vastidão do castelo iluminados por imensos lustres dourados cravejado por diamantes e outras jóias o assustava. Sentia-se muito pequeno ali dentro.
Felipe Blackheart marchou com seu grupinho ordinário para Arthur.
- Então você é verme novato que derrubei mais cedo? – perguntou. Seus cabelos escuros e ondulados estavam caídos sobre sua face branca.
Arthur encarou o terceirianista de cara amarrada.
- Não olhe para mim desse jeito seu merdinha! – retrucou Felipe. – por sua causa vou ficar o próximo mês limpando os sanitários depois das aulas.
Tomado de raiva Arthur disse:
- Se não fosse tão babaca não teria acontecido nada disso!
Todos ao redor, a tirar apenas pelos alunos do primeiro ano, levaram as mãos à boca, assustados. Arthur teve a impressão de ter proferido o maior palavrão do mundo. Felipe sentiu as veias de seu corpo pulsarem: como ele ousara responde-lo?
- O que você disse? – indagou o rapaz. – repita se for homem...
Felipe segurou Arthur pela gola de sua veste e ergueu o outro braço preparando para um soco. Alguns alunos murmuravam em pânico com os outros enquanto Arthur se perguntava como conseguira arrumar tanta confusão num só dia.
Antes que o punho de Felipe Blackheart descesse sobre o rosto do garoto a comissão de professores chegou. Vinham em fila, caminhando e conversando alegremente. O diretor Albino Belforth vinha no meio deles conversando discretamente com um homem alto de cabelos finos e negros, tão negros que faziam o cabelo de Felipe parecerem claros.
- Se salvou por hoje, merdinha. – bracejou Felipe se afastando.
Assim que os professores, e alguns outros funcionários, se aproximaram da porta do grande salão, ela se abriu magicamente – sem qualquer ruído. Havia duas grandes mesas de mogno de cada lado do lugar com vários candelabros de platina por cima. No fundo ficava a bancada alta dos professores e mais adiante um vitral de quase 14 metros de altura com o grande leopardo de Palas desenhado.
Os professores se assentaram em seus lugares. Os alunos veteranos foram se espalhando pelas duas mesas destinadas aos alunos. Os novatos ficavam perdidos sem saber o que fazer, ou onde se sentar.
O diretor Belforth se levantou e disse em tom alto e claro, numa altivez que o distanciava muito do velho que Arthur havia conversado na cozinha de seu Cafofo:
- Aluno do primeiro ano sigam aqui para frente.
O grupo de cerca de 200 alunos rumou para junto da bancada dos professores. Um velho manco ajustou os aluno lado a lado virado para o restante da escola. Alguns deles suavam nervosos, outros tremiam, um garoto próximo de Arthur parecia preste a ter um desmaio.
O homem de cabelos mais-que-negros que conversava com Belforth se levantou, com um pergaminho em mãos, e anunciou um por um os alunos, pedindo que o mesmo desse um passo à frente ao ser chamado.
Quando o nome Arthur Mortense foi proferido algumas pessoas observaram curiosas. Nunca tinham visto ninguém com o nome Mortense, a não ser o fundador de Palas. Não que fosse importante, na verdade era engraçado. Principalmente por que “era aquele moleque”.
Umas pessoas disseram em alta voz: “Você logo vai estar tão morto como o fundador, Mortense”.
Arthur corou.
Depois do último nome ser chamado os primeiranistas se dirigiram as mesas – uns a da direita e outros a da esquerda. Arthur preferiu a da direita. Sentou-se justo ao lado dos dois primos que brigavam no embarque do Báltico na Praça 15.
A garota, Ana Rivers, fitou Arthur por um breve momento. Ela o olhava como olharia um verme, sujo e asqueroso. Voltou-se para o seu prato jogando seus longos cabelos loiros para trás. Thiago, seu primo, meneou a cabeça e cumprimentou Arthur sorrindo.
- Prazer, Thiago Brandevil. – disse estendendo a mão.
- Arthur Mortense.
Arthur se sentou e viu que algumas pessoas o observavam. Alguns com uma grande e misera cara de pena.
- Não ligue para eles. – disse Thiago. – dão muito crédito a esse palhaço do Blackheart.
- Você já estudava aqui? – perguntou Arthur.
- Não, claro que não. – contou Thiago logo percebendo que o “Sr. Coitado” era filho de trouxas. – sou do primeiro ano como você, mas conheço o pasmo desde que nasci. Nossas famílias são amigas, e minha mãe é prima de quarto grau dele se não estou enganado.
Interrompendo a conversa do dois garotos surgiram os cardápios – um para cada aluno. Era feito de uma material grosso, couro talvez, tinha cor de barro e letras amarelas. Arthur abriu o seu temeroso. Aquilo surgira do nada.
Dentro continha as seguintes informações: pratos do dia – e então se seguia a listagem variada dos pratos que tinham para hoje, bebidas – uma lista coberta de bebidas que o garoto nunca ouvira falar, e por último a listagem das sobremesas.
Thiago fez o seu pedido rapidamente como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo e então o que pedira apareceu em sua frente em pratos metálicos brilhantes. Arthur ficou maravilhado pelo modo como a comida surgira.
Em seguida fez o seu pedido.
Pela primeira vez se sentia realmente feliz.

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