O caminho das pedras



Quando Tonks e Hermione alcançaram a entrada do castelo tudo parecia gélido e acinzentado. Tudo parecia mórbido e triste. Gina parecia estar tendo um ataque epilético, pois tremia convulsivamente enquanto chorava silenciosamente.

Tonks levou as mãos ao rosto e o sacudiu de um lado para o outro. Em seguida ela se aproximou de Harry e disse algo a ele que se levantou. Ela girou a varinha e uma maca apareceu. Hermione se aproximou de Gina e a fez levantar-se. As duas seguiram abraçadas logo atrás da maca até a enfermaria.

Talvez por nunca ter visto alguém próximo morto, mas Hermione não conseguia parar de olhar para Rony. Porque ele tinha que ter feito aquilo? Porque não a escutaram quando ela alertou sobre a mente do garoto?

Não demorou muito e os professores começaram a aparecer na enfermaria. Harry simplesmente deixou o lugar sozinho e por muitas horas não foi visto. A Professora McGonagall ordenou que Hermione levasse Gina dali e ela obedeceu.

Foi bem difícil convencer a garota a dormir.Mas foi mais difícil ainda chegar no dormitório do sexto ano e informar a mais alguém sobre o que acontecera.

- Lilá?- chamou Hermione ao entrar no dormitório.

Silêncio. Hermione se mirou no espelho da penteadeira. Apesar da tristeza em seus olhos não havia mais marca alguma aparente.

- Lilá, eu preciso falar com você.- Repetiu ela enquanto arrancava o distintivo e depositava-o com um ruído sobre a mesa. Em seguida ela abriu o colarinho das vestes e se assentou por ali.- Lilá eu...

A garota colocou seus gigantescos e curiosos olhos para fora do cortinado e fitou Hermione.

- Por favor, venha aqui.- completou Hermione.

A garota deixou sua cama e caminhou até a de Hermione. Se assentou por ali.

- Aconteceu uma coisa.- começou Hermione sem saber como dizer.- Uma coisa que provavelmente não lhe deixará muito feliz.

- Algo com o Rony?- perguntou a garota.- Ele piorou? Ele tem andado tão estranho ultimamente, Hermione...

- Aconteceu algo com o Rony, sim.- disse Hermione fechando os olhos para tentar não derramar lágrimas.- Mas de certa forma ele não piorou.

- O que aconteceu então?- perguntou Lilá.

Silêncio. Hermione não queria falar, definitivamente ela não estava preparada para aquilo tudo.

- Rony...- começou Hermione sentindo que não agüentaria, que as lágrimas viriam à tona.- Ele...- ela engasgou por um momento.- Ele estava no telhado da escola e...- ela parou novamente tentando escolher as melhores palavras.- E ele pulou de lá.

Seguiu-se um minuto de silêncio. Hermione viu a cara, antes curiosa, agora chocada de Parvati aparecendo pela cortina da cama.

- E ele... ele está bem?- perguntou Lilá quase que sem voz.

- Não se pode cair daquela altura e estar bem.- Respondeu Hermione secamente. Lilá arregalou os olhos.- Oh! Desculpe Lilá.- disse ela enquanto se assentava ao lado da outra e a abraçava.- Sabe, era um dos meus melhores amigos, não há como eu não me alterar.

Lilá se levantou com certa violência e sorrateiramente deixou o dormitório. Parvati se levantou e a observou sair.

- Não precisava ter sido grossa!- disparou ela.

Hermione a olhou como se fosse o mais desprezível dos vermes e em seguida se levantou e deu as costas. Foi trancar-se no banheiro onde nas duas horas que se seguiram ela chorou silenciosamente, assentada a um canto.

Em um corredor escuro qualquer Harry fazia o mesmo. Chorava como nunca havia chorado na vida. Sentia-se mais vazio agora do que quando Sirius morrera. Sentia-se simplesmente péssimo e quando o dia seguinte nasceu ele se levantou e desceu para o café da manhã. Não demorou muito e ele viu Hermione entrar no salão comunal. Estava sem as vestes de Hogwarts, no lugar destas havia outras, completamente negras. E no rosto um fúnebre óculos-escuros.

Por um momento ele pensou que ela caminharia até ele. Que o daria um abraço e lhe diria que tudo ficaria bem. Mas ela simplesmente passou direto e foi se juntar à Gina, igualmente de negro. Após o episódio Harry perdeu completamente o apetite e deixou o salão principal, mas não seguiu para suas aulas, foi se jogar a um ponto isolado no jardim.

- Harry.

Ele se virou e viu Luna. A garota deixou-se assentar ao lado dele.

- Eu já soube sobre o que aconteceu.- Começou ela.- O enterro será esta tarde, você já sabe?

Harry sequer se mexeu. Pensava agora em outra coisa. E o plano para ir até a casa dos Malfoy, como ficaria? Como se estivesse lendo seus pensamentos Luna logo respondeu.

- Partiremos esta madrugada.- disse ela.- Não temos tempo a perder.

Silêncio.

- Hermione pediu que você arrumasse uma pequena bolsa para viagem.- continuou Luna.- Eu já arrumei três barracas para passarmos a noite se for necessário e Hermione disse também que...

- Hermione!- murmurou Harry com desprezo.- Ela é louca! Eu cheguei à essa conclusão esta manhã! Ela consegue ser mais louca que você, Luna.

O canto da boca de Luna se contorceu em um quase imperceptível sorriso, mas ela não deixou escapar nenhuma espécie de protesto ao ser chamada de louca.

- Não a culpe pelos fatos...

- Eu não a estou culpando por estes fatos!- disse Harry.- Ela nem olha na minha cara, Luna! E nem é capaz de me dizer o porque!?

Silêncio. Luna pensou por um momento.

- Não me sinto no direito de falar com você sobre isso.- disse ela.- Não quero acabar julgando a Mione... Mas... Me responda, Harry: Caso ela olhe na sua cara ou não, você vai deixa-la partir sozinha?

- De maneira alguma!- disse Harry.- Eu não vou deixa-la ir com aquele traste do Malfoy e...

- Você vai deixar de amá-la por isso?- perguntou Luna ignorando o último comentário do garoto.

Harry pensou por um momento. Se Hermione chegasse para ele e dissesse “Vá embora!” Ele sabia que de alguma forma a obedeceria. Sobretudo sabia que jamais conseguiria esquece-la.

- Não.- Ele respondeu.

- Então não tente subverte-la!- disse Luna em tom agudo.

Harry ergueu os olhos para ela. Carregava um embrulho que ela imediatamente estendeu a ele.

- O enterro será às cinco.- disse ela.- Nos encontraremos na Sombra dos Sonserinos as uma e meia da manhã. Não se esqueça da capa da invisibilidade.- completou antes de se distanciar.




****




Hermione se juntou a Luna e as duas seguiram pela estrada que levaria a Hogsmead. O cemitério, de certa forma estava cheio. Hermione ajeitou os óculos escuros enquanto olhava à volta.

A Sra. Weasley e Gina permaneciam abraçadas próximo ao caixão, na sala de velório. Harry também já aparecia por ali, a um canto, as mãos nos bolsos. A gravata rota e as vestes incrivelmente amassadas.Ele ergueu os olhos ao passo que Hermione desviava os seus e observou tristemente as duas garotas passarem.

Seguiu-se assim por todo o velório. Harry a um canto, cabisbaixo, deixando escapar um ou outro olhar. Hermione da mesma maneira, apesar de ter mais liberdade para examinar Harry, graças aos óculos escuros.

Sentia uma dor imensa por dentro ao pensar que por escolha própria jamais tornaria a tocar Harry. Eles seguiriam seu plano, Voldemort finalmente cairia. Ela terminaria o seu sétimos ano. Se formaria, seguiria alguma carreira promissora e viveria até que a morte a levasse. Era duro ter que planejar uma vida futura sem Harry. Principalmente decidindo isso da forma que decidira.

O caixão agora estava sendo preparado para ser baixado cova à dentro. Os olhos de Hermione mais uma vez recaíram sobre Harry, este estava cabisbaixo e parecia chorar silenciosamente. E então ela a viu. Qualquer pessoa que a olhasse não a reconhecia, talvez nem a visse, mas foi pela presença de mente que Hermione a notou.

Trajava a capa e o capuz negros. Como quando Hermione a vira no Cabeça de Javali. Se mantinha distante, entre os túmulos mais sombrios. Tinha a cabeça erguida e desta forma podia-se ver seus olhos faiscando como duas esferas translúcidas sob a luz da lua.

Gui começou a fazer o discurso de despedida a Rony. Mas Hermione não conseguiu prestar atenção. Como que levada por uma força estranha, ela deu a volta no aglomerado de gente e nem notou que esbarrou em Harry ao passar.

Ela continuava lá. Como uma estátua negra. Como uma assombração. Hermione deu mais alguns passos e a encarou enquanto sacava a varinha sem chegar realmente a ergue-la. Nem notou que Harry estava agora a menos de dois metros dela. Fitando-a confuso.

Seguiu-se um minuto em silêncio. O crepúsculo se iniciara e um vento fresco soprava. E então ela desapareceu. Hermione olhou à volta e de repente sentiu-se tonta. Virou-se, viu Harry encarando-a, mas não só isso. Ela via através das pessoas, através de tudo. As ossadas por sob as lapides e lajes e até mesmo o corpo de Rony sob o caixão que agora era coberto de terra.

Ela observou um corpo se mexer até Rony e beijar-lhe. Em seguida o corpo, Belatriz Lestrange, virou-se para ela e deu um sorriso cruel.

- Hermione?!

A garota sentiu a cabeça doer. Abriu os olhos e viu Harry, se ergueu assustada. Estava deitada em uma cama, uma cama não. Um dos leitos da enfermaria de Hogwarts.

- Você desmaiou durante o enterro.- explicou uma outra voz. Ela olhou para o lado e viu Tonks, Gina e Luna, ambas fitando-a preocupadas.

Hermione se lembrou do ocorrido e arregalou os olhos.

- Aconteceu alguma coisa?- perguntou Tonks fitando-a de uma forma que para Harry lembrava muito a Dumbledore.

Hermione hesitou por um momento. Tonks tentava penetrar a sua mente, mas ela já podia impedir tal feito com facilidade.

- Está tudo bem.- disse Hermione com firmeza.- Foi só um mal estar.

- Vou falar com Madame Pronfey, pedir que ela lhe prepare um chá.- disse Tonks enquanto se retirava.

- Quantas horas são?- foi a primeira coisa que Hermione perguntou olhando para Luna.

- Sete e trinta e cinco da noite.- respondeu a outra.

- Tenho que me livrar desta enfermaria.- disse ela.

- O que aconteceu de verdade?- perguntou Gina olhando-a com um olhar cansado e tristonho, ainda trajando preto.

Hermione olhou à volta e em seguida narrou resumidamente o ocorrido.

- Com isso eu pude confirmar algumas coisas.- concluiu Hermione.- Foi ela quem levou Rony ao suicídio. Usando de uma ligação que ela não dificilmente criou entre eles.

Tonks vinha voltando.

- Talvez seja melhor passar a noite aqui.- disse ela.

- Não!- disse Hermione mais rapidamente do que esperava.- Tenho... Tenho que estudar.

- Ainda haverá muitas noites antes dos testes.- disse Tonks.

- Mas...- começou Hermione.

- Mamãe já partiu?- perguntou Gina em tom choroso.

- Sim.- informou Tonks.

- Achei que ela passaria esta noite comigo.- disse a garota baixando os olhos.- Deixe que Hermione me faça companhia...

- Hermione pode estar precisando de descanso.- disse Tonks olhando de uma para a outra, desconfiada.- Minerva já me falou sobre a visível falta de repouso que emana de Hermione. Essa é uma boa oportunidade para descansar.

- Ela vai descansar!- disse Gina.- Só a presença dela me trará conforto... Hermione é como uma irmã para mim, e agora que o Rony se foi...- Ela falava em um tom que lembrava à Murta que Geme e Harry não foi capaz de dizer se era fingimento ou não.

No fim Tonks concordou. Os três seguiram na companhia da professora para a torre da Grifinória, Luna para a da Corvinal. A professora Minerva estava no salão Comunal e seguiu com Gina e Hermione até o dormitório do sexto ano. Esperou-as trocar os pijamas e deitarem sobre a larga cama de colunas que Hermione usava. Só então ela se retirou.

Harry a observou atravessar o salão comunal e ganhar os corredores. Sentia-se ansioso. Se Rony estivesse ali talvez os dois mantivessem uma conversa para descarregar aquele sentimento. Mas ao invés do amigo havia apenas colegas de casa que uma vez ou outra se aproximavam de Harry para dar-lhe “meus pêsames”.

As horas foram passando lentamente. Harry viu o salão comunal se esvaziar. O ponteiro do relógio de pulso andando lentamente. Hermione e Gina permaneciam deitadas na cama de Hermione, em claro, respirando calmamente, as mochilas prontas debaixo da cama, esperando que a roupa fosse trocada, que o relógio finalmente batesse a hora da partida.

Em outros tempos os três estariam se lamentando pela morte do tão querido amigo. Mas agora, eles tinham que aceitar que o passado é passado.

Na torre da Corvinal Luna lia O Pasquim de cabeça para baixo. Cho Chang e uma outra garota do sétimo ano foram as ultimas a deixar o salão comunal. A hora da fuga se aproximava.

No dormitório do sexto ano Crabbe e Goyle já roncavam. Blás estava assentado na janela observando o jardim florido lá em baixo.

- E quando tudo isso acabar?- perguntou ele.

- Os caminhos se abrirão para nós.- disse Draco.

- Eles não vão querer deixar a sua tia livre.- disse Blás.

- Eu sei.

- Nenhum dos lados.

- Ela vai se esconder por um tempo.- disse Draco pensativo.- E eu também.

- Talvez eu vá para a Irlanda.- disse Blás.- Para a casa de meus avós. Acho que lá eu estarei seguro contra qualquer coisa.

- É bom você sumir por um tempo também.- concluiu Draco enquanto abria uma gaveta e tirava algo enrolado em um pano dali.

- Ficarei lá.- disse Blás.- Esperando o seu chamado.

Draco fitou-o em silêncio. Agradecido pela fidelidade do outro. Em seguida se levantou e dirigiu-se ao banheiro. Desenrolou o objeto e chamou.

- Tia.

Não demorou muito e o rosto da mulher apareceu no espelho. Ela fitou Draco e sorriu.

- Creio que a Sra. deve voltar para casa agora.- disse Draco em tom sereno.- Parto em algumas horas. No fim do terceiro dia cuide de Dumbledore.

Belatriz sustentou o sorriso e fazendo uma pequena e divertida reverência ela desapareceu.




****




Faltava pouco para uma hora da manhã quando Hermione se levantou. Gina se assentou e a olhou.

- Troque-se.- ordenou a primeira.

Gina se levantou e obedeceu. Em dez minutos as duas estavam descendo as escadas para o salão comunal com mochilas nas costas. Harry já estava por ali e se levantou ao vê-las.

Hermione sacou a varinha e conjurou uma maca. Harry a olhou confuso.

- Onde está a capa da invisibilidade?- perguntou Hermione. O garoto tirou a mesma de dentro da mochila e estendeu-a.- Deite-se aí.

- Se nos pegarem fora da cama dizemos que somos monitoras.- explicou Gina.- Mas você não tem essa desculpa.

Harry lentamente obedeceu. Hermione ajeitou as mochilas aos pés dele sobre a maca e cobriu tudo com a capa da invisibilidade.

Era no mínimo estranho atravessar o castelo daquela forma, pensou Harry. Mas no fim ele pôde se sentir aliviado por não terem encontrado ninguém no caminho.

Draco, Luna e Zambini já estavam no lugar combinado quando eles chegaram. Draco olhou para as duas, levemente confuso.

- Onde está o Potter?- perguntou ele.

Hermione puxou agilmente a capa e Harry se assentou na maca enquanto ajeitava os óculos. Os três apanharam as mochilas e a maca desapareceu.

Seguiu-se um longo silêncio. Todos mantinham suas mochilas às costas com os olhares cheios de expectativa, mas ninguém parecia disposto a dar o primeiro passo. Pela primeira vez Harry sentiu que não seria o que comandaria aquela “operação”, talvez por isso olhou para Draco.

- Creio que estão todos aqui.- disse o rapaz olhando de um em um.- Estive espionando a sala de Tonks e ela está em reunião na sala do diretor.

Silêncio.

- Bom, o que estamos esperando?- perguntou Blás que parecia, de certa forma, o mais animado do grupo.

Todos concordaram com a cabeça e tomaram o rumo da estrada que levava à Hogsmead. Seguiam calados. Havia cumplicidade naquele silêncio, havia dúvida, mas também esperança.

Uma hora depois eles alcançaram a estação. O trem já estava parado ali. Hermione entregou as passagens ao maquinista e eles foram se acomodar em uma cabine ao fundo.

Silêncio. Alguns minutos se passaram e a locomotiva começou a mover-se. Luna tirou de um bolso o Pasquim. Hermione olhava o nada pensativa. Draco olhava Hermione com olhos de cobiça. Blás e Gina estavam quietos e lançavam-se, às vezes, olhares tímidos. Ele, Harry, sentia fome.

- Alguém lembrou da comida?- arriscou ele algum tempo depois.

Draco deu um sorriso divertindo enquanto desviava seus olhos cinzas de Hermione para poder encarar Harry. Hermione se curvou, apanhou a própria mochila e, sem erguer os olhos, estendeu-a para Harry.

O garoto comeu alguns bolinhos de abóbora em silêncio. Duas horas mais tarde resolveu tirar um cochilo. O dia já havia raiado quando a locomotiva finalmente parou.




***continua***

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