Mudando o Rumo da Guerra
“De pé aqui com as mãos em meu bolso, como já estive muitas vezes
Thinking back...”
Lembrando do passado...”
(Bon Jovi – You Had Me From Hello)
Sirius Black encarava o teto de seu quarto escuro, deitado. A lembrança da batalha de dias atrás ainda estava nítida em sua memória. Ele se ausentara enquanto estava com Bellatrix, e só depois viera a saber das inúmeras perdas que tiveram.
”Lindo, homem. Seus amigos morrendo e você transando com a sua pior inimiga. Ótima conduta.” – debochou de si mesmo em pensamentos. Colocou uma das almofadas no rosto, mania que tinha desde adolescente, sempre o fazia quando queria esquecer algo. Mas nem sempre adiantava, como era o caso.
Soube também que houve muitas perdas para os comensais. A batalha, na verdade, não terminara. Os dois lados acabaram achando melhor bater em retirada quando viram que estavam todos cometendo suicídio. Sirius sentia-se culpado pela preocupação no rosto de James quando ele apareceu.
“Onde você estava, seu cachorro desgraçado?!” – James gritou, indignado
“Você não quer saber, Prongs. Não quer saber.” – Sirius disse, esquivando-se – algo que o amigo ignorou por completo.
“Procuramos você por horas, chegamos a pensar que estivesse morto! Nunca mais.” – ele disse, segurando Sirius pelos ombros. Falava sério, mas a expressão em seu rosto já era tranqüila por ter o amigo de volta, são e salvo. “Nunca mais se atreva a fazer isso, Padfoot!”
Sirius riu, e os dois abraçaram-se dando tapinhas um nas costas do outro. As amizades - e principalmente o medo de perdê-las - ficavam mais fortes naqueles tempos difíceis.
Agora, ele pensava como poderia contar a James o que havia feito. Era loucura. Não, não podia contar a ninguém. Até mesmo o mais insano dos amigos o condenaria por aquilo. Além de Bellatrix ser a pior dos comensais, Sirius e ela eram primos. Aquilo não podia ter acontecido.
Não podia ter acontecido.
Estava realmente mais do que na hora de ele aprender a se controlar. Não podia mais agir como um adolescente. Havia muita coisa em jogo agora. E se algum dos lados soubesse que os dois se envolveram? E se Lestrange soubesse que eles se envolveram? Não podia por tudo a perder.
Sirius levantou-se, indo até a pequena, mas aconchegante, sacada do quarto, parando apoiado na parede com as mãos nos bolsos, gesto um tanto quanto seu. Por um momento, um pensamento ridículo passou pela sua cabeça: e se tentasse trazer Bellatrix para o lado do bem? Mas desistiu da idéia tão rapidamente quanto a teve. Ela era assim desde criança, jamais mudaria. Gostava mais das Artes das Trevas do que de qualquer coisa. Uma lembrança bem significativa disso veio à mente de Sirius...
Mansão Black, verão de 1976.
Sirius já deixara de se surpreender com as coisas que sua família fazia, mas não conseguiu não ficar boquiaberto com aquela notícia. Ali, na mesa de jantar, no verão de seu quinto ano em Hogwarts, seus pais anunciavam o noivado de sua prima, Bellatrix, com Rodolphus Lestrange.
Por Merlin. Não que gostasse de Bellatrix, longe disso, mas ela tinha só 16 anos, e teria que se casar com um pretendente escolhido pelos Black. Se não fosse quem fosse, Sirius conseguiria até sentir algo mais do que pena. Estava realmente dividido entre a idéia de que ela merecia aquilo, e de que ninguém merecia aquilo.
Viu pelo canto dos olhos a garota sorrir falsamente para o noivo que estava sentado a sua frente, junto com toda sua família macabra. Será que ela gostava dessa idéia? Trix costumava seguir as regras, mas não era de aceitar o que não queria tão facilmente. Seu poder de persuasão era bem grande – e todos naquela casa pareciam ceder a ele.
Viu também a garota se levantar, pedindo licença e avançando corredor à dentro. Como de costume, sua maldita curiosidade o fez ir atrás dela.
Ao alcançar a prima, segurou-a pelo braço, forçando-a a parar de caminhar. – “Você não está... feliz com isso, está?” – perguntou, erguendo uma sobrancelha.
Ela se virou, encarando-o sem emoção. – “É o meu papel como uma Black digna, coisa que você nunca será.”
“Não foi isso que eu perguntei.” – disse, olhando-a nos olhos.
Por um momento, jurou vê-la fraquejar. Achou que ela fosse despejar estar cansada de tudo aquilo. Bobagem.
“Ah, me deixe garoto!” – ela disse, soltando seu braço bruscamente da mão do primo que ainda a segurava.
“Fugir não vai te livrar dos problemas, Trix.” – disse, sorrindo vitorioso.
“Fugir, Sirius? Pare de tentar filosofar. Eu não estou fugindo de nada. Só estou me livrando do meu primo chato.” – ela retrucou, sorrindo cinicamente.
“Então quer dizer que você quer casar com aquele homem?”
Ela pareceu parar para pensar um momento. – “Não.” – respondeu, simplesmente. “Mas vou.”
“Bellatrix, você não quer ser feliz?!” – Sirius perguntou, indignado com a frieza da garota.
“Só há uma maneira de ser feliz, Sirius. Dinheiro e poder. Se você puder garantir essas duas coisas, poderá garantir todo o resto.”* - disse, encarando-o seriamente. “Eu vou ser grande, você vai ver. Maior do que qualquer um dessa família, vou ter mais poder do que você jamais sequer imaginou.”
“Resposta errada, Trix. Resposta errada.” – o garoto disse, dando as costas e começando a andar.
“Não dê as costas pra mim, Sirius.”
”Isso é uma ameaça, priminha?” – ele disse, dando uma gargalhada forçada. “É melhor você não dar as costas pra mim.”
As lembranças daquela época o faziam sentir-se um inútil. Era tão fraco... Obrigado a se sujeitar a tantas coisas dentro daquela casa. Lembrou-se de Andromeda, ela sempre tivera as palavras certas para qualquer momento, provavelmente teria para este também. Não que ele pretendesse, em sã consciência, contar a ela – ou a qualquer outro ser vivo. Até porque não significara nada, repetiu em pensamento. Do mesmo, não sabia onde encontrar a prima. Fazia tempo que ela não dava notícias – o que o deixou realmente preocupado. Andie era casada com um trouxa. Mas, vendo por outro ângulo, também era irmã de Bellatrix, ela não poderia ser tão insensível a ponto de deixar machucarem sua própria irmã. Ou podia. Difícil dizer com certeza. Afinal, ela abriu mão de seu coração – isso se algum dia teve um – quando se tornou comensal.
Ironicamente, pensou que Bellatrix fora bem-sucedida em sua vida. Ela sempre dissera que queria ser grande, ser lembrada, e não só mais uma Black, bonita, bem educada e com um marido rico. Isso era muito pouco para ela, pouco demais para suportar toda aquela maldade.
Interrompendo sua linha de pensamento, um Remus ofegante irrompeu em seu quarto. “Padfoot. Ataque de Comensais. Hogsmead. Agora!” – e desaparatou instantaneamente, seguido por Sirius.
Bellatrix estava acomodada na poltrona da sala de estar de sua casa – extremamente elegante, os móveis todos feitos de madeira escura da melhor qualidade, as poltronas e sofás num tom de vermelho escuro, feitas de couro de dragão, e nas estantes, inúmeros objetos decorativos e alguns até voltados às Artes das Trevas também, mas que seriam facilmente escondidos em alguma emergência. Perdida em seus pensamentos, observava o crepitar do fogo na lareira. Aquilo a hipnotizava. Seus olhos já estavam ardendo quando as chamas tomaram a forma dos corpos dela e de Sirius, e ela teve que sacudir a cabeça para que tudo voltasse ao normal. De alguma forma a cena dos dois juntos não saía de sua cabeça... Que maldição, aquilo estava atormentando-a.
Sentiu uma mão tocar seu ombro, e segurou-se – ainda bem que o fez – para não deixar escapar um “Sirius?!” . Mas é claro que não era Sirius. Estava tão perdida nas imagens que via no fogo que nem lembrava mais de onde estava, ou seja, na sua casa. Sua casa com Rodolphus, lugar onde o primo jamais poderia estar. Sacudiu a cabeça novamente para tentar afastar aqueles pensamentos de uma vez por todas.
“Bellatrix.” – ele disse, beijando o pescoço da esposa.
“Olá, Rodolphus.” – ela disse, virando o rosto para poder vê-lo.
Culpou-se por compará-lo com Sirius no mesmo momento em que o enxergou. O desgraçado do primo conseguia ser a criatura mais bonita na qual ela já tinha posto os olhos... E Rodolphus, bem, era só Rodolphus.
Mas ela estava satisfeita com seu casamento. O marido sempre fora um partido promissor: rico, de família tradicional, e Comensal da Morte. Não havia amor nenhum entre os dois, – mas amor era algo que ela não se sentia incomodada por não sentir, pelo contrário, sempre fora ensinada a evitar esse sentimento – só uma espécie de cumplicidade, talvez dada mais pelo fato dos dois às vezes trabalharem juntos, prazer físico, e uma certa admiração. Admiração esta vinda principalmente da parte do homem, que colocava Bellatrix num pedestal. E quem não o faria? Para alguém como ele, era uma honra ser casado com uma mulher dotada de tamanha beleza e inteligência, e ainda por cima admirada por todos os bruxos das Trevas por ser a única comensal mulher. O tirava do sério vê-la conversando com outros homens, não por uma suposta falta de confiança, mas pelos olhares que lançavam a ela, podia ver que não havia um que não a desejasse. Mas ela era sua, e pobre de quem a tocasse.
“O Lord requisita sua presença.”
Ela se permitiu sentir medo por alguns segundos. Mas não, não haveria como ele ter descoberto... Ou haveria? De qualquer forma, ela aparatou para a sede imediatamente. Entrou, abrindo as pesadas portas de pedra da casa aparentemente abandonada, encontrando alguns comensais, que a cumprimentaram.
“O Lord a espera, Bellatrix.” – Lucius disse, indicando o caminho com a cabeça.
“Já estou sabendo.” – disse, indo em direção à sala do mestre.
Era um corredor escuro, cheio de portas nas laterais, e por trás de algumas delas nem mesmo Bella sabia o que se passava, estavam sempre trancadas. Depois de um tempo que pareceu relativamente maior do que as outras vezes que fora ali, chegou à porta do aposento onde seu amo se encontrava. Agarrou com força a maçaneta em forma de cobra e a girou, fazendo com que a porta se abrisse num estrondo.
“Milorde.” – ela disse, adentrando na sala e indo até a poltrona onde o mesmo estava sentado, ajoelhando-se a seu lado com a cabeça baixa, respeito que os comensais deviam sempre demonstrar.
“Bellatrix.” – o homem disse, segurando a lateral da face da garota com sua mão gélida, e levantando seu rosto. “Sempre pontual.” – Disse, mas havia algum sarcasmo em sua voz... Ou quem sabe ela só estivesse achando isso porque se sentia culpada, poderia estar imaginando coisas.
“Estou sempre pronta para servi-lo, meu senhor.” – ele fez um aceno positivo com a cabeça, ela se levantou.
“Fui informado que você se ausentou na última batalha. Espero que possua uma justificativa convincente.” – disse, naquela calma habitual e assustadora ao mesmo tempo.
Bella sentiu um calafrio percorrer todo seu corpo. Voldemort a encarava, olhando profundamente em seus olhos, e ela sabia o que ele tentava fazer. Feche sua mente, feche sua mente, repetia em pensamento.
“Meu duelo com um auror acabou se transferindo para a floresta, Milorde.” – disse, concentrando-se para não deixar que ele vislumbrasse qualquer vestígio de mentira em sua mente.
“Um auror que você conhece bem, não é mesmo?” – ele parecia ter olhos em todos os lugares.
“Apenas Sirius, mestre, meu primo traidor do próprio sangue. É uma ofensa para mim conhecê-lo.” – disse, tentando manter sua postura despreocupada.
“Claro.” – ele disse, com um sorriso cínico se formando nos lábios. Se levantou da poltrona. Parecia um gigante perto dela, sua aura era tão sombria.
“Ah, Bellinha... Você devia saber que ninguém, ninguém engana Lord Voldemort!” – dizendo isso, segurou o braço da mulher com força, trazendo-a para perto de si.
Ela estava com medo, era verdade. Mas aquilo não deixava de ser excitante. Era simplesmente fascinada pelo mestre, ele era tão poderoso... Nenhuma punição que lhe desse diminuiria isso.
“Eu sei o que você e seu primo sujo fizeram, Bella, eu sei...” – sussurrou no ouvido da garota, passando a mão direita pela lateral do corpo dela. “E não estou nem um pouco satisfeito!”
Na última frase, sua voz se alterou e podia-se ver claramente a fúria em seu rosto. Tudo que a mulher sentiu depois foi a dor de seu corpo se contorcendo devido ao Cruciatus que ele lhe lançou. Voldemort era o bruxo das trevas mais poderoso do qual já se tivera registros, uma maldição lançada por ele, mesmo levianamente, era fortíssima.
Mas, tão de repente como a maldição veio, ela cessou. Bellatrix encolheu-se no chão, apertando seus braços em volta da barriga que doía. – “Milorde, eu... Eu não queria.”
“Poupe-me de suas desculpas.” – ele disse, seco. “Mas você tem sorte, Bellatrix, acabou por ser útil.”
Ela o olhava, sem entender, quando ele mandou que ela levantasse – o que ela fez, com uma dificuldade imensa, mas não demonstrou dor, não podia parecer fraca depois de tudo.
“Sabe como ruem os maiores impérios, Bella?” – ele disse, juntando as mãos num gesto enigmático. “Quando são atacados não de fora, mas internamente. Nós somos mais poderosos do que essa corja que Dumbledore libera, mas nem por isso devemos subestimá-los. Será melhor se acabarmos com eles de uma vez para que não nos incomodem mais. Está entendendo onde eu quero chegar?”
Ela não sabia se estava, realmente. Ou talvez não quisesse entender.
“Você vai conquistar a confiança do Black, vai usar seus talentos de atriz para fazê-lo acreditar que você mudou, e vai se infiltrar na Ordem da Fênix.” – disse, com aquele sorriso vitorioso no rosto. “Vamos por a prova o que costumam dizer, um bom espião vale mais que mil soldados.”
Bellatrix estava perplexa. Era uma missão que ela nunca imaginara ter que cumprir, lhe dava nojo só de pensar em ter que conviver com todos aqueles traidores e sangue-ruins. Seus pensamentos estavam a mil. Como ela faria isso? Era uma ótima atriz, mas Sirius também não era nenhum idiota, não cairia tão fácil assim.
Como que lendo a mente da mulher – o que ele provavelmente fez – Voldemort respondeu às suas perguntas.
“Ele vai acabar acreditando. Você vai convencê-lo de que eu quase a matei, e que viu que eu não merecia sua lealdade.” – falou, com um pouco de nojo das próprias palavras.
“E como vou convencê-lo que você quase me matou, Milorde?”
“Ora, achei que fosse mais inteligente, Bella... Eu vou quase matá-la.” – ele disse, rindo de uma maneira doentia, fazendo com que inúmeros calafrios percorressem o corpo dela.
Depois disso, ela só teve tempo de sentir seu corpo sendo lançado contra a parede, e a sessão de tortura começando. Voldemort não brincara quando disse que ia quase matá-la, Bellatrix nunca havia apanhado tanto.
Aquilo pareceu levar uma eternidade, e quando acabou, o mestre simplesmente disse “Pronto, acho que já está bastante convincente. Agora dê um jeito de encontrar seu primo, você sabe onde fica o apartamento dele. E que fique claro: não vou tolerar falhas.”
Ela teve que se segurar para não rir – até porque rir doeria de uma maneira insuportável. Como ele esperava que ela aparatasse naquelas condições? Se viesse de outra pessoa, ela provavelmente diria que era uma brincadeira, mas vindo do Lord das Trevas, sabia que não era. Precisava aparatar. E foi o que fez, sentindo uma dor extrema em todo seu corpo, mesmo sabendo que podia custar-lhe a vida.
Não podia falhar.
N/A: Depois de uma eternidade, voltei a postar nessa fic. Não vou fazer grandes comentários sobre o capítulo – ele é meio sem ação, mas mostra o rumo que a história vai tomar daqui para frente.
Espero que alguém ainda se preste a ler isso aqui. Beijos!
* Frase de Lex Luthor, Smallville.
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