O prisioneiro de Azkaban

O prisioneiro de Azkaban



- Rony, você está bem?

- Onde está o cão?

- Não é um cão. – gemeu o ruivo com os dentes rilhando de dor – Harry, é uma armadilha...

- Quê...

- Ele é o cão... Ele é um animago...

O garoto olhou fixamente para ele por cima do ombro de Harry e Sirius se virou depressa, fechando a porta do quarto. Agora estavam todos ali...

- Expelliarmus! – Sirius exclamou com a voz rouca, apontando a varinha que roubara do ruivo para eles.

As varinhas de Harry e da outra garota saíram voando de suas mãos e Sirius as recolheu. Dando um passo à frente, ele fixou os olhos macilentos em Harry.

- Achei que você viria ajudar seu amigo... – engolindo em seco, ele abaixou a voz rouca – Seu pai teria feito o mesmo por mim. Foi muita coragem não ter correr à procura de um professor. Fico agradecido... Vai tornar as coisas muito mais fáceis...

Ele viu a face do garoto se contorcer de raiva. Com um espasmo de dor, percebeu o que estava acontecendo. Harry também acreditava que ele era um traidor. O menino se levantou, mas, antes que pudesse se aproximar, os dois amigos dele o puxaram de volta.

- Não, Harry! – a garota murmurou, sem se atrever a se mexer.

O ruivo, esforçando-se violentamente para se pôr em pé, olhou para ele também.

- Se você quiser matar o Harry, terá que nos matar também!

Sirius sentiu uma certa nostalgia ao ver a disposição dos amigos do afilhado. Com a voz mais branda que conseguiu fazer, ele se dirigiu ao garoto.

- Deite-se. Você vai piorar a fratura nessa perna.

- Você me ouviu? – Rony continuou, apoiando-se em Harry – Você vai ter que matar os três!

- Só vai haver uma morte aqui hoje à noite. – Sirius respondeu com um sorriso. Estava mais próximo do que nunca de vingar os amigos, de vingar a si próprio...

- Por quê? – perguntou Harry, tentando se desvencilhar dos amigos – Você não se importou com isso da última vez, não foi mesmo? Não se importou de matar aqueles trouxas todos para atingir Pettigrew... Que foi que houve, amoleceu em Azkaban?

- Harry, fica quieto! – a mocinha choramingou.

- ELE MATOU MINHA MÃE E MEU PAI! – bradou Harry, desvencilhando-se deles.

Sirius não se mexeu quando o garoto veio em sua direção, sua mente estava tão absorta nos guinchos desesperados que agora vinham do bolso da camisa do ruivo que ele se deixou empurrar contra a parede por Harry.

Ele sentiu o corpo ser socado pelo garoto. Sua paciência estava começando a se esgotar. Precisava terminar logo com aquilo antes que Pedro voltasse a fugir.

- Não... – ele apertou a garganta do afilhado – Esperei tempo demais...

Nesse momento ele sentiu as duas outras crianças avançarem para cima dele. Por alguns instantes eles lutaram até que ouviu a voz de Harry gritar.

- Saiam da frente!

Esparramado junto à parede, Sirius observou Harry aproximar-se, apontando a varinha para seu coração.

- Vai me matar, Harry? – murmurou ele, encarando os olhos verdes que tantas vezes tinha embalado até o sono no passado.

- Você matou meus pais.

- Não nego que matei. Mas se você soubesse da história completa...

- A história completa? Você vendeu meus pais a Voldemort. É só isso que preciso saber.

- Você tem que me ouvir. – Sirius disse com urgência. Não podia deixar que Harry fizesse aquilo... – Você vai se arrepender se não me ouvir... Você não compreende...

- Compreendo muito melhor do que você pensa. – o garoto respondeu – Você nunca a ouviu, não é? Minha mãe... Tentando impedir Voldemort de me matar... E foi você que fez aquilo... Você é que fez...

Sirius arregalou os olhos. Harry ouvia a mãe? Um clarão de entendimento passou por ele. Os dementadores...

Nesse instante, Bichento pulou para seu peito. Ele sentiu um nó na garganta ao perceber o que o gato estava tentando fazer.

- Saia daí. – ele murmurou, tentando empurrá-lo.



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A noite caía célere em Azkaban. Deitado em sua cela, Sirius observava um recorte de jornal onde nove bruxos acenavam sorridentes, tendo por trás deles uma enorme pirâmide. No ombro de um dos garotos, um rato gordo descansava.

Os olhos azuis do homem tinham estado fixos no pequeno rato durante toda a semana, desde que o Ministro da Magia, Cornélio Fudge, estivera em Azkaban e dera a ele o Profeta Diário. Sirius respirou fundo, relendo mais uma vez as últimas linhas abaixo da fotografia.

“A família Weasley vai passar um mês no Egito, de onde voltará no início do ano letivo em Hogwarts, escola que cinco dos seus filhos ainda freqüentam.”

'- Ele está em Hogwarts. - Sirius resmungou para si mesmo, entre dentes.

Rabicho, Pedro Pettigrew, estava vivo... Vivo e perto de seu afilhado, pronto para entregar o último dos Potter ao menor sinal de reaparecimento do maldito Voldemort. Fora muito esperto, muito mais inteligente do que ele supusera que Pedro poderia ser.

Tinha que sair daquele lugar. Tinha que continuar vivo, tinha que chegar até Harry. Proteger o filho, já que falhara em proteger o pai.

"Ele está em Hogwarts".

O homem rasgou uma tira da calça, amarrando junto ao peito o pequeno gravador que lhe fizera companhia por tantos anos. Em seguida, respirou fundo e transformou-se no velho Almofadinhas. Mas o imenso cachorro que acompanhava os outros marotos em suas andanças na lua cheia agora estava magro, muito fraco, respirando quase que com dificuldade.

Não era de todo ruim. Estava tão magro que conseguiu passar pelas grades quase que sem esforço. À sua frente, agora havia o mar. Quanto teria que nadar? Sobreviveria? Não importava, ele tinha que tentar. Não. Ele não podia apenas tentar. Ele tinha que conseguir.

"Ele está em Hogwarts".


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13 de junho de 1981

Susan fechou os olhos para impedir-se de chorar. Não daria aquela satisfação aos malditos comensais. Não fraquejaria. Nunca.

Ajoelhou-se por trás do sofá que estava usando como esconderijo, observando o céu pelo teto parcialmente desabado. Esperava que Selene já estivesse longe e segura. Não queria que tudo aquilo fosse em vão; se tinha que morrer, queria pelo menos que a vida da amiga fosse poupada.

A voz do líder do grupo de comensais que tinha invadido a casa feriu seus ouvidos, próxima demais para ser ignorada.

'- Ainda não se cansou de brincar de gato e rato, mestiça idiota?

A morena suspirou, segurando a varinha com firmeza. Quando se levantasse, não haveria mais retorno. Não tinha como fugir e já estava fraca demais para fazer frente a alguém.

Passou as mãos de leve sobre a barriga. Como se arrependia de não ter contado a verdade a Sirius quando tivera chance... Agora era tarde. Tarde demais para ela, para Sirius... E para o filho deles.

Mordendo os lábios, ela finalmente ergueu-se, encarando os olhos febris de BartôCrouch Jr.

Os dois ergueram as varinhas ao mesmo tempo. Dois jatos de luz entrechocaram-se no ar; a pequena explosão resultante fez tremer a já combalida estrutura da casa. Susan respirou fundo ao perceber que sua própria magia fora derrotada e que seu corpo era erguido no ar.

Não havia mais "se" - se escaparia com vida - mas "quando". Quando morreria? Quanto tempo seu corpo agüentaria as torturas que os comensais pretendiam infligir a ela?

Sentiu o gosto de sangue quando mordeu os lábios com força para não gritar. Começara.

Susan não conseguiu mais controlar as próprias lágrimas. Sentiu algo quente escorrer pelas suas pernas, enquanto todos os sons ao seu redor pareciam ter se bloqueado. Tarde demais... Tarde demais... Tarde...

As lágrimas quase a cegavam, enquanto, aos poucos, sentia-se esmorecer. Estava sendo deixada pela vida; em breve ela não passaria de um invólucro vazio, um corpo sem alma...

Já não sentia mais dor, embora os comensais continuassem a se divertir, testando na moça as maldições que conheciam. Ela deixou a mente vagar uma última vez. Pensou nos amigos. Na mãe, sempre sorridente. No pai, nos avós, nos tios, nos primos... E em Sirius.

Em um último esforço, apontou a varinha, ainda presa entre os dedos que já se enterravam na carne, para si mesma. Não permitiria que os comensais conspurcassem seu corpo.

'- Desintegritas. - ela murmurou, antes de finalmente abrir a mão e deixar a varinha cair no chão.

Bartô arregalou os olhos, enquanto toda a casa balançava, desfazendo-se em ruínas.

'- Aparatem, RÁPIDO!

Os comensais imediatamente obedeceram. O corpo de Susan brilhava em meio ao pó até desaparecer em uma nuvem de partículas brilhantes, rapidamente levadas pelo vento.

A noite, que começara escura, agora estava iluminada pelas centelhas do incêndio que rapidamente consumia os casarões de Oxford. Os aurores começavam a chegar, enquanto a maioria dos comensais abandonava suas vítimas ao sentirem o chamado de seu Lorde.

No apartamento de Susan, Sirius esperava, ansioso, a chegada da moreninha. Mas ele nunca mais a veria.


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- Onde é que ele está, Sirius?

Remo observou a face inexpressiva do antigo amigo. Onde estava Pedro? E o que ele fazia ali? O mapa não podia estar errado...

Muito lentamente, Sirius ergueu a mão e apontou para Rony. Remo fixou os olhos sobre o bolso da camisa do garoto, onde um pequeno volume podia ser visto. Aquilo não era possível...

- Mas então... Por que ele não se revelou antes? A não ser que... – os olhos de Remo se arregalaram, afinal entendendo tudo o que estava acontecendo – A não ser que ele fosse o... A não ser que você tivesse trocado... Sem me dizer?

Tremendo imperceptivelmente, Remo fez o gato levitar e aproximou-se de Sirius. Ele era inocente. ELE ERA INOCENTE! Ajudou o amigo a se levantar e, no instante seguinte, estavam abraçados, como irmãos que eram.



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Lentamente ele se esgueirou pelos jardins bem cuidados da rua dos Alfeneiros. Só tinha estado uma vez naquele lugar, quando ajudara Tiago a “raptar” Lílian da casa onde a ruivinha morava com a irmã, pouco tempo depois de terem se formado em Hogwarts.

Não tinha como ter certeza absoluta de que, após tantos anos, Petúnia ainda morasse ali e, com ela, Harry. Mas era sua única pista do paradeiro do afilhado e gostaria de, pelo menos por alguns instantes, ver como o garoto estava.

Um barulho de algo sendo empurrado chamou a atenção dele. Silenciosamente, o cão negro procurou as sombras, enquanto uma silhueta a sua frente abria um malão, tirando dele uma varinha.

'- Lumus.

Almofadinhas estreitou os olhos ao ver o garoto que estava à sua frente. Por alguns instantes, ele se sentiu tentado a voltar à forma humana e perguntar a Tiago o que ele estava fazendo ali.

Mas os olhos verdes do garoto, que brilharam confusos por alguns instantes antes dele cair por cima do malão, rapidamente fizeram Sirius perceber que não estava diante do amigo, mas do filho dele.

Almofadinhas voltou a avançar pelo caminho de seixos, disposto a se revelar a Harry, a contar ao garoto tudo, a falar dos marotos, de Lílian, de...

Antes que ele pudesse se revelar à escassa luz do único poste aceso, um barulho alto ecoou na rua vazia. Almofadinhas assistiu a Harry embarcar no Nôitibus Andante, sentindo um estranho aperto no peito.

Muito em breve, eles voltariam a se encontrar. Em Hogwarts, onde o traidor esperava também por eles.


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01º de novembro de 1981

A noite estava escura como breu; não havia sequer uma estrela no firmamento. Talvez os deuses soubessem o drama que se desenrolava naquele lugarejo escondido, ou talvez fosse só uma coincidência. Fosse como fosse, havia uma tristeza mal disfarçada no ar. A magia chorava a perda de sua guardiã.

Mas Sirius ainda não sabia de nada disso quando pousou a moto no caminho florido apesar da proximidade do inverno, obra da magia de Lílian. Podia sentir, mas não conseguia acreditar. Mesmo diante das ruínas do casarão que abrigara seus amigos, ele não podia, ou não queria entender o que acontecera.

Uma silhueta gigantesca levantou-se das ruínas com um pequeno embrulho que gemia baixinho em seus braços. Hagrid. Sirius imediatamente desmontou da moto e caminhou até o homem, tendo os olhos levemente embaçados. As poucas luzes acesas da rua atrapalhavam sua visão.

'- Hagrid, onde eles estão? Onde eles...

O gigante apenas abaixou a cabeça como resposta e Sirius sentiu o desespero crescer em seu peito. Era mentira. Tinha que ser mentira. Um pesadelo... Dali a pouco ele ia acordar e ia encontrar Tiago deitado na cama ao lado, roncando, enquanto Remo acabava de se arrumar e Pedro tentava se erguer depois de cair da cama pela décima vez. E depois eles desceriam para o salão principal e Lílian estaria lá para gritar com Tiago, e Camille usaria um dos objetos de seu pai para afastá-lo. Susan estaria com seus recortes, Emelina iria para a mesa da Corvinal tomar café com Fábio... Tudo estaria bem, na segurança de Hogwarts, sob as vistas de Dumbledore.

'- Sirius, o que você está sentindo? Está passando mal? - Hagrid segurou com um único braço o pequeno e com o outro apoiou Sirius, fazendo o rapaz se sentar - Eu sinto muito. Tiago e Lílian, eles não... Eles não sobreviveram. Mas Harry...

Pálido e tremendo, Sirius finalmente se deu conta do embrulho que Hagrid segurava com cuidado.

'- Harry? Harry está vivo? Mas... Mas e Voldemort? - ele se levantou, sem conseguir se conter.

Hagrid tremeu involuntariamente a menção do nome tão temido, mas encarou os olhos azuis do rapaz com alegria.

'- Ele se foi. Aquele-que-não-deve-ser-nomeado se foi. Graças ao pequeno Harry. Devia se orgulhar do seu afilhado, Sirius. Ele vai ser famoso. Vai ficar conhecido como “o-menino-que-sobreviveu”. Graças a ele, podemos de novo respirar em paz.

Respirar em paz. Ele nunca poderia respirar em paz sabendo que errara com Remo e entregara os melhores amigos nas mãos do mais temido bruxo de todos os tempos. Mas ainda havia Harry. O menino que sobreviveu. O filho de seu melhor amigo. De seu irmão...

'- Me dá o Harry, Hagrid. Sou o padrinho dele, vou cuidar dele.

Hagrid meneou a cabeça tristemente.

'- Não, Sirius. Dumbledore ordenou que eu levasse Harry para os tios trouxas. Ele quer que a irmã de Lílian cuide dele.

O rapaz quase riu. Harry Potter sendo criado por trouxas? E, pior ainda, pela irmã de Lílian, a que os chamava de aberração, anormais e outras coisas do tipo? Mas ele não pode rir. Subitamente se lembrara de que ninguém sabia que Pedro fora o fiel de segredo dos Potter. Dumbledore achava que ele, Sirius, é que tivera esse encargo. E agora, eles iam achar que ele era um traidor.

E porque não? Um Black, apenas mais um maldito Black. Todos iriam dizer que, assim como a prima Bellatrix, ele era um dos comensais mais fiéis ao Lorde das Trevas. Um seguidor de Voldemort.

'- Leve a moto, Hagrid.

O homem olhou-o curioso.

'- Mas, e você?

'- Não vou precisar mais dela. - Hagrid assentiu e caminhou para a moto, antes, no entanto, que pudesse montar, Sirius correu até ele, segurando-o pelo braço - Deixa eu ver meu afilhado. Uma última vez.

Hagrid assentiu, tirando a manta do rosto do pequeno garoto. Havia um corte na testa dele, mas Harry observou o padrinho com seus grandes olhos verdes, sem lágrimas. Sirius limpou o sangue que se coagulara ao redor do corte e beijou de leve a cabeça do menino, voltando a colocar a manta sobre ele.

Afastando-se, Sirius viu o gigante montar a moto, ligando-a e logo desaparecendo na noite escura. Uma nuvem moveu-se vagarosamente, finalmente revelando a lua cheia em todo o seu esplendor. Em algum lugar, Remo Lupin estava sozinho, enfrentando mais uma de suas dolorosas transformações.

Sirius voltou para as ruínas, revolvendo-as até achar os corpos. Primeiro foi Lílian, facilmente encontrada pelos cabelos flamejantes. Se não fosse pela palidez e por um corte na maçã do rosto, ele poderia dizer que a amiga dormia tranqüilamente. Pouco depois, sob uma viga que sustentara quase todo o teto que desabara, ele encontrou Tiago. As lentes dos óculos estavam trincadas e ele conservava no rosto um semblante de desafio e um meio sorriso. No que Tiago pensara antes de morrer? Saberia que Voldemort encontraria seu fim no pequeno Harry?

Com a varinha, ele flutuou o corpo do amigo para junto do de Lílian, consertando os óculos dele e cicatrizando o arranhão dela. Ali estavam eles como foram em vida; juntos. Sirius sentiu um soluço escapar da garganta, mas segurou-se para não chorar. Ele ainda não podia chorar seus mortos. Não enquanto Pedro Pettigrew estivesse em liberdade.

Ele ajoelhou-se ao lado da ruiva e tirou a corrente que ainda pendia em seu pescoço. A pedra branca do pingente pareceu brilhar por alguns instantes, mas foi rápido demais para que ele pudesse ter certeza. Guardando o cordão no bolso, ele começou a caminhar até os limites da cidade, onde poderia aparatar.

Seu faro nunca falhara. Sabia onde encontrar o maldito traidor. Jurara nunca mais pôr os pés naquela rua, mas era preciso. Por uma última vez, ele precisava voltar ao Largo Grimmauld, número doze. Ele aparatou e, exatamente como previra, encontrou Pedro diante do casarão que pertencia aos Black.

Segurando a varinha com força, ele plantou-se diante do traidor.

'- Ora, ora, ora... Se não é meu velho e querido amigo Rabicho? E então, rato? Satisfeito? SATISFEITO, MALDITO!

Pessoas pararam para observar a discussão. Os olhos de Sirius se estreitaram ao ver o supremo esforço que Pedro fazia para vencer o medo e falar. A face vermelha e confusa dele contrastava com os olhinhos rápidos, que iam da multidão que começava a se formar para o moreno.

'- Assassino.

Sirius sentiu um choque percorrer seu corpo ao ouvir essa palavra saída da boca de Pedro. Mas em vez de retrucar, o moreno só conseguiu rir, uma risada sem alegria, fria, quase mecânica.

'- Talvez eu seja, Rabicho. Por ter confiado em VOCÊ!

Pedro deu um meio sorriso misturado com soluços fingidos. O amigo tinha caído em sua armadilha.

'- Lílian e Tiago, Sirius! Como é que você pôde?

Sirius fechou os olhos por alguns instantes, estendendo a varinha para frente. Ele era inocente. Mas também era culpado. Deixara de acreditar em Remo, que nunca fizera nada que pudesse justificar sua desconfiança. Quando os reabriu, as orbes azuis se paralisaram nos lábios de Rabicho um segundo antes de uma enorme explosão ocorrer.

Ele viu a forma humana de Pedro através da fumaça, encolhendo até tornar-se um ridículo ratinho inofensivo, que logo correu dali. A rua estava quase que completamente destruída, havia corpos ensangüentados no chão, gritos desencontrados... Mas nada daquilo importava. Uma garoa fina começou a cair enquanto Sirius se deixava cair no chão, rindo como louco.

E foi dessa maneira que o Esquadrão de Execução das Leis da Magia o encontrou, diante de uma cratera e da capa de bruxo de Pedro Pettigrew, completamente ensangüentada.


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- Está bem então. Conte a eles o que quiser. Mas faça isso depressa, Remo, quero cometer o crime pelo qual fui preso.



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Chovia forte naquele dia, mas, mesmo assim, o campo de quadribol estava lotado. Lentamente, ele se aproximou, observando com os olhos caninos os pequenos pontos vermelhos que sobrevoavam o espaço acima dele.

Com cuidado, ele se esgueirou pelas arquibancadas, seu olhar fixo no céu. Finalmente chegou à última fila de cadeiras vazias. Um relâmpago soou ao mesmo tempo em que um raio forte caía um pouco atrás dele. Almofadinhas, entretanto, não se mexeu.

Havia um par de olhos muito verdes sobre ele. Por alguns instantes, Harry o encarou nos olhos e Sirius sentiu um aperto no peito. Sua respiração acelerou-se no instante em que Harry desviou o olhar e guinou a vassoura para cima.

“Traidor...”

O cachorro sentiu um calafrio na espinha e voltou-se para fora do campo. Algo muito errado estava acontecendo...

“Você está cego, Sirius! Está deixando de confiar em alguém que esteve ao seu lado mesmo nas maiores burradas... Lamenta a covardia do seu irmão pelos motivos errados, como se Régulo devesse ter ficado ao lado dos comensais até o fim para provar sua coragem... E chora por uma mulher que nunca, NUNCA te amou! Você está criando problemas atrás de problemas, e na maior parte, são apenas problemas imaginários. Pare de agir como uma criança!”

Ele deixou um ganido de dor escapar enquanto pulava das arquibancadas para o chão. Os dementadores... Os dementadores tinham invadido Hogwarts...

“Ela não pode ter morrido... Por favor, me diga que isso é só mais um estúpido pesadelo...”

Rapidamente escapou do campo de quadribol, sem se importar com o enorme alarido que subia das arquibancadas. Entrou na Floresta Proibida correndo, sem prestar atenção por onde ia, sem se importar com os galhos baixos que o arranhavam à sua passagem.

Finalmente, em uma clareira próxima a um lago, ele se deixou cair. Não queria se lembrar, não queria ter de lembrar, não queria...

Aos poucos, ele foi se acalmando. Não podia se desesperar. Não agora, que chegara tão perto de seus objetivos. Tinha o meio-amasso ajudando-o... Pedro em breve pagaria.

Respirando fundo, ele voltou a se transformar em humano, deixando a água lavar seu corpo. Aparentemente, aquele era o ano dos grandes reencontros... Vira Remo no campo quando estava saindo. Ele estava lá também, entre os professores.

Existiria alguma possibilidade de eles voltarem a se ver? Ele esperava que não. Preferia acabar de uma ver por todas com Pedro, sem ter que encarar seus velhos fantasmas.


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15 de novembro de 1981

'- Eu, Bartolomeu Crouch, juiz do Supremo Tribunal Bruxo, diante de todas as provas apresentadas e do testemunho de Alvo Dumbledore, diretor da escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, declaro Sirius Black culpado por traição ao Ministério e à sociedade bruxa, assim como pelo assassinato de treze trouxas, de Pedro Pettigrew e de Lílian e Tiago Potter.

Sirius permaneceu impassível enquanto ouvia sua sentença. Ninguém acreditaria na verdade, não havia porque tentar de novo... Pedro fizera um bom trabalho. Estava vivo... e livre. O mesmo não se podia dizer dele próprio. Perdera a liberdade. Estava vivo, mas que espécie de vida teria em Azkaban? Seria melhor que o matassem de uma vez.

'- Como tal, eu o condeno à prisão perpétua em Azkaban, sem direito a apelação. Sessão encerrada.

O moreno quase riu. Aquilo não era um julgamento, como ele poderia apelar? E a quem poderia apelar? As únicas pessoas que acreditariam nele estavam mortas. E, naquele exato instante, os corpos de ambos estavam sendo enterrados.

Ele foi levado de volta à cela que ocupava desde o dia anterior. Na manhã seguinte, ele seria levado para Azkaban. Sirius fechou os olhos, lembrando-se da sensação que tivera da primeira vez que vira um dementador. Não era uma lembrança muito boa... Não quando envolvia sua doce e querida mãezinha...

As horas se passaram sem que ele se desse conta disso. A cela voltou a se abrir e Sirius se perguntou se já vinham levá-lo. Mas, em vez de guardas, quem entrou na cela foi um rapaz de cabelos e olhos claros, alguém que ele conhecia muito bem. Remo Lupin.

Os dois se encararam estranhamente. Por alguns instantes, Sirius pensou em contar toda a verdade para o amigo. Mas logo descartou essa idéia. Ele não acreditara nem em Tiago quando esse afirmara que Remo não poderia ser um traidor, porque Remo agora acreditaria nele? Que direito ele tinha de afirmar que era inocente para aquele que julgara culpado por tanto tempo?

Além disso, Sirius não tinha muita certeza se era inocente. Por sua estupidez, entregara os amigos para Pedro. Ele deveria ter aceitado ser o fiel. Se fosse pego, mesmo a morte não o impediria de continuar guardando o segredo. Porque fora tão impulsivo? Pedro jamais suportaria as torturas que poderiam lhe infligir... Mas, isso não teria muita importância, afinal, Rabicho era um traidor desde muito antes de ter os amigos nas mãos. Graças a ele, Voldemort soubera da Ordem e de seus membros.

'- Tiago e Lílian foram enterrados hoje à tarde.

A voz do outro saiu rouca, muito diferente do tom sempre calmo de Aluado. Sirius virou-se para o pequeno quadrado que pretensamente chamavam de janela. Começava a escurecer. O silêncio se instalou entre eles por alguns instantes e Sirius observou o amigo mergulhar em lembranças. Estaria pensando na traição dele?

'- Como está Harry? - Sirius perguntou sem se voltar para ele.

Respirando fundo, Remo encostou-se à parede.

'- Dumbledore disse que ele está bem. Está com os tios.

Uma risada que mais se assemelhava a um latido saiu da garganta de Sirius.

'- Então ele também vai ter sua própria prisão... A irmã de Lílian nunca foi um exemplo de tolerância. - Sirius tirou algo do bolso, erguendo a mão para Remo - Pode guardar isso? Acho que vai estar mais seguro com você.

Remo estreitou os olhos, mas aceitou a cordão.

'- Há mais alguma coisa que você queira? - Remo perguntou, fazendo força para a voz sair.

Sirius refletiu por alguns instantes.

'- Há uma caixinha... Está no meu quarto. Um gravador. É a única coisa que quero levar comigo.

Remo assentiu. Mais um pesado silêncio instalou-se entre eles. Não havia nada mais a ser dito. Sirius voltou a observar o céu e Remo virou-se para ir embora. Sirius mordeu os lábios. Não podia ser daquele jeito. Não podiam se despedir assim...

'- Eu sinto muito... – ele murmurou tristemente antes de ouvir a cela se fechar e os passos de Remo afastarem-se apressadamente.


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- Isto não é um rato. – Sirius disse com a voz rouca.

- Que é que você está dizendo... É claro que é um rato...

- Não, não é... – Remo confirmou as palavras de Sirius – É um bruxo.

- Um animago. – continuou o outro bruxo – Que atende pelo nome de Pedro Pettigrew.



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Rabicho escapou rapidamente através da grama escura. Podia ouvir o próprio coração bater acelerado enquanto ele corria como louco, observando a luz cheia que brilhava pálida sobre sua cabeça.

Uivos de dor vieram de longe e ele imprimiu ainda mais velocidade às pequenas patinhas. Tinha que escapar, tinha que conseguir... Não desperdiçara doze anos de sua vida para ser preso, não podia se deixar pegar. Não podia...

Remo, Sirius... Eles jamais teriam compaixão. Não haveria clemência para ele se fosse preso. Nenhuma misericórdia.

A lembrança dolorosa da face de Harry Potter, tão extremamente parecido com o pai, pesou em sua consciência. Estava em dívida para com o filho de Tiago.

Rapidamente sumiu pela Floresta, pela primeira vez em sua vida sem se importar com os barulhos e os cheiros que chegavam a ele, sem se importar com o instinto que gritava perigo naquela direção.

Mais do que nunca, agora ele tinha que encontrar seu Lorde. Só estaria à salvo quando estivesse junto Dele. E, se fosse preciso para escapar com vida, ele entregaria até mesmo o último dos Potter. O único que tivera piedade...


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- Severo, você está cometendo um engano. – Remo respondeu com urgência – Você não sabe de tudo, posso explicar, Sirius não está aqui para matar Harry...

- Mais dois para Azkaban esta noite. Vou ficar curioso para saber como é que Dumbledore vai encarar isso... Ele estava convencido de que você era inofensivo, sabe, Lupin... Um lobisomem manso...

- Seu tolo... Será que um ressentimento de criança é suficiente para mandar um homem inocente de volta a Azkaban?



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Ele observou a caixa em cima da cama por alguns instantes. Aquilo tudo não podia ser verdade. Não podia...

Entretanto... Entretanto, tinha que acreditar em Dumbledore. O velho diretor não poderia ter sido enganado com tanta facilidade. Se ele dizia que Pettigrew estava vivo e Black não era o traidor...

Mordendo os lábios para não perder o controle sobre si mesmo, Severo deixou-se cair na cama. Aquela história, de certa maneira, encaixava-se com algumas coisas estranhas que ouvira quando era um comensal... E que ele não entendera na época.

Ainda assim, ele não queria que o maldito Black fosse inocentado. Odiava o maroto com todas as forças, assim como detestava o lobisomem.

Ao lembrar-se do maroto Lupin, ele novamente sentiu-se tentado a socar alguma coisa e assim desafogar toda a raiva que sentia. Contra os dois marotos e contra ele mesmo. Ainda podia ver a face triste do lobisomem quando ele deixara “escapar” a real condição do professor de Defesa Contra as Artes das Trevas.

“Interessante notar que nosso professor de DCAT poderia servir de cobaia para seus próprios alunos se fosse um pouco mais manso...”

As palavras, cobertas de sarcasmo, voltaram a sua mente. Àquela altura, Lupin estava já se preparando para deixar o castelo.

Respirando fundo, o bruxo se levantou, tomando a caixa que continha os pertences de Tiago Potter que ele encontrara há muitos anos. Estava na hora de devolver aquelas tralhas...


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- Você não entende! – Pedro choramingou – Ele teria me matado, Sirius!

- ENTÃO VOCÊ DEVIA TER MORRIDO! – rugiu Sirius – MORRER EM VEZ DE TRAIR SEUS AMIGOS, COMO TERÍAMOS FEITO POR VOCÊ!



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Remo observou com estranheza os pertences empilhados na carruagem. Não se lembrava daquela caixa de papelão amassada. O que poderia ser aquilo?

Com cuidado, ele puxou a caixa para seu colo. E sentiu o coração acelerar ao ver o conteúdo da mesma.

Como aquilo fora parar ali? Os diários dos marotos, as fotos deles, as invenções nada inocentes de Pontas e Almofadinhas... Quem teria deixado aquele pequeno tesouro com ele?

'- Dumbledore... – Remo murmurou para si mesmo – Dumbledore deve ter deixado isso aqui. Mas porque ele não entregou a Harry?

Meneou a cabeça. Talvez o velho diretor pensasse que ele deveria guardar aquilo para o jovem... Proteger aquelas lembranças até que Harry tivesse condições de suportar todo aquele legado...

Sorrindo, ele se deixou perder em recordações. Apesar de tudo o que acontecera, estava mais feliz do que estivera em muito tempo... Sirius ainda era um fugitivo... Mas estava livre. E era inocente. Harry crescia, cada vez mais parecido com o pai e rodeado de amigos tão leais quanto os marotos tinham sido um dia.

Não importava o quanto as sombras pudessem crescer. O quão próximo Voldemort poderia estar... Os marotos estavam de volta... Para sempre...


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- Você acha que os mortos que amamos realmente nos deixam? Você acha que não nos lembramos deles ainda mais claramente em momentos de grande dificuldades? O seu pai vive em você, Harry, e se revela mais claramente quando você precisa dele. De que outra forma você poderia produzir aquele Patrono? Pontas reapareceu ontem à noite.



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Sirius observou a coruja sumir no horizonte, enquanto acariciava a cabeça de Bicuço. Fechando os olhos com um pequeno sorriso, ele se deixou envolver pelas lembranças.

Uma brisa suave soprou naquele fim de tarde. O sol se punha ao longe, na linha do mar, que brilhava com as últimas luzes do dia. Ele respirou fundo o ar salgado, lembrando-se dos amigos.

Estava livre. E as pessoas que ele mais desejava que acreditassem nele agora o consideravam inocente. Há muito não se sentia tão feliz.

Por breves instantes, ele teve a impressão de que não estava sozinho. Havia uma presença confortadora junto dele. Reabrindo os olhos, Sirius suspirou.

'- É hora de começar tudo de novo. – ele sorriu, tirando o velho e conhecido gravador do bolso – Bem-vindo de volta à vida, Sirius Black.

E montando Bicuço novamente, ele subiu nos ares, sendo rapidamente engolido pela noite que acabava de cobrir o mundo.


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É isso aí, pessoal... Aqui está o último capítulo da saga. A despedida definitiva... Mais de um ano depois de a última guardiã começar a ser publicada, finalmente, o fim...

Até lá, fiquem se perguntando o que eu ainda tenho na manga para vocês... Hohohohohohohoho (risadinha maligna). Agradecimentos, dedicatórias, beijos para mamãe, papai e para a Xuxa, tudo junto com o epílogo. Tem prova amanhã... (malditos sejam os professores malucos).

Beijos,

Silverghost.

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