A decisão de Lílian



Lílian observou o chalé com um sorriso, enquanto tirava a luva para abrir a porta. Lá dentro, tudo estava em perfeita ordem, apenas um pouco de poeira, logo denunciada pela alergia da ruiva, mostrava que não havia ninguém ali.

Ela caminhou pela casa, tirando o cachecol e o casaco. Uma cozinha, uma sala, um quarto com banheiro. Pequeno, mas prático. A ruiva retirou a varinha do bolso e apontou para a lareira.

- Incendio!

Logo um calor gostoso preencheu a casa. Ela voltou até o quarto, retirando do bolso três pequeninas malas que, com outro aceno da varinha, voltaram ao seu tamanho natural. Em meia hora ela guardou seu velho violão, as roupas e os livros que trouxera. Agora só precisava de uma faxina para completar seu trabalho.

Enquanto assoviava uma canção, ela coordenava a vassoura, que varria sozinha, e um pano, que voava para todos os lados, tirando o pó. Não demorou muito para que tudo estivesse limpo. Depois de guardar a vassoura, ela seguiu resoluta para a cozinha.

Os armários estavam cheios, como Dumbledore dissera, afinal, eles não a tinham mandado ali para morrer de fome. Com um pote de biscoitos e um pouco de chá, ela voltou para a sala, finalmente descansando junto à lareira.

"- E Tiago?" - a voz do diretor soou em seus ouvidos.

- Sim, Lílian, e Tiago? - ela perguntou para si mesma.

Conhecendo o namorado como ela conhecia, podia dizer que ele definitivamente não se afastaria se soubesse o que acontecera. Ele, com sua estúpida coragem e teimosia se arriscaria ao lado dela. Apenas um toque, mesmo de leve e...

Balançando a cabeça, ela tentou se livrar desses pensamentos. Era melhor esquecer Tiago. Era isso... Talvez fosse melhor que nunca voltassem a se ver. Essa resolução, mais do que tudo, a incomodou. Não sentir o toque de Tiago já era ruim por si só, mas ser privada do som do riso dele, da voz, do olhar...

- É melhor que seja assim. - ela disse em voz alta, tentando se convencer.

Mas, e se por alguma armadilha do destino, eles se reencontrassem? Não podia dar a ele esperança, mesmo que a esperança fosse agora a única coisa que a sustentava. Talvez, algum dia, pudesse voltar... Mas não podia fazê-lo esperar.

Se o reencontrasse, teria que afastá-lo. E só havia uma maneira de afstá-lo. Ela teria que acertar onde mais doía em Tiago Potter: o orgulho.



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Sirius ouvia da sala o barulho incessante da cozinha, enquanto uma música istrumental enchia o pequeno apartamento. Susan estava preparando o almoço, que, pelo cheiro, era certamente algo muito bom. Ela passou pela porta da cozinha, metida num velho avental e dançando alegremente com uma vasilha nas mãos. O rapaz riu de leve, embra sua vontade fosse a de gargalhar. Só que não podia se dar a esse luxo, ou sentiria as costelas se mexendo de novo...

- Ei, Su, o que você tá fazendo aí?

- Lasanha. Enquanto você estiver aqui, só vai comer comida italiana.

- Isso é o paraíso... - ele falou marotamente, enquanto a garota reaparecia na porta da cozinha.

- O que disse?

- Nada não... - o moreno respondeu, voltando a se deitar no sofá - Ei, Su, você já teve alguma notícia da Lílian?

- Não. Eu telefonei pra casa dela, mas D. Míriam disse que ela ainda não apareceu. Então o próprio Tiago atendeu e disse que ela está numa missão para a Ordem. O pobrezinho está desesperado...

- Você está sabendo da Ordem? - Sirius perguntou curioso.

- A Lily me convidou. Falando nisso, eu estive com Dumbledore antes do ataque com vocês. Ele disse que logo teríamos reunião. Mais duas casas de famílias bruxas foram atacadas esse mês.

- Como você sabe disso? Eu etou no quartel-general dos aurores e só ouvi alguns boatos sobre isso.

- Nem sempre trabalhar na parte burocrática é ruim, Sirius. É no meu setor que estão censurando as reportagens de jornais e revistas sobre tudo o que está acontecendo. Como não aconteceu nenhuma morte, dessa vez o ministério conseguiu abafar. Eles ainda não perceberam que esconder a situação só vai piorar as coisas.

Sirius assentiu e ela voltou a cozinha. O disco na vitrola terminou e um pesado silêncio caiu sobre a casa. Fazia quase uma semana que tivera alta no St. Mungus e viera para a casa de Susan. Ia sentir falta da presença da amiga quando voltasse para sua casa, de ser tão mimado e paparicado. Será que se casasse com Camille, sua vida seria assim também?

Como se adivinhando os pensamentos do rapaz, Susan voltou à porta com uma vasilha cheia de algo branco e fofo como neve.

- E como vai com a Dearborn? - ela perguntou enquanto batia o creme.

- Não vai. A Camille está de casamento marcado pra logo. Eu ainda estou pensando em fazer uma última tentativa, mas ainda não tenho certeza.

- Escreva uma carta pra ela. - Susan sugeriu com um sorriso triste, sem olhar pra ele.

- É, talvez seja uma boa idéia. Mas o que é isso que você está fazendo aí? - ele perguntou curioso.

- É pra sobremesa. Já comeu ambrosia? - ela perguntou.

- Não. Mas tenho certeza que vou adorar experimentar.

Ela sorriu novamente, voltando para a cozinha enquanto ele cruzava os braços sob a cabeça. Ê, vida boa...



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Tiago observou pelas janelas do expresso o vilarejo se aproximar. Finalmente chegara a Hogsmeade. Passara uma semana preso em casa pelos cuidados da mãe, descobrindo que as roupas e a grande maioria dos pertences pessoais de Lílian tinha desaparecido. Mandara corujas e mais corujas na esperança de receber alguma esposta da namorada, mas elas sempre voltavam sem ter feito sua entrega.

Assim, só havia uma pessoa a quem recorrer. Se Lílian estava numa missão para a Ordem, Dumbledore certamente sabia onde ela estava. Tiago estava mais que preocupado com a namorada, pois a sensação ruim que o perseguia ultimamente estava de volta com força total. E ele sabia que isso tinha a ver com Lílian.

Então, ali estava ele, descendo o trem rapidamente, visto que ainda estava fraco para aparatar. A "surra" que levara realmente não lhe fizera bem. Ele observou o vilarejo com saudade. Hogsmeade estava exatamente como ele conhecera. Parando diante da Casa dos Gritos, ele suspirou. Tantas lembranças...

- Tiago? O que está fazendo aqui, garotão?

O moreno sentiu-se levantado do chão por um forte abraço enquanto Hagrid assoava o nariz. Não demorou muito para perceber que o guarda-caça tinha bebido um pouco além da conta.

- Ahn... Olá, Hagrid. Porque não está em Hogwarts?

- Aproveitando um pouco a noite. Está bonita, não?

Tiago observou o céu estrelado. Sim, estava uma bela noite. Se Lily estivesse ali, eles poderiam se divertir contando as infinitas estrelas... Tiago meneou a cabeça. Porque pensar na ruiva doía tanto? O que tinha acontecido? De algum ponto distante veio a voz de Hagrid.

- E você, o que faz aqui sozinho?

- Preciso ver Dumbledore. - ele respondeu rápido - Pode me dar uma carona, Hagrid?

O guarda-caça sorriu, apontando para uma carruagem sem cavalos parada ali perto.

- Pode subir, Tiago.

O moreno assentiu. Meia hora depois estavam diante do castelo. Hagrid se despediu e Tiago caminhou pelos corredores até a gárgula que guardava a entrada do escritório de Dumbledore.

- E agora, qual será a senha?

- Besouros recheados. - soou a voz do diretor logo atrás dele.

Tiago virou-se, encontrando Dumbledore sorrindo. A passagem se abriu e ele indicou com a mão o caminho. Pouco depois estavam no escritório do professor, em silêncio. O auror observou a fênix, sentindo-se um pouco idiota. Talvez estivesse fazendo "tempestade em copo d'água" e, a essa altura, Lily já tivesse até voltado da missão e o estivesse esperando em casa.

- Ela não está.

- Como? - Tiago perguntou, olhando para o pensativo diretor.

- Você disse que talvez Lílian esteja em casa. Ela não está.

- Então onde ela... Afinal, o que está acontecendo?

- Eu não posso dizer. Prometi a ela.

- Ela está em alguma missão perigosa, é isso? - Tiago perguntou ansioso.

- Não. Ela simplesmente precisa de um tempo para pensar.

- Pensar? O que aconteceu?

- Eu já disse que não posso contar, Tiago. - Dumbledore disse sorrindo enquanto abria a gaveta e tirava dela uma pequenina chave - Mas eu não prometi nada sobre levá-lo até ela...



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Estava novamente sonhando. Porque não podia simplesmente dormir em paz, sem ter que rever seus piores pesadelos toda vez que deitava a cabeça no travesseiro?

Bem, pelo menos parecia que estava tudo em paz ali. O chalé estava silencioso e, junto Pà lareira, ela estava sentada ao lado de um rapaz. Por ujm instante, Lílian achou que aquele era Tiago. Mas não. Aquele era Gideão Prewett.

Estavam muito próximos... Se Tiago visse aquilo, certamente teria uma crise de ciúmes homérica. A porta do chalé se abriu. E depois, tudo voltou a escuridão.



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Gideão acabou de guardar as coisas que havia trazido na cozinha e foi para a sala, onde Lílian observava o fogo, sentada junto a lareira. Ele colocou mais lenha para avivar as chamas e sentou-se ao lado dela.

- Lily?

Ela fixou o olhar no amigo, notando quão próximos eles estavam. Mas não se mexeu. A ruiva sentiu a mão dele pousar sobre a sua, que estava enluvada.

- Gideão... Vocês está tentando suicídio?

- Sabe, Lily, eu não me importaria de morrer se pudesse, ao menos uma vez...

O rosto dele estava muito próximo e Lílian se deixou perder nos olhos de Gideão, tão extremamente parecidos com os de Tiago.

A porta do chalé se abriu de mansinho e Lílian se virou, sem se afastar de Gideão. Já sabia quem estava ali. Ela vira em seu sonho. Afinal entendera o que ele queria dizer. Havia uma maneira de afastar o namorado de uma vez por todas. Porque, parado no umbral da porta, estava Tiago.

O moreno arqueou as sobrancelhas ao ver quão próximos estavam os dois. Mas ele segurou-se. Não era hora de fazer uma cena ou despertaria a fúria de Lílian. Ele observou Gideão levantar-se, recolhendo seu casaco que estava sobre a poltrona. Ele voltou-se para Lílian, que levantava agora, com o olhar fixo ao de Tiago.

- Lily, eu já vou indo. se precisar de alguma coisa, me avise.

Ela assentiu e Gideão desapareceu pela porta que Tiago deixara aberta. O moreno tirou os òculos embaçados para limpar na blusa, sorrindo para Lílian. Agora que estava diante da ruiva, toda aquela sensação ruim que o angustiava desaparecera. Ele aproximou-se dela, estendendo a mão.

- Vamos para casa, Lily. Acho que temos muito o que conversar.

Lílian percebeu que ele estava com ciúmes, embora tentasse esconder isso por trás do sorriso calmo. Ótimo, assim seria tudo bem mais fácil. Ela deu um passo para trás e Tiago sentiu-se brutalmente empurrado por uma mão invisível, batendo com as costas na parede. Ela o observou por alguns instantes, os olhos extremamente vermelhos, antes de abaixar a cabeça.

- Eu não vou voltar com você para casa, Tiago Potter. Nunca mais.

Ele a observou, obviamente assustado.

- O que está acontecendo, Lily? Que raios de brincadeira é essa? E o que aquele idiota estava fazendo aqui?

- Não é brincadeira. - ela levantou a cabeça, os traços de vermelhidão nos olhos tinham sumido completamente - Apenas vá embora, Potter.

- Eu não vou embora enquanto você não explicar o que está acontecendo. - ele respondeu, levantando-se.

- Eu tentei fazer as coisas mais fáceis pra você.

- Pois as faça difícil. Eu não saio daqui até que você me dê um argumento convincente para isso.

Lílian sorriu ironicamente.

- Você quer saber o que Gideão estava fazendo aqui? Bem, eu vou dizer a você. Ele passou a noite aqui. E quer saber o que mais? Eu usei você, Potter. Usei para poder sair de casa, para me proteger, enfim... pra uma série de coisas. Por sorte, eu percebi que não preciso de você. - ela respirou fundo - Eu não gosto de perdedores, Potter.

- É mentira! - ele gritou, caminhando resoluto até ela. Mas paralisou-se no caminho, bem diante da ruiva.

- Não, Potter, não é mentira.

- Você está mentindo. Você me ama! - o rapaz gritou, fazendo um enorme esforço tentando se livrar da magia dela.

- Eu não te amo. - ela disse com a voz calculadamente fria, os olhos abaixados - Se algum dia eu te amei, isso não existe mais.

- Você está mentindo... - ele disse quase num sussurro, os olhos avermelhados.

- Você não tem orgulho, seu idiota? Eu te traí e ainda assim você corre atrás de mim? Eu não menti, Potter. - ela disse com a voz carregada de desprezo, tentado por tudo segurar-se para não chorar - Eu não te amo mais. Agora vá embora.

- Lily...

- VÁ EMBORA!

Ele a observou atentamente com os olhos repletos de mágoa. Finalmente a magia dela cessou. Ele estava livre. Ele deu às costas a Lílian, colocando sobre a mesa o cordão com o pingente de Hades, abrindo a porta por onde um vento frio entrou.

- Até algum dia, Lílian. - ele disse em voz baixa.

- Adeus, Potter.

Ele saiu do chalé, aparatando depois de se distanciar da construção. Lá dentro, Lílian caminhou até a mesa, pegando o cordão. Ainda estava quente. Ela escorregou até o chão, finalmente deixando as lágrimas terem livre curso. Estava tudo acabado agora.

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