A tristeza de Remo



Remo dobrou a carta recém-lida, guardando-a num dos vários bolsos do casaco, dando algumas migalhas de biscoito para a pequena coruja que fizera a entrega. Ela bicou o dedo dele com leveza, como se pedindo uma resposta.

- Não, Hórus, eu não tenho nada para mandar para sua dona dessa vez também.

A coruja o olhou com censura antes de empoleirar-se no canto que o rapaz arrumara para que ela descansasse um pouco da longa viagem. Afinal, da Inglaterra para a China havia uma boa distância.

Da pequena janela do cubículo onde estava instalado, Remo observou o céu estrelado. Há duas semanas estava ali, na pista de um Ch'Iang Shih, uma espécie de vampiro típico do país. Já passara por quase toda a Europa e agora estava ali. Quem diria que ele chegaria tão longe apesar de todas as dificuldades...

Ele olhou mais uma vez para a coruja azulada antes de se sentar diante da carcomida lareira, tirando a carta do bolso mais uma vez. Sua "aparição" escrevera de novo. E, de novo, não teria resposta. Não podia alimentar as esperanças da garota sem nome com quem sonhava desde que saíra da Inglaterra. Fechando os olhos, ele jogou a carta ao fogo. Depois, vencido pelo cansaço, deitou-se no pobre sofá, logo mergulhando num sono profundo.



--------------------------------------------------------------------------------


- Nenhuma resposta, Hórus? - a morena perguntou tristemente.

A coruja piou baixinho e Tonks deixou escapar um suspiro resignado enquanto levava o animal de volta para a janela, para que pudesse voar ao corujal.

Quando Hórus desapareceu em meio à noite, a garota voltou-se para o espelho no dormitório vazio. Se a visse agora, o ex-monitor certamente a reconheceria. Exceto pelo cabelo, um pouco maior do que usara para se encontrar com ele, aquela era exatamente a imagem da garota que agarrara Remo Lupin na torre de Astronomia.

Ela se sentou em sua cama antes de se deixar cair, olhando desolada para o teto. Quase três anos... Três anos em que só tinha notícias pelas raras cartas que ele respondia. Maldita diferença de idade. Ele já tinha vinte e ela, só catorze. Seis anos a separavam de estar junto do rapaz. Só seis anos...

- Eu vou acabar enlouquecendo se continuar me torturando por isso. Ele não responde minhas cartas, quando dá sinal de vida é só para pedir que eu me acalme nas toneladas de papel que mando ou vou acabar matando Hórus! No mínimo deve ter arranjado outra para fazer companhia!

Tonks revirou-se na cama com esses pensamentos nada animadores. Na verdade, eles não tinham nenhum compromisso, ela não podia cobrar nada dele. Além do que, ele sequer sabia quem ela realmente era! Talvez fosse hora afinal de esquecer aquela paixão infantil que sentia desde que pusera os olhos sobre Remo Lupin.



--------------------------------------------------------------------------------


- Ele não vai chegar à tempo. - Lílian observou - Da última vez em que mandou notícias, o Remo estava na Rússia, a essa altura ele já está na terra do Sol Nascente. Vocês deviam ter mando esses convites bem antes.

- Lily, obrigado pela força... - Tiago respondeu enquanto amarrava a grossa carta no pé de Deméter, a coruja da namorada.

- Tiago, vocês se formam na Academia semana que vem. Você acha realmente que essa carta vai chegar a tempo?

- Então porque você escreveu?

- Não sou eu que estou me formando. E eu não ia deixar passar a oportunidade de escrever para o Remo.

O moreno suspirou derrotado. Lílian observou Tiago levar a coruja até a janela e deixá-la voar. Rapidamente ela desapareceu de vista, e logo os dois ficaram sozinhos.

- Tiago?

- O que é?

- Você e o Sirius, apesar de se formarem semana que vem vão continuar tendo as aulas de defesa pessoal, não é?

Ele assentiu.

- Mas Moody aceitou trocar o horário. Embora eu não ache que ele tenha feito isso pensando em nos deixar ter um pouco de tempo livre...

- Os ataques têm se intensificado. Mas o Ministério está tentando abafar o que está acontecendo, logicamente que sem sucesso. Já não estão conseguindo censurar os jornais.

- Como você sabe que está havendo censura? O Profeta Diário está sempre estampando as mortes que acontecem de trouxas por toda a Grã-Bretanha.

- Estão escondendo os assassinatos de bruxos. Por hora, estão falando apenas dos trouxas, que não têm como se defender. Assim, os bruxos acreditam que, se forem atacados, poderão fazer alguma coisa. Já faz algum tempo que não há nenhum ataque massivo, como o que aconteceu em Hogsmeade há alguns anos. Mas isso não significa que bruxos não estejam sendo assassinados. E bruxos importantes. A casa do Sr. Crouch foi atacada a pouco tempo, por sorte a esposa e o filho dele conseguiram se esconder.

- Onde você consegue essas informações, Lily?

- Com a Susan. Ela trabalha no mesmo departamento em que fica o Quartel-general dos Aurores.

- Então eu também vou ficar sabendo dessas coisas... Mas vamos esquecer essa guerra, pelo menos por enquanto. Faz um bocado de tempo que nossas "folgas" não coincidem...

O rapaz estampou um sorriso malicioso e Lílian respirou fundo, embora também sorrisse interiormente.



--------------------------------------------------------------------------------


Remo observou a esfera luminosa parar diante do monte de arroz que ele depositara na entrada do cemitério. Imediatamente a esfera transformou-se num homem baixo, que pôs-se de joelhos e começou a contar, grão por grão, o arroz. O rapaz sorriu. Só naquele canto do mundo para um vampiro ser criado por um pulo de gato e ter de parar para contar todo monte de arroz que encontra no caminho...

- Incendio!

Com um aceno da varinha, Remo apareceu diante do Ch'Iang Shih, que pegou fogo sem emitir um ruído sequer, logo tranformando-se me cinzas. satisfeito com o fim de sua caçada, o rapaz olhou para a lua, que já estava quase que completamente cheia.

- Só mais duas noites. - ele murmurou para si mesmo, começando a caminhar de volta para o pequeno vilarejo.

No dia seguinte teria que começar a se afastar, ou acabaria por cometer uma carnificina quando se transformasse. Ele passou pelo casal de velhinhos que cuidavam da pequena estalagem em que estava hospedado e cumprimentou-os com a cabeça antes de seguir para o seu quarto, pensando que precisava de mais pílulas de tradução o mais rápido possível. Quando finalmente penetrou no cubículo que ocupava há quase um mês, encontrou, para sua surpresa, duas corujas empoleiradas: Apolo de Sirius e Deméter de Lílian.

Com um sorriso, ele desembaraçou as corujas dos três grandes pergaminhos que elas traziam. A primeira era uma carta de Lílian, que perguntava como estavam os estudos e falava empolgada sobre as aulas no St. Mungus (Chegando a descrever dissecações que causaram arrepio no maroto). A segunda, de Tiago, começava pedindo desculpas pelas loucuras da namorada e avisava que em breve ele e Sirius estariam se formando. A terceira, de Sirius, acompanhava um pequeno envelope. Depois de ler duas páginas sobre todos os dotes da professora de defesa pessoal que os dois amigos tinham, louvores à Camille Dearborn e Muitas histórias de encontros mirabolantes, Remo abriu o envelope, encontrando um convite para a formatura deles, que fôra a duas semanas.

Dando uma olhada para a data em que as cartas tinham sido escritas, ele aproximou-se das duas corujas, entregando a elas água e comida.

- Dei trabalho para vocês, não? Quase um mês me procurando por todo o continente... Merecem descansar bastante.

Deméter e Apolo piaram fraco, logo atacando o que lhes era oferecido. Remo observou as duas e as cartas dos amigos. Eles não deviam estar muito felizes com seu não comparecimento à festa deles. Decidido, ele caminhou até sua única mala, começando a arrumar tudo o que possuía nela.

Definitivamente, já passara da hora de voltar para casa...



--------------------------------------------------------------------------------


Dumbledore estava sozinho em seu escritório, observando os enfeites de natal que cobriam sua mesa. Mais um ano estava terminando. Mais um ano de guerra. E a situação estava realmente coemçando a ficar crítica. O Ministério logo não suportaria mais a pressão.

Fawkes soltou uma nota triste e o velho diretor olhou com carinho para a fênix, voltando depois o olhar para uma série de livros muito antigos que estavam empilhados no chão.

- Você prevê tempos difíceis, não é, Fawkes? Especialmente para a guardiã.

A fênix soltou mais um pio fraco e Dumbledore voltou a olhar para a janela, onde a neve começava a se acumular.

- Talvez seja hora de parar de temer... Eu não queria envolver aqueles jovens nessa maldita guerra. Se eu pudesse...

Fawkes cantou suavemente, interrompendo-o e voou até o ombro dele. O velho suspirou.

- Muito bem, eu escreverei a Alastor. Vejamos o que posso fazer.



--------------------------------------------------------------------------------


Remo acabou de arrumar a pequena sala da casa onde sua mãe morara até o ano anterior, quando falecera. Depois se deixou cair no antigo sofá e olhou para sua mala, ainda não desfeita e para a gaiola em que Deméter e Apolo dormitavam. Decidira trazer as corujas consigo ao invés de mandá-las de volta para os amigos, pois chegaria e elas ainda estariam muito longe, mesmo com o atraso de uma semana que tivera pela transformação na lua cheia.

Ia ser uma bela surpresa quando aparecesse na casa dos amigos com as corujas... Quantos anos não se viam? Quase dois. Realmente, seria muito bom reencontrá-los depois de tanto tempo. Mergulhado em pensamentos sobre a reação dos outros marotos, Remo só percebeu a coruja que batia no vidro fechado da janela há meia hora quando ela deu um vôo rasante na chaminé, quase caindo no fogo da lareira.

Era uma grande coruja, como as que tantas vezes pegara na escola para mandar cartas aos pais. Curioso, o rapaz desamarrou o pergaminho lacrado que a coruja lhe ofereceu, logo reconhecendo a figura do lacre. O brasão de Hogwarts.



--------------------------------------------------------------------------------


Tonks prendeu o cabelo num rabo de cavalo, saindo do banheiro em seguida para encontrar Grimassi, sua colega de quarto, já impaciente.

- Tonks, você vai passar o natal aqui, não podia esperar pelos que precisam ir embora para acampar no banheiro?

- Calma, Grimassi! - a morena respondeu sem perder o bom humor - Ele é todo seu, fique à vontade.

A outra garota passou pela morena, fechando a porta pesadamente, sem no entanto abalar Tonks, que já estava mais que acostumada com os ataques da colega de quarto. Assim, assoviando alegremente, a garota saiu da sala comunal da Lufa-lufa, disposta a brincar um pouco na neve que se acumulara nos campos da escola. Antes, é claro, faria uma visita a Hagrid para ver se ele tinha mais algum bichinho interesante para mostrar a ela.

Ela saiu do castelo, sentindo uma lufada de ar frio penetrar-lhe pelo casaco, mas não se importou, seguindo o caminho por tantas vezes percorrido, distraidamente, até se dar conta de que estava diante do corujal. Tonks sentiu ímpetos de procurar Hórus e escrever mais uma carta para Remo. Mas controlou-se. Ele nunca mais respondera, porque deveria continuar a insistir?

Com esses pensamentos, ela afastou-se do corujal, com o humor um pouco diferente do que quando acordara. Aquele ia ser mais um longo dia...



--------------------------------------------------------------------------------


Mais um natal. Aos poucos a neve se acumulava nos pátios de Hogwarts. Remo sorriu ao ver os flocos que caíam. Chegara a pouco de Hogsmeade para a reunião que Dumbledore marcara, torcendo para que os amigos também tivessem sido chamados, pois ainda não pudera vê-los. Alguém parou ao seu lado.

- Eu sinto muita falta da época em que éramos nós a brincar lá fora. - Selene observou, apontando para as crianças que brincavam na neve.

- Nossas únicas preocupações eram como azarar o Snape no dia seguinte, como fugir de uma monitora ruiva raivosa enquanto tentávamos fazê-la se apaixonar pelo ser que ela mais detestava sobre a face da terra e quem conseguia comer mais no jantar. Éramos uns idiotas. Mas eu também sinto saudades disso.

Selene sorriu.

- Infelizmente não podemos mais voltar no tempo. Mas o que está fazendo aqui? Pensei que estivesse fora do país.

- Cheguei a dois dias. Dumbledore me mandou uma carta.

- Dumbledore? Porque o diretor mandou uma carta para você?

- Ele disse que era para tomar chá, mas duvido muito que seja só isso. E você?

- Ouvi falar que a professora Áugure, de adivinhação, ia se aposentar, por isso vim visitá-la. Mas ela desistiu depois de consultar o tarô e descobrir que a sucessora dela ainda não está pronta para assumir o cargo.

Remo sorriu discretamente.

- Espero que não demore muito, ela precisa descansar... Mas você viu mais alguém da nossa turma por aí?

- Deveria? - Selene perguntou desconfiada - Por acaso vocês marcaram uma farra e não me convidaram?

- É claro que não! - Remo respondeu surpreso.

- Bem, mesmo que tivessem marcado, eu já tenho um compromisso essa noite, vou tocar em Londres. Então, eu vou indo, espero que possamos nos rever em breve. - a moça disse sorridente, despedindo-se.

Remo observou Selene desaparecer no corredor. efinitivamente, ela não mudara nada... Distraído, ele voltou a olhar para a janela, até passos ecoarem no corredor.

- Tonks, não corre, você vai...

Tarde demais. A garota se estatelou no chão, já perto do rapaz. Um outro garoto apareceu logo atrás dela. Rápido, Remo foi até a garota, ajudando-a a se levantar.

- Você está bem... - ele se interrompeu, olhando-a espantado.

Tonks tirou a poeira das mãos sem olhar para quem a ajudara.

- Tudo bem, isso acontece sempre. Obrigada. - ela disse, levantando o rosto para encarar Remo Lupin.

Antes que qualquer coisa pudesse ser dita, alguém fez Remo virar-se, dando um grande abraço nele. Tiago. Lílian e Sirius o olhavam sorrindo e Tonks aproveitou para sumir o quanto antes dali.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.